Paul Lee Corbett, morador de Washington, EUA, é um caçador de cogumelos mágicos de 63 anos com grande amor pela natureza. Entre 1968 e 1976, ele viveu, estudou e viajou entre o Noroeste do Pacífico, nas Rocky Mountains, e regiões do Alasca. Ele passou grande parte de sua vida no Alasca, onde sustentou sua família utilizando o ambiente que os rodeava. Ele utilizava redes e linhas para pesca, caçava seu alimento e cultivava seus vegetais. Além disso, é um amante de longas mochiladas entre o Alasca e a Colúmbia Britânica. “Eu amo a natureza e a paz de estar nela”, ele diz.
Enquanto explorava essas terras, Corbett ao mesmo tempo criou uma forte relação com o uso da paisagem através das substâncias enteógenas, como a cannabis, LSD, e cogumelos mágicos. Corbett conhece bastante, de fato, sobre cogumelos mágicos – e não somente por comer eles. Ele é um forrageador experiente com vasto conhecimentos sobre as diferentes espécies de cogumelos psicodélicos, que possuem uma diversidade de aproximadamente centenas de espécies, pertencendo a algumas dezenas de gêneros.
Ele dá crédito ao LSD em particular por ter “mudado sua mente em todas as direções” e libertado ele de seu vício em heroína. Mas os efeitos permanentes foram muito mais profundos. “Eu não me sentia mais confortável nessa sociedade, os Estados Unidos, ou até mesmo qualquer sociedade”, ele diz. Após suas experiências com drogas, ele deixou os EUA, viajando para o norte antes de chegar no Alaska, recomeçando sua vida em localidades remotas.
Atualmente, Corbett está enfrentando uma possível sentença de prisão de cinco anos por posse de cogumelos que contém psilocibina. Em novembro de 2016, ele foi preso por coletar cogumelos mágicos no Cape Disappointment Park no estado de Washington. Ele viu o que parecia ser uma nova espécie não identificada de cogumelo mágico, coletando o espécime para análise posterior. Corbett alega inocência, argumentando que ele não cometeu nenhum crime e não feriu ninguém. Ele estava apenas exercendo sua curiosidade natural, ele disse.
Ele coletou os primeiros cogumelos mágicos nos arredores de Seattle em 1972. “Aquilo abriu meus olhos para as informações recentes sobre estação e localização, então eu me tornei curioso sobre aquilo”, ele contou. “Eventualmente eu encontrei outras espécies de Psilocybe. Uma vez que você encontra o cogumelo, você aprende sobre os outros cogumelos que crescem com ele, quais são os tipos de árvore, qual tipo de substrato eles se desenvolvem, seja ele grama ou casca de árvore. Os cogumelos o educam sobre o resto da floresta e do ambiente também”.
Corbett estava fazendo uma trilha no Cape Disappointment Park quando ele notou grandes cogumelos avermelhados em uma pilha de lascas de madeira, que para seu conhecimento, não eram identificadas. Um sinal próximo dizia: “Proibido coletar cogumelos: violadores sujeitos a processo criminal”. Corbett ignorou o aviso, surpreendido por sua descoberta. “Todo mundo que vai para lá pens que esses cogumelos são Psilocybe azurescens, mas eles não são. Eles são mais potentes como os “liberty caps” (Psilocybe semilanceata), e são muito, muito bonitos. Mais perto, na grama, ele encontrou azurescens verdadeiros. Mais espécimes do cogumelo misterioso haviam surgido perto do local onde Corbett tinha estacionado seu caminhão.
Os cogumelos estranhos, Corbett acredita, são uma sub-espécie – senão uma espécie totalmente diferente – de azurescens. “Eu os coloco junto pois eles são claramente diferentes, sem nenhum engano. Eles não se parecem nenhum pouco”. Após armazenar a sacola em seu caminhão, Corbett coloca mais 10 cogumelos em seu bolso, quando um guarda sai dos arbustos com uma arma apontada para a cara de Corbett.
O guarda olhou nos bolsos de Corbett em procura dos cogumelos, e então o algemou. Outro guarda logo chegou também. Corbett revelou calmamente onde os outros cogumelos estavam armazenados, e os oficiais revistaram seu veículo. Ele foi preso e então levado para a prisão local. Depois que a polícia chamou um juiz, eles foram aconselhados a libertar Corbett. Ele voltou para a costa de Washington para sua esposa, Joyce, que ele nunca pode deixar sozinha por muito tempo pela sua debilidade física.
Corbett foi acusado de posse de uma substância controlada, punida em Washington com até 5 anos de prisão e fiança de 10.000 dólares. Foi oferecida a ele um acordo de um ano de condicional com 15 dias na prisão, mas ele imediatamente recusou. “Joyce utiliza a cannabis medicinal para reduzir um quarto de sua medicação para a dor”, ele explica, “mas na condicional ela não poderia nem estar no mesmo local que eu”.
“Além disso”, ele adiciona (com um tom de enfado), “eu não cometi um crime. Não existe nenhum lado prejudicado envolvido no que ocorreu, somente Joyce e eu. De fato, durante minhas coletas, eu provavelmente salvei centenas de pessoas que eram realmente estúpidas”. Nem todas as espécies de cogumelos são seguras para o consumo, ele afirma. Através do conhecimento que ele obteve e compartilhou em uma longa jornada de forrageio, ele preveniu iniciantes de sofrerem possíveis efeitos colaterais fatais.
Corbett esteve na corte diversas vezes desde o incidente, mas o caso ainda não foi resolvido. Vinte e quatro horas antes de um de seus compromissos na corte, foi ordenado que ele deixasse sua esposa no hospital sob risco de desrespeito ao tribunal – apesar dos pedidos do doutor para que fosse feito o contrário – e dirigisse por 6 horas de Fort Townshend, sua residência, para comparecer à audiência.
Corbett foi fustrado pelo que ele considerou conselho insuficiente ou até mesmo contraprodutivo de seus advogados, que sugeriram a ele se declarar culpado. Eles se recusaram a discutir qualquer coisa relacionada a cogumelos ou enteógenos, e esperam que Corbett aceite a acusação e cumpra a pena. Mas ele está determinado a desafiar a lei e provar sua inocência.
Desde então ele despediu seus advogados e espera contratar um que represente melhor ele e sua situação única. Ele abriu uma campanha de arrecadação para custear as despesas legais e as despesas médicas de sua parceira.
Desde a prisão, Corbett e Joyce tem viajado por Washington, devido à uma recente hospitalização e cirurgia que Joyce foi submetida. Ele afirma que a pior consequência provável de sua convicção será deixar para trás sua parceira. “Nós estamos vivendo em um acampamento agora – que é muito bom – mas ela não é capaz de viver sozinha”. Ambos dependem da renda por invalidez, e não possuem dinheiro para aluguéis.
Corbett dá um suspiro profundo quando expõe essa situação. “Isso deve acabar. As pessoas precisam se educar. Minha esperança é educar toda a corte. É um mistério para todos nós o motivo desses cogumelos serem ilegais. E é um mistério para mim por que a palavra ‘liberdade’ não se aplica à minha curiosidade e uso enteogênico”.
Ele está inseguro do seu próprio destino, mas ele não perdeu a fé nas gerações jovens. “Eu tenho a esperança que a educação sobre essas substâncias enteogênicas possam nos auxiliar a mudar o mundo, pois estou preocupado com ele. Eu espero que esse novo movimento possa mudar as coisas. Então nós olhamos para tudo – cada um e a Terra – de um modo que seja mais cuidadoso e mais para o lado do amor.
“Eu acho que as pessoas realmente não conhecem os cogumelos e onde eles habitam. Eles vivem em lindos lugares, lugares incríveis. E novamente eles também nos seguem seja por onde formos. Eles querem estar conosco, e nos ensinar”.
Corbett retornará ao julgamento em novembro de 2017, depois de mais duas audiências programadas no outono.
— A princípio, eu não estava de acordo com a ideia depublicar esta entrevista [na revista High Times]. Eu estava chocado e surpreso pela existência de tal revista, cujos textos e propagandas tendem a tratar o assunto das drogas ilegais com uma atitude casual e irresponsável. Também, a maneira com a qual a High Times trata sobre a política da maconha, cujo problema necessita urgentemente de uma solução, não corresponde à minha abordagem. Mesmo assim, eu cheguei a decisão de que minhas declarações, aparecendo numa revista direcionada a leitores que, atualmente, fazem uso de drogas ilegais, pode ser de especial valor e poderia ajudar a diminuir o abuso e uso indevido das drogas psicodélicas. Michael Horowitz convenceu-me de que uma descrição precisa da descoberta do LSD, das plantas mágicas mexicanas (sobre as quais tantas versões enganosas existem), e minha opinião dos vários aspectos do problema das drogas, dentre outros tópicos, seria útil para uma grande e interessada audiência de pessoas nos Estados Unidos. Esta entrevista tem como objetivos a promoção de informação sobre o que essa classe de drogas pode e não pode fazer, e quais são os seus potenciais perigos.
No alto da Segunda Guerra Mundial, quatro meses após a criação artificial da primeira reação nuclear ser liberada em uma pilha de minério de urânio em Chicago, um traço acidentalmente absorvido do produto de um semi natural fungo do centeio, silenciosamente explodiu no cérebro de um químico suíço de 37 anos, que trabalhava nos laboratórios de pesquisa da Sandoz em Basel. Ele relatou ao seu diretor:
“Fui forçado a interromper meu trabalho no laboratório no meio da tarde e ir para casa, enquanto eu era apreendido por uma peculiar inquietação associada a uma sensação moderada de tontura… uma espécie de embriaguez que não era desagradável, e que era caracterizada por uma atividade extrema da imaginação … surgiu sobre mim um fluxo ininterrupto de imagens fantásticas de plasticidade e vividez extraordinárias e acompanhadas por um intenso, caleidoscópio jogo de cores….”
Três dias depois, em 19 de abril de 1943, o Dr. Albert Hofmann ocupou-se de um auto experimento, que tanto confirmou os resultados de sua experiência psicoativa anterior, como revelou uma fascinante nova descoberta: aqui jazia a primeira substância conhecida a produzir efeitos psíquicos em dosagens muito pequenas, mensuráveis apenas em microgramas! O Dr. Hofmann havia descoberto o LSD-25.
A dietilamida do ácido lisérgico (LSD) foi entusiasticamente investigada pela profissão psiquiátrica europeia como uma possível chave para a natureza química da doença mental. Acreditava-se que seus efeitos mimetizavam o estado psicótico. Assim que o LSD foi introduzido na psiquiatria americana em 1950, rapidamente o interesse disseminou-se entre os militares dos Estados Unidos e aos interesses de segurança nacional. Em meados de 1950, o LSD estava sendo pesquisado como um intensificador da criatividade e estimulador da aprendizagem; rumores de suas qualidade extáticas, místicas e psíquicas começaram a vazar através dos escritos de Aldous Huxley, Robert Graves e outros luminares literários.
Um experimento de Harvard, não médico e em larga escala, envolvendo o LSD e outras drogas psicodélicas no início dos anos 60, precipitou uma feroz controvérsia sobre os limites da liberdade acadêmica, e focou a atenção nacional na droga hoje conhecida como “ácido”. A meio caminho da turbulenta década, um milhão de pessoas havia experimentado o LSD do mercado-negro, engendrando uma revolução neurológica cujo o resultado ainda não foi averiguado. Em 1966, o Congresso proibiu o LSD.
O Dr. Hofmann hoje vive numa aposentadoria confortável, em uma colina com vista para a fronteira Suíça-França. Ele concedeu a High Times esta exclusiva entrevista, para discutir não apenas as implicações de sua descoberta do LSD, mas também suas investigações químicas menos divulgadas, sobre os agentes ativos de várias plantas sagradas mexicanas.
Considerando o trabalho de sua vida, o Dr. Hofmann parece um provável candidato ao Prêmio Nobel em química. Suas descobertas não apenas ampliaram nosso conhecimento de químicos psicoativos e disparou a imaginação de milhares de cientistas, historiadores e outros pesquisadores; mas elas tiveram um direto e revolucionário impacto na habilidade da humanidade de entender e ajudar a si mesma.
Horowitz:
Que trabalho você fazia antes de descobrir o LSD?
Hoffman:
Nos primeiros anos de minha carreira, no laboratório de pesquisas farmacêuticas da Sandoz em Basel, eu estava ocupado principalmente com investigações sobre componentes cardíacos, glicosídeos da cila (ou “Scilla maritima”). Estas investigações resultaram na elucidação da constituição química do núcleo comum destes agentes, fornecendo medicamentos valiosos que são amiúde usados no tratamento de insuficiência cardíaca.
A partir de 1935, eu trabalhei nos alcalóides do ergot, resultando no desenvolvimento da ergonovina, a primeira preparação sintética de alcalóides naturais do ergot: Methergin, usado em obstetrícia para interromper hemorragias; e Hydergine, para queixas geriátricas.
Em 1943, os resultados deste primeiro período da minha pesquisa na área do ergot foram publicados num jornal científico, “Helvetica Chimica Acta”. Como resultado de meus primeiros oito anos da pesquisa com ergot, eu sintetizei um grande número de derivados do ergot: amidas do ácido lisérgico; o ácido lisérgico sendo o núcleo característico dos alcalóides naturais do ergot. Dentre essas amidas do ácido lisérgico, também estava a dietilamida do ácido lisérgico.
Horowitz:
Você tinha LSD em seu laboratório já em 1938?
Hofmann:
Sim. Na época, uma série de experimentos farmacológicos estavam sendo realizados no departamento de farmacologia da Sandoz. Excitação acentuada foi observada em alguns dos animais. Mas estes efeitos não pareceram interessantes o suficiente aos meus colegas de departamento. O trabalho com LSD foi suspenso por vários anos. Como eu tinha um sentimento estranho de que seria valioso executar estudos mais profundos neste composto, acabei preparando uma quantidade fresca de LSD na primavera de 1943. No decorrer deste trabalho, uma observação acidental levou-me a executar um planejado auto experimento com tal composto, que então resultou na descoberta dos extraordinários efeitos psíquicos do LSD.
Horowitz:
Que tipo de droga você estava tentando fazer quando sintetizou o LSD?
Hofmann:
Quando eu sintetizei a dietilamida do ácido lisérgico, código de laboratório LSD-25 (ou simplesmente LSD), eu havia planejado a preparação de um composto analéptico; um estimulante circulatório e respiratório. A dietilamida do ácido lisérgico está relacionado, em sua estrutura química, com a dietilamida do ácido nicotínico, conhecido por ser um analéptico eficaz.
Horowitz:
A descoberta do LSD foi um acidente?
Hofmann:
Eu diria que o LSD foi resultado de um complexo processo, que teve sua gênese em um conceito bem definido, seguido por uma síntese apropriada, isto é, a síntese da dietilamida do ácido lisérgio – durante o curso do qual uma observação fortuita serviu como gatilho para um auto experimento planejado, que então levou a descoberta dos efeitos psíquicos deste composto.
Howoritz:
“LSD-25” significa que a preparação do LSD, com os característicos efeitos psicoativos, foi a vigésima quinta que você fez?
Hofmann:
Não, o número 25 por trás do LSD significa que a dietilamida do ácido lisérgico foi o vigésimo quinto composto que eu havia preparado numa série de amidas do ácido lisérgico.
Horowitz:
No relato publicado de sua primeira experiência com o LSD, em 16 de abril de 1943, às 15h00 em Basel, você escreveu sobre uma “intoxicação de laboratório”. Você engoliu algo, respirou um vapor, ou algumas gotas de solução caíram sobre você?
Hofmann:
Não, eu não engoli nada, e eu estava acostumado a trabalhar sob várias condições de limpeza pois, em geral, essas substâncias são tóxicas. Você deve trabalhar muito, muito limpo. Provavelmente, um traço da solução de dietilamida do ácido lisérgico, que eu estava cristalizando do álcool metílico, foi absorvido através da pele dos meu dedos.
Horowitz:
Quão grande foi a dose que você tomou naquela primeira vez, e qual foi a natureza e intensidade daquela experiência?
Hofmann:
Eu não sei—um traço imensurável. A primeira experiência foi bem fraca, consistindo em pequenas mudanças. Tinha uma agradável qualidade de filme de conto de fadas. Três dias depois, em 19 de abril, 1943, eu fiz meu primeiro experimento planejado, com 0,25 miligramas (ou 250 microgramas).
Horowitz:
Você engoliu?
Hofmann:
Sim, eu preparei uma solução de 5 miligramas e tomei uma fração correspondente a 250 microgramas, ou 25 milionésimos de uma grama. Eu não esperava que esta dose funcionasse, e planejava tomar mais e mais, até obter os efeitos. Na época, não havia nenhuma outra substância conhecida que tivesse qualquer efeito numa dose tão pequena.
Horowitz:
Os seus colegas sabiam que você estava fazendo este experimento?
Hofmann:
Somente meu assistente.
“Das minhas experiências com LSD… eu recebi o conhecimento de não apenas uma, mas de um número infinito de realidades.”
Horowitz:
Você estava familiarizado com o trabalho sobre mescalina feito por Klüver, Beringer e Rouhier no final dos anos 1920, antes de você fazer, em você mesmo, experimentos com substâncias alteradoras da mente?
Hofmann:
Não – eu fiquei interessado no trabalho deles somente após a descoberta do LSD. Eles são pioneiros na área das plantas psicoativas.
A mescalina, estudada pela primeira vez por Lewin em 1888, foi o primeiro alucinógeno disponível como um composto quimicamente puro; LSD foi o segundo. As investigações de Karl Beringer foram publicadas na clássica monografia “Der Meskalinrausch” em 1928, mas nos anos seguintes, interesse na pesquisa de alucinógenos desapareceu gradualmente.
Não foi até minha descoberta do LSD, que é aproximadamente 5.000 a 10.000 vezes mais ativo que a mescalina, que esta linha de pesquisa recebeu novo ímpeto.
Horowitz:
Naquela tarde, por quanto tempo você conseguiu escrever notas de laboratório?
Hofmann:
Não muito. À medida que os efeitos se intensificavam, eu percebia não saber o que iria acontecer, se algum dia eu voltaria ao normal. Eu pensei que estava morrendo ou ficando louco. Eu pensei na minha esposa e duas crianças pequenas, que nunca saberiam, ou entenderiam, por que eu teria feito aquilo. Meu primeiro auto experimento planejado com o LSD foi uma “bad trip”, como dizem nos dias de hoje.
Horowitz:
Por que levou quatro anos, desde a sua descoberta dos efeitos psíquicos do LSD, até a publicação de seu relato? Sua informação foi abafada?
Hofmann:
Não havia abafamento sobre este conhecimento. Depois da confirmação, por parte dos meus voluntários da equipe da Sandoz, da ação deste extraordinário composto, o Professor Arthur Stoll, que na época era o diretor do departamento de farmacologia da Sandoz, perguntou-me se eu permitiria seu filho, Werner A. Stoll—que estava iniciando sua carreira no hospital psiquiátrico da Universidade de Zurique—enviar este novo agente para um estudo psiquiátrico fundamental em voluntários normais e em pacientes psiquiátricos. Esta investigação levou um longo tempo, pois, o Dr. Stoll, assim como eu e a maioria dos jovens suíços naquele período de guerra, frequentemente tínhamos que interromper nossos serviços e servir ao exército. Esse excelente e compreensivo estudo não foi publicado até 1947.
Horowitz:
Agentes governamentais, cientes do LSD, lhe abordaram durante a Segunda Guerra Mundial?
Hofmann:
Antes do relatório psiquiátrico de Werner Stoll em 1947, não havia nenhum conhecimento geral sobre o LSD. Em contrapartida, nos círculos militares dos anos 1950, havia discussão aberta sobre o LSD como uma “droga incapacitante”, e portanto “uma arma sem morte”. Na época, o Exército dos EUA enviou um representativo a Sandoz para falar comigo sobre o procedimento de produção de LSD em larga quantidade.
Claro, o plano de usá-lo como um “agente incapacitante” não foi viável, pois não havia maneira de distribuir uniformemente as doses—alguns tomariam um monte e outros não tomariam nada. Discussões sobre os usos militares do LSD não eram segredo naqueles tempos, apesar de alguns jornalistas falarem como se fosse.
Horowitz:
O nome de Arthur Stoll aparece junto ao seu no artigo de química onde a síntese do LSD é descrita pela primeira vez. Qual era a conexão dele com esta investigação?
Hofmann:
O nome de Stoll, como parte de sua função de diretor do departamento, aparece em todos os artigos vindos dos laboratórios de pesquisa da Sandoz; mas ele não teve conexão direta nenhuma com a descoberta do LSD. Ele foi um dos pioneiros na pesquisa com ergot, tendo isolado em 1918 o primeiro alcalóide quimicamente puro do ergot—a ergotamina—que mostrou ser um medicamento útil no tratamento de enxaqueca. Mas então a pesquisa com ergot foi interrompida na Sandoz, até que eu retomei-a novamente em 1935.
Horowitz:
Quem foi a segunda pessoa a tomar LSD?
Hofmann:
Professor Ernst Rothlin, o então diretor do departamento de farmacologia da Sandoz. Rothlin estava duvidoso quanto ao LSD; ele alegou ter uma volição forte, e que era capaz de suprimir os efeitos de drogas. Mas após ter tomado 60 microgramas—um quarto da dose que eu havia tomado—ele ficou convencido. Eu tive que rir enquanto ele descrevia suas fantásticas visões.
Horowitz:
Você tomou LSD fora do laboratório?
Hofmann:
Por volta de 1949 a 1951, eu arranjei algumas sessões domiciliares com LSD, na companhia amigável e privada de dois bons amigos: o farmacologista Heribert-Konzett, e o escritor Ernst Jüenger. Jüenger é o autor de, entre outras obras, “Abordando Revelações: Drogas e Narcóticos” [“Annaeherungen; Drogen und Rausch“. Stuttgart: Klett. 1970].
Eu fiz isso com o intuito de investigar a influência dos arredores, das condições exterior e interior na experiência do LSD. Esses experimentos mostraram-me o enorme impacto do—para usar termos modernos—set & setting sobre o conteúdo e caráter da experiência.
Também aprendi que o planejamento tem suas limitações. Apesar do bom humor no início de uma sessão—expectativas positivas, belos cenários e companhia simpática—certa vez eu caí numa terrível depressão. Esta imprevisibilidade dos efeitos é o maior perigo do LSD.
Horowitz:
Há quanto tempo e com que frequência você continua a tomar LSD?
Hofmann:
Os meus 10 a 15 experimentos com LSD foram distribuídos ao longo de 27 anos. O último foi em 1970. Desde então, eu não tomei mais LSD, pois acredito que, tudo o que uma experiência de LSD pode me dar, já foi-me dado. Talvez, mais tarde em minha vida, eu precise tomar uma ou várias vezes mais.
Horowitz:
Qual foi a sua maior dose única de LSD tomada?
Hofmann:
250 microgramas.
Horowitz:
Você recomendaria o uso de LSD?
Hofmann:
Eu suponho que sua pergunta refere-se ao uso não medicinal de LSD. Atualmente, se tal uso fosse legal (o que não é o caso), eu sugeriria as seguintes diretrizes: a experiência é melhor conduzida por uma pessoas madura, estável e com uma razão significativa para tomar o LSD.
No que diz respeito aos seus efeitos psíquicos e sua constituição química, o LSD pertence àquele grupo de drogas mexicanas, “peyotl”, “teononocotl” e “ololiuqui”, que tornaram-se drogas sagradas devido a sua misteriosa maneira de afetar o cerne da mente.
A veneração temerosa das religiões indígenas pela droga psicodélica, pode ser substituída, em nossa sociedade, por respeito e reverência, baseado em conhecimento científico estabelecido de seus efeitos psíquicos únicos.
Esta atitude respeitosa em relação ao LSD, deve ser complementada por condições externas apropriadas—pela escolha de um ambiente inspirador e uma companhia selecionada para a sessão; e havendo assistência médica disponível, no caso em que for preciso.
Horowitz:
Os efeitos do ergotismo são similares aos do LSD?
Hofmann:
Há duas formas de ergotismo: “ergotismus gangrenosus” e “ergotismus convulsivus”. A primeira é caracterizada por sintomas de gangrena, porém não acompanha efeitos psíquicos. Na última forma, contrações e convulsões dos músculos acarretam, frenquentemente, num estado comparável à epilepsia—uma condição às vezes acompanhada por alucinações, e assim relacionada aos efeitos do LSD. Isso pode ser explicado pelo fato de que os alcalóides do ergot têm o mesmo núcleo básico que o LSD; isto é, eles são derivados do ácido lisérgico.
“Eu fiquei sabendo… que os russos estudaram os usos do LSD em investigações militares e parapsicológicas; e que eles estavam à procura de um antídoto.”
Horowitz:
Você concorda com o termo “psicodélico”, cunhado pelo Dr. Humphry Osmond?
Hofmann:
Eu acho que é um bom termo. Corresponde melhor aos efeitos dessas drogas do que “alucinógenos” ou “psicotomiméticos”. Outra denominação adequada seria “phantastica”, cunhada por Loius Lewin nos anos 1920; mas não foi aceita em países anglo-saxônicos.
Horowitz:
Você descreveu as suas investigações sobre drogas psicoativas como um “círculo mágico”. O que você quer dizer?
Hofmann:
Minhas investigações com as amidas do ácido lisérgico me levaram ao LSD. O LSD trouxe os cogumelos sagrados mexicanos à minha atenção, que levou à síntese de psilocibina, que por sua vez trouxe a visita de Gordon Wasson e as subsequentes investigações com o “ololiuqui”. Lá, de novo eu me encontrei com as amidas do ácido lisérgico, encerrando o círculo mágico 17 anos depois.
Horowitz:
Você pode descrever os eventos que levaram a isso?
Hofmann:
Após ter estudado a cerimônia do cogumelo no México, durante 1954 e 1955, Gordon Wasson e sua esposa convidaram o micologista Roger Heim a acompanhá-los numa nova expedição em 1956, a fim de identificar o cogumelo sagrado.
Ele descobriu que, a maioria dos cogumelos, eram de uma nova espécie pertencente ao gênero “Psilocybe mexicana”, da família “Strophariaceae”. Em seu laboratório em Paris, ele foi capaz de artificialmente cultivar alguns deles, mas, após tentativas mal sucedidas em isolar o princípio ativo, ele enviou os cogumelos sagrados aos laboratórios Sandoz, na esperança de que nossa experiência com LSD nos permitiria resolver o problema. Num certo sentido, o LSD trouxe os cogumelos sagrados ao meu laboratório. Primeiramente, testamos o extrato de cogumelo em animais, mas os resultados foram negativos. Era incerto se os cogumelos cultivados e secados em Paris continuavam ativos; então, a fim de resolver este ponto fundamental, decidi testá-los em mim mesmo. Eu comi 32 espécimes secos de “Psilocybe mexicana”.
Horowitz:
Não é uma dose grande?
Hofmann:
Não. Os cogumelos eram muito pequenos, pesando apenas 2,4 gramas—uma dose média, segundo os padrões indígenas.
Horowitz:
Como foi?
Hofmann:
Tudo assumiu um caráter mexicano, fosse com meus olhos fechados ou abertos. Eu via apenas temas e cores mexicanas. Quando o doutor, supervisionando o experimento, curvou-se para verificar minha pressão sanguínea, ele foi transformado em um sacerdote asteca, e eu não ficaria surpreso se ele houvesse sacado uma faca de obsidiana.
Foi uma experiência forte e durou cerca de seis horas. Os cogumelos estavam ativos; os teste em animais deram resultados negativos devido à comparável baixa sensibilidade dos animais para substâncias com efeitos psíquicos.
Horowitz:
Você então procedeu com a síntese?
Hofmann:
Depois deste confiável teste em seres humanos (o que significa que eu e meus colegas de trabalho ingeriram as frações a serem testadas), eu extraí os princípios ativos dos cogumelos, purifiquei-os e finalmente os cristalizei.
Eu nomeei “psilocibina” o principal princípio ativo do “Psilocybe mexicana”; e psilocina para o seu alcalóide acompanhante, geralmente presente apenas em quantidades pequenas. Então, eu e meus colegas estávamos capazes de elucidar a estrutura química da psilocibina e psilocina, e após isso, nós conseguimos sintetizar tais compostos.
Hoje, a produção sintética de psilocibina é muito mais econômica do que obter do próprio cogumelo. Assim, o “teonanacatl” fora desmistificado—as duas substâncias, cujo efeitos mágicos fizeram os indígenas mexicanos acreditarem por milhares de anos que um deus residia no cogumelo, poderiam agora ser preparadas em uma retorta.
Horowitz:
Em uma de suas palestras gravadas, Aldous Huxley descreveu o encanto da famosa “curandera” de Wasson, Maria Sabina de Huautla, sobre a ingestão da psilocibina. Ela percebeu que poderia fazer magia durante todo o ano, e não apenas na sessão do cogumelo após as chuvas.
Hofmann:
Aquela era a minha psilocibina. Quando eu e Wasson visitamos Maria Sabina, não haviam cogumelos sagrados pois, era muito tarde na estação do ano; então fornecemos a ela pílulas contento psilocibina sintética.
Após ter tomado uma dose um tanto forte, no decorrer da sessão noturna, ela disse não haver diferenças entre as pílulas e os cogumelos. “O espírito do cogumelo está na pílula”, disse ela—prova final de que nossa preparação sintética era idêntica, em todos os aspectos, ao produto natural.
Horowitz:
O que incitou sua investigação de outra das plantas sagradas mexicanas, o “ololiuqui”?
Hofmann:
Quando Wasson veio a Sandoz, em meu laboratório, para ver os cristais de psilocibina sintética, ele estava encantado com os resultados de nossa investigação química, que haviam confirmado seus estudos etnomicológicos sobre os cogumelos sagrados. Nos tornamos amigos e fizemos planos futuros para investigar as plantas sagradas mexicanas.
O próximo problema que decidimos atacar, foi o enigma do “ololiuqui”, que é o nome asteca para as sementes de certas glórias-da-manhã. Com a ajuda de Wasson, eu pude obter sementes de “ololiuqui” coletadas por indígenas zapotecas. A análise química (das sementes de “ololiuqui”) forneceu um resultado bastante surpreendente. O princípio ativo que isolamos mostrou-se ser a amida do ácido lisérgico, e outros alcalóides do ergot.
Horowitz:
Então o “ololiuqui” é quimicamente relacionado ao LSD?
Hofmann:
Sim. O principal alcalóide do “ololiuqui” é a amida do ácido lisérgico, que difere do LSD—da dietilamida do ácido lisérgico—por apenas dois radicais etil. Eu não esperava encontrar derivados do ácido lisérgico—que na época eram conhecidos apenas como produtos de fungos inferiores do tipo ergot—também em plantas superiores, em espécies da glória-da-manhã da fanerogâmica família dos “Convolvulaceae”. Meus resultados foram tão surpreendentes, que o primeiro artigo enviado sobre o assunto, em Melbourne em 1960, havia sido recebido com ceticismo pelos meus colegas. Eles não acreditavam em mim. “Oh, você tem tantos compostos de ácido lisérgico em seu laboratório, talvez tenha contaminado seu “ololiuqui” com extratos deles”, diziam eles.
Horowitz:
Qual era o propósito de sua jornada ao México?
Hofmann:
Era uma expedição que Wasson organizou no outuno de 1962, em busca por outra não identificada e mágica planta mexicana, a saber, a chamada “hojas de la Pastora”. Nós viajamos a cavalo em trilhas indígenas pela Sierra Mazateca, chegando finalmente em tempo para estar presente numa cerimônia noturna, na cabana de uma curandera que utilizava o suco de folhas da “hojas de la Pastora”. Mais tarde, conseguimos obter algumas amostras da planta. Era uma nova espécie da família da hortelã, que foi, posteriormente, identificada botanicamente na Universidade de Harvard e nomeada “Salvia divinorum”. De volta ao meu laboratório na Sandoz, eu não tive sucesso em extrair o princípio ativo, que na “Salvia divinorum” é muito instável.
Horowitz:
Os efeitos psicoativos da “Salvia divinorum” são similares àqueles do LSD e “Psilocybe mexicana”?
Hofmann:
Sim, porém menos pronunciados.
Horowitz:
Quais escritores você acha que têm mais sucesso em transmitir a experiência psicodélica na literatura?
Na literatura alemã, Rudolf Gelpke merece ser mencionado a este respeito, mas eu creio que seu trabalho não esteja disponível em inglês. “Von Fahrten in den Weltraum der Seele” [“Viajem no Cosmos da Alma”], publicado no jornal “Antaios” em 1962, é especialmente bom. Eu devo também mencionar a nova monografia do Dr. Stan Grof, “Realms of the Human Unconscious” [New York: Viking, 1975], contendo descrições excelentes de sessões com LSD na perspectiva de estudos psiquiátricos.
Horowitz:
Herman Hesse ou Carl Jung alguma vez mostraram interesse em sua descoberta?
Hofmann:
Eu nunca conheci Hesse, mas seus livros—especialmente “O Jogo das Contas de Vidro” e “O Lobo da Estepe”—me interessaram profundamente em relação à pesquisa com LSD. É possível que Hesse experimentou com mescalina nos anos 1920, como alguns supõe—eu não tenho forma alguma de saber. Exceto um breve encontro com Jung, em um congresso internacional de psiquiatras, eu não tive contato com ele.
Horowitz:
Alguma vez você se encontrou com Aldous Huxley?
Hofmann:
Duas vezes. Em 1961, eu me encontrei com ele para almoço em Zurique; e novamente em 1963, quando ambos estávamos atendendo a Conferência WAAS [World Academy of Art and Science], onde tópicos gerais sobre superpopulação, esgotamento dos recursos naturais e ecologia foram discutidos. Eu fiquei profundamente impressionado com Huxley: ele irradiava vida, inteligência, bondade e franqueza—e claro, era extremamente articulado.
Horowitz:
O que você acha do “Livro Tibetado dos Mortos”, como um guia para a experiência psicodélica, conforme sugerido por Huxley e os pesquisadores de Harvard, dentre outros?
Hofmann:
As ideias e instruções gerais dadas, sobre como preparar e conduzir a sessão psicodélica, são o resultado de longas experiências nesta área, e parecem muito valiosas. O que me perturba é o uso estrangeiro do simbolismo tibetano. Eu prefiro que permaneçamos dentro do nosso próprio quadro cultural—que usemos símbolos encontrados nos escritos de místicos ocidentais, tais como Silesius, Eckhart, Boehme e Swedenborg.
Horowitz:
Qual foi sua impressão sobre o trabalho do Dr. Timothy Leary com psicodélicos?
Hofmann:
Eu formei minha primeira impressão do Dr. Leary em 1963. Naquela época, ele estava envolvido, juntamente com seu colega, o Dr. Richard Alpert, em um projeto na Universidade de Harvard investigando o uso de LSD e psilocibina na reabilitação de presidiários. O Dr. Leary me enviou um pedido de 100 gramas de LSD, e 25 quilos de psilocibina. Antes que o departamento de vendas da Sandoz pudesse executar a demanda de extraordinária quantidade de compostos psicodélicos, solicitamos ao Dr. Leary o fornecimento da licença de importação necessária das autoridades de saúde dos EUA. Ele falhou em fornecê-la. A maneira irrealista na qual ele lidou com esta transação, deixou a impressão de um pessoa indiferente aos regulamentos da sociedade.
Eu tive um vislumbre de outra faceta de seu caráter quando, mais tarde naquele mesmo ano, ele me convidou a participar de um encontro em Zihuatanejo (México) sobre pesquisa de drogas. Ele emfatizou que rádio, televisão e jornalistas das mais importantes mídias de massa estariam presentes, o que revelou uma personalidade muito pública em sua consciência.
Horowitz:
Você se encontrou com Leary mais tarde, não?
Hofmann:
Uma década depois que o Dr. Leary escapou da prisão e estava vivendo em exílio na Suíça. Eu estava ansioso para conhecê-lo pessoalmente, tendo lido tanto sobre ele na mídia durante o período de intervenção. No dia 3 de setembro de 1971, se encontraram em Lausanne o pai e o profeta do LSD.
Eu fiquei surpresso em encontrar, não um cientista do tipo professoral, nem um fanático; mas um delgado, sorridente e juvenil homem, representando mais um campeão de tênis do que um professor de Harvard.
No decorrer de nossa conversa, o Dr. Leary deu-me a impressão de uma pessoa idealística, que acredita na influência transformadora das drogas psicodélicas sobre a humanidade; que é consciente do complexo problema de drogas e, ainda assim, era desleixado quanto a todas as dificuldades envolvidas na promoção de suas ideias.
Horowitz:
Além do seu estilo pessoal, o que você achava das ideias do Dr. Leary na época de seu encontro na Suíça?
Hofmann:
Nós estávamos de acordo no que concerne a enorme importância de fazer uma distinção fundamental entre as drogas. Concordamos que o uso de drogas produtoras de dependência, especialmente a heroína (com seus desastrosos efeitos somáticos e psíquicos), deveriam ser evitadas por qualquer meio possível. Concordamos também, na avaliação dos potenciais efeitos benéficos das drogas psicodélicas. Nós discordamos quanto à extensão e por quem os psicodélicos devem ser usados.
Ao passo que o Dr. Leary advoga o uso de LSD, sob condições apropriadas, por pessoas muito jovens, por adolescentes, eu insisti que uma personalidade madura e estável fosse uma condição prévia. Madura pois, a droga pode liberar apenas o que já está na mente. Não traz nada novo—é como uma chave que pode abrir uma porta para o nosso subconsciente. Estável pois, é necessário força espiritual para manusear e integrar uma esmagadora experiência psicodélica em sua “Weltbild” (N.T.: visão de mundo).
Horowitz:
O LSD possui qualidades afrodisíacas?
Hofmann:
Apenas no sentido em que o LSD adiciona novas dimensões para todas experiências; incluindo, é claro, a sexual.
Horowitz:
Você se beneficiou financeiramente de sua descoberta do LSD?
Hofmann:
Não.
Horowitz:
A Sandoz é uma das maiores empresas farmacêuticas do mundo. Como que lidou com a produção e distribuição de uma substância tão controversa quanto o LSD?
Hofmann:
Desde o início, era claro que o LSD (apesar de suas extraordinárias qualidades) não tornaria-se uma preparação farmacêutica de valor comercial. Não obstante, a Sandoz colocou um enorme esforço em investigações científicas da substância, mostrando o papel eminente que o LSD poderia ter como uma excelente ferramenta na pesquisa do cérebro e na psiquiatria.
Portanto, a Sandoz tornou o LSD disponível no mundo todo, para investigadores clínicos e experimentais qualificados, a fim de promover tais pesquisas com ajuda técnica e, em muitas casos, auxílio financeiro. A Sandoz teve um papel nobre no desenvolvimento científico do LSD.
Horowitz:
A Sandoz interrompeu a produção de LSD porque ele estava entrando no mercado negro?
Hofmann:
Em 1965, no começo da histeria do LSD, a Sandoz interrompeu completamente a distribuição de LSD para propósitos de pesquisa, no intuito de evitar toda possibilidade (e para contrariar falsos rumores) de que o seu LSD estaria entrando no mercado negro. Outra razão, era forçar autoridades de saúde de diferentes países, a fornecer regras e regulações adequadas sobre a distribuição de LSD. Depois que isso foi realizado, novamente eles forneceram LSD para distribuição na América pela FDA [Food and Drug Administration], porém apenas aos investigadores licenciados.
“Aos 19 anos, eu tomei a decisão de tornar-me químico, por razões ambas místicas-filosóficas e curiosidade.”
Horowitz:
Nos Estados Unidos, tem havido uma recente grande investigação sobre experimentos indequados com LSD, conduzidos pela CIA, Exército, Marinha e outras agências governamentais. Eles obtiveram LSD da Sandoz, assim como Timothy Leary obteve o dele em seu projeto psicodélico de Harvard?
Hofmann:
A Sandoz fornecia a Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA (a FDA), que então distribuía na América. Provavelmente, foi assim que a CIA e outros obtiveram.
Horowitz:
Você alguma vez foi abordado por agentes soviéticos, à procura de LSD da Sandoz ou de suas especialidades?
Hofmann:
Isso não aconteceu. Eu fiquei sabendo, de cientistas suecos em Estocolmo, que os russos estudaram os usos do LSD em investigações militares e parapsicológicas; e que eles estavam à procura de um antídoto. Mas a empresa farmacêutica de Spofa, em Praga, é que provavelmente forneceu o LSD.
Horowitz:
Você está familiarizado com o químico underground, Stanley Owsley, que nos anos 60 produziu a mais ampla distribuição de LSD clandestino?
Hofmann:
Eu escutei o seu nome mencionado nesse contexto, porém, não sei mais nada sobre ele.
Horowitz:
Quanto tem sido a pureza do LSD clandestino que você testou?
Hofmann:
Alguns continham a quantidade “rotulada”, alguns menos. É difícil de fazer uma preparação estável em condições laboratoriais menos que perfeitas. Você deve eliminar todo traço de oxigênio. Oxidação destrói o LSD, assim como a luz.
Horowitz:
Vocês está familiarizado com a substância parecida com o LSD, chamada ALD-52, que teve destaque num julgamento sobre ácido há dois anos?
Hofmann:
Sim. ALD-52 é acetil-LSD, uma modificação do LSD que se mostrou ser tão ativa quanto o original, pois, o acetil é removido dentro do corpo e então você tem os efeitos do LSD. Tem sido utilizado apenas experimentalmente. Alguns anos atrás, nós o enviamos ao Centro de Reabilitação de Drogas em Lexington (Kentucky) para testagem.
Horowitz:
O que você sabe sobre ketamina?
Hofmann:
Ketamina é um psicodélico totalmente sintético, diferentemente do LSD, que é um produto semissintético.
Horowitz:
Para muitas pessoas, o LSD proporciona algo que elas chamam de experiências religiosas. Quais são seus sentimentos sobre isso?
Hofmann:
Pessoas a quem o LSD proporciona experiências religiosas, esperam ter tais experiências quando elas tomam LSD. Expectativa—que é idêntica à auto sugestão—determina, num alto grau, o que irá acontecer na sessão, pois, sua extrema sugestibilidade é uma das características mais importantes do estado mental do LSD.
Outra razão para a incidência de experiências religiosas, é o fato de que o próprio núcleo da mente humana é conectado a Deus. Esta mais profunda raiz de nossa consciência, que no estado normal é encoberta por superficiais atividades racionais da mente, pode revelar-se através da ação de uma droga psicodélica.
Horowitz:
O LSD é um agente evolutivo?
Hofmann:
Possivelmente. No estado mental do LSD, podemos nos tornar conscientes, nas palavras de Teilhard de Chardin, do “todo complexo das relações inter humanas e intercósmicas com um imediatismo, uma intimidade e um realismo” que, de outra forma, aconteceria apenas em estados extáticos espontâneos, e para poucos abençoados.
Entre líderes espirituais, existe consenso de que, a continuação do presente desenvolvimento, caracterizado pelo crescimento da industrialização e superpopulação, irá resultar na exaustão dos recursos naturais e destruir as bases ecológicas da existência humana neste planeta. Esta tendência de auto aniquilação, é re forçada por políticas internacionais baseadas em “viagens de poder” e na preparação de armas de potencialmente apocalípticas.
Esse desenvolvimento pode ser impedido apenas através de uma mudança na atitude materialista que causou o próprio desenvolvimento. Esta mudança pode resultar apenas da percepção das raízes espirituais mais profundas da vida e da existência; do uso compreensivo de todas as forças de nossa inteligência e de todos os recursos de nosso conhecimento.
Esta abordagem intelectual, complementada pela experiência visionária, poderia produzir uma alteração de consciência sobre a verdade e realidade, que então poderia ter uma significância evolutiva. O LSD, seletiva e sabiamente usado, poderia ser o meio de alguém complementar a percepção intelectual e visionária, e ajudar a mente preparada a tornar-se consciente de uma realidade mais profunda.
Horowitz:
Suas experiências com LSD mudaram sua vida pessoal e gostos?
Hofmann:
Aumentou minha sensividade para música clássica—especialmente Mozart. Meus hábitos de vida não mudaram.
Horowitz:
Sua mulher também experimentou com psicodélicos?
Hofmann:
Sim. Uma vez no México, na sessão com “Salvia Divinorum”, quando eu tive um problema gástrico e não poderia ingerir o suco, ela tomou meu lugar. Ela também ingeriu algumas das pílulas de psilocibina durante a sessão histórica em que Maria Sabina confirmou sua potência.
Horowitz:
Para quais usos médicos gerais o LSD poderia ser comercializado no futuro?
Hofmann:
Doses muito pequenas, talvez 25 microgramas, poderiam ser úteis como um euforizante ou antidepressivo.
Horowitz:
Quais de seus trabalhos estão disponíveis em inglês?
Hofmann:
Há vários anos atrás, eu e o Dr. Richard Evans Schultes de Harvard, fomos coautores de um livro chamado “The Botany and Chemistry of Hallucinogens“. Destina-se, primariamente, em fornecer conhecimento básico de botânica e química das plantas alucinógenas a estudantes especializados. Atualmente, estou escrevendo minhas memórias; mas estas serão publicadas primeiro em alemão.
Horowitz:
O que você tem feito desde sua aposentadoria da Sandoz?
Hofmann:
Eu me aposentei em 1971, após 42 anos com a Sandoz. Desde então, eu tenho escrito e dado aulas sobre drogas psicoativas. Aqui em casa, eu trabalho no pomar e corro nas florestas para me exercitar. É maravilhoso poder passar um monte de tempo na natureza intocada, após décadas de trabalho em laboratórios.
Horowitz:
Em seu livro “Gravity’s Rainbow”, o autor americano Thomas Pynchon descreveu um vitral em seu escritório, nos enfadonhos laboratórios da Sandoz. Isso é verdade?
Hofmann:
Isso é verdade. Agora está aqui em minha casa. Na realidade, é um moderno vidro em estilo antigo, retratando Esculápio e seu mentor, o centauro Quíron.
Horowitz:
Os suíços estão orgulhosos de sua descoberta do LSD e das sínteses da psilocibina e “ololiuqui”, ou a controvérsia em torno destas drogas dissiparam isso?
Hofmann:
Minhas descobertas se mostraram bastante controversas. Alguns consideram estas drogas como sendo “diabolique”, e uns clérigos pediram-me para confessar minha culpa em público; mas em círculos profissionais, meu trabalho tem sido apreciado. Eu fui honrado pelo Instituo Nacional Politécnico aqui na Suíça; por graus honorários em ciência natural e em farmacologia no Swedish Royal Pharmaceutical Institute; e nos Estados Unidos, por uma adesão honorária na Sociedade Americana de Farmacognosia.
Horowitz:
O que o fez decidir tornar-se um químico?
Hofmann:
Eu estava interessado em saber do que nosso mundo era feito. A química é a ciência dos constituintes do mundo, então aos 19 anos, eu tomei a decisão de tornar-me químico, ambos por razões ambas místicas-filosóficas e curiosidade.
Horowitz:
O LSD afetou sua perspectiva filosófica?
Hofmann:
Das minhas experiências com LSD, incluindo a terrível primeira vez, eu recebi o conhecimento de não apenas uma, mas de um número infinito de realidades. Experienciamos uma realidade diferente, dependendo da condição de nossos sentidos e receptores psíquicos. Eu percebi que a profundeza e riqueza dos universos interior e exterior são imensuráveis e inesgotáveis; mas que devemos retornar destes mundos estranhos para nossas casas e viver aqui, na realidade que é fornecida pelos nossos sentidos normais e saudáveis. É como astronautas retornando de voos espaciais: eles devem reajustar-se a este planeta.
Em algumas de minhas experiências psicodélicas, eu tive um sentimento de amor extático e unidade com todas as criaturas do universo. Ter tido tal experiência de absoluta beatitude significa um enriquecimento de nossa vida.
Horowitz:
Como você gostaria que gerações futuras lembrassem de você e sua descoberta?
Hofmann:
Talvez a imagem de um químico andando de bicicleta, em sua primeiríssima viagem de LSD, irá mudar para o Velho da Montanha.
A maioria dos professores espirituais são fortemente contra o uso de qualquer droga. Alguns alertam que as drogas irão desfazer anos de progresso árduo em direção a iluminação, enquanto outros dizem que o estado induzido pela droga pode parecer o mesmo, mas está em um nível inferior, e isso pode induzir as pessoas ao erro. Alguns poucos acreditam que um verdadeiro estado místico possa ser induzido por drogas, mas pensam que seu resultado é diminuído.
Entretanto, existem alguns professores que acreditam no valor do MDMA, tanto para a iluminação pessoal, quanto para o treinamento de outros. Eu entrevistei quatro: um monge Beneditino, um rabino, um monge Rinzai Zen e um monge Soto Zen. Também obtive comentários de outro monge Beneditino. Esses são lideres religiosos ativos que escrevem livros espirituais, ensinam prática espirituais e dão palestras públicas sobre assuntos espirituais, mas, exceto pelo último, nunca admitiram publicamente suas visões sobre o valor espiritual do MDMA. O monge Soto Zen, Pari, concorda que “Drogas não combinam com meditação. ” Entretanto, ele diz “Meditação combina maravilhosamente bem com drogas. ” Não há contradição: drogas perturbam padrões adquiridos na meditação, mas sob o efeito de MDMA é fácil meditar. “Ficar quieto enquanto toma MDMA te ajuda a aprender a sentar, provendo um conhecimento experiencial. ” Mas é um bom método para aprender? “É como um remédio. Se olharmos para o nosso estado mental e do planeta, devemos ser gratos por quaisquer meios que possam ajudar. Entretanto, assim como todo bom medicamento, também pode ser mal-usado. ” Todos eles acreditam que se beneficiaram do uso do MDMA, que pode ajudar a produzir uma experiência mística válida, não causa dano a mente e é útil para ensinar os estudantes. A razão para que eles não promovam seu uso é que eles devem seguir as politicas de suas ordens religiosas, e essas naturalmente obedecem a lei. Eu achei fascinante ouvir o quão similar suas experiências eram, ainda que diferentes para qualquer outra pessoa. Quando perguntei sobre o que eles achavam sobre o uso de MDMA por ravers, suas opiniões divergiram. O Beneditino sente que é profano pessoas tomarem drogas ao não ser que sejam espiritualmente orientadas, enquanto o rabino pensa que o sentimento de unidade e enxergar a vida por uma nova perspectiva é uma experiência igualmente válida para os ravers.
Eu levei Bertrand, o monge Rinzai Zen, para uma festa rave onde ele tomou MDMA—anteriormente ele só havia tomado enquanto meditava. Quando sentiu o efeito, ele brilhou e anunciou “Isso é meditação! ” Longe de ser estranho para a sua experiência, ele viu que todos estavam totalmente absortos em suas danças sem consciência própria ou dialogo interno, e isso era a verdadeira essência da meditação.
O rabino não estava apenas ciente de que dançar sob o efeito do MDMA podia ser uma experiência espiritual, mas também que o misticismo estava agora mais prontamente disponível nas pistas de dança do que em igrejas, mesquitas ou sinagogas. Ele sugeriu que se sacerdotes experimentassem a droga, eles não somente apreciariam seu valor espiritual, mas seriam capazes de entender melhor os jovens. Pari fez a seguinte analogia: “É como um escalador andando pelas montanhas que está perdido na névoa e impedido de ver o pico que se dispôs a escalar. De repente a névoa se dissipa e ele experiência a realidade do pico, e ganha senso de direção. Mesmo que a névoa surja outra vez, e ainda que o caminho seja longo e árduo, o vislumbre é geralmente uma enorme ajuda e encorajamento. ”
Entrevista com um monge Beneditino
Irmão Bartholemew é um monge que usou MDMA cerca de 25 vezes num período de 10 anos como ajuda para sua experiência religiosa. Normalmente ele toma sozinho, mas também tomou junto a um pequeno grupo de pessoas com objetivos semelhantes. Ele descreve o efeito como uma abertura de uma ligação direta com Deus. Enquanto usando o MDMA, ele experienciou uma compreensão muito profunda da compaixão divina. Ele nunca perdeu a claridade deste insight, e permanece como um reservatório onde ele pode recorrer. Outro beneficio de seu uso de MDMA foi que a experiência da presença divina lhe vinha sem esforço. O efeito se manifestava em sua forma elemental na respiração, o sopro divino. Após seu despertar, ele começou a descobrir a validade de todas as outras grandes experiências religiosas.
Ele acredita que a “ferramenta” do MDMA pode ser usada em níveis diferentes como uma ferramenta de pesquisa ou espiritual. Quando usado apropriadamente, é quase um sacramento. Tem a capacidade de lhe colocar no caminho certo para a união divina com ênfase no amor, amor vertical, num sentido de ascendência. Entretanto, esse ganho só é possível quando se olha na direção correta. Não deveria ser usado ao não ser que esteja realmente a procura de Deus, e não é apropriado para hedonistas ravers adolescentes. O lugar onde é ingerido deve ser quieto e sereno. Deve haver também uma ligação intima entre aqueles que compartilham a experiência. A experiência deve ser perseguida com uma certa dose de supervisão porque o MDMA produz uma tendência de que sua atenção se disperse. Existe também o perigo de delapidar a experiência ao ficar preso em sentimentos de euforia, ao invés de alcançar o reino espiritual. Entretanto, embora possa ser inestimável, não deve se tornar necessário, uma vez que a necessidade de uma droga lhe nega a liberdade.
[ Eu enviei ao Irmão Bartholemew uma cópia do texto acima para sua provação, e ele adicionou o seguinte: ]
“Um elemento que você pode querer adicionar é o da intimidade da voz na conversação. MDMA sempre me empurra em um espaço de intimidade na conversação. Existe uma qualidade especial nela. Você sente uma sensação de peso, uma sensação de peso nesta conversação, de algo profundo, tão sério quanto a própria vida. É um espaço interno onde não há máscaras, sem pretensões, absolutamente aberto e honesto. Não é uma intimidade erótica, mas sim filosófica e mística. Isso faz algum sentido? Você tem consciência de que se trata de uma comunicação interna raramente alcançada na conversa comum. Realmente não há palavras adequadas para descrever esse estado de percepção, bastando dizer que é essencial em minha experiência.”
Entrevista com o rabino na Sinagoga Oeste de Londres
Após uma conversa que tocou na necessidade da preparação para a morte, eu perguntei ao rabino uma questão sobre o valor do MDMA para os pacientes terminais (referência ao estudo do Dr. Charles Grob em Los Angeles.) Ele respondeu que o MDMA possui tanto valor para os moribundos, quanto aos ravers, permitindo assim a sensação de unidade, possibilitando ver a vida de uma nova perspectiva. A proibição não é a melhor maneira de se lidar com uma substância que pode ser sacramental da mesma forma como a comunhão do vinho. Essas substâncias podem despertar sensações estranhas que podem ser desconfortáveis, mas são essenciais para uma compreensão mais profunda de nós mesmos. Entretanto, existem outros métodos para alcançar esses sentimentos, como aqueles descritos em um livro chamado Mind Aerobics.
No final, o rabino me chamou para vir para o palco. Ele me levou em uma escada da saída de incêndio, fora dos ouvidos de sua comitiva, e me disse que ele não podia arcar com o risco de prejudicar o seu projeto, apoiando publicamente o uso de drogas ilegais, mas que ele tinha o meu livro (ele o elogiou.) Ele acreditava que o MDMA e outros psicodélicos poderiam ser usados para um imenso beneficio, não apenas para a consciência pessoal, mas pelo bem de Gaia e o bem-estar cósmico do planeta. Ele deu a entender que a experiência com MDMA possuía a mesma qualidade e valor potencial que outras experiências místicas, e sugeriu que os sacerdotes experimentassem a droga, tanto para entender os jovens, como para validar as experiências espirituais produzidas por drogas. Ele se referiu à conclusão de Abraham Maslow a respeito das “experiências de pico”: que tomar uma droga é como atingir o topo da montanha por um teleférico ao invés da labuta da escalada—pode ser visto como trapaça, mas te leva ao mesmo lugar. Ele finalizou me dando um grande abraço e me encorajando em meu trabalho.
Visita ao monge e professor Rinzai Zen
Bertrand é um monge Zen budista e professor de meditação na casa dos 70 anos. Seguindo uma carreira convencional, ele teve uma experiência de despertar com mescalina quando ele tinha 47 que o fez reavaliar sua e buscar um caminho espiritual. Isso o levou a encarar o Rinzai Zen com um mestre japonês rigoroso. Embora tenha achado o treino extremamente difícil, ele eventualmente se tornou o abade de um monastério Zen.
Bertrand tomou MDMA cerca de 25 vezes nos últimos 10 anos. Ele geralmente usou-o no segundo dia de uma meditação de sete dias, e descobriu que a droga permitiu que ele prestasse atenção de todo coração, sem qualquer distração. Como estudante, ele também usou uma vez quando praticava um exercício Zen chamado Koan. Durante os Koans, o mestre nomeia a tarefa que o aluno deve contemplar, como o clássico “compreender o som de um bater de palmas. ” O estudante tem de demonstrar compreensão, normalmente após um tempo considerável, e muitas vezes é lhe dito para tentar de novo.
Sob efeito do MDMA, Bertrand atravessou por entre os Koans com uma impressionante facilidade. Ele, inclusive, se sentiu iluminado em duas ocasiões, apesar dele não confiar que essas experiências sejam do nível mais alto. Ele também conhece um monge Zen suíço que usa MDMA, mas ele nunca contou ao seu mestre. Ele sente que a experiência seria de grande valor para alguns de seus devotos e rígidos companheiros monges Zen, embora ele conheça apenas um outro monge Zen que faça uso de MDMA.
Perguntado se a experiência com MDMA tinha igual valor quanto chegar “lá” da maneira difícil, ele respondeu que o MDMA simplesmente permite que usuário foque, de todo coração, em sua tarefa atual, e o resultado é real em todos os aspectos porque são os mesmos. De fato, o MDMA permitiu que ele fosse mais longe do que ele era capaz sem a substância. Eu o pressionei para descobrir os aspectos negativos, e ele me disse que uma vez ele cometeu o erro de tomar o MDMA pouco antes de liderar uma meditação. Isso abriu seus olhos para o quão tensos e necessitados seus alunos eram. Ele expressou aquilo que sentia muito livremente: que eles pareciam como cadáveres, todos alinhados com seus chales negros! Isso era inapropriado, e ele não usou novamente o MDMA quanto ensinava. Ele sentiu que seu erro estava em não respeitar que seus alunos se encontravam em um espaço diferente.
Entretanto, Bertrand acredita que o MDMA seria uma ferramenta extremamente útil para ensinar os estudantes que também estivessem sob efeito. Na verdade, ele se perguntou se viveria o bastante para poder usa-lo legalmente. Pressionado sobre os possíveis problemas, ele disse que sempre haverá pessoas que chegam querendo a iluminação em uma bandeja, e a notícia de que existe uma nova técnica usando uma droga atrairia aqueles que esperam que “seja feito por eles”. A festa rave foi a primeira vez que Bertrando tomou MDMA exceto quando estava meditando, e ele foi surpreendido pelo quão diferente a experiência era. De antemão, ele disse que mal suportava ao barulho e volume do som. Depois que o MDMA fez efeito, ele pode ver o valor do volume ao “afogar” as distrações. A batida monótona era semelhante a algumas cerimônias de índios americanos que também fornecem a sensação de união tribal pelo uso de uma droga—embora tenha sentido que a rave perdeu a estrutura cultural e foco dos indígenas. (Bertrand já foi convidado de um ritual Indigena Americano, embora não tenha tomado nenhuma droga.) Ele podia ver o valor dessa nova experiência para o Budismo como expansiva — meditação era contrativa, mas ambos foram essenciais.
Sua primeira reação após o MDMA começar a fazer efeito foi tristeza por sua posição como parte de uma instituição de uma religião restritiva, e a realização de que o treinamento Zen não era adequado para os ocidentais em sua presente forma. Mais tarde, ele entrou na dança. Conforme sua face mudava de severa para feliz, ele exclamou: “Isso é meditação — estar realmente no presente e não em sua cabeça”. No dia seguinte, ele disse que sentiu como se a experiência havia deixado uma impressão em sua vida, e ele não tinha certeza onde isso o levaria. Enfatizou o que ele já sabia: que seus estudantes eram muito contraídos, e essa experiência expansiva da rave era o que eles precisavam, e era uma pena que ele não poderia advogar sobre isso em sua posição.
No dia seguinte, ele me disse que isso podia ser um ponto de virada muito importante em sua vida. Ele tinha que passar um tempo para digerir o que havia aprendido, mas sua resposta imediata era que ele não podia continuar sendo parte de uma instituição de sua escola na sua presente forma. Ele podia ver que o aspecto contrativo do treino havia sido muito enfatizado em sua escola, na crença de que os ocidentais já eram muito expansivos. Na verdade, aqueles que buscavam mestres Zen no Oeste realmente precisavam da habilidade de ser expansivos — e a rave proporcionava isso. Um mês depois, Bertrand me telefonou para dizer que ele acabará de ministrar um retiro de uma semana, que foi mais leve e positivo, quase como uma sensação de alegria. Ele atribuiu isso ao efeito da experiencia da rave, que por sua vez afetou os participantes. Também, ele se sentiu muito mais jovem e mais flexível. De fato, um problema de coluna que havia lhe causado dores por anos parecia estar completamente curado, o que fez ele suspeitar que especificamente esse problema na coluna era causado pela mente. Eu enviei os rascunho das entrevistas com o rabino e o monge Beneditino à Bertrand. Ele comentou que sua experiência se assemelhava com a do rabino sobre estar em um estado mental aberto. Divergia com o Beneditino, que dizia que o MDMA lhe permitia focar totalmente sem distração, e com atenção prolongada. Ele sentiu que a base do estado mental era enfatizada. Perguntei como ele sugeria usar o MDMA. Ele recomendou meditação após a abertura como uma forma de canalizar a energia liberada. Bertrando descreveu o MDMA como uma “experiência nutridora”
Visita a um monge e professor Soto Zen
Pari tomou LSD na universidade. Na verdade, ele mudou-se para uma comuna que tomava LSD em rituais semanais regulares, porém mais tarde essa busca por conhecimento o levou para longe das drogas para a Yoga, a qual ele praticou por muitos anos. Entã ele viajou e se envolveu com o Zen, vivendo em uma comunidade Soto Zen por 10 aos até ser ordenado monge. Ele havia sido feito desde então Abade pelo seu mestre; isso é, lhe é dado o poder para ordenar novos monges Zen. Ele agora vive em uma bela e tranquila casa Vitoriana na cidade com sua esposa e filho, onde ele tem um pequeno zendo (sala de meditação). Ele também tem um centro de retiro nas montanhas. Ele divide seu tempo entre o Budismo e ativismo social/ecológico. Nos últimos 5 anos, Pariu tomou MDMA cerca de 15 vezes, geralmente sozinho ou com sua esposa e amigos íntimos. Aquilo lhe fornecia uma grande clareza e tranquilidade, muito parecido com seshin— prática que dura 1 semana — quando tudo se torna mais claro, mais desperto.
Tradicionalmente, ensinamentos orientais são fortemente contra às drogas. Mas sua tradição em particular possui uma exceção a essa regra, e seu professor no Japão havia usado peyote, LSD e MDMA. Certa vez Pari irritou o professor Budista vietnamita Thich Nhat Hanh por apontar que a maioria dos estudantes ocidentais o procuravam pelas experiências com as drogas, então não era certo para ele ter uma posição forte contrária ao uso de drogas, especialmente já que ele não havia experimentado por si mesmo.
Ele havia usado MDMA para ensinar com alguns estudantes, incluindo um que já fora sido ordenado monge. Esse era um homem extremamente intenso e colocava um esforço tremendo para fazer o seu melhor na meditação. O MDMA o ajudou a ver que o tentar em si era o seu principal obstáculo. Outro estudante era um homem de negócios bem sucedido e mão de ferro. MDMA simplesmente o parou — ele mudou dramaticamente em uma pessoa calorosa e satisfeita que apenas queria se sentar tranquilamente no zendo.
Quando perguntei se o sucesso com o MDMA era válido tanto quanto sem, ele respondeu : “É a experiência que importa, não como você chega lá. Olhe para a história das grande religiões. Muitos dos seus fundadores e santos tiveram uniões místicas durante febre causada por ferimentos, durante o qual, como sabemos hoje, o corpo produz substâncias psicodélicas. Um bom exemplo seria Inácio de Loyola, fundador da ordem Jesuíta.”
Eu perguntei a Pari se pensava que haviam alguns tipos de pessoas que não se beneficiariam ou seriam enganados pelo MDMA. “Pode ser um problema para aqueles que não estão suficientemente aterrados, aqueles com tendencia a flutuar em outros mundos facilmente, de qualquer modo. Entretanto, a maioria de nós somos muito ligados a terra, presos demais nessa realidade em particular e uma pequena ajuda de um amigo pode ser de grande valor.” Ao contrário do LSD e outras drogas, o MDMA age em termos de relacionamentos — consigo, Deus, natureza. Ele ainda abre um terreno comum com outras pessoas as quais ainda não conhece.
Eu perguntei se havia algum motivo para usar o MDMA uma vez a iluminação ter sido atingida. “Atingir a iluminação para a maioria de nós é transitório e raro. Depois de um tempo, a experiência direta é substituída pela lembrança dela e uma experiência direta de tempos em tempos ajuda e revigora.” Mas, eu perguntei, a experiência induzida pela droga era realmente a mesma? Após certa hesitação Pari respondeu, “Sim, o estado da mente é idêntico, ainda assim há uma diferença sútil, talvez em razão dos efeitos físicos da droga no corpo. Sem a droga, há apenas um fator a menos. Isso é simples, e talvez implique em ser melhor. O valor desse estado é o mesmo: poder olhar para trás e ver o estado da mente “normal” com uma perspectiva clara mas diferente.”
Qual a situação ideal? “Para um iniciante, um amigo confiável e mais experiente é altamente recomendável. Você deve criar um ambiente que ache convidativo. Faça a prática espiritual que você tiver. Para alguns pode ser cantar, rezar, pintar, meditar ou sentar em uma catedral; para outros é andar sozinho pelas montanhas.” Porém, ele alertou que nem toda tentativa é positiva. Ele sentiu mal e tremulo em sua última experiência com MDMA, embora depois de uma hora ele vomitou e então se sentiu melhor.
Estamos atualmente experimentando uma renascença na pesquisa psicodélica, enquanto Michael Pollan escreveu em seu recente artigo no The New Yorker.. Substâncias alucinógenas, como psilocibina podem de fato ser usadas para tratar uma variedade de desordens de saúde mental, da ansiedade e o vício à depressão, e os pesquisadores das principais escolas médicas dos Estados Unidos querem descobrir todo o seu potencial terapêutico.
A Psilocibina está no grupo das drogas classificadas como “psicodélicos clássicos”, que também inclui LSD, Mescalina e DMT, e foram designadas substâncias proibidas desde que Nixon assinou o Ato de controle de Substâncias em 1971. Essa classificação (que definia a droga como tendo alto potencial de abuso e nenhum uso médico aceitável) tornou os psicodélicos muito difíceis de serem estudados em laboratório.
Mas nos últimos anos temos testemunhado uma enxurrada de novas pesquisas neste campo, a começar por um estudo de referência, por Roland Griffiths, um psicofarmacologista da Escola de Medicina da Universidade Johns Hopkins. Em seu estudo, voluntários a quem foram administradas doses de psilocibina, sob uma estrita supervisão dos terapeutas, relataram experiências transformadoras, e melhoras de longo prazo no bem estar pessoal, satisfação com a vida e mudança positiva nos comportamentos. Dois terços dos participantes disseram que a sessão foi uma das “mais espiritualmente significantes experiências de suas vidas”. O trabalho de Griffiths, inspirou muitos outros experimentos, incluindo um estudo em curso na Universidade de Nova York, onde pacientes em estágio avançado de câncer passam por uma sessão terapêutica com psilocibina para ajudá-los a lidar com a ansiedade de fim de vida.
Em uma entrevista por telefone, Eu falei com Peter Hendricks, um professor da Universidade do Alabama na Escola Birmingham de Saúde Pública, sobre os entusiasmantes avanços acontecendo no campo. Em janeiro passado, Hendricks e seus colaboradores publicaram um estudo na Psychopharmacology sobre a associação do uso de psicodélicos clássicos e uma redução nas tensões psicológicas e tendências suicidas na população americana adulta. Hendricks compartilhou sua visão sobre a falta de fundamentação científica para a nossa lei de drogas, as peculiares ansiedades sociais provocadas pelos alucinógenos, e porque um novo mundo da pesquisa psicodélica está apenas começando.
Allegra Kirkland: Como Você ficou interessado em pesquisar os efeitos dos psicodélicos na saúde mental e bem-estar das pessoas?
Peter Hendricks: Minha base é na psicologia clínica, com foco no vício. Para as pessoas que trabalham no campo da saúde mental, existe uma motivação em ajudar os outros. Muitos de nós gostaríamos de ver estes problemas que tentamos desvendar desaparecerem por completo. Eu sei que pode soar muito otimista, mas com isso em mente, não é difícil ver porque as taxas de sucesso dos tratamentos existentes são tão desapontantes. A gama de intervenções que temos neste momento para tudo de depressão à vício não está ainda como gostaríamos que estivesse. Então estamos buscando melhorar o que já existe.
Quanto ao porquê de estudar psicodélicos, é uma uma história um tanto interessante. Quando eu era um pós-doc em 2006, publiquei minha dissertação em um jornal chamado Psychopharmacology. Eles me enviaram uma cópia complementar dessa publicação para que eu pudesse ver o meu artigo na impressão, e eu estava tão animado para vê-lo no dia em que chegou ao meu escritório. Mas o artigo que eu abri era, na verdade a peça fundamental do professor Johns Hopkins, Roland Griffiths, na pesquisa psicodélica.
AK: Michael Pollan descreve no New Yorker que pareceu que o artigo de Griffiths realmente marcou uma virada na aceitação pela comunidade científica da pesquisa psicodélica. Você concorda com isso?
PH: Concordo absolutamente. Foi grande. Eu nasci em 1976 então vivi por dento a guerra às drogas e, certamente, a campanha “Just Say No” dos anos 80. Como muitas pessoas, eu sempre assumi que informaçã que me era dada era precisa. Eu tinha todas as razões para acreditar e confiar no governo e em seus fundamentos para a proibição das drogas. Até aquele momento, eu pensava que alucinógenos eram perigosos, e que as razões para enquadrá-las nas “Substâncias de Categoria I” eram válidas. Mas quando eu li o estudo de Roland, foi um divisor de águas para mim. Não apenas mudou meu entendimento dos psicodélicos, como me encorajou a me aprofundar nas leis de drogas e nas razões por trás delas.. No curso de um ano ou dois, eu percebi que existe de fato um enorme potencial curativo nessas substâncias e o funamento legal para sua proibição é muito pobre.
Ainda assim, como um psicólogo, eu teria cuidado a não menosprezar aqueles que estão tendo dificuldade em entender a minha posição. Há um grande professor de Nova York chamado Jonathan Haidt, que estuda os fundamentos morais de conservadores e liberais e deu uma incrível palestra no TED sobre isso. Ele dizia que os liberais em geral, querem ver a mudança da sociedade e ir para a frente. Conservadores normalmente gostam que as coisas fiquem como estão. Ele enxerga essas duas forças como yin e yang; elas se complementam. Se todo mundo fosse um progressista, ele argumenta, a sociedade iria mudar muito rapidamente e poderia, no pior dos casos, mergulhar na anarquia. Por outro lado, se nós nunca mudarmos, então nunca vai evoluir: nós nunca veríamos os avanços em direitos humanos que temos visto ao longo dos últimos cem anos. Então, a mudança é boa. Mas eu consigo entender como uma mudança muito rápida pode ser um conceito assustador.
AK: Continue !
PH:Eu acho que no final dos anos 60, havia algumas mudanças bastante dramáticas ocorrendo. Eu não acho que as pessoas da minha idade conseguem realmente apreciar o quão monumentais algumas delas foram. O show do Elvis onde ele estava balançando os quadris foi considerado extremamente controverso e selvagem. E em apenas alguns anos, vimos hippies barbudos de cabelos compridos, queimando os seus cartões de pagamento e vivendo em comunas. Tivemos músicas de formas que nunca ouvimos antes, como o Grateful Dead e suas jam sessions de 45 minutos e as incríveis inovações de Jimi Hendrix. Acho que o LSD e os outros psicodélicos estavam sendo em boa parte o combustível dessa mudança. E numa posição de compreensão, eu posso ver como para um monte de gente, essas alterações foram assustadoras ou esmagadoras…. A razão médica ou científica para classificar essas drogas como Categoria I não estavam lá. Mas eu posso entender como as pessoas pensavam que era a melhor coisa para o nosso país.
AK: Você acha que em alguma parte o motivo das pessoas estarem mais abertas a este tipo de pesquisa agora é porque testemunhamos o fracasso da guerra às drogas e por percebermos que as pessoas vão usá-las sejam elas ilegais ou não? Isso é uma mudança cultural, que estamos enxergamos de forma mais natural a realidade do uso de drogas?
PH: Eu acho que a ciência e a cobertura midiática associada estão cumprindo um papel. Eu estive entre aqueles que achavam que sim, alucinógenos deveriam ser substâncias proibidas; sim, elas são drogas perigosas; não, não existem aplicações terapêuticas para elas. Eu acreditava nisso até que eu vi a ciência, até que eu vi que o estudo de Griffiths, em 2006, e os estudos que se seguiram, incluindo o estudo da UCLA sobre aliviar a ansiedade de fim de vida em pacientes com câncer avançado. As informações mostram que essas drogas podem ser muito terapêuticas e podem ocasionar talvez as experiências mais significativas na vida de um indivíduo. Por que nós não queremos olhar para como elas podem nos ajudar a fazer o que fazemos melhor? Por que nós não queremos usar estas substâncias para ajudar a aliviar o sofrimento humano? Eu não posso pensar em uma boa razão, especialmente quando você dar uma olhada nos dados. Os psicodélicos podem ser administrados com muita segurança nestas configurações controladas e levar a alguns resultados terapêuticos muito impressionantes.
AK: Seus colegas da universidade estão a bordo de suas ideias ou você precisa empurrá-las para serem aprovadas?
PH: Tem uma variedade de reações, mas eu acho que a maior parte dos meus colegas apoiam. Alguns são mais céticos, mas eu compreendo porque eu mesmo sempre fui cético.
AK: Toda essa pesquisa é bastante nova e as amostras ainda são pequenas. Então, mesmo sendo um tema excitante, tenho certeza que as pessoas tem suas reservas.
PH: Com certeza. E novamente, eu acho que a maioria de nós tínhamos todas as razões para acreditar que as leis sobre drogas eram baseadas em fundamentação científica sólida, que havia razão por trás disso. Eu estive entre os que acreditavam que havia motivos para manter estas drogas ilegais., há 10 anos atrás. Mas eu acho que a maioria dos meus colegas está se abrindo para ouvir os argumentos, para olhar para os novos estudos sendo realizados. Como cientistas, soms treinados para sermos céticos. Eu sempre espero que meus colegas sejam assim. Mas também somos treinados a sermos abertos a novas ideias, a ir onde a informação nos leva. Eu acho que neste caso a informação está nos levando persuasivamente em uma direção.
O comentário mais cínico que já recebi foi: Porque você buscaria uma área de pesquisa, que não tem financiamento federal? Esse é um comentário comum q eu recebo sobre a natureza e o foco das nossas posições. Eu entendo a preocupação. … Mas eu acho que há um sentimento entre as pessoas que fazem esta linha de trabalho que esta poderia ser a tal “mudança de jogo”, que nós devemos isso a nós mesmos, â humanidade, perseguir este tipo de trabalho com ou sem financiamento federal. … Obviamente que gostaríamos de ver o financiamento no futuro, porque é conveniente para executar o tipo de estudos de grande escala necessárias para determinar a eficácia dessas substâncias. Mas eu acho que para muitos de nós este é um trabalho de amor, e vamos prosseguir este trabalho com ou sem financiamento.
AK: Eu ia perguntar se você acha que Instituto Nacional da Saúde Mental irá algum dia financiar a pesquisa psicodélica. Você acha?
PH: Você sabe, eu certamente espero que sim e acho que há informação demais para ser ignorada por muito tempo. Ciência é um processo cumulativo e se com o passar do tempo, um estudo parece prover um padrão de resultados, ele ganha peso. Meu amigo e colega Matt Johnson acabou de conduzir um estudo de psilocibina para o abandono do cigarro e 80% dos participantes pararam de fumar! Ninguém fala disso! Não havia condição de controle neste estudo, mas mesmo assim, eu nunca ouvi falar em nenhuma intervenção que reportasse 80% de abstinência, depois de um acompanhamento de 6 meses. Há ainda alguns estudos que eu publiquei que são mais naturalistas, utilizando grandes amostras.
AK: Pode me contar mais sobre o estudo que você publicou em Janeiro sobre psicodélicos e a redução de tensões psicológicas e tendências suicidas.
PH: Todos os anos, o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos realiza a Pesquisa Nacional sobre Uso de Drogas e Saúde. Um de seus funcionários vai bater à sua porta, perguntar se você quer participar, e se você disser que sim, você iria responder a perguntas em um computador que lhe será entregue. A pesquisa lhe pergunta sobre o uso de drogas atual, histórico de uso de drogas e uma série de questões relativas à saúde mental. Meu interesse era saber se havia ou não uma relação entre o uso ou não de um psicodélico clássico e as tendências suicidas. Com esses tipos de conjuntos de dados que estão disponíveis para o público, você tem que trabalhar com o que lhe dão. Eu não projetava os parâmetros do estudo e não havia um enorme número de perguntas sobre o uso dos psicodélicos. … Em todo o caso, queríamos ver se havia uma relação já ter utilizado um psicodélico e o sofrimento psicológico e pensamentos ou comportamento suicida.
A idéia aqui é que a experiência mística desencadeada pelos psicodelicos pode ser fator de mudança de vida ou de transformação. Você pode usar essas substâncias apenas uma vez e experimentar o que um dos meus psicólogos favoritos William Miller chama de “mudança quântica”: a idéia de que alguém pode mudar muito de repente, muito dramaticamente e de forma permanente. Então a pergunta é: poderia apenas uma experiência com essas subtâncias colocá-lo no caminho para uma melhor saúde mental?
AK: Então essa é uma característica especial dos psicodélicos em comparação à outras drogas? Nada mais tem esse efeito transformador nas pessoas?
PH: O meu melhor conhecimento indica que isso é correto. É uma característica particular dos psicodélicos, principalmente dos psicodélicos clássicos, promover esses tipos de experiência. Existem exemplos dessas experiências místicas transformadoras por todas as grandes religiões do mundo e na ficção… A metafísica disto está além da minha capacidade de comentar, mas sabemos que essas experiências de transformação acontece organicamente nas pessoas. E temos uma classe de substâncias que podem ocasionar este tipo de experiência em uma boa porcentagem daqueles que as utilizam… O que encontramos em nosso estudo é que aqueles que utilizaram psicodélicos estavam menos propensos a reportar tensões psicológicas, durante 1 mês e menos propensos a reportar pensamentos e tentativas suicidas por 1 ano.
AK: O artigo do New Yorker pintou uma imagem que existiria uma vasta diferença entre uma sessão psicodélica acompanhada por um doutor em um ambiente controlado e seguro, e alguém que tomasse um psicodélico para uma experiência recreativa. Que em ultimo caso, haveria muito mais espaço para coisas darem errado – seja ansiedade, seja essas experiências místicas não ocorrerem. O que você tem a dizer sobre isso?
PH:Isso é um ponto muito bom para trazer. Pesquisar essas substâncias não é fácil. Isso pode acontecer, e eu achei a FDA e todas as outras agências do governo que eu trabalhei muito agradáveis e prestativas. Mas ainda há um monte de burocracia envolvida, como você pode imaginar. Portanto, para aqueles de nós que estão interessados em explorar essas substâncias, estudos de levantamento na população permitem-nos um meio de levantar dados na ausência de realmente ser capaz de administrar a substância para as pessoas em um laboratório. … Além disso, embora eu ache que esses estudos laboratoriais são fantásticos e elegantes, e Ronald Griffiths é um cientista magistral, elas envolvem um pequeno número de participantes. Porque as condições são muito bem controladas, pode-se sempre fazer a crítica de que esse tipo de relacionamento só vai ser visto entre um seleto grupo de indivíduos em um ambiente muito “artificial”. … Então eu acho que olhar para esses diferentes tipos de abordagens em conjunto é fundamental.
Novamente, a ciência é cumulativa e nenhum estudo será perfeito. Mas eles todos se complementam de uma forma ou de outra. No caso de nosso estudo de levantamento, tínhamos uma amostra muito grande, quase 200,000 pessoas, e estávamos olhando para o uso naturalista em condições não laboratoriais. A questão é, o uso d epsicodélicos tem efeito benéfico nessas situações? I argumentaria que sim, ainda que o benefício seja certamente maior em contextos cuidadosamente controlados.
AK: Você ou seus colegas tem planos de fazer testes clínicos num futuro próximo?
PH: Com certeza temos! Estou realmente empolgado com isso. Estaremos investigando a eficácia da psicoterapia facilitada pela psilocibina, para a dependência de cocaína, aqui meso no Alabama… Eu ainda não tenho falado disso porque quero esperar até estarmos recrutando pessoas.
AK: Alguma consideração final que você queira compartilhar sobre a pesquisa psicodélica como área de estudo?
PH: Eu acho que uma parte fundamental do que estamos tentando fazer é mudar a opinião pública. É importante que as pessoas saibam que aqueles de nós que estão trabalhando nesta área são cientistas desapaixonados que estão tentando estudar este fenômeno de forma objetiva. … Nós não estamos interessados na legalização ou utilização generalizada.
Se você realmente pensar sobre isso, não há nada provocativo sobre o que estamos fazendo. Nós somos cientistas clínicos que gostariam de ver as intervenções que temos serem mais eficazes. Nós gostaríamos de ver um alívio do sofrimento humano, e os dados científicos sugerem que estas substâncias podem ser muito eficazes a este respeito. É simples assim. Estamos apenas seguindo uma linha de trabalho que pode fazer uma diferença real em termos de dor que as pessoas têm de suportar. Espero que todos concordem com a gente, a este respeito, certo? Estamos tentando fazer do mundo um lugar melhor.
PARA PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DE MINNESOTA, PLANTAS ALUCINÓGENAS OFERECEM MAIS DO QUE O OLHO PODE VER
4 de Junho, 2013
Traduzido do texto original de Dan Olson,
Minnesota Public Radio (Fonte)
ST. PAUL, Minnesota. — Para o olho destreinado, uma certa estufa de plantas no campus St. Paul da Universidade de Minnesota, pode não parecer nada especial, mas Dennis McKenna, um etnofarmacologista, vê muito além do que isso.
Algumas podem curar doenças, como a pervinca de Madagascar. “Ela é a fonte de dois remédios muito importantes para tratar a leucemia infantil“, disse McKenna. Outras plantas da estufa são a fonte de substâncias psicodélicas que alguns cientistas afirmam ter poder terapêutico.
McKenna, que leciona no na Universidade no Centro para a Espiritualidade e a Cura, é uma autoridade em alucinógenos derivados de plantas como a Ayahuasca, o chá feito na bacia amazônica da América do Sul e usado como parte de cerimônias religiosas. – “São usadas para buscar informações no mundo do espírito sobre as doenças e sobre que planta pode ser apropriada para usar em um paciente que está doente” diz o cientista.
Dennis McKenna veio para Minnesota 20 anos atrás para trabalhar na Aveda, a famosa companhia de utilização de plantas para produtos de cuidados pessoais. Além de seu trabalho na universidade, ele ensina no Peru e colabora com grupos de pesquisa sem fins lucrativos que investigam os usos terapêuticos dos psicodélicos.
EXPERIÊNCIA EM PRIMEIRA MÃO
Aos 16, em sua pequena cidade natal no Colorado, Dennis e um amigo ingeriram sementes de Datura porque ouviram falar que teria algum efeito sobre eles. Esse “algum efeito” se transformou em uma experiência psicodélica de 3 dias que ele confessa ter sido bastante desagradável. – “Especialmente para nossas mães que não sabiam o que estava acontecendo”, disse o professor.
McKenna teve sua primeira experiência com a Ayahuasca em 1991, em uma igreja no Brasil. Ele e centenas de outros se sentaram em um templo circular, enquanto um homem distribuía copos de papel com o que ele chamou de “Líquido marrom de gosto horrível“. Uma hora e duas doses mais tarde, ele disse que sentiu a força da Ayahuasca passar através dele como se estivesse subindo em um elevador de alta velocidade. Dennis disse que se sentiu energizado e estava lúcido e consciente como uma combinação de força e iluminação.
A primeira parte de sua experiência visionária foi de um ponto de vista de milhares de quilômetros ao longo da bacia amazônica, onde podia ver a curvatura da terra e redemoinhos de nuvens. No centro, havia uma enorme videira ancorada à terra lá embaixo.
Ele estava impressionado. Na parte seguinte da visão, ele foi transportado do espaço para debaixo da terra, como uma molécula de água perdida entre as fibras da raiz, onde se podia sentir a temperatura fria do solo. Então ele sentiu o que descreve como uma força osmótica que o espremia no sistema vascular da planta, flutuando, suspenso em um fluxo por um túnel abobadado, com uma luz verde no final, até chegar à folha.
No final ele disse que foi sacudido com uma sensação de tristeza esmagadora misturada com um profundo temor pelo delicado equilíbrio da vida no planeta, os processos frágeis que impulsionam e sustentam a vida. McKenna disse que chorou, sentiu tristeza, fúria e uma raiva direcionada para a nossa voraz espécie destrutiva, pouco consciente do próprio poder devastador.
Ele se lembra de uma voz calma que lhe dizia: “Você macacos só pensam em executar as coisas. Vocês nunca pensam que somos nós que permitimos isso acontecer“.
Ele interpretou a voz como sendo de toda a comunidade de espécies que constituem a biosfera do planeta. Ao fim da visão, que McKenna diz ter durado por volta de 20 minutes e incluiu emoções do desespero ao êxtase, uma sensação de alívio temperada com esperança tomou conta dele.
POUCOS ESTUDOS SOBRE OS EFEITOS
Sua primeira experiência alucinógena com ayahuasca reforçou a sua compreensão intelectual do funcionamento interno das plantas. – “Foi-me dado um assento na primeira fileira do interior da planta, e começei a observar o processo de fotossíntese“. – disse o professor.
Os estudos com psicodélicos foram atrasados no final dos anos 1960 e início de 1970 quando o Congresso e o presidente Richard Nixon aprovaram a legislação que proibiu o uso de alucinógenos, o que fechou a porta para maioria das pesquisas. Porém, McKenna disse que alguns estudos parecem mostrar que a psilocibina, substância encontrada em uma espécie de cogumelo, ajuda a aliviar a ansiedade em pessoas com doenças terminais. Ele argumenta que pode ajudar o paciente a ter uma nova perspectiva sobre a morte. – ” ‘Sim, eu sei que estou morrendo, mas eu estou vivo agora e o que eu quero fazer é viver cada dia ao máximo‘ “.
McKenna disse também que outro psicodélico parece ajudar alguns alcoólatras e fumantes quebrar seus vícios e pode ajudar pessoas que sofrem de estresse pós-traumático lidar com a vida. – “Há uma dimensão espiritual para a cura. A medicina convencional fica meio desconfortável com esse conceito. É por isso que os psicodélicos são tão importantes. Eles podem trabalhar nessa interface entre farmacologia e espiritualidade“, argumentou o cientista. Segundo ele, menos de 10 por cento das plantas do mundo têm sido pesquisados para possíveis usos medicinais.
Entrevista na íntegra (em inglês) para a Minnesota Public Radio
To postando um trecho traduzido de uma entrevista que achei muito interessante. Pra quem não conhece, Terence McKenna foi um pesquisador de plantas psicodélicas de projeção internacional. Nasceu no Colorado (Estados Unidos) em 1946, graduou-se pela Universidade de Berkley e obteve mestrado em Xamanismo e Conservação de Espécies Botânicas. Em 1992 publicou o livro “Food of the Gods” (“Alimento dos Deuses”), onde descreveu a evolução humana a partir do consumo de substâncias como o DMT e a psilocibina, encontrada em cogumelos alucinógenos. McKenna morreu em 2000 e é considerado por muitos como um “cientista da Nova Era”. Esta entrevista foi concedida a revista OMNI em 1993.
A entrevista pode ser encontrada integralmente (sem tradução) aqui: http://deoxy.org/t_omni.htm Inclusive, se alguém tiver disposição e conhecimento pra traduzir tudo, sinta-se à vontade, pois seria um grande prazer postá-la por completo =)
OMNI: Para que servem suas pesquisas com substâncias psicodélicas?
MCKENNA: É uma tragédia pensar que alguém pode ir para o caixão ignorante das possibilidades da vida. E faço analogia com o sexo. Poucas pessoas podem evitar, em suas vidas, uma experiência de natureza sexual, já que sexo é uma das informações de que a condição humana dispõe. Sexo é um grande prazer, sexo liberta. Detesto pensar que alguém pode morrer sem experimentar sexo! O mesmo acontece com a experiência psicodélica. Ela é parte legítima da condição humana. Ela disponibiliza uma infinidade de informações fundamentais que perdemos quando o homem passou a se distanciar da natureza.
OMNI: “Food of the Gods” liga DMT à psilocibina. Qual a relação?
MCKENNA: A psilocibina e o DMT são quimicamente da mesma família. Meu livro é sobre a história das drogas; mostra o impacto cultural e o poder de desenhar a personalidade que elas possuem. As pessoas têm tentado, sem sucesso, responder como nossas mentes e consciências podem derivar do macaco. Já formularam todo o tipo de teoria sobre isso, mas para mim a chave que destranca este grande mistério é a presença de plantas psicoativas na dieta do homem primitivo.
OMNI: O que o levou a concluir isto?
MCKENNA: A teoria ortodoxa da evolução nos diz que pequenas mudanças adaptativas de uma espécie acabam sendo geneticamente impressas em seu DNA. Os descendentes da espécie vão acumulando novas mudanças adaptativas, até que o conjunto de mudanças gere outra espécie. Pesquisas de laboratório mostram que a psilocibina, mesmo ingerida em quantidades muito pequenas, é capaz de imprimir mudanças em nós. Nos anos 60 Roland Fisher, do National Institute of Mental Health, deu psilocibina a voluntários, e então realizou testes oftalmológicos. Os resultados indicaram que a visão periférica aumenta quando havia psilocibina no organismo do voluntário.
Bem, o aumento da visão periférica seria de grande ajuda adaptativa para o hominídeo, pois caçavam com mais sucesso e se defendiam melhor, também!
Então aqui temos o fator químico: quando adicionado à dieta, psilocibina resultou num excelente “artefato” de sobrevivência.Quando os macacos desceram das árvores encontraram cogumelos no solo. Em pequenas quantidades aumentou sua capacidade visual periférica; em maiores quantidades, aumentou as atividades de seus sistemas nervosos centrais, que resulta em maior atividade sexual e, conseqüentemente, descendentes que carregam genes modificados pela psilocibina.
OMNI: Como as informações disponíveis sobre a psilocibina sustentam sua teoria?
MCKENNA: Bem, este é o problema: a psilocibina foi descoberta em 1953, e não foi totalmente caracterizada até ser proibida, em 66. A janela de oportunidade que se abriu para estudá-la foi de apenas nove anos. Quem pesquisava a psilocibina nem sonhava que os estudos seriam proibidos pelo governo americano! Quando o LSD foi apresentado à comunidade psicoterapêutica, e uma grande esperança de estudos dos processos mentais e psicológicos se abriu, o governo suprimiu as pesquisas com drogas psicodélicas. A conseqüência disto é que a comunidade científica está capenga, pois não pôde cumprir sua missão de conhecer profundamente os mistérios da mente humana. A ignorância e o medo do governo atrapalharam o trabalho dos cientistas.
OMNI: Você está dando uma enorme quantidade de poder a uma droga. O que você pode dizer sobre a psilocibina?
MCKENNA: Ainda não sabemos tudo o que a psilocibina e o DMT podem oferecer. É como quando Colombo avistou terra, e alguém disse, “Então você viu terra. Isso é importante?”, e Colombo disse, “Você não entende: este é o Novo Continente”. Então uns marinheiros, como eu, retornaram da viagem dizendo, “Não há bordas no planeta, ele é redondo. E mais: não há monstros marinhos, e sim vales, rios, cidades de ouro”. É duro de engolir, mas caso possam voltar a estudar a psilocibina, os cientistas poderão revolucionar a forma com que lidamos com o ser humano e com o universo. Nos últimos 500 anos a cultura ocidental suprimiu a idéia de inteligências desencarnadas, da presença real de espíritos. Mas trinta segundos de viagem com DMT acabam com a dúvida. Esta droga nos mostra que a cultura é um artefato, que você pode ser um psiquiatra em Nova York ou um xamã em Ioruba, mas que essas realidades são apenas convenções locais que organizam as pessoas em sociedade. A experiência com DMT é universal, pois mostra do mesmo modo, para qualquer pessoa de qualquer cultura, a legitimidade do universo espiritual.
OMNI: Bem, mas a cultura nos dá alguma coisa para fazer, Terence.
MCKENNA: Sim, mas a maior parte das pessoas acha que cultura é o que é real. A psilocibina mostra que tudo o que você sabe está errado. O mundo não está sozinho, não é tridimensional, o tempo não é linear, não existem coincidências. Existe, sim, um nexo interdimensional.
OMNI: Se tudo o que sei está errado, então o que está certo?
MCKENNA: Você precisa reconstruir. É, no mínimo, uma tremenda permissão para sua imaginação. Você não tem que seguir Sartre, Jesus, ninguém. Tudo se esvai, e só o que você pensa é, “Sou apenas eu, minha mente e a Mãe Natureza”. Esta droga mostra que o que existe do outro lado é uma impressionantemente real forma de vida auto-consistente, um mundo que permanece o mesmo toda vez que você o visita.
OMNI: E o que está lá nos esperando? Quem?
MCKENNA: Você cai num espaço. De alguma forma, você pode dizer que é subterrâneo. Existe uma sensação de enclausuramento, mas ao mesmo tempo o espaço é amplo, aberto, caloroso, confortável de uma forma muito sensual, material. Há entidades totalmente formadas, não há dúvidas de que essas entidades estão lá. Enquanto isso você diz, “Batimentos cardíacos? Normais. Pulso? Normal.” Mas sua mente está dizendo, “Não, eu devo ter morrido, é muito radical, muito, muito radical. Não é a droga, drogas não fazem coisas assim”, e você continua vendo o que está vendo. A droga nos tenta revelar qual a verdadeira natureza do jogo. Que a dita realidade é uma ilusão teatral. Então você quer encontrar seu caminho até o diretor que produz a realidade, e discutir com ele o que acontecerá na próxima cena.
OMNI: Você dedicou boa parte de sua vida no mapeamento do DMT e da psilocibina. Como você os interpretaria?
MCKENNA: Estas substâncias podem dissolver numa única viagem toda a sua programação mental até então. Elas te levam de volta à verdade do organismo – a que diz que idioma, condicionamento e comportamento são totalmente desenhados para mascarar. Uma vez dopado, você renasce para fora do envelope da cultura. Você chega literalmente nu neste novo lugar.
OMNI: Você acha que realmente existe algo como uma “bad trip”?
MCKENNA: Uma viagem que acaba te fazendo aprender mais rápido do que você quer é o que as pessoas chamam de bad trip. A maior parte das pessoas tenta dosar o aprendizado inerente às drogas, mas às vezes a droga libera mais informação do que você é capaz de aprender. Para piorar, a mensagem pode ser, “Você trata mal as pessoas!”, e ninguém quer escutar isso.
OMNI: Como você pode defender as drogas com tanto entusiasmo quando elas estão associadas a tanto sofrimento e caos?
MCKENNA: Nós deveríamos falar da palavra êxtase. Em nosso mundo, comandado pela Madison Avenue, êxtase é aquilo que você sente quando compra uma Mercedes e pode bancá-la. Mas este não é o significado certo. Êxtase é uma emoção complexa que contém elementos de medo, triunfo, empatia e pavor. O que substituiu nosso pré-histórico conceito do êxtase é a palavra “conforto”, uma idéia tremendamente asséptica, letárgica. Drogas não são confortáveis, e qualquer um que pense que elas são uma forma de conforto ou escapismo não deveria tomá-las até que tenham coragem de lidar com as coisas como elas realmente são.
OMNI: Que tipo de pessoas não deveria tomar drogas?
MCKENNA: Pessoas mentalmente instáveis, sob enorme pressão, ou operando equipamentos dos quais dependem as vidas de outros seres humanos. Ou pessoas frágeis, ingênuas, superprotegidas. Algumas pessoas foram tão estragadas pela vida que a dissolução de amarras não é boa para elas. Essas pessoas deveriam ser cuidadas com carinho, e não encorajadas a arrebatar limites. Se por fatores genéticos, culturais ou psicológicos as drogas não são para você, então não são para você. Não estou pedindo para que todas as pessoas tomem drogas, mas acredito que assim como uma mulher deve estar livre para controlar sua fertilidade, uma pessoa deveria estar livre para controlar sua própria mente.
Todos deveriam ser livres para tomar o que quisessem, e estar bem informados sobre o que cada opção envolve. Exatamente como acontece com educação sexual. Hoje a forma com que lidamos com informações sobre drogas é a mesma como fazíamos nos anos trinta com sexo. Você aprendia através de rumores! Então as pessoas acabam tendo idéias absurdas sobre as coisas.
OMNI: Onde está sua esperança?
MCKENNA: Está na psicologia e nos jovens. Eles têm o que nunca tivemos: pessoas mais velhas que já tiveram experiências psicodélicas. O LSD tomou, e ainda toma, de assalto nossa sociedade. Dois estudantes de bioquímica podem fazer um pequeno laboratório móvel e produzir, num final de semana, de 5 a 10 milhões de doses de ácido para distribuir em papel pelo mundo. Esta facilidade e discrição criou uma pirâmide de atividade criminal de tanta potência que o governo reage como se um revólver estivesse apontado para sua cabeça. O que, no fundo, é verdade! A estratégia certa é subversão, atenção e discreto não-conformismo contra o tédio e a opressão do mundo.
OMNI: Terence, meu amigo, existe alguma coisa que o deixa com medo?
MCKENNA: Loucura. As pessoas me perguntam, “Posso morrer tomando esta ou aquela droga?”. É a pergunta errada. Claro que sempre existe algum risco em qualquer coisa, mas o que é realmente perigoso é a sua sanidade, porque como a desconstrução da realidade é infinita, você pode se mudar para algum
outro lugar. Tenho medo de não ser capaz de contextualizar essa desconstrução, me perder e não retornar à comunidade humana. Estamos tentando construir pontes, não navegar infinitamente.
OMNI: Como você vê o futuro?
MCKENNA: Se a história seguir futuro adentro, será um futuro de escassez, preservação do privilégio, controle da população através do uso cada vez mais sofisticado de ideologia para acorrentar e iludir as pessoas. Estamos no limite exato. O que também potencialmente nos aguarda é uma dimensão de tanta liberdade e transcendência que, uma vez lá, viveremos de imaginação. Seremos rapidamente irreconhecíveis se comparados ao que somos hoje porque hoje somos definidos por nossas limitações: a lei da gravidade, a necessidade de comer, de ficarmos ricos. Temos o poder de nos expandir indefinidamente para o prazer, atenção, carinho e conexão. Só precisamos nos libertar e nos permitir.