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FAQ da Crise Psicodélica

Ajudando alguém através de uma bad trip, de uma crise psíquica ou de uma crise espiritual.

:!: Este FAQ não é mantido nem atualizado regularmente. Pode incluir informação defasada. Por favor verifique a data da versão para ver quando ela foi mais recentemente revisada. Para dados atuais, veja no sumário sobre a substância no site Erowid.

ÍNDICE
(se sublinhado, clique para ir)​
  1. Isenção de Responsabilidade
  2. Créditos
    • Histórico de Revisões
  3. Introdução
  4. Avaliação
  5. Situações que requerem Ajuda Profissional
  6. Situação Crítica ou de Ameaça à Vida
  7. Situação de Crise (Emocional, Mental, Espiritual)
    • Lista Rápida
    • Armadilhas a evitar
    • O que fazer
    • Resumo
  8. Apêndices

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1. Isenção de Responsabilidade
Este FAQ é trazido apenas para fins informativos. Não defendemos quaisquer tipo de atividades ilegais. No entanto, nós realmente acreditamos no direito ao livre acesso a informações e ideias. Por fim, recomendamos enfaticamente que se informe sobre a legislação aplicável a você sobre o assunto. Este FAQ pode ser redistribuída desde que o texto não seja alterado e sejam mantidos os créditos. Se você criar cópias deste FAQ na internet, por favor tente mantê-lo atualizado com a última versão.

2. Créditos
A informação contida neste FAQ foi retirada de diversas fontes. A coleção, organização, formatação e escrita da informação para este documento foram feitas pelo Erowid.

Histórico de Revisões

0.5 – 09/10/97 – Confeccionados e-mails e enviados para comentários.
1.0 – 05/03/98 – Criado o HTML básico do FAQ.
1.1 – 11/07/98 – Adicionado índex, isenção de responsabilidade, créditos e melhorada de forma significativa a organização.
1.2 – 12/18/99 – Atualizada a seção de antídotos.
2.0 – 08/22/01 – Reorganizado para uma perspectiva de uso em tempo real. Adicionada a seção de Avaliação.
2.1 – 08/01/05 – Alterada referência para RCP/Respiração de Resgate na sessão de “Situação Crítica ou de Ameaça à Vida”.
2.2 – 02/17/14 – Adicionado link para o site Tripsit.​
3. Introdução
Há muitas situações diferentes nas quais uma pessoa pode precisar de ajuda enquanto estiver sob efeito de psicoativos. Decidir o que fazer em uma situação particular requer calma, pensamento claro e a habilidade de tomar decisões. Este FAQ é voltado a fornecer ideias do que alguém pode fazer para ajudar. Qual(is) método(s) em particular deve(m) ser usado(s) será algo único para cada tipo de situação. Lembre-se, apesar de não ser fácil nas situações mais extremas, a coisa mais importante que você pode fazer para ajudar alguém em crise psicodélica é permanecer calmo e com a maior lucidez possível.4. Avaliação
A ajuda a alguém em situação de crise deve ser dividida em dois estágios: avaliação e ação. O primeiro passo é avaliar a situação e tentar determinar o tipo de ação que precisa ser tomada.5. Tipo de Situação

  • Existe perigo físico imediato ou potencial? [Crítico] A pessoa está consciente? A respiração está reduzida ou acelerada? Ritmo cardíaco? Há qualquer descoloração da pele? Se inconsciente, há resposta apropriada à dor?
  • A pessoa é um perigo para si mesma ou para os outros? [Crítico] Ela está violenta e agindo de forma ameaçadora contra terceiros? Quais são as chances de que ela ataque alguém? E de se machucar sem querer? Entrar num carro e dirigir? Tentar se matar?
  • A pessoa está tendo uma crise espiritual, mental ou emocional? [Crise] Ela lhe parece excessivamente assustada, deprimida ou irritada? Mudanças de humor? Agindo como louca? Acordada mas não responde?

6. Informação Útil
A seguinte informação pode ser útil em determinar qual ação deve ser tomada. Tente não deixar a pessoa sozinha enquanto estiver coletando os dados. Em casos de crises espiritual e/ou emocional, é com frequência melhor perguntar a amigos ou pessoas próximas do que tentar obter tais informações diretamente da pessoa em crise.

  • Qual foi a substância utilizada? Se possível, aprenda qual(ais) substância(s) a pessoa tomou e por qual meio (oral, fumado, injetado). O quanto ela tomou? Quando tomou? Estará ela fazendo uso de outros medicamentos ou suplementos?
  • Quem é essa pessoa? Possui amigos por perto? Onde mora? Possui um histórico prévio deste tipo de problema ou similar?

Descubra tudo o que puder. Sem uma boa avaliação do que está ocorrendo, é mais provável a incidência de erros críticos ao lidar com a situação (bombear desnecessariamente alguém cheio de benzodiazepínicos, falhar em ligar pra emergência a tempo, etc.). Com o máximo destas informações quanto possível em mãos, decida sobre a gravidade da crise e aja de acordo com o tipo de situação:

  • Crítica – perigo físico imediato ou potencial da pessoa a si mesma ou a outros, possivelmente requerendo atenção médica;
  • de Crise – favorável para comportamento psicótico extremo, repetições de pensamentos negativos, ataques de pânico.

7. Situações que Requerem Ajuda Profissional

1) Se você sentir que vidas estão em risco.2) Se você sentir que a situação está fora de controle e que ninguém mais deseja assumir a responsabilidade pela pessoa.​


8. Situação Crítica ou de Ameaça à Vida

  1. Quem está disponível para ajudá-lo? Ache alguém com experiência médica em emergências. Quanto mais, melhor, mas alguém com treinamento na Cruz Vermelha é bem melhor do que alguém sem noção de primeiros socorros.
  2. Se a pessoa está tendo convulsões. Afrouxe as roupas, coloque uma almofada e posicione o corpo dela de forma a prevenir ferimentos e sufocamento. Convulsões podem ser muito, muito sérias; são mais arriscadas quanto mais frequentes e mais longas forem, e podem causar dano cerebral permanente nos piores casos.
  3. Se a pessoa está consciente. Olhe para sinais reveladores do que ela tomou: tensão forte na mandíbula é normalmente associada a MDMA ou outros estimulantes. Observe se está nistagma (olhos agitados), também sinal de uso de estimulantes. Procure por suor – que é um bom sinal neste momento. Atente para calafrios, cubra-a com um cobertor se aparentar estar com tremores.
  4. Se a pessoa está inconsciente. Tente acordá-la gentilmente. Balance-a com jeito, dirija-lhe a palavra com voz firme (“Você está bem? Devo chamar um médico?”). Se estiver vomitando, vire-a de lado para que o vômito possa fluir pra fora da boca (e assim ela não irá se sufocar). Tente determinar se a pessoa está em coma ou em um estado dissociado [veja abaixo – definição de coma].
  5. Se a pessoa não estiver respirando, tente fazê-la voltar a respirar. Afrouxe as roupas. Sacuda-a com gentileza. Desobstrua as vias aéreas, especialmente se houve vômitos. A respiração de resgate pode ser realizada por alguém certificado para tanto.
    • Nota da tradução: no Brasil, a respiração de resgate pode ser executada por qualquer pessoa enquanto os profissionais de emergência não chegarem ao local.
  6. Se o coração da pessoa não está batendo. A reanimação cardiopulmonar (RCP) pode ser realizada por alguém certificado para tanto.
    • Nota da tradução: no Brasil, a reanimação cardiopulmonar pode ser executada por qualquer pessoa enquanto os profissionais de emergência não chegarem ao local.
  7. Ligue para a Emergência – SAMU (192), Bombeiros (193) ou outro número com socorro médico em sua localidade. Lembre-se que irá demorar um pouco para o assistente responder às perguntas, e esteja pronto para a chegada dos veículos de emergência e dos possíveis policiais. Limpe o caminho para o pessoal da emergência até a pessoa. Se você estiver em uma festa, desligue a música e faça um anúncio para localizar amigos… se algum ainda estiver disponível.
  • Esta pode ser uma decisão difícil em muitas situações, mas neste momento estamos falando de eventos com perigo de vida. As consequências de chamar ajuda externa serão bem menos severas do que as consequências da perda de uma vida.
  • Nota da tradução: no original, a ligação é para o 911 dos Estados Unidos, que une emergência médica e polícia, enquanto no Brasil estes números são separados. Contudo, a depender da situação encontrada, poderá a equipe de emergência que chegar ao local acionar a polícia. De qualquer forma, e nunca será demais repetir: em primeiro lugar a vida, sempre.

9. Situação de Crise (Emocional, Mental, Espiritual)
Situações de crise podem se manifestar de múltiplas maneiras, desde explosões beligerantes potencialmente violentas, até a completa supressão de estímulos externos, bem como paranoia ou medo debilitantes, ou ainda comportamentos psicóticos ou compulsivos relativamente inofensivos. Como alguém lida com esta situação depende muito dos sintomas que a pessoa está experimentando.

Na maioria das situações, você não está tentando forçar nenhuma ação ou reação em particular da parte da pessoa em crise. A questão não é de “acalmá-la” com palavras, uma vez que isto normalmente só piora as coisas. Tenha certeza de que ela saiba que tudo no mundo externo está em perfeita ordem… Você está com ela, cuidando dela. Garanta que ela não se machuque nem a outros, e se as coisas saírem de controle, chame por ajuda. Seja lá o que você decida fazer, atente para as reações dela. Se o que você está fazendo parece piorar as coisas, parta para outra solução.

Muitos guias e conselheiros que possuem experiência com este tipo de crise emocional/espiritual aguda dizem que a melhor coisa a se fazer é dizer para deixar fluir e relaxar nos sentimentos. O mantra “respire, relaxe, deixe fluir” foi desenvolvido nas décadas de 1960 e 1970 para terapias psicodélicas e argumenta-se que muito da dissonância emocional e do estresse mental advém de lutar e resistir contra processos internos desconfortáveis. Guias sugerem que normalmente o medo é a força dominante a precipitar uma crise e o papel principal de um gerenciador de crise é ajudar a criar um espaço no qual a pessoa possa se sentir segura.

Lista Rápida
Tente ter noção do “quão longe” a pessoa está. Ela pensa estar no mesmo lugar em que você? Ela sabe que horas são, ou como se chama? Ela sabe que ingeriu um psicoativo?

  • Tranquilize-a, em tom de voz calmo e prosaico, de que você está com ela e cuidando dela.
  • Lembre-lhe de que este é um estado mental induzido por substância, de que irá acabar.
  • Lembre-lhe de respirar e relaxar.
  • Deixe-a saber que crises espirituais são normais.
  • Permaneça tão calmo quanto possível enquanto estiver falando com a pessoa, e use um tom de voz normal mesmo que você esteja ansioso.
  • Se possível, traga-lhe um pouco de água ou um pedaço de pão. Pergunte-lhe se gostaria de um gole ou de uma mordida.
  • Sente e converse. Passe o tempo com ela.
  • Se você sabe o nome dela, use-o algumas vezes: “Hey, Fulano(a), como você está?”
  • Se apresente, diga seu nome e como você chegou até ali.
  • Olhe para coisas bonitas.
  • Cante (qualquer coisa, mas especialmente músicas infantis).
  • Cuide de um animal, ou brinque com um.
  • Vá caminhar.
  • Recorde boas memórias (praia, crianças, etc.).
  • Dance.
  • Deem as mãos.

Armadilhas a Evitar

  • Não tente demais trazer a pessoa em crise “de volta à Terra”. Isto frequentemente piora as coisas.
  • Não a confunda com perguntas repetidas sobre questões que não pode responder.
  • Não a faça se sentir ainda mais isolada agindo de foma preocupada e nervosa perto dela.
  • Evite qualquer atividade física complexa, como tentar fechar o zíper de uma jaqueta, ou concertar o som, ou ainda acender a luz piloto do fogão.
  • Respeite suas necessidades e fronteiras:
    • Não toque nela se não quiser ser tocada.
    • Dê espaço à pessoa se ela aparentar que o deseja.

O Que Fazer

  1. Se uma pessoa parece estar passando por um momento difícil, gentilmente lhe pergunte se tem alguém que ela gostaria que estivesse junto para ajudar. Se ela parecer perturbada com a ideia de ter outrem ao lado de si, tenha alguém por perto para ficar discretamente de olho nela.
  2. Relacione-se com a pessoa no espaço em que ela se encontra. Muitas vezes, o que a isola e cria um senso de paranoia ou perda é que ela está tão além da consciência normal que as pessoas tentam excessivamente trazê-la de volta. Parta para, ao contrário, estar ali por ela e mais nada. Tente ver o mundo através dos olhos dela.
  3. De quais formas diferentes você pode mudar o cenário/setting (nível de ruído, temperatura, exterior contra interior, etc.)? Um cenário do tipo festa-rave ou concerto pode agravar o estado mental da pessoa. Considere encontrar um local o mais quieto possível se isto parecer ajudar (depende das pistas dadas pela pessoa em crise), e peça aos demais presentes para não se amontoarem à volta. Reassegure-a de que a situação está sob controle, anotando quem oferecer ajuda caso esta seja necessária depois.
  4. Como você pode reduzir o risco de prejuízo emocional ou físico? Lembre-se de que a sua preocupação deve ser com os sentimentos da pessoa em crise, e não com a situação em si (como em “ah, Jesus, Maria, José! Nós temos que fazer alguma coisa”).
  5. Paranoia: se a pessoa não quer ninguém por perto, retroceda, vire-se de forma que não a encare; mas a mantenha sob sua vista da forma mais discreta possível. Pense em como seria estar em um estado de paranoia, tendo ainda um estranho (irrelevante se você o é de fato ou não) te seguindo e vigiando.
  6. Que tipo de objetos, atividades e/ou distrações ajudarão a pessoa a superar um momento difícil (brinquedos, animais, música, etc.)?
  7. Sem pressão: apenas esteja com ela. A menos que haja risco de lesão corporal, tão-somente deixe claro que você está ali no caso dela precisar de alguma coisa.
  8. Toque. O toque pode ser muito poderoso, mas também pode ser muito violador. Em regra, não toque a menos que a pessoa diga que pode, ou que lhe toque primeiro. Se parecer que ela precisa de um abraço, pergunte-lhe. Se ela está além da comunicação verbal, tente ser sensível a qualquer reação negativa ao toque. Tente evitar ser arrastado para qualquer contato sexual. Frequentemente, dar as mãos é um meio muito efetivo e não ameaçador de deixar que uma pessoa saiba que você está ali para ajudá-la se for preciso.
  9. A intensidade pode vir em ciclos ou ondas. Também pode funcionar como um sistema – um movimento através de espaços transpessoais que pode ter um começo, um meio e um fim. Não tente forçar demais para movê-lo.
  10. Vai acabar: se a pessoa está conectada o suficiente para se preocupar com a própria sanidade, assegure-lhe de que está em estado alterado devido a um psicoativo e que depois de um tempo retornará ao seu estado mental “normal”.
  11. Indução normal por drogas: conte à pessoa em crise que ela está experimentando os efeitos agudos de um psicoativo (se você souber qual, diga-lhe), que é normal (apesar de incomum) passar por crises espirituais e que ela (assim como outros milhares que a antecederam) estará bem se relaxar e deixar a substância seguir seu curso.
  12. Respiração: respire com a pessoa. Se ela estiver conectada o suficiente para colaborar com sua assistência, faça-a se juntar a você em respirações profundas, longas e cheias. Se estiver dócil a este ponto ou se estiver realmente distante e surtando, colocar uma mão na barriga dela e dizer “respire por aqui por baixo”, “apenas continue respirando, você pegou o jeito”, pode ajudar.
  13. Relaxamento: pode ser muito difícil relaxar enquanto se morre ou se é despedaçado por demônios, mas lhe diga que você está ali para garantir que nada ocorra com seu corpo físico. Uma das coisas mais importantes durante processos internos realmente difíceis é aprender a estar bem com a ocorrência destes, para “relaxar” da tentativa de frear a experiência e apenas a deixar acontecer.
  14. Ficando meditativo: sugerir-lhe gentilmente que feche os olhos e se foque no próprio interior pode, às vezes, mudar o curso da experiência em andamento.
  15. Descalço no chão: uma das coisas que mais centraliza e traz de volta à Terra é tirar os tênis e meias e deixar seu pé tocar diretamente no chão duro. Tenha cuidado ao fazer isso em locais com riscos de danos aos dedos.
  16. Contato visual: se a pessoa não está agindo de forma paranoica ou com medo de você, tenha certeza de adicionar bastante contato visual.
  17. Tudo está bem comigo: deixe claro que o mundo pode desabar para ela, mas que está tudo bem com você.
  18. Processo saudável: crises são uma parte normal dos processos psicológicos humanos, e uma forma de aproveitá-las melhor é tomá-las como um método de cura, não como um “problema” a ser concertado. Veja Grof, Bill Richards, et al.

Pode ser extremamente difícil conversar, se relacionar, ou sequer estar totalmente ciente da presença de outras pessoas durante o pico de experiências intensas. Se você está cuidando de uma pessoa que está nesta situação, ouça o que ela diz e (se parecer apropriado ou útil) poderá fazer-lhe indagações bem simples sobre suas experiências: “que cor é esta?”, “você está triste?”, “qual a sua idade?”, etc.

É provável que as respostas sejam metafóricas e vagas: “todas as cores”, “sou mais velho que o rio”, etc. Não espere conseguir travar uma conversação normal.

A coisa mais confortadora que algumas pessoas reportaram ter ajudado durante uma experiência aguda foi um cobertor enrolado em torno delas. Não podemos recomendar o suficiente que se tenha um cobertor pesado e espesso para emergências.

Resumo
Apesar de que lidar com uma crise psicodélica possa ser igualmente enervante para os participantes, cuidadores/sitters e observadores, a maioria dos eventos são gerenciáveis através de uma avaliação cuidadosa seguida de uma resposta calma e decisiva. Para a pessoa que estava em crise, integrar a experiência uma vez que a fase aguda tenha passado é tão importante quanto encarar a própria crise.

Apêndices

Antídotos
Esta seção é para discussão de substâncias que são usadas no tratamento de crises psicodélicas. A droga mais usada por profissionais de emergência é a Clorpromazina (Amplictil), apesar de que seu uso foi reduzido em parte porque parece ser psicologicamente extremamente árduo para quem o toma.

A maioria das crises agudas que terminam em atendimento de um profissional de emergência são resultado de extrema ansiedade. Psicodélicos podem e de fato precipitam sentimentos incontroláveis de paranoia, ansiedade, medo e outros estados agitados. De acordo com profissionais médicos que possuem experiência em lidar com psicodélicos, os fármacos principais usados para tratar destes estados agitados agudos são os benzodiazepínicos como Rivotril, Diazepan, Lexotam e outros.

“Se todas as abordagens psicológicas falharem e se tranquilizantes tiverem de ser usados, é muito melhor começar com Librium (30-60 mg) ou Valium (10-30 mg), o que parece aliviar emoções dolorosas sem interferir no curso da sessão. O quanto antes, o paciente deve retomar uma posição reclinada com tapa-olhos e fones de ouvido, para continuar com a abordagem introspectiva da experiência”.
– Stan Grof, LSD Psychotherapy

Haloperidol – Uma droga antipsicótica usada para tratar psicoses agudas e crônicas e que é considerada “particularmente efetiva no gerenciamento de hiperatividade, agitação e mania”.
[mentalhealth.com]

Risperdal (risperidine / risperidone) – Antipsicótico relativamente novo frequentemente considerado como a primeira opção entre os antipsicóticos para tratamento de episódios psicóticos agudos e extremos induzidos por alucinógenos por conta de sua afinidade com receptores 5HT2a. Antipsicóticos não costumam ser usados para tratar reações de pânico e outras crises psicodélicas que não envolvam atitudes externas.
[TraumaSurvival.org]

Amplictil (clorpromazina) – Um antipsicótico com um grande rol de efeitos colaterais desagradáveis, é uma distante terceira ou quarta opção no tratamento da maioria das psicoses e ansiedade. “Amplictil e Melleril são agentes antipsicóticos de uma classe chamada fenotiazinas. Eles são excluídos do uso em idosos porque não possuem um perfil favorável de efeitos colaterais. Se um agente tiver a necessidade de controlar episódios agudos de comportamentos ameaçadores ou de agressões, antipsicóticos mais recentes como Risperdal ou Haldol são preferíveis”.
[Geriatric Drug Review]

Amplictil e outros tranquilizantes principais não são neutralizadores específicos de efeitos do LSD. Usados em altas dosagens, tais medicamentos têm um efeito geral inibidor que suprime e mascara a ação psicodélica do LSD. Uma análise detalhada em retrospectiva desta situação normalmente mostra que o paciente experimenta a ação de ambas drogas simultaneamente, e que o efeito combinado é bem desagradável”.
– Stan Grof, LSD Psychotherapy

O tratamento de uma crise psicodélica com Amplictil deve ser evitado e é considerado uma forma de tortura mental extrema, além de ser conhecido por resultar em semanas ou meses de trauma psicológico para a pessoa tratada por meio desta “camisa de força mental” durante o ocorrência de uma crise psicodélica.
[Thorazine Vault]

Valium (diazepam) – Usado no tratamento de ansiedade e de espasmos musculares, tanto quanto em geral para acalmar as pessoas. A dosagem usada é entre 2 a 10 mg para baixa ansiedade, e de 10 a 30 mg para ataques agudos ou extremos. O Valium é substância controlada nos EUA porque algumas pessoas acreditam que os efeitos sejam agradáveis o suficiente para o uso recreativo. Valium, Xanax e outros equivalente benzodiazepínicos são considerados pela comunidade psicodélica como o melhor tratamento químico para crises psicodélicas extremas.
[Valium Vault]

Xanax (alprazolam) – Mais um benzodiazepínico (como o Valium) usado para tratar ansiedade, espasmos musculares e para acalmar as pessoas. O Xanax faz efeito mais rapidamente do que o Valium e é considerado mais útil para tratar episódios agudos. Pílulas de Xanax são às vezes mastigadas para acelerar os efeitos, apesar de que o gosto pode ser desagradável; e refrigerante, água ou fruta podem ser necessários para reduzir o amargor. A dosagem para Xanax é de 0,25 a 1 mg para baixa ansiedade, e de 1 a 3 mg para ataques extremos e agudos. Veja Valium, acima. Xanax pode ser um pouco mais sedativo do que Valium.
[Xanax Vault]

Definições
Coma – Considera-se “coma” a ocorrência simultânea de inconsciência e baixa ou nenhuma reação a estímulos, e é algo que deve ser levado muito a sério. Comas são uma reação normal a overdoses de GHB, opiáceos, quetamina e DXM; sendo que já se ouviu falar também de sua ocorrência com outras substâncias (2C-T-7, DMT, 5-MeO-DMT e possivelmente outras) e algumas combinações; mas é extremamente incomum com a vasta maioria dos enteógenos/psicodélicos. Se a pessoa estiver inconsciente, diga seu nome, tente despertá-la de forma gentil e pergunte-lhe se está dormindo. Verifique seu pulso e sinta sua testa para ver a temperatura. Cheque a resposta à dor – aperte o músculo ao longo da clavícula e o torça ou belisque com força na base de uma unha; olhe a resposta física a isto (no mínimo as pupilas irão dilatar temporariamente). Se você não tiver resposta pra nada disto, então parece ser um coma. Estados dissociativos fortes podem se assemelhar a um coma, mas assim como alguém que desmaia com álcool, a maioria dos estados dissociados irão incluir algum tipo de movimentação, alguma resposta a estímulos (você a belisca e ela diz “ai”, ou tenta afastar a sua mão, ou rola).


FONTE EROWID 

Agradecemos imensamente a tradução feita pelo colaborador ExPoro.
Seja você também um colaborador, entre em contato:

equipemundocogumelo@gmail.com

FAQ da Experiência Psicodélica

ÍNDICE

 

 

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1. Isenção de responsabilidade
Esse FAQ é trazido apenas para fins informativos. Não defendemos qualquer tipo de atividade ilegal. No entanto, nós realmente acreditamos no direito ao livre acesso a informações e ideias. Por fim, recomendamos enfaticamente que se informe sobre a legislação aplicável a você sobre o assunto.

2. Introdução
Muito se escreveu sobre as variedades de experiência psicodélica, e há alguns materiais excelentes pela internet, como a tradução de 200K do Psychedelic Experience, mencionada abaixo. Em tempo, não há arquivo que prepare o psiconauta de primeira viagem ou cubra a experiência de um ponto de vista compreensível para pessoas que não viajaram anteriormente. Esse FAQ é uma tentativa de criar esse tipo de compilação.

Esse arquivo originalmente veio da FAQ sobre Psilocybe Mushroom, que incluía uma série de informações que se tornaram aplicáveis para todas as substâncias psicodélicas, não apenas cogumelos. Além disso, nós separamos os pedaços aplicáveis e os expandimos quando necessário nesse texto. Como antes, “nós” e “eu” alternam ao acaso entre os autores e seus assistentes.

Esse arquivo é dividido em 5 partes principais. As partes 3 a 5 (Antes, Durante e Depois) descrevem a preparação para a viagem, a viagem em si mesma e os efeitos posteriores ao fim dela. A parte 6 traz conselhos extras para o psiconauta de primeira viagem. A parte 7 dá mais orientações para o guia de primeira viagem.

Um Suplemento para Doses Altas [HDS do Inglês High Dose Supplement] a esta FAQ será publicado em data posterior, com o propósito de dar informações adicionais aos exploradores de doses altas.

Comentários e críticas são bem-vindos, como sempre. Curta o seu voo.

3. Antes
Todos os aspectos da preparação pra viagem, mental ou não.

3a. Escolha da substância
De longe, as drogas psicodélicas mais populares são LSD e cogumelos. Cannabis, apesar de psicodélica em algum sentido, não o é na mesma magnitude dos reais alucinógenos, ao menos em doses normais. Isso de fato é um caminho para demonstrar ao usuário de álcool/nicotina/café que nem todas as drogas botam a pessoa pra baixo. MDMA é uma classe própria, mas muito do que está escrito aqui é aplicável. No entanto, ao menos do jeito que é comumente usado, tende a não ser uma experiência de expansão da mente, e sim de êxtase físico (o trocadilho é proposital). Existem também, é claro, DMT, 2C-B e outras substâncias famosas; mas a pessoa mediana não costuma chegar nelas. Mais informação sobre elas no HDS.

Para o iniciante sortudo o suficiente para ter uma escolha, eu recomendo cogumelos. Uma viagem de cogumelo dura cerca de 6 horas, enquanto o LSD pode durar por até 12 horas; e essas 6 horas extras são normalmente tempo demais, principalmente para psiconautas estreantes. No entanto, algumas pessoas pensam que LSD é um psicodélico mais “positivo” ou “pra cima” que o cogumelo, mas isso depende do seu humor. Pessoalmente, eu acho que a curta duração é mais importante, até porque primeiras viagens ruins são extremamente raras.

Deve-se visar uma dosagem baixa. Afinal, você sempre pode aumentar a dosagem na próxima vez, mas não pode diminuir uma bad trip. No mercado negro é mais difícil estimar a força da dose, então ter um viajante experiente para experimentar o que será usado é uma boa ideia. Veja as FAQs de dosagem para informação mais precisa. Especialmente com LSD, não caia na armadilha que “nada está acontecendo, acho que tenho que tomar mais”, depois de ingerir a primeira dose. Espere pelo menos uma hora com psilocibina (cogumelo) e pelo menos duas horas com LSD antes de tomar mais para aumentar o efeito.

Entretanto, nas palavras de Dave Gross:

Mas também não muito pouco. A primeira viagem é importante, e parece ter mais potencial quando no primeiro encontro com o reino da psicodelia. Na minha opinião, pode ser bom que a primeira viagem seja poderosa (ou seja, mergulhar ao invés de andar sobre as águas). Existem duas considerações: reduza a possibilidade e severidade de uma potencial bad trip, e aumente o poder e a intensidade desconcertante de uma good trip. Ambos são importantes. Se segurança fosse a preocupação principal, a pessoa não estaria considerando usar uma substância eventualmente ilegal e que joga com sua mente em primeiro lugar. Existe a necessidade de uma balança entre conservadorismo seguro (“como viajar com segurança”) e entusiasmo (“como ver Deus, ser Deus e fazer Deus obsoleto enquanto ouço Pink Floyd”).

3b. Escolha da companhia
As dinâmicas do grupo escolhido para a viagem são cruciais. Vamos considerar alguns aspectos, um por vez:

Tipos de Amigos
Para citar um texto anônimo que descreve a escolha de companhias de viagem de forma brilhante:

“Escolha alguém com disposição para ouvir você cantando a mesma canção repetidamente e repetidamente, desafinado e com a letra errada. Alguém com quem você não se incomode de te ver, e que também não se incomode de te ver engraçado, rindo, chorando, se mijando de medo, falando com Deus, etc. Alguém que irá segurar as suas mãos enquanto você faz cocô para evitar que você caia na privada e desça pela descarga. Alguém, talvez, um pouco mais forte fisicamente que você.

Definitivamente, alguém que já viajou antes, mais de uma vez. Alguém que tem histórias pra contar, e outras que jamais contaria. Alguém que leve isso a sério, mas ainda tenha senso de humor.

Definitivamente alguém com algum grau de compaixão e, com certeza, sabedoria.

Definitivamente, alguém que não vai deixá-lo sozinho, nem por um segundo.

Se você escolher alguém com quem possa transar, tenha certeza de que ele(ela/s) vai aceitar um amante desajeitado e cheio de risadinhas; e que ele(ela/s) não ficará ofendido(a) se você não conseguir manter uma performance ou esquecer totalmente da transa! Alguém que possa ficar calmo e te manter calmo se você ficar mandão.

Se você achar alguém que cumpra todos esses critérios, considere um casamento. Tente ser merecedor”.

Tamanho do Grupo
Viajar sozinho, especialmente para o iniciante, é de certa forma tolice. Existem dois fatores em selecionar o tamanho do grupo. Primeiro, para pessoas inexperientes, ter vários amigos presentes vai reduzir a chance de alguém entrar em pânico. No entanto, enquanto o tamanho do grupo aumenta geometricamente, as tensões e conflitos dentro dele aumentam exponencialmente, gerando uma atmosfera tensa e aumentando a possibilidade de bad trips. Números pares também são preferíveis, pois se/quando o grupo se partir em pares não deixará ninguém de fora, o que seria chato.

Assim, recomendamos o tamanho total do grupo da seguinte forma:
Todos são inexperientes: 3-4
Uma pessoa inexperiente: 2-3
Todos são experientes : 2

Um guia experiente, como um terapeuta ou xamã, pode às vezes trabalhar com um grupo maior, como 8 a 16 pessoas. Mas normalmente todos os envolvidos têm pelo menos alguma experiência.

Confiança no Grupo
Essa é provavelmente a característica mais importante. Se você confia nas pessoas com quem está viajando junto, você se sentirá à vontade com elas durante a viagem e pode usar o tempo de forma mais produtiva, ao invés de ficar se perguntando com os motivos ocultos das pessoas presentes. Ser capaz de confiar no julgamento do guia é especialmente importante, então.
Problemas de Gênero
Viajar com membros do sexo apropriado presentes é divertido, mas também traz o problema da tensão sexual. Sentimentos podem emergir durante a viagem, mas também é possível se ler errado os sinais dos outros, e você pode fazer algo que lhe deixe sem graça depois. Também merece nota que pessoas com relacionamentos conturbados (que acabaram de terminar, ou que sempre brigam, etc.) não devem viajar juntos, ou a viagem será focada nesses aspectos negativos.

O problema central é, novamente, confiança. Se todos os membros do grupo desejam confiar um nos outros, não deverá haver problemas. Discussões de todos os problemas que possam surgir e exercícios do tipo share-water-grow-closer, como meditação em grupo, são úteis. Considere também uma experiência de apenas MDMA juntos, talvez como um facilitador.

Um dos nossos companheiros de viagem teve problemas com isso. Por vários meses havia uma atmosfera extremamente desconfortável de falta de confiança e paranoia entre três membros do grupo. Eventualmente a situação ficou intolerável, foi confrontada diretamente e, por meio de discussão franca, o problema foi resolvido antes de explodir em nossas caras.

A moral é a seguinte: não deixe isso acontecer com o seu grupo. Discutir problemas como esses diretamente pode ir contra a etiqueta e ser um pouco embaraçante, mas é muito melhor do que ter que lidar com uma atmosfera constantemente incerta e venenosa.

Tomada de decisões
Conflitos de interesses podem surgir quando viajando com grupos maiores. Um conjunto de instruções:

  • Sempre pergunte a todos os presentes se está tudo bem ou não em mudar de música, alterar a luz, etc.
  • Cada membro do grupo deve ter um poder de veto absoluto. Ou seja, se todos os demais querem Z, mas um único membro não o quer de forma veemente, então o grupo não fará Z.
  • O guia é o árbitro final em quaisquer disputas.
Doses no Grupo
O guia deve tomar uma dose também para melhorar a comunicações com os outros e pra fazer as 6 a 12 horas de babysitting mais interessantes. No entanto, sua dose não deve ser alta a ponto de perder contato com a realidade. Nível 2 ou por aí é provavelmente o melhor. Exceto talvez o guia, todos os presentes devem estar sob influência do psicodélico, senão os não viajantes irão se sobrepor e trazer todo mundo pra baixo, de volta à realidade.

3c. Escolha do local
O local ideal pra viajar é, ao mesmo tempo:

  • Isolado, de forma que você não encontrará com nenhum amigo, parente ou vizinho durante a viagem;
  • No campo, de forma que você possa se afastar da afobação e dos barulhos da cidade grande, e curtir a natureza;
  • Familiar, de forma que você se sinta seguro e confortável;
  • Confortável, ou seja, com camas e colchões para todos.

Infelizmente, achar um local que cumpra todos esses requisitos não é possível pra maioria das pessoas, então você terá que se contentar com menos. Se você mora sozinho, ótimo, só tenha certeza que irá tirar tudo que te liga ao mundo externo durante a viagem (desligue telefones e campainhas, diga aos seus amigos e parentes para não te visitarem). Se você ainda mora com os pais, escolha um momento quando estará absolutamente, completamente e totalmente certo que eles não chegarão implodindo sua viagem na metade. Considere alugar uma cabana na floresta pro fim de semana ou talvez apenas um quarto de motel – há algumas opções bem baratas de hospedagem, e em grupo é possível pagar com baixo custo lugares mais caros. Aqui na Finlândia há milhares de casas de campo pro verão, quase sempre localizadas perto de lagos e florestas, que preenchem os critérios de um local perfeito para viajar.

Nas primeiras viagens eu recomendo permanecer dentro de quatro paredes, pelo menos no pico, com talvez uma excursão eventual no parque do bairro quando os efeitos estiverem passando. Outra escolha é entre viajar de dia ou de noite. De noite, você pode ver melhor as alucinações e o crepúsculo melhora a viajibilidade das coisas, e sair é mais fácil porque há menos pessoas à volta. Viajar à noite também oferece a vantagem de se poder dormir logo após o fim da viagem, de forma que você acorda renovado de manhã. Por outro lado, de noite as coisas podem também parecer um pouco estranhas demais, e ser roubado durante a onda não será agradável.

Uma vez que você tenha mais experiência e consiga interagir com pessoas que não estão viajando, seja aventureiro e vá acampar na floresta, tente a praia, um parque de diversões, uma rave… Uma vez, Leary disse (eu acho) que a maior razão das pessoas enjoarem de psicodélicos é que elas sempre fazem as mesmas coisas enquanto estão viajando, ao invés de tentarem coisas novas.

3d. Preparação
Comece a preparação uns dias antes da viagem. Carregue seu equipamento (cérebro) com tudo que você ache que seja útil. Pessoalmente, eu gosto de documentários sobre a natureza, pois são fáceis de absorver (vídeo ou TV). Livros são bons mas mais devagar pra carregar na mente. Andar na natureza, quieto e em paz, bem como meditações asseguram que eu terei energia mental e felicidade suficientemente longas. Tente quebrar o ciclo normal de trabalho e, se você está estressado, demore uns dias a mais longe de tudo antes de ir pra viagem.

Considere o que você come no prazo de umas 8-12 h antes da viagem. Você deve querer armazenar energia pra sua viagem, então uma pequena refeição de carboidratos e proteína cerca de 3-4 h antes da viagem pode ser útil, especialmente para a viagem mais longa do LSD. Por outro lado, jejuar ou só tomar sucos no dia da viagem pode lhe dar leveza de qualidade, que é boa para uma jornada mais religiosa ou de xamanismo. Se você tiver uma refeição cerca de 1-2 h antes de ingerir o material, ele será absorvido mais lentamente (a menos que seja LSD e absorvido debaixo da língua), e pode aumentar a náusea e o desconforto intestinal aos que tem tendência pra tanto. Você deve evitar alimentos com alto nível de gordura no dia da viagem, apesar de que um pouco de chocolate é uma tradição mexicana com os cogumelos.

Evite situações desagradáveis logo antes da viagem. Se você vir muitos filmes de terror ou tiver uma discussão de 2 horas com alguém, essa bagagem emocional negativa provavelmente irá ressurgir durante a viagem.

3e. Música
Um dos fatores mais importantes da preparação é a música – especialmente em ambientes urbanos a música pode ser necessária pra camuflar e mudar o fundo sonoro do dia-a-dia. Música pode atingir a sua imaginação e uma miríade de diferentes jeitos. Música pode te levar embora, confortar ou te fazer sentir inacreditavelmente bem. Também pode te deixar triste, saltitante ou nervoso. Por isso, é muito importante fazer a escolha certa da música. Existe música de viagem e música de viagem – dependendo do resultado desejado. Eu vou me focar no lado mais profundo; música para viagens xamânicas, viagens espaciais e viagens intensas de cogumelos mágicos.

Eu falo pela minha própria experiência, então pode ser que o material citado não se encaixe totalmente pra você. Eu sempre fui céptico sobre isso, mas os resultados são com frequência incríveis e surpreendentes. Músicas que você gosta em seu estado normal de consciência não são o ideal – talvez sirvam para antes e depois da viagem. Para uma viagem tente achar uma música que seja calma, nem muito agitada ou rápida, não muito estruturada, e que possa ficar bem como música de fundo se desejado.

Uma típica programação de música pra viajar ficaria assim:

Primeira hora
Otimista, relaxante, talvez não muito profunda. Adventures Beyond the Ultraworld (da Orb) é uma favorita, Little Fluffy Clouds é garantia de te colocar no clima certo.
Segunda e terceira horas
É quando o pico vai ocorrer, então a seleção musical deve ser feita cuidadosamente. Escolha algo bem quieto e calmante, há várias sugestões disponíveis.
Quarta até sexta horas
Mais do mesmo ou talvez absolutamente nada. A esta altura, a música está somente no fundo e sua seleção não importará muito.

Esses tempos são para psilocibina, multiplique por dois para LSD.

E agora os tipos comuns de músicas para viajar:

Ambiente
Um monte de música entra nesta categoria hoje em dia, e pode ser muito difícil achar algo realmente ambiente no meio de todas essas novas ambiente-techno/dub. As minhas favoritas e de muitos outros incluem Ashra Temple, John Cage, Cluster, Brian Eno, Robert Fripp, Steve Hillage, Daniel Lanois, Pink Floyd, David Toop & Max Eastley, Tangerine Dream e Tuu. Todas essas se movem em tangentes mais sérias – vale a pena checar. Muitas lojas de música trazem-nas sob o nome comum de New Age, próximas das músicas crystal-healing. Para um lado mais techno da música ambiente, tente Aphex Twin, James Bernard, FFWD, FSOL, PEte Namlook, The Orb (especialmente os lançamentos mais recentes), William Orbit, Seafeel, Sun Electric ou Terre Thaemlitz, por exemplo.

Ethno
Músicas de culturas diferentes ao redor do mundo, especialmente músicas de xamãs ou músicas que visam experiências religiosas ou espirituais – bateria xamânica, australian dijetidoo sounds ou cantos gregorianos ou de monges budistas, por exemplo. Compilações de Músicas para Meditação podem ser excelentes! Há uma enorme quantidade deste tipo de música ao redor do mundo.

Minimalista
Especialmente Terry Riley, Steve Reich, Philip Glass e Lamonte Young todos fizeram psychoacoustic music. Riley é especialista: beyond words – algo inacreditável. Pra quem conhece do assunto.

Silêncio
Silêncio completo ou “Música da Mãe Natureza” – melhor som pra viajar desde que existem humanos viajando. O padrão de gotas de chuva caindo ultrapassa qualquer música que possa ser criada. Algo que deve ser tentado. Perfeito.

Outras
Algumas pessoas ouvem, por exemplo, industrial ou rap. Enquanto ambos são ótimos de se ouvir turbinado, também tendem a apresentar desagradáveis e desanimadores temas assustadores que é melhor evitar enquanto não se for muito familiar com o mundo psicodélico. Às vezes, um techno mais encorpado (trance, acid, progressive) é excelente – pessoalmente, eu acho Orbital 2 brilhante. Mas, normalmente, muita percussão (batida) não é uma coisa boa. Muitas pessoas também gostam de música clássica. Basicamente, tente a música que você normalmente gosta, mas com um pouco de cuidado.

De qualquer forma, pra uma viagem real eu digo: depois de tomar, desligue as luzes, ligue o volume no limite do subliminal, relaxe e sintonize-se com a vibração da Terra.

3f. Acessórios de viagem (triptoys)
Acessórios de viagem só devem ser usados depois do pico ter claramente terminado e seu grupo ter entrado na fase em que se tem novamente alguma energia ao invés de só se voar no hiperespaço. Claro, algumas pessoas continuam com a música ou buscas mais espirituais. Em ordem alfabética (no original em Inglês):

  • Livros são um gosto adquirido. A maioria das pessoas acham difícil ler, enquanto outros precisam estar viajando pra entender determinados textos, por exemplo, Joyce;
  • Frutas cítricas, especialmente laranjas. Uma combinação poderosa de cheiro, textura e sabor. Suco é um substituto decente;
  • Lápis ou tintas para desenho;
  • Tocar percussões pode prover uma experiência de indução ao transe interessante, seja um tocando por todos ou o grupo se revezando no instrumento;
  • Comidas gelatinosas. Por exemplo, gelatina, pudim de chocolate, jujubas…
  • Qualquer coisa que brilhe no escuro, preferencialmente que não sejam caveiras ou esqueletos, por razões óbvias;
  • Qualquer coisa fluorescente;
  • Flores frescas parecem lindas e cheiram maravilhosamente bem;
  • Comida é uma categoria por si mesma. Além das comidas preferidas de sempre, tente sorvete, comida de neném (do tipo fruta), refrigerantes… Apenas pequenas porções são necessárias, contudo: durante a viagem você não pode realmente comer, apenas sentir o sabor;
  • Incenso, especialmente quando está escuro e você pode balançá-lo e criar rastros no ar, ou olhar a fumaça à deriva com uma lanterna. O cheiro também dá um bom tom à atmosfera;
  • Fluffies (aquelas bolas com pelos elásticos), quanto maior e mais colorido melhor, são muito positivos;
  • Espelhos podem ser interessantes, mas também arriscados. A menos que tenha alta auto-estima, e a maioria das pessoas não tem, é comum ver seu rosto coberto com cabelos/insetos/espinhas/seja lá o que for, quando você olhar pro espelho. Mas, muitas pessoas adoram espelhos quando viajam, e há casos de autoestimas melhorando depois de um longo tempo de sessões olhando pro espelho;
  • Filmes quase merecem sua própria seção. Desde que todos tem seus favoritos, vou apenas listar os populares: The Mind’s Eye e Beyond the Mind’s Eye, ambos animações de computador, são clássicos. Também são o Fantasia e Alice in Wonderland, da Disney. Koyaanisquatsi é outro favorito. Evite filmes “ferra mentes” como os trabalhos de David Lynch: Natural Born Killers, Tetsuo, etc.; são muito assustadores e difíceis de acompanhar sob influência;
  • Instrumentos musicais, especialmente violões e guitarras, são divertidos de serem tocados;
  • A natureza é o maior e mais inigualável acessório de viagem, ponto final. Eu realmente recomendo sair, especialmente à noite. Estou realmente convencido que a floresta à noite durante a viagem é a coisa mais irada do universo. Neste mesmo pé, está a praia quando se está de dia; o lago durante o pôr do sol; e um campo coberto de neve na luz da lua; e……..
  • Estroboscópios regulados a 20-30 Hz são ótimos. Cuidado: luzes estroboscópicas podem causar crises em pessoas com epilepsia não diagnosticada, teste-as antes de usar;
  • Bichos de pelúcia são demais: eles são uma ligação familiar com a realidade e, mais importante, são divertidos de abraçar, brincar ou jogar por aí;
  • Televisão é algo ambivalente. Algumas pessoas gostam, outras não conseguem imaginar algo que queiram fazer menos sob influência. Se quiser tentar a TV, desenhos (especialmente Reboot) são provavelmente o melhor;
  • Jogos com a voz. Jogar apenas com sons de vogais ou fazer uma língua usando vogais e consonantes pode ser muito interessante, seja o grupo todo junto ou alternando com um membro de cada vez;
  • Água: você pode beber, pode espirrar, se tiver suficiente ainda pode andar sobre ou ainda submergir totalmente. Eu não recomendo nadar de verdade durante uma viagem, especialmente em águas desconhecidas.

Também experimente as coisas à sua volta. A natureza provê um monte de coisas legais. Até seixos podem lhe dar horas de diversão.

3g. Interações com outras drogas
A maioria das drogas, prescrições e outras, misturam mal com psicodélicos, então as evite. Claro, coisas como aspirina não vão influir tanto, mas você não quer mesmo ter uma dor de cabeça enquanto viaja. Mas, por exemplo, antidepressivos tem todo tipo de reações imprevisíveis. Alguns (como Prozac) reduzem o efeito, mas outros (como Lithium) o aumentam demais. O Erowid tem um arquivo separado de interações entre antidepressivos e psicodélicos. Consulte para mais informações.

Há três exceções bem conhecidas para a regra acima:

  • Maconha, se fumada durante a viagem, tem normalmente três efeitos. Se fumada antes ou durante a ingestão, normalmente alivia o mal estar. Se fumada durante o pico, fará a viagem ser mais forte. Se fumada depois do pico, vai fazer a viagem voltar por um tempo. Note que esses são apenas efeitos comuns, podendo variar individualmente;
  • MDMA (extasy) combina bem tanto com LSD quanto com a psilocibina. Misturar MDMA com LSD é chamado de candyflipping, enquanto MDMA com cogumelos é chamado de MX-missile (mushrooms = M, extasy = X);
  • Óxido nitroso (N2O) irá normalmente levar a viagem até o nível 4 ou 5 por alguns minutos. Não se esqueça de tomar fôlego vez em quando sempre que usar isso.

3h. Outras considerações
A roupa deve ser solta e fácil de colocar ou tirar. Sua temperatura corporal deverá aumentar alguns graus, então vista-se levemente.

Traga algo para beber (preferencialmente água, apesar de refrigerante ser um ótimo acessório de viagem) e um lanche leve para comer depois.

Mantenha as luzes apagadas ou enfraquecidas. Evite luzes vermelhas, ter sua visão avermelhada durante a viagem é comum e você não quer piorar isso.

Muitas pessoas se preparam pra viagem com alguma forma de trabalho corporal, especialmente massagem ou yoga. Principalmente se combinadas com jejum ou comidas leves, elas podem estabelecer uma sintonia espiritual para a viagem e reduzir os “ruídos” durante a mesma. Meditação/visualização guiada bem no começo da onda também é popular.

Enquanto na viagem, você não interpreta os sinais do seu corpo do mesmo jeito que normalmente faz. Por exemplo, se está com fome ou sede ou quente ou com frio ou precisando ir ao banheiro, essa impressão pode ser atrasada ou mudada no caminho até a sua consciência alterada. Se em algum ponto da viagem você se sentir agitado, insatisfeito ou irritado e não pode dizer exatamente porque:

  • Mude a música, se houver alguma tocando;
  • Mude a iluminação;
  • Vá ao banheiro;
  • Tome um copo de água.

3i. Intenções da viagem
Citação direta de _The Psychedelic Experience_:

Qual o objetivo? O Hinduísmo clássico sugere quatro possibilidades:

  1. Aumentar o poder pessoal, entendimento intelectual, compreensões mais aguçadas de si e da cultura, melhoria da situação de vida, aprendizado acelerado, crescimento profissional;
  2. Dever, ajuda aos outros, prover cuidado, reabilitação, renascer para pessoas companheiras;
  3. Diversão, aproveitamento sensual, prazer estético, aproximação interpessoal, pura experimentação;
  4. Transcendência, liberação do ego e dos limites do espaço-tempo, realização da união mística.

Na experiência transcendental extrovertida, o eu é extaticamente fundido com objetos externos (como flores ou outras pessoas). Na experiência transcendental introvertida, o eu é extaticamente fundido com processos da vida interior (luzes, ondas de energia, eventos corporais, formas biológicas, etc.). Nenhum dos dois estados é mais negativo que positivo, dependendo das preparações da viagem. Para a experiência mística extrovertida, alguém deve trazer à sessão velas, pinturas, livros, incensos, músicas, ou passagens gravadas para guiar a atenção na direção desejada. Uma experiência introvertida requer a eliminação de todo estímulo: sem luz, sem som, sem cheiro, sem movimento.

[…e agora uma seção de outra parte do guia: ]

Pessoas naturalmente tendem a impor perspectivas pessoais e sociais em uma nova situação. Por exemplo, alguns sujeitos ill-prepared inconscientemente impõe um modelo médico na experiência. Eles procuram por sintomas, interpretam cada nova sensação em termo de doença/saúde, e, se a ansiedade se desenvolve, pedem tranquilizantes. Ocasionalmente, sessões ill-planned terminam com o sujeito pedindo para ver um médico.

Revolta contra as convenções pode motivar alguém a usar a droga. A ideia inocente de fazer algo longe ou vagamente impertinente pode nublar a experiência.

[Psicodélicos] oferecem vasta possibilidades de aprendizagem acelerada e pesquisa científica, mas para sessões iniciais, reações intelectuais podem virar armadilhas. Desligue a sua mente é o melhor conselho para novatos. Depois que você aprender a como mover sua consciência – para a perda do ego a de volta ao ego, à sua própria vontade – então exercícios intelectuais podem ser incorporados na experiência psicodélica. O objetivo é te libertar da sua mente verbal o máximo possível.

Expectativas religiosas merecem o mesmo conselho. Novamente, o sujeito nas primeiras sessões é melhor aconselhado a se deixar levar pela correnteza e permanecer firme o máximo possível, e adiar interpretações teológicas.

Expectativas recreacionais e estéticas são naturais. A experiência psicodélica provê momentos de êxtase que esmagam qualquer jogo pessoal ou cultural. Pura sensação pode capturar a atenção. Intimidade interpessoal alcança as alturas do Himalaia. Prazeres estéticos – música, artes, botânica, natureza – são aumentados ao milhão. Mas reações de jogo do ego (“Eu estou tendo esse êxtase. Como sou sortudo!”) podem prejudicar o sujeito de atingir uma pura perda do ego.

Em outras palavras, é uma boa ideia decidir de antemão qual seu objetivo na viagem, e checar com seus companheiros se é possível sincronizar suas atividades, músicas, etc. Tentar atingir o nirvana através de meditação za-zen é um pouco difícil quando a pessoa com que você está viajando junto só quer saber como é delirar (rave) com um techno hardcore de 300 bpm arrancado a 100 dB.

A contrapartida disso é que você deve evitar definir a natureza da sua experiência antes dela com precisão demais. No fim, você só pode influir no caminho que a viagem tomará, não controlá-la. E não ser capaz de alcançar um objetivo muito rigidamente estabelecido vai frustá-lo à toa. Como dito acima, desligue a sua mente.

4. Durante
O que irá acontecer durante a viagem e o que fazer sobre isso.

4a. Conselho geral
Uma vez sob efeito, é relativamente fácil esquecer que você pode alterar o curso da viagem. Visuais e pensamentos vem e vão, e tudo segue um padrão estranho e desconhecido, mas divino. No entanto mudar o padrão é fácil – desde que você não se esqueça de que é possível. Sempre decida e pondere o que você quer ver e onde você quer ir antes da experiência. Uma viagem xamânica para o submundo é interessante, assim como prever o futuro. Normalmente, cada psiconauta cria seu próprio caminho pra estabelecer um padrão – seja isso pro bem ou pro mal. Qualquer coisa é possível!

Mas se lembre das palavras imortais do Hitchhiker’s Guide to the Galaxy (O Guia do Mochileiro da Galáxia):

     _____     _    _  .  .   ___   __    . .  . .   _   ___    _____
    /     \   | \  / \ |\ | /  |   |  |  /| |\ | |  / \  \ /   /     \
   |  | |  |  |  )(   )| \|    |   |--' /-| | \| | (      V   |  | |  |
   | \___/ |  | /  \_/ |  |    |   |   /  | |  | |  \_/   o   | \___/ |
    \_____/   *******************  ********************  ***   \_____/

[ NÃO ENTRE EM PÂNICO!!! ]

4b. Interferência física
Além da possível náusea do começo, que invariavelmente some depois que chegam as alucinações, os cogumelos podem causar interferências físicas ou psicossomáticas. Você se sentirá estranho, e talvez sensações físicas assustadoras como pele líquida ou proporções corporais distorcidas apareçam. Talvez sinta que tem problemas para respirar; que acabou de mijar ou cagar nas calças; que está afundando no chão ou em si mesmo. Se realmente começar a se preocupar com isso, talvez você comece a sentir como se vermes estivessem rastejando no seu estômago, que o teto está pra cair sobre você, que o colchão que você está em cima está tentando te devorar…

Sim, você adivinhou, isso é uma bad trip chegando. Não entre em pânico! Isso é normal, e nada realmente aconteceu ou está acontecendo, é só sua mente exagerando e criando coisas. Mas o mais importante: VOCÊ AINDA PODE PARAR ISSO. Aprenda a distrair seus pensamentos em outras direções nesses momentos. Não é fácil, mas é uma habilidade muito importante para viagens em altas doses.

Um dos benefícios de viajar com um grupo bem selecionado é que em um momento como esse, você pode chegar até alguém, tocá-lo e convencer a si mesmo que você ainda está são. E se você tem um bom guia, ele irá notar que você está num momento crítico e virá te ajudar, te confortar, mudar a música e te tirar dessa bad trip.

4c. Plano de vôo
[ Comments about the timing for LSD welcome, I have no personal experience with the stuff… -G ]

VÔO MINUTOS DEPOIS DA INGESTÃO
Fase LSD Psilocybin
IGNIÇÃO 0 0
Normalmente os primeiros efeitos da droga são percebidos depois de 10 ou 20 minutos. Coisas estranhas e engraçadas podem surgir na sua mente. Pode se sentir muito relaxado ou querendo pular. Depois você pode sentir que está decolando pras estrelas, e avante.
ACELERAÇÃO 45 20
Aqui batem os efeitos físicos que eventualmente ocorram. Você pode evitar ou reduzir a náusea não comendo muito antes da viagem ou não se movendo muito durante essa fase. Vomitar é incomum mas já foi relatado; ter uma sacola pra vomitar nas primeiras viagens é uma boa ideia. Se você achar que seu corpo realmente não gosta de cogumelos, uma pilula contra enjôo antecipadamente deve ajudar. Mas não se importe muito com isso, mesmo que se sinta enjoado a náusea irá acabar rapidinho.
DECOLANDO 60 40
Começa o reino da experiência psicodélica; normalmente os primeiros sinais reais são simples alucinações com olhos fechados ou no escuro, pequenos pixels coloridos voando à volta, etc. Se alguém precisa ir ao banheiro, deve ser agora.
EM ÓRBITA 90 70
Nessa hora os efeitos mais poderosos estão começando a aparecer. O corpo se sentirá pesado e sonolento.
PICO 180 120
O pico da experiência. Normalmente bem incrível.
DESACELERAÇÃO 300 240
Nesse momento a pessoa irá começar a se relembrar dos conceitos da realidade normal e vai querer pegar algo pra beber e comer, ou conversar e se mover um pouco.
ATERRIZAGEM 10 h 360
A maioria dos efeitos desapareceram e é possível dormir.
REALIDADE 16 h 12 h
Se você viajou de noite e dormiu após o fim da viagem, esse é o momento quando você se levanta… e as chances são de que você se sinta INCRÍÍÍÍÍÍÍÍVEL!

É sempre uma boa ideia ficar junto com seu grupo, ou pelo menos parte dele, e trocar experiências. No dia seguinte e no posterior as pessoas vão tender a ficar mais interiormente focadas, ainda analisando o que elas acharam durante a viagem e a importância disso para elas. Mas após esse estágio inicial de análise, comparar experiências é bem útil.

4d. Diferenças entre Psilocibina e LSD
LSD e psilocibina, apesar de similares, não são iguais. Aqui vai um bom artigo de Ellis Dee (an188749 – at – anon.penet.fi) resumindo as diferenças:

“Aqui vai uma lista parcial das diferenças entre os efeitos do LSD e da psilocibina, na forma como os vejo: —
(key — P: Psilocibina; L: LSD)

  • Duração
    P: início: 30 minutos; pico 90 minutos; duração: 6 horas;
    L: início: 60 minutos; pico 2-3 horas; duração: 10 horas.
  • Estimulação
    P: pequeno efeito estimulante, às vezes induz leve sonolência;L: pronunciado efeito estimulante, similar à feniletilamina.
  • Percepção
    • Escopo do Efeito
      P: primariamente visual [Eds: nós discordamos disso.];
      L: todos as áreas dos sentidos – visual, auditivo, tátil, sinestesia.
    • Integração Perceptiva P: sinestesia limitada, até em doses altas;
      L: sinestesia profunda em doses altas, especialmente percepção visual de estímulos auditivos.
    • visual
      • Especificidade
        P: um pouco específico, com formas recorrentes;
        L: geral, amplo espectro de possíveis efeitos.
      • Estética
        P: visões de beleza sublime são comuns;
        L: neutra, visuais indo de banais a sublimes.
      • CPr
        • Matiz
          P: cores quentes compostas de terra;
          L: cores primárias e espectrais.
        • Associação Cor-Objeto, Mobilidade
          P: concreto: cores fundidas aos objetos;
          L: abstrato: cores se movendo e mudando livremente.
        • Outras qualidades
          P: rico, lustroso;
          L: transparente, neutro.
      • ○ Padrões
        • Detalhes
          P: pouca ênfase em detalhes;
          L: fino detalhe, qualidade fractal.
        • Forma
          P: amplas regiões interligadas contendo diferentes cores unidas por bordas curvadas e evidentes;
          L: grande variedade de formas; pequenas linhas, estruturas elucidadas por facetas.
    • Consciência, Geral
      • Dissolução do Ego
        P: suave despersonalização acompanhando a experiência da beleza interior e empatia com outros seres ou fenômenos;
        L: despersonalização profunda acompanhando a experiência de unidade subjacente e ligação com tudo.
      • Expansividade
        P: suavemente expansivo;
        L: muito expansivo, multiplicidade de pensamentos e emoções, senso de ligação.
      • Cognição e Percepção
        P: percepção é pouco afetada pela cognição;
        L: cognição e percepção estão intimamente associados, com a percepção parecendo ser amplamente direcionada por processos cognitivos.
      • Continuidade
        P: pouca continuidade, uma vez que uma sensação intensa substitui a outra;
        L: alto grau de continuidade possibilitada (aparentemente) pela mediação da percepção pela cognição.

Algumas das diferenças são exageradas um pouco para fins de clareza.<”

4e. Alucinações
Descrever alucinações e efeitos visuais não é possível; não apenas são indescritíveis como são diferentes em cada pessoa. Mas, que seja, vamos tentar o impossível e prover uma lista curta de alguns tipos mais clássicos de alucinações com que nos deparamos, em ordem aproximada de quão alto deve ser a dose para que surjam.

CEV = Closed Eye Visual (Visualização de Olhos Fechados)
OEV = Open Eye Visual (Visualização de Olhos Abertos)

  • Pontos vermelho/verde/azul (CEV ou OEV)
    Possibly the most common type of hallucination, this usually occurs at the onset. The basic idea is that a layer of red, green, and blue blips – kind of like looking at a TV set from real close – is superimposed on everything. Most visible in darkness.
  • Pixalização (OEV)
    O secundo estágio do efeito acima é a pixalização, ou seja, tudo parece ter sido separado em pequenos pixels, como os da tela de um computador. Esse efeito é difícil de descrever, e só posso lhe dizer que saberá quando o vir. Pessoas que não são ligadas em computadores descrevem o efeito como uma fina malha ou rede colocada sobre seu campo de visão.
  • Traçadores (OEV)
    Deixa traços coloridos mover objetos que contrastam bastante com o fundo (como o incenso aceso numa sala escura, bola voando com o céu azul, etc.).
  • Desvio pro Vermelho (OEV)
    Tudo parece como se estivesse olhando por trás de lentes coloridas de vermelho. Agora você sabe porque hippies amam tanto óculos de sol vermelhos…
  • Respiração (OEV)
    Um efeito muito comum em doses mais altas. O objeto em questão começa a pulsar pra cá e pra lá, borbulhar, mudar, se dividir em várias camadas, transformar-se até ficar totalmente irreconhecível… Normalmente visível em objetos maiores, como areia da praia, nuvens, paredes e carpetes com texturas, etc.
  • Derretimento (OEV)
    Corolário direto do Respiração, melhor visto em plantas e árvores. O objeto em questão começa a agir como se fosse de plástico e alguém o estivesse esquentando. Ele se distorce, flui para baixo, talvez meneie um pouco em uma dança cósmica. Sombras podem exibir uma forma especial de derretimento: elas se movem por si mesmas.
  • Aurificação (OEV) [descrito por James Kent]
    Normalmente meus visuais de cogumelos começam como aurificação de cores enevoadas de arco-íris de qualquer coisa que eu olhe. Então, enquanto a viagem se intensifica, eu tenho o que posso chamar de kodakização ou polaroidização – as auras em volta dos objetos mundanos 3-D começam a se alterar em instantâneos – normalmente de membros da família ou de experiências recordadas de diferentes perspectivas;Os instantâneos tem um tipo de “efeito cascata infinito” em volta das beiradas, como se estivesse evaporando no tempo… Isso não é muito acurado, mas não sei como descrever melhor. Talvez assim: eles são fractalizados nas beiradas. Eu estudei esse efeito por algum tempo e acredito que essa alucinação se dá devido a uma mudança na velocidade na qual eu percebo a luz. As beiradas fractalizadas tendem a pulsar e piscar e regredir ao infinito. Quanto mais próximo eu analiso as bordas, mais complexas elas ficam – ao infinito. Boa música, boa erva, ou uma combinação dos dois irá animar os instantâneos – fazê-los se transformarem e escorrerem em diferentes cenas mais rapidamente. Chamo a isso de graxa da animação.
  • Visão de Raio-X (OEV) [descrita por James Kent]
    Me lembro de estar num ônibus com meu amigo com uma dose mediana de cogumelo mais ayahuasca (1,5 cogu mais 1 cápsula). Quando eu olhei seu rosto, podia ver a rede de veias pulsando sangue por sua cabeça e cérebro. Pude ver através de sua pele e enxergar seu crânio. Foi realmente estranho, mas também muito legal. Eu comecei a rir tanto que tive que botar minha mão no rosto para reduzir o barulho. Em outra viagem (dose similar – meu usual), eu estava olhando uma árvore e subitamente eu podia ver cada veia na árvore e a seiva correndo ali dentro de forma lenta mas constante. Também pude ver ciscos como pequenas formigas percorrendo tudo, inclusive meu corpo. Eles voavam através do espaço em padrões orgânicos – da árvore, para o deck, para minhas pernas, etc. Eu não sei o que esses ciscos eram. Primeiro assumi que eram algum tipo de inseto, mas eram muito pequenos pra isso. Ninguém comigo (viajando ou sóbrio) podia vê-los, então os coloquei como ilusão de viajante. No entanto, certa vez em uma caminhada (e viajando), eu sentei numa pedra e notei a MESMA COISA. Dessa vez eu busquei e vi que eram na verdade pequenos insetos nas pedras.Eles eram menores que as pequeniníssimas partículas de poeira sobre a rocha, mas estavam definitivamente se movendo em padrões de insetos. Eu os mostrei ao meu amigo, que também estava viajando, e ele não os pode ver. Então eu disse, “não, eles são realmente pequenos, como átomos”, e subitamente ele também os viu. Nós dois quase enlouquecemos. Eu ainda não sei o que eram – ácaros, bactérias, etc. – mas eles existiam e estavam lá. Eles estavam comendo e excretando algum tipo de líquen que estava espalhado por todas as pedras e árvores na área. Era maravilhoso. Eu estive caminhando na mesma área sóbrio muitas vezes e nunca as vi. Quando eu voltei uma vez sóbrio, poderia vê-los se olhasse realmente de perto, mas somente na área pequena que eu olhasse, e realmente forçando a vista. Sob efeito, eu os via em todo lugar (como milhões de rastros de formigas). Falo sobre acuidade visual!
  • O Guardião (CEV ou OEV)
    Poucas pessoas, inclusive eu, são sortudas o suficiente para ter uma alucinação constante que dura toda a viagem e até depois. Castaneda menciona-os em seus livros como “guias” ou “guardiões”. Duas formas incluem uma malha azul e vermelha de flashes, e uma estrela vermelha brilhante. Podem ocorrer ou não em diferentes viagem e também retornar em flash back após o fim da viagem.
  • Padrões Geométricos (CEV)
    Um tipo de alucinação é o padrão geométrico. Há muito subtipos destes: mandelbrot, espirais, padrões de interferência em ondas, etc. O aspecto unificador é que tendem a ser em cores prismáticas e com natureza fractal, ou seja, o mesmo padrão é repetido continuamente. Costumam ser bidimensionais em baixas doses, mas ficam 3D em altas doses. _Psychedelic Experience_ chama a isso de _The Internal Flow of Archetypal Processes_ (O Fluxo Interno de Processos Arquétipos).
  • “O Fluxo de Fogo da Unidade Interna” (CEV)
    Outro tipo pego de _Psychedelic Experience_. Esse envolve mais um *sentimento* de algo do que *visualização*, apesar de haver alucinações indescritíveis acompanhando os sentimentos. A diferença básica pro último acima é que os visuais não são geométricas ou separadas, mas amorfas, formas obscurecidas diretamente ligadas a emoções que estão sendo experimentadas, que podem ser positivas (bem-aventurança, amor, paz) ou negativas (isolamento, ausência, tristeza).
  • Padrões Tradicionais (CEV)
    São bem comuns visuais contendo imagens Aztecas, Maias, de Nativo Americanos, Indianos, culturas Africanas. Variam desde ver uma clara pintura/estátua de um Deus nativo até a visões vagas de escrituras e templos ou até mesmo a ideia geral de que as alucinações estão num determinado estilo.
  • Alucinações (CEV, raramente OEV)
    Alucinações de verdade – ou seja, objetos que são reconhecidos e aparentam ser reais mas não estão ali – podem ocorrer com viagens de dose alta. Se sortudo, o viajante talvez possa até ser transportado a um mundo do tipo País das Maravilhas literal, não apenas figurativo. Isso não seria apenas um simples sentimento como “Eu me senti como um satélite” ou “Eu fui transportado pela música”. Com alucinações reais, os visuais são equivalentes a um filme 3-D numa tela de 360 graus.
  • Entidades (CEV, raramente OEV)
    Encontros com outros seres são fato recorrente em altas doses. Não vou tratar das questões filosóficas complexas sobre o que eles são (se são algo), como chegaram ali, o que significam; tudo que sei é que eles existem. Alguns tipos comuns:

    • O louva-a-deus, uma criatura mistura de alien com cabeça de inseto que costuma parecer extremamente inteligente, consciente e neutra/negativa em relação ao viajante. Pode ser verde ou branco acinzentado;
    • O tão conhecido elfo do DMT, uma entidade parecida com um gnomo brincalhão, engraçado e normalmente amigo;
    • Pequenas pessoas felizes que dançam e aparecem em grupos grandes;
    • Massas de protoplasma do hiperespaço que, apesar de não terem forma, são conscientes.

    Tem outras, mas essas são as mais comuns.

  • Luz Límpida da Realidade (CEV or OEV)
    Nirvana, perda do ego, êxtase sem jogos, iluminação, verdade final, “a mente infalível do estado místico puro”, etc. Uma coisa é certa: você vai saber quando chegar lá. =) Novamente, se por um lado qualquer viagem decente irá seriamente reduzir a dominação do ego e te deixar ver muita coisa que normalmente não repararia, por outro lado a perda do ego a ponto da “Luz Límpida” é bem rara e até viajantes mais experientes consideram-se com sorte de terem tido essa experiência, considerada de “nível 5”.

Essa está longe de ser uma lista completa. Apesar do listado acima, você vai notar que tudo, especialmente a natureza, simplesmente parece *diferente*: novo, fresco e de alguma forma estranho e familiar ao mesmo tempo. Os detalhes vão se sobressaltar e os contrastes entre as cores serão enaltecidos. Eu acho essa habilidade de ver o mundo diferentemente como um dos aspectos mais recompensadores dos psicodélicos.

4f. Níveis psicodélicos
Para discussões com outros psiconautas, uma escala para ranquear o nível psicodélico de uma viagem é necessário. O padrão ao menos na internet é a escala de Graeme Carl, de 0 a 5, que se provou mais detalhada e trabalhável do que o sistema de “3 a mais” de Shulgin. Aqui vai o que o próprio Graeme (an43543@anon.penet.fi) diz sobre isso:

“[…] Em apenas sete anos eu viajei”” cerca de 60 vezes. Durante esse período eu prestei bastante atenção nos efeitos de várias dosagens e cheguei à conclusão que a curva de dosagem-resposta não é linear, tanto para LSD quanto para psilocibina (cogumelos). Essa não linearidade é diferente de uma pessoa pra outra, mas a forma essencial do gráfico é consistente. O seguinte diagrama em ascii é uma tentativa de retratar essa informação:

  5 I                                 ooooooooo
    I
  4 I                          ooooooo
N   I
I 3 I                   ooooooo
V   I
E 2 I            ooooooo
L   I
  1 I     ooooooo
    I
    Iooooo______________________________________
   0      2      3      5      13     20
40
             D O S A G E M  (em cogumelos frescos)

[…] A ideia essencial do gráfico é o que eu quero deixar valendo, uma vez que as dosagens individuais variam de pessoa a pessoa, em até mesmo uma proporção de 2x.

[ Notas:

A figura de dosagens passada acima aplica-se apenas ao obscuro cogumelo Psilocybe subaeruginosa Australian, então ignore-as. A ideia básica da escala funciona bem o suficiente para qualquer psicodélico. Como referência, uma parceira minha precisa de 1 g pra ter o mesmo efeito que eu com 3 g]

Nível 1:
Esse nível produz um nível suave de efeito, com enaltecimento visual (p.e., cores mais brilhantes, etc.). Ligeiras anomalias na memória de curto prazo. Hemisférios cerebrais mudam a forma de se comunicar, fazendo a música soar mais expressiva;
Nível 2:
Cores brilhantes e visuais (p.e., as coisas começam a se mover e respirar), alguns padrões bidimensionais ficam aparentes fechando os olhos. Pensamentos confusos e reminiscentes. Mudança no padrão da memória de curto prazo leva a contínuos padrões de pensamentos distrativos. Muito aumento de criatividade fica aparente uma vez que o filtro natural do cérebro é ignorado. (*)
Nível 3:
Visuais muito óbvios, tudo parecendo curvado e/ou deformado e caleidoscópios são vistos em paredes, faces, etc. Algumas alucinações mais suaves como rios fluindo em madeira granulada ou superfícies peroladas. Alucinações de olhos fechados ficam em 3-D. Há uma confusão dos sentidos (por exemplo, vendo sons como cores, etc.). Distorção do tempo e momentos eternos. O movimento às vezes fica extremamente difícil – muito esforço requerido.
Nível 4:
Alucinações fortes, p.e., objetos se tornam em outros objetos. Destruição ou multiplicação do ego. (P.e., ou as coisas começam a falar com você, ou você sente coisas contraditórias ao mesmo tempo). Alguma perda da realidade. O tempo perde o significado. Experiências fora do corpo e espirituais são comuns. Mistura dos sentidos.
Nível 5:
Total perda de conexão visual com a realidade. Os sentidos param de funcionar da forma normal. Total perda do ego. Fusão com o espaço, outros objetos ou com o Universo. A perda de realidade fica tão aguda que desafia qualquer explicação. Os níveis mais baixos são relativamente fáceis de explicar em termos de mudanças mensuráveis na percepção e padrões de pensamento. Esse nível é diferente do universo em que as coisas são normalmente percebidas – isso deixa de existir. Nirvana total (**).

Notas:

* Para que a humanidade sobrevivesse, tivemos de aprender nos primórdios como fechar e filtrar as informações que chegam ao cérebro. Esse processo de filtragem nos permite ficar centrados e com um só pensamento. Imagine-se completamente consciente de todos os sinais vindo do seu corpo num só momento, de cada centímetro da sua pele e como a sente; eternamente consciente da sua língua na sua boca, daquela coceira no final do seu nariz ou do som do ar condicionando assobiando suave ao fundo. Eu acho que viajar traz de volta essa consciência geral que foi fechada desde que nós éramos árvores.
Você já notou crianças num shopping center? Se notar, elas parecem estar viajando: olham estupefatas todas as maravilhosas cores, andando e olhando o teto ou a si mesmas nas superfícies espelhadas. Enquanto as crianças envelhecem, gradualmente aprendem a fechar essa arremetida de informações, e não mais parecem notar o mundo como quando eram novos. Quando se chega à fase adulta, essas sensações são até mesmo perdidas na memória. Talvez isso explique porque tantos iniciantes parecem sentir uma estranha familiaridade, uma sensação de que a viagem é de alguma forma mais real do que a estrita realidade.

** Iluminação Satori (Satori enlightenment), Zen instantâneo, Nirvana, etc. Você vai achar muitos desses termos orientais usados junto às drogas psicodélicas. Em minha (humilde) opinião, verdadeira iluminação Satori só é alcançada quando o ego foi totalmente superado; somente quando o “boi” foi rastreado, domado e trazido de volta à cidade. Isso, infelizmente, não pode ser alcançado na realidade alterada do universo psicodélico. Os lapsos de Satori que podem ser experimentados durante uma viagem são percebidos como um momento de absoluta paz e calma; período em que, por um curto tempo, o ego está tão difuso que a mente não é escravizada por muitas das paixões que normalmente a dominam.

A não-linearidade da escala é debatível, e especialmente nos níveis mais baixos (0-2) é bem nublada. Pessoalmente, eu acho que uma característica distinguidora extra entre os níveis 2 e 3 é que no nível 2 você pode controlar os OEVs, ou seja, só aparecem se você olhar; enquanto no nível 3 eles aparecem em todo lugar sem qualquer esforço. Igualmente, o nível 5 é uma classe por si mesmo, e você não alcançará o Nirvana só por tomar uma dose cavalar.

O texto completo dos Níveis Psidocélicos, o que inclui uma série de vários exemplos de níveis, está disponível no Erowid.

5. Depois
O que vem depois, fisicamente e mentalment.

5a. Visão geral
Rebotes da experiência persistirão desde alguns poucos dias até várias semanas. O que você aprendeu deverá mudar a sua vida. Ocasionalmente esse ensinamento será negativo e você ficará depressivo um tempo enquanto assimila que estava errado sobre algo a sua vida inteira. Mas a depressão nunca é extrema e – receoso como pode soar – você será uma pessoa melhor depois disso.

5b. Efeitos pós-viagem
Todos os efeitos posteriores possuem uma característica em comum: a frequência e/ou intensidade diminuem com o tempo. Retornando 100% ao normal costuma tomar cerca de um mês, apesar de que a maioria desaparece em uma semana. Aqui está uma lista, categorizada pela frequência de ocorrência e por ordem alfabética:

Efeitos Comuns

[a maioria das pessoas os vivenciam]

 

Alienação
Soa um pouco desagradável, e de fato seja o efeito colateral mais desagradável. Em resumo, depois da destruição do ego e de ver através dos jogos que as pessoas fazem na vida (veja The Psychedelic Experience), normalmente se começa a sentir alienado dos não-viajantes, simplesmente porque eles não podem ver através dos jogos que jogam, e há coisas mais importantes na vida do que correr atrás de pedaços de papel com fotos de presidentes mortos neles. Também, como psicodélicos são ilegais, a pessoa deve se manter de guarda levantada sobre o que falará aos não iluminados. “O que será se meus pais/vizinhos/professores/chefes descobrirem que uso drogas?”. Até com bons amigos não-viajantes, o fato de eles não terem vivenciado a impressionante experiência psicodélica é de certa forma uma barreira. Não há cura pra isso, além de tempo e desenvolvimento de um cinismo; além, é claro, de “converter” seus amigos.
Desorientação
Sua mente, após encarar a tarefa de lidar com todo o imenso fluxo de informações durante a viagem, poderá se sentir lenta por um dia ou dois. Se concentrar e evitar que a mente saia para assuntos mais interessantes fica difícil. Talvez você experimente flashes de consciência onde, nos momentos mais aleatórios, você começará a ponderar o “significado da vida”, ou pior, “quem eu sou?”, “o que eu sou?”, “por que eu sou?” Essa a razão de se sugerir um dia de descanso após a viagem, se possível.
Euforia
“A VIDA É BELA!!!” Esse é um pós efeito que ninguém reclama, infelizmente costuma durar apenas um dia ou dois. Poderá durar meses, anos ou até pra sempre uma forma mais suave de euforia, que eu chamaria de “apreciação da beleza geral das coisas” e consiste na capacidade de curtir vistas como um céu azul até nas manhãs de segunda.
Percepções (insights)
O corolário da mente para impulsos aleatórios (veja abaixo), que incluem observações brilhantes como “carros são máquinas!”, “pessoas são objetos tridimensionais!” e “a lama é legal!”. Não ria: essas são coisas que nunca teria pensado sem passar pela lubrificação mental da psicodelia. E alguns, ou a maioria, desses insights costumam se provar extremamente úteis na sua vida vida pessoal ou filosófica.
Impulsos Aleatórios
Durante a semana da viagem ou pouco mais, são normais desejos e impulsos totalmente aleatórios de fazer algo estranho. Formas tópicas (que podem variar enormemente) incluem “eu preciso pular naquela pedra e quicar sobre ela!” ou “Uvas! Eu preciso comer um monte de cacho de uvas!”. Os impulsos são sempre inofensivos (por exemplo, não será “preciso pular de um precipício”), mesmo que outras pessoas possam te estranhar fazendo o que te deu vontade. Seguir esses desejos é uma boa ideia, porque é DIVERTIDO!

Raros

[acontece de vez em quando]

 

Síndrome Bipolar (“montanha-russa emocional”)
Uma forma de depressão. Como o nome indica, a síndrome consiste em alternância entre mania (felicidade) e depressão (tristeza), sem razão aparecente para se ir de um estado ao outro. O período dos ciclos varia de minutos a dias, com a amplitude desse pós efeito acabando em no máximo umas duas semanas. Infelizmente, não há muito o que se fazer nesse caso, exceto esperar e curtir as partes divertidas; mas talvez ter consciência de que a depressão é induzida quimicamente e irá acabar logo seja uma ajuda. Mais estranhamente, ao contrário dos demais efeitos colaterais, este não parece ter relação com a proporção da dose tomada e poderá aparecer até mesmo com uma viagem não-espetacular em baixa dose.
Experiências de Conversão
Uma completa e súbita reorientação do sistema de valores de alguém, em oposição à re-estruturação de prioridades mais ou menos intensa que os psicodélicos tendem a ocasionar. “Tudo que você sabe está errado, mas você pode ser curado”.
Depressão
Provavelmente o menos raro dos efeitos raros, normalmente ativado por uma viagem ruim, especialmente uma em que se aprende algo desagradável sobre si ou sobre os outros; mas algo aparece sem razão evidente. Como a síndrome bipolar, normalmente passa em torno de uma semana.
‘Flashbacks’
O pós-efeito mais famoso, e também o mais exagerado. “Flashbacks patológicos” plenos, em que você revive totalmente parte da onda e que é o propagandeado pela mídia, pertencem à categoria “extremamente raros”. O mais comum é algo que te lembra da sua viagem, e por um momento você experimenta um fenômeno específico da viagem: normalmente uma alucinação simples ou aqueles sentimento cósmico de flutuação. Isso é um quase sempre divertido e provoca uma sensação de “uau!”. Viajantes frequentes se referem a isso como “brindes”. Em termos de computação, flashbacks não são falhas (bugs), mas recursos (features).
Episódios psicóticos de 48 h ou mais
Em outros termos, um episódios sério de insanidade que não termina com a viagem. Este é muito raro, 0,08% (8 a cada 10.000 pessoas) de acordo com um estudo sobre usuários de LSD. E até nesses casos raros, o paciente quase sempre tinha um histórico de doença mental anterior, apesar de haver exceções. Até um episódio psicótico sério não quer dizer que você vai enlouquecer pra sempre.

Muito raros

[menos de 1% de todos os usuários]

 

Transtorno perceptivo persistente por alucinógenos (no inglês, HPPD)
Após sua primeira viagem, quase todo mundo acha que os visuais que obtém com os olhos fechados (sem drogas!) são mais claros ou mudam, quase sempre permanentemente. Isso é normalmente atribuído a ser capaz de notar coisas que você não podia ver antes. Mas muito, muito raramente, uma forma extrema disto surge:

“Com HPPD, pessoas podem experimentar uma desordem perceptiva que descrevem como viver em uma bolha debaixo da água. Também descrevem trilhas de luz e imagens seguindo o movimento de suas mãos… Essa desordem na percepção é agravada pelo uso de qualquer substância psicoativa…”

“Com HPPD, a pessoa normalmente sofre de ansiedade e até pânico, e fica fóbico e deprimido. Com vítimas de HPPD, nossa experiência tem sido a de que os indivíduos não têm um histórico psiquiátrico perturbado antes do início do uso de drogas psicodélicas…”

“Para HPPD, recuperação sem uso de drogas e com aconselhamento de apoio tem se mostrado um tratamento adequado, apesar de que a recuperação pode levar vários meses. Medicação contra ansiedade pode ser necessária para tratar os distúrbios secundários de ansiedade e pânico que normalmente se desenvolve quando alguém sente que sofreu um dano cerebral irreversível…”

(David Smith et al, /Psychiatric Annals/ 24:3 March 1994 p. 145)

Suicídio
Obviamente não causado diretamente pela droga, mas indiretamente através de ataques de grave depressão, experiências de conversão negativas e várias formas de doenças mentais. Também raro ao extremo.

5c. A síndrome do Eraserhead
Os cogumelos podem ser divertidos. Alguém pode querer comê-los diariamente. A – não é legal, B – não é bom. Uma tolerância física/psíquica surge bem rapidamente: normalmente 3 a 4 vezes em um intervalo de 7 dias causa um efeito menor e uma viagem notavelmente menos divina. Eu recomendaria visitar o mundo espiritual de 4 a 10 vezes ao ano, pelo frescor e divindade nisso. A maioria de nós conhece um usuário abusador de drogas (acid-head, pot-head, etc.). Eu chamo de Eraserheads (já viram o filme?) de ácido ou cogumelo, uma vez que ficam um pouco paranoicos, maníaco-depressivos e teimosos. É fácil extrair más vibrações de psicodélicos – apenas os use da mesma forma de toma álcool – sem qualquer respeito ou cuidado. Então, lembre-se do que o prefácio diz e use a consciência do cérebro símio-turbinado que todos temos. E se você só quer ferrar com seu cérebro, há substâncias melhores para isso por aí pelo mundo.

6. PARA O VIAJANTE
Essa seção é dedicada à quem está se preparando para a primeira viagem no mundo da psicodelia.

6a. Preâmbulo
A primeira viagem é um evento inesquecível que poucas coisas, como casamento ou nascimento de um filho, podem vencer em termos de intensidade emocional, e pro seu próprio bem é melhor tratá-la com seriedade. Para citar Andrei Foldes, “você nasce sozinho, morre sozinho, e viaja sozinho”. DROGAS PSICODÉLICAS NÃO SÃO BRINQUEDOS.

6b. Estado mental
Se você está deprimido, perturbado no trabalho, doente, ou só buscando um bom momento não use drogas psicodélicas. LSD e psilocibina são lupas mentais e, se você já se sente um lixo, você irá tão somente perder a viagem afundando na sua própria insignificância e se sentindo ainda pior. O viajante habilidoso é capaz de usar essa lupa em sua vantagem e resolver o problema durante a viagem, mas não é algo prazeroso e nem recomendado para iniciantes.

Por outro lado, se você está saudável, feliz e olhando para a viagem como uma ida a uma terra distante que você sempre quis visitar – então você está em boa forma. A felicidade é aumentada da mesma forma que raiva e medo também o são.

6c. Não se preocupe, seja feliz (Don’t worry, be happy)
Agora, você provavelmente está assustado e convencido que a experiência é uma provação terrível onde até um pequeno detalhe indo mal poderá levar a 12 h de inferno. Essa visão, felizmente, é falha. Este FAQ tem a infeliz tendência de salientar o lado negativo das coisas. Com baixas doses, apenas faça o básico da preparação, e tudo irá perfeitamente bem. Apenas com doses mais altas é que há risco real de uma bad trip, e até nem a preparação mais cuidadosa, autoanálise intrépida e companhias bem selecionadas podem garantir um risco zero. (Se está planejando uma jornada de alta dosagem, veja o FAQ de High Dose).

Mas me deixe te contar uma história. Minha primeira viagem foi uma dose mediana de Psilocybe Semilanceata, e mais tarde eu a classifiquei como nível 2 ou 3 de 5. Às 22 h de um dia qualquer, um amigo me ligou e me chamou, que íamos viajar agora.

Tínhamos planejado em geral por um tempo, mas uma oportunidade inesperada surgiu e decidimos usar. Então, lá estava eu, com uma hora pra me preparar, nunca tendo usado qualquer outra droga além de álcool até então na minha vida, indo viajar num apartamento não-familiar, sem acessórios de viagem, sem fundo musical próprio, e no geral totalmente despreparado para o que ia ocorrer.

Então, nós usamos. E eu levei uma pancada. Minha visão do mundo se partiu. Seis horas de êxtase, pairando nos limites da sanidade. E, apesar da falta de preparação, foi uma experiência realmente incrível e quase totalmente positiva.

Tudo que posso dizer é: não se preocupe. Apenas aborde a viagem com a mente aberta e tudo ficará bem.

6d. Viajando apenas por diversão
A maioria dos guias sobre experiência psicodélica, incluído este, são voltados para o sabor místico de alto nível das viagens. Ainda, se você estimar sua dose corretamente, para a primeira vez sua viagem provavelmente não será maior que o nível 3, e nada realmente cósmico deverá ocorrer, pelo menos por si mesmo. Há, portanto, dois jeitos de lidar com isso.

Primeiro, você pode tentar direcionar a viagem a uma direção mística. Isso requer escuridão, falta de estímulos sensoriais, companhias muito bem cuidadosamente selecionadas e uma preparação (setting) silenciosa. Ainda assim, você só chegará a alguma lugar se meditar, ou mais precisamente, apenas ficar sem se mover com olhos fechados durante o pico da viagem – ainda haverá 3-4 horas de viagem sobrando. Daí, a resposta lógica é:

Segundo, esquecer sobre os aspectos místicos, apenas se acostume com o estado alterado, e acima de tudo DIVIRTA-SE! Lá em cima, nós listamos uma série de acessórios de viagem – teste-os! Ande pelo seu apartamento, saia lá fora (talvez até na luz do dia?), visite um bom parque… não tenha medo de sorrir e dar risadinhas. A expressão tolo viajante (tripping fool), apesar de estranho pro não-iniciado, é uma descrição perfeita do estado em que você deverá estar durante a viagem. Você fará muitas coisas infantis e/ou bobas, brincando com pedras legais ou plantas ou seja lá o que for, olhando boquiaberto como as árvores parecem incríveis. E você estará totalmente consciente do quão não adulto está sendo seu comportamento, mas isso não importará nem um pouco porque por essas poucas horas de psicodelia, você será capaz de redescobrir como é se sentir criança novamente, largar todos aqueles jogos do ego sem sentidos, e experimentar o mundo novamente pela primeira vez.

6e. Viewpoint by Jake
Estava lendo este FAQ e pensando que grande trabalho ele é. Mas me veio à cabeça que ele somente representa um “estilo” de viagem – o tipo que eu e meus amigos costumamos fazer – que é bem cerebral, espiritual, calma, ou até “saudável”, pode-se dizer. É o tipo de abordagem que a maioria neste grupo parece querer também, o tipo de abordagem necessária para para levar as coisas como com o DMT.

Mas isso me fez pensar em outros estilos nos quais estive em contato (e participei), o estilo das pessoas que provavelmente não estão muito interessadas em um grupo de emails, nas dimensões espirituais da viagem, ou sequer na importância de se manter a cabeça de alguém inteira. Estou apenas curioso sobre outras abordagens que as pessoas encontraram. Eu acho que isso vai no mesmo sentido das minhas mensagens anteriores.

Pegue alguns dos meus amigos do segundo grau, por exemplo. A terminologia usada aqui é ficar mal. Quando você toma ácido ou cogumelo você está “doidão”, você ficou de cara torta, você está chapando. Psicodélicos são tratados como uma versão mais forte de álcool. E tem a mesma autodestruição do “machão” anexa a isso. Todos vocês sabem disso; o quanto você pode tomar, o quanto você pode arrebentar, quantos/as taças/baseados/baldes/pílulas pode ingerir antes de desmaiar ou vomitar sangue (sim, eu sei de gente que já vomitou sangue tomando baldo de óleo, seja lá por qual razão). Quando falei lá em casa sobre DXM (psicoativo do xarope), vários deles correram, conseguiram 3 caixas cada (mais o THC fumado em grande quantidade) e então morreram algumas vezes. Um cara apenas sentou no seu apartamento por uma semana usando DXM e eventualmente tentou pagar outro amigo meu 20 dólares para que fosse pegar mais xarope pra ele.

Uma noite na vida aqui é cerca de 6-8 doses de um bom LSD, sentado num apartamento escuro e enfumaçado, incapaz de se mover, com Pantera, Machine Head, White Zombie, Fear Factory, Sepultura e outros mestres trash/death no volume máximo. Sem Brian Eno ou batida do mundo na estante de CDs deles, desconfio.

Eles se orgulham de conseguirem segurar a onda juntos. Eles vão tentar assustar uns aos outros, fazer coisas que colocarão suas mentes no limite o máximo possível. Se alguém começar a ficar um pouco irritado eles o levam até o limite.

Atividades divertidas são dirigir rápido em ruas escuras, quebrar telas de TV com os punhos, lutando. Pensar é proibido, claro; a experiência toda é apenas uma dose, uma sensação, um show do tipo caleidoscópico, uma chance de enlouquecer.

Para outros que conheço, umas poucas doses ou poucas gramas significam que é hora de ir pro bar, ou beber um engradado de cerveja. (Sim, uma grade; pros poucos que não sabem, você sequer sente. Bem, imagino que seu fígado sinta).

Talvez esse seja apenas a ponta mais extrema da mentalidade de festa e drogas.

6f. Conselho geral
Outros pontos para se ter em mente:

– O único sinal externamente visível que você está viajando é a pupila dilatada. Coloque óculos escuros quando sair.
– Você já leu o FAQ sobre LSD ou Cogumelos Psilocybe?

6g. Palavras finais de sabedoria
Palavras finais de sabedoria
* Deixe ir, deixe fluir…
* São apenas as drogas,
* Tudo está bem.

7. Para o Guia
Essa sessão é voltada para a pessoa que quer introduzir os amigos no mundo da psicodelia da forma mais agradável possível.

7a. Preâmbulo
Ser guia não é uma tarefa a ser cumprida facilmente. Como guia, seu papel é guiar os outros, pra ter certeza que não sofrerão danos e que tudo está bem. Isso também significa que você deve ser capaz de suprimir seu desejo de se divertir e de controlar as ações alheias para que se acomodem a você. Essa não é uma tarefa fácil.

7b. Requerimentos
Os requerimentos mínimos de um guia bem sucedido são experiência com psicodélicos (não precisa ser enorme, mas alguma, quanto mais melhor) e a habilidade de lidar com o que quer que aconteça. Um bom guia é também capaz de “sair dessa” e interagir com a realidade até no meio de uma viagem pesada, ao invés de entrar em pânico ou se retirar para dentro de si mesmo. Um guia com experiência suficiente pode até se abster de tomar qualquer droga e apenas colocar-se no mesmo estado que os outros viajantes; isso, contudo, é mais fácil de falar do que fazer.

7c. Papel
O bom guia é comumente comparado com um mestre Zen benevolente. Em outras palavras, o papel do guia não é tagarelar sem parar e tentar controlar tudo o que o viajante faz. Ao guia se supõe guiar: ajudar o viajante através dos locais mais difíceis, talvez sugerir atividades, mas acima de tudo, deve saber quando simplesmente se calar e deixar o viajante livre por si mesmo. O guia deve monitorar o viajante, mas sem ser indiscreto. Não pergunte a cada 5 minutos se estão bem, o que só irá deixá-los nervosos. Se eles não estão bem e você estiver prestando atenção, você notará.

Um pequeno esboço do que um guia deve fazer:

  • A fase de começo da viagem é a mais importante, uma vez que ela normalmente determina como o pico será. Durante esse estágio, faça o melhor pra ter certeza de que o viajante está se erguendo bem. Ambas partes serão capazes de se comunicar pelo menos no começo, então verifique o viajante regularmente.
  • Quando o pico da onda chegar, estará mais ou menos claro como o viajante está indo. Se está bem, sem problemas, apenas fique na sua mantendo um olhar discreto no viajante e fazendo coisas mundanas como mudar CDs ou o que for necessário. Se o viajante não estiver indo bem, veja a próxima seção.
  • Eventualmente, o pico irá acabar e o viajante provavelmente vai começar a vagar ou brincar com os acessórios de viagem que você trouxe (você realmente trouxe alguns, não trouxe?). Entre na diversão! Estar em volta de alguém viajando irá lhe induzir ao mesmo estado mental também.

Tenha certeza absoluta que o(a) viajante entende de antemão que você está ali apenas para ajudá-lo(a), e que não importa o que perguntarem, não irão lhe incomodar e você estará grato em ajudar. Encoraje-os a se comunicarem durante a viagem, especialmente se as coisas estão indo mal ou se não gostarem de algo. Isso é fácil de dizer, mas difícil de se por em prática.

7d. Lidando com situações difíceis
Pessoas reagem de formas diferentes ao desprazer, mas a forma mais comum de reação é ficar em posição fetal e parecer em dor. (Mas, muitas pessoas ficam em estado fetal quando se sentem muito bem… então verifique a expressão facial antes de intervir e discuta isso de antemão com os viajantes). Se o viajante não está num bom momento, mude a música para algo feliz e familiar, mude a localização ou saia para uma caminhada (com o viajante, claro). Se estão assustados, tente segurar as mãos e tranquilizá-los de que tudo está bem. Se eles expressarem medo (“Isso nunca vai parar? Estou enlouquecendo? Estou morrendo?”), combata especificamente aquele medo, lembrando-os de que estão sob efeito de drogas, que a viagem vai acabar e que você cuidará para que nada de ruim aconteça. Se eles estão tristes, um abraço será bem útil na maioria das vezes. Isso é senso comum amplo, mas se lembre de que não deve ter medo de intervir se houver necessidade. Constantemente, os sentimentos negativos vão “paralisar” o viajante e eles não serão capaz de fazer nada – nem mesmo dizer que a viagem está indo mal – então a iniciativa é do guia.

Pra qualquer tipo de bad trip, é importante enfatizar ao viajante que o medo é causado pelo ego tentando se manter unido, e que o único remédio é deixar rolar. Resistência não é apenas inútil mas também contraprodutiva. Apesar de ter certeza de que Winston Churchill não disse isso nesse sentido, a única coisa que o viajante com um guia deve temer é o medo em si mesmo.

Se isso não parecer funcionar – e talvez não funcione – a outra ferramente no arsenal do guia é mudar o cenário (setting). Sim, estou me repetindo, mas isso é importante. O viajante com frequência resistirá à ideia de mudar de lugar, mas se você gentilmente forçá-lo a fazer tal mudança, a melhora pode ser dramática. Tenha em mira contrastes; p.e., se está num lugar fechado, vá pra um aberto e vice-versa, o que fará o viajante apagar as más vibrações anteriores e começar com uma “lousa em branco”.

7f. Resumo de um contribuidor anônimo
Eu realmente não gosto do termo guia. Eu não presumiria guiar ninguém. De fato, tentar ativamente forçar alguém em uma direção é uma armadilha ao guia. O guia perde a oportunidade de aprender com as experiências dos viajantes. Vamos chamar o guia de ajudante.

Essas são as vantagens de se ter um ajudante:

  1. A presença do ajudante torna possível ao viajante encarar o que vier de negativo de forma mais corajosa. A presente reconfortante do ajudante habilita o viajante a ir para experiências difíceis e atravessar pro outro lado. Ao invés de recuar, a pessoa pode realmente explorar a escuridão e derramar um pouco de luz sobre ela e sobre si mesma.
  2. O ajudante pode ajudar com medos de perda da sanidade. Tais medos são normais em face às modificações extremas no sentido de passagem de tempo (“socorro, não acaba!”). O ajudante deve deixá-lo saber em que estágio você está, o quanto demorou até agora, o quanto demorará até acabar. O aspecto útil da experiência de parada do tempo permanece, mas o medo vai embora.
  3. O ajudante pode ajudá-lo a lembrar-se do que você queria explorar durante a viagem. Alguém pode querer explorar uma certa percepção ou tema imporante, e então se distrair totalmente. O ajudante pode lembrá-lo em um momento predeterminado.
  4. A memória pode ficar incompleta depois da experiência. O ajudante pode tomar algumas notas para refrescar a sua memória e capacitá-lo a lembrar da sequência corretamente. Isso pode ser bem fácil de aprender com as suas sessões.
  5. Quando as coisas realmente ficarem ruins, o ajudante pode intervir mudando os cenários (setting). Eles podem mudar a música, dirigir sua atenção a outro lugar, levá-lo a outra sala, etc. Mais tarde, você pode retornar à área do problema quando o envolvimento emocional estiver menor.

O que quase nunca é enfatizado é a fantástica oportunidade ao ajudante. Por ver como as sessões dos outros se desenvolvem, ele(a) pode aprender muito sobre as próprias experiências. Também, não há nada como ver alguém cujos sentidos estão abertos, absorvendo a beleza de coisas simples como uma folha ou uma pedra polida, para lembrá-lo de prestar atenção ao prazer das percepções do dia-a-dia. O ajudante tem uma oportunidade maravilhosa de aprender sobre a mente humana. Pense sobre todos os psicólogos que tiveram essa ferramenta retirada deles na década de 60: eu aposto que muitos deles dariam tudo para continuar com suas pesquisas!

7g. Nota de rodapé
O _The Psychedelic Experience_ fala um pouco sobre esse assunto. Ao invés de citar tudo (que está bem condensado acima, mas não totalmente), nós recomendamos que você pegue uma cópia do livro para um ponto de vista alternativo. Tenha em mente que o livro _The Psychedelic Experience_ é voltado para grupos grandes de 10+ pessoas e seus guias, enquanto nós nos focamos nos grupos mais típicos de 2 a 4 pessoas.

A tempo, algumas pessoas não gostam do _The Psychedelic Experience_ porque acham que fazem do papel do guia muito ativo, e também tem um tom negativo em relação a ele. P.e., “a menos que você faça X, Y e Z, você irá apodrecer num inferno psicodélico”. Pessoalmente, eu acho que grande parte dos conselhos continua válida, apesar disso.

8. Conclusão
Por favor, apertem seus cintos de segurança, apaguem seus cigarros e apreciem a viagem

(K) Kopyleft Brahman Industries 1995. All rites reversed.


FONTE EROWID

Agradecemos imensamente a tradução feita pelo colaborador ExPoro.
Seja você também um colaborador, entre em contato:

equipemundocogumelo@gmail.com

10 filmes psicodélicos para viajar a fundo na mente humana

Não há algo que sabemos que não é a partir da percepção dos sentidos, a compreensão da alma e da compreensão da mente.

— Aristóteles


A mente humana sempre foi um enigma para nossa espécie, não importa o tempo ou lugar que vivemos. É que se trata da forma como cada pessoa percebe o mundo, onde o todo define  o seu próprio todo. Mas como funciona a percepção? Até onde pode chegar a mente? Há algo mais da nossa consciência que não conseguimos alcançar? Essas são perguntas básicas que direcionam o movimento que hoje conhecemos como psicodelia.

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É normal que sintamos curiosidade pela forma como  funciona o que há dentro de nós, e essa mesma curiosidade é o que tem nos levado através dos tempos, a experimentar substâncias diferentes que criam vivências que nos ajudam a compreender melhor. Justamente como normalmente não atingem a apreciação da complexidade das coisas, sempre existiu as pessoas que experimentam o que todos não se atrevem, e dentro deles, há aqueles que foram dadas a tarefa de expor ao mundo o que viram , desde pintores e escritores a músicos e cineastas, tudo para a esperança de que outras pessoas também consigam ver um pouco  de sua experiência; assim impulsionando mais o movimento psicodélico.

Sem dúvida, esses artistas deixaram um legado psicodélico para o público que aprecia, tanto que muitas de suas obras foram consideradas genialidades, ou se tornaram cults, como é o caso do idolatrado  “The Wall” do Pink Floyd. Houve muitas coisas para nos conduzir a uma contemplação mais profunda do ser humano, e felizmente para muitos, você pode alcançá-lo através de imagens e sons, mesmo tendo a imaginação só como um motor; não é preciso ingerir qualquer substância para entender , e os filmes a seguir são um bom exemplo.


“A Montanha Sagrada” (1973)

Alejandro Jodorowsky

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O estilo de Jorowsky se destaca por sempre romper padrões e por transgredir a barreira entre o comum e o bizarro e saber encaminhar o espectador para um estado de contemplação elevado. E  reafirmou essa características após o seu filme de maior sucesso A Montanha Sagrada, que alavancou sua fama e foi considerado uma das melhores produções cinematográficas do seu tempo, e se tornou referência para o cinema exotérico. Protagonizado por um personagem incomum, o “vagabundo”, A Montanha Sagrada pode ser considerada uma viagem interplanetária direto para os confins da consciência humana.


“Planeta Fantástico” (La planete sauvage) (1973)

René Laloux

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Sendo um filme de origem francesas,não te supreederá muito a extravância e inovação que é o Planeta Fantástico, que foi uma animação de sucesso para o seu tempo; e que ultrapassou a barreira impostas por décadas  de que desenho é algo estritamente para crianças. Pode ser que este filme também não seja compreendido por adultos, tendo em vista que trata de assuntos que são de difícil contemplação para muitos: a cimeira experiência do não vivo.


“Viagem Alucinante”( Enter the Void) (2009)

Gaspar Noé

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Um traficante de drogas, um disparo e uma experiência extra corporal: essas são as três palavras que resumem  o filme de Gaspar Noé. Este filme francês foi filmado com uma perspectiva de visão subjetiva, assim é bem fácil entrar na viagem mental do protagonista e sentir totalmente identificado com ele: Vai querer experimentar?


“Across The Universe” (2007)

Julie Taymor

across-universeAcompanhada por músicas dos Beatles, se você quer saber o que é ter uma experiência com substâncias alucinógenas em uma estória de amor típica adolescente, sem dúvida Across The Universe é para você. Com propostas visuais bastantes agradáveis e interessantes, este musical irá mostrar o hippie experimentador que há em você.


“Alice” (1988)

Jan Svankmajer

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Jan Svankmajer é um dos cineastas mais subvalorizados da sua época, e que deveria ser conhecido pelo público não só pelo seu incrível talento para adaptar todas as suas ideias para stop motion, mas também pelas suas ideias incríveis. Estas versão checa de Alice no País das Maravilhas, sem dúvida te dará algo para pensar… ou viajar.

 


“The Fall. O Sonho de Alexandria” (The Fall. El sueño de Alexandria) (2006)

Tarsem Singh

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Com mais corantes surrealistas do que uma droga pscicodélica, este filme de Singh não é aqueles que você deve passar, embora esse filme seja pouco conhecido. Com passagens extraídas da imaginação do braço de uma menina é ferido, enquanto  não tem nada para fazer enquanto se recuperava no hospital, “O sonho de Alexandria” transporta para um universo que seduz e encoraja o expectador a  utilizar o recurso mais bonito da mente humana: a imaginação.

 


“Pink Floyd — The Wall” (1982)

Alan Parker

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Aparentemente, essa produção cinematográfica puramente psicodélica é a mais conhecida de todas. Este filme com ideias de Roger Waters convida o público a “explodir o muro” e atrever-se a ver as coisas como são, sem tapujos ou eufemismo. Apesar de que é necessário uma grande capacidade de interpretação inferência devido a quantidade de analogias visuais, é necessário  você empurrar os limites da vida cotidiana, pois ele vai abrir muitas portas para a realidade do mundo que nos rodeia. Além disso, se a mente pode viajar apenas com músicas do Pink Floyd, imagine isso em conjunto com elementos visuais.


“Viagens Alucinantes” ( Altered States) (1980)

Ken Rusell

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William Blake escreveu uma vez:  “Se as portas da percepção estivessem abertas, tudo apareceria ao homem como realmente é: infinito. Para o homem fechou-se para ver todas as coisas através de fendas estreitas de sua caverna. ” Esta frase inspirou Aldous Huxley, e  faz alusão ao mito da caverna mencionado nos diálogos de Platão, e é perfeitamente para descrever esse filme, que é um reflexo do que acontece quando alguém se atreve a explorar o impossível: tempo através da memória genética.


“A Cela” ( The Cell) (2000)

Tarsem Singh

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Estrelado por Jennifer Lopez, este filme é, sem dúvida, uma obra-prima no campo da trillers psicológicos e problemas que podem  “explodir a mente” para ninguém. Basicamente, a história aborda uma realidade onde a ciência está tão avançada que pode causar uma pessoa a entrar na cabeça de outro para ver como sua mente, consciente e inconscientemente funciona, mas o ponto interessante sobre o filme é a pessoa em cuja cabeça  se entra  é o protagonista: um assassino sádico.


“Isso não é um Filme” (2010)

Olallo Rubio
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Este é um filme pouco usual, não só porque ele se chama ” Isso Não é um Filme”, e sim porque verdadeiramente rompe com os estereótipos do que um filme ( roteiro) deveria ser. Este filme centra-se exclusivamente a denunciar o “sistema”, uma espécie de “Big Brother” monstruosa a que pertencemos e que não sabemos, no entanto, dirige a vida de todos.


“Paprika” (2006)

Satoshi Kon

paprika

 

Dizem que essa animação japonesa foi a  inspiração para o filme, quatro anos depois, estrelou Leonardo DiCaprio, dando fama ao conceito de inclusão de sonhos e influenciar a mente de cada espectador: “Inception”. Bem … assim como é este filme americano, também “Paprika”: complexa, intrigante, com realidades alternativas sobrepostas uma em cima de outras . Simplesmente, um must- see para quem curte filmes psicodélicos.

 

Alguns dizem que o psicodélico é uma válvula de escape, mas … do quê? Muitas vezes precisamos de um “escape” porque a mente exige que nos afastamos um pouco do mundo exterior para se conectar com o interior, e que o “eu” sempre tem coisas mais interessantes a dizer.


Não importa o quanto queremos nos  entender através dos outros, a verdade é que cada mente é  uma  aquisição de uma maneira diferente de processar o mundo, e isso depende em grande parte do que ele absorve. Por mais variedades que tenhamos em nossa mente, por isso é sempre bom ampliar nossos horizontes, por isso é importante  tomar do mundo  o que se é possível, e claro, ter um bom filtro interno. Você tem coragem de experimentar esses filmes?

Cogumelos tem resultados sem precedentes para o alívio do sofrimento relacionado com o câncer

O tratamento com psilocibina, o princípio ativo dos cogumelos alucinógenos, promove um alívio rápido e duradouro da ansiedade e da depressão entre a maioria dos pacientes com câncer, inclusive aqueles com doença avançada, de acordo com dois estudos com desenhos semelhantes publicados on-line em 1º de dezembro no periódico Journal of Psychopharmacology.

A eficácia descrita não tem precedentes na psiquiatria e na psico-oncologia, disse Roland Griffiths, neurocientista e pesquisador responsável de um estudo com 51 pacientes realizado na Johns Hopkins University, em Baltimore, Maryland.

Quando os pacientes do estudo receberam uma única dose alta de psilocibina sintética, o índice geral de resposta clínica aos seis meses para os desfechos primários de depressão e ansiedade foi de 78% e 83%, respectivamente, e o índice geral de remissão completa dos sintomas foi de 65% e 57%, respectivamente.

A psilocibina pode representar uma mudança de paradigma no tratamento dos pacientes com sofrimentos psicológicos relacionados ao câncer, acrescentou Griffiths em uma coletiva de imprensa.

CITACAO

“A psilocibina pode representar uma mudança de paradigma.”
Dr. Roland Griffiths

Os atuais tratamentos farmacológicos da ansiedade e da depressão relacionada com o câncer “tendem a não funcionar melhor do que o placebo” e demonstraram um índice de resposta de aproximadamente 40% em meta-análises, disse o Dr. Steven Ross, psiquiatra e pesquisador responsável do segundo estudo com 29 pacientes realizado na New York University (NYU), na cidade de Nova York.

O sofrimento psíquico relacionado com o câncer é especialmente difícil de tratar, sugeriu o pesquisador, observando que os medicamentos convencionais, como a fluoxetina (Prozac, Eli Lilly), têm mais eficácia no tratamento do sofrimento psíquico dos pacientes com outras doenças graves, como a aids e o acidente vascular encefálico.

No estudo da NYU, em 6,5 meses de acompanhamento, uma única dose moderada de psilocibina sintética foi associada a efeitos duradouros, visto que cerca de 60% a 80% (dependendo do instrumento de avaliação) dos participantes apresentaram redução clinicamente significativa da depressão ou da ansiedade, informaram o Dr. Ross e seus colaboradores.

Estes resultados podem ser um divisor de águas no campo da psiquiatria, já que recentemente a psilocibina também foi administrada com segurança em pacientes com depressão refratária ao tratamento e sofrimento psíquico associado a outras doenças com risco de vida, bem como à dependência de álcool ou tabaco e ao transtorno obsessivo-compulsivo, como já informou o Medscape.

Os pacientes que participaram nos dois novos estudos, que são até o momento os maiores estudos randomizados controlados com psilocibina para a depressão e a ansiedade em pacientes com câncer, também falaram na coletiva de imprensa.

Dinah Bazer, 69 anos, do Brooklyn, em Nova York, foi diagnosticada com câncer de ovário em 2010 e passou por uma cirurgia bem-sucedida e quimioterapia, mas apresenta sofrimento psíquico constante.

“Eu estava absoluta e inteiramente consumida pela ansiedade e pelo medo da recidiva, disse Dinah, que participou do estudo da NYU. “Durante a minha experiência com a psilocibina, visualizei meu medo como uma massa física no meu corpo. Fiquei louca de raiva e gritei para ele ‘some daqui!’, e ele se foi. Eu, então, entrei em um estado difícil de descrever como ateia… banhada no amor de Deus. Isso durou horas. Quando a experiência terminou, meu medo e minha ansiedade tinham desaparecido”, segundo ela.

“Esta droga salvou a minha vida, e mudou a minha vida”, disse Dinah.

A administração de “drogas psicodélicas” como a psilocibina foi estudada no passado nos Estados Unidos para uma série de doenças, observa o Dr. Craig Blinderman, no comentário que acompanha o artigo(http://journals.sagepub.com/doi/full/10.1177/0269881116675761). O Dr. Blinderman é especialista em cuidados paliativos no Columbia University Medical Center/New York-Presbyterian Hospital, em Nova York.

Essas pesquisas foram suspensas quando o presidente Richard Nixon assinou a Lei de Substâncias Controladas de 1970, colocando as drogas psicodélicos na Classe I, que corresponde às “drogas sem uso médico aceito na época e com grande potencial de abuso”.

O Dr. Blinderman afirma que os pacientes com câncer têm uma prevalência de ansiedade e depressão de 30% a 40%, que é muito mais elevada do que os 7% a 10% encontrados na população geral.

Muitas vezes, os pacientes oncológicos que sofrem de ansiedade ou depressão têm desfechos piores, até mesmo maior utilização dos serviços de saúde, mais dor, pior qualidade de vida e menor sobrevida, escreve o pesquisador, citando vários estudos.

Esses novos estudos são “inovadores” e apresentam resultados muito empolgantes, disse o Dr. Blinderman, que também participou da entrevista com os jornalistas.

Uma das batalhas travadas no atendimento de pacientes com câncer, especialmente aqueles com doença avançada, é idar com a “angústia existencial” que, de acordo com o Dr. Blinderman, é uma síndrome caracterizada por falta de esperança e desamparo diante da perda de propósito e significado na vida.

O desafio clínico de abordar e tratar essa angústia existencial é exacerbado pelos problemas correlatos, continuou o pesquisador. “As limitações na cobertura da saúde mental e a escassez de profissionais experientes em psico-oncologia disponíveis representa outro obstáculo para os pacientes com câncer… no sentido de colaborar para o bem-estar deles”, disse o médico.

O “mais interessante” para o Dr. Blinderman sobre os novos estudos, foi que os dois encontraram uma correlação entre os pacientes tendo alguma “experiência mística” e extensão da melhora da ansiedade e da depressão.

Por exemplo, no estudo da NYU, os autores informaram que a intensidade da experiência mística subjetiva, classificada de acordo com o Questionário de Experiência Mística (Mystical Experience Questionnaire – MEQ 30) e relatada pelo próprio participante, “mediou” significativamente a diminuição dos sintomas de ansiedade e depressão em médio prazo (por exemplo, seis semanas após a primeira dose).

CITACAO
“Trata-se de um resultado profundo”
Dr. Craig Blinderman

“Trata-se de um resultado profundo”, disse o Dr. Blinderman sobre a correlação entre a experiência mística relatada pelos participantes e os resultados positivos.

Essas observações também lançaram uma nova luz sobre “o aumento do interesse na morte com assistência médica” nos Estados Unidos, disse ele. A incapacidade terapêutica de aplacar o sofrimento existencial dos pacientes é o “principal motivo” que os leva a optar pela morte com assistência médica, disse o Dr. Blinderman.

“Não dispomos de nenhum bom tratamento para a angústia existencial”, observou. Antes de abraçar a opção de terminar a vida, comentou o pesquisador, parece apropriado tentar explorar métodos terapêuticos como a psilocibina, que poderiam aliviar o sofrimento que originou o desejo do suicídio assistido.

Detalhes do estudo

Na Johns Hopkins, todos os 51 participantes tiveram diagnóstico de câncer potencialmente fatal, em 65% dos casos sendo recidiva da doença ou metástase. Os tipos de câncer foram: mama (n = 13), cavidade oral, laringe, faringe e esôfago (n = 7), gastrointestinal (n = 4), geniturinário (n = 18), hematológico (n = 8) e outros (n = 1). Todos os pacientes haviam tido diagnóstico psiquiátrico formal, como transtorno da ansiedade ou transtorno depressivo.

Em termos de dados demográficos dos pacientes, a média da idade foi de 56 anos, metade dos pacientes eram do sexo feminino e a maioria (92%) era branca.

O estudo teve desenho duplo-cego, cruzado, com duas sessões (marcadas com cinco semanas de intervalo), comparando os efeitos de uma dose alta a uma dose baixa de psilocibina, administradas em cápsulas. A dose baixa serviu, na prática, como placebo, pois era baixa demais para produzir algum efeito.

Na segunda sessão, os participantes receberam uma cápsula com a dose alta.

Para minimizar os efeitos da “expectativa”, os participantes e os membros da equipe que supervisionaram as sessões foram informados que os participantes receberiam psilocibina nas duas sessões, mas as doses não foram informadas.

Durante cada sessão, dois monitores ajudaram os participantes, que foram incentivados a deitar, usar máscara nos olhos e ouvir música com fones de ouvido, em um ambiente “domiciliar”. Os monitores não davam orientações, davam apoio, disseram os autores, e estimulavam os participantes a confiar, deixar acontecer e se abrir à experiência.

Os pesquisadores avaliaram o humor de cada participante, a atitude em relação à vida, seus comportamentos e sua espiritualidade por meio de questionários e entrevistas estruturadas antes da primeira sessão, sete horas depois de tomar a psilocibina, cinco semanas após cada sessão e seis meses após a segunda sessão.

Os instrumentos de medida dos desfechos primários da depressão e da ansiedade foram a Hamilton Depression Rating Scale, a Hamilton Anxiety Rating Scale, o Beck Depression Inventory e o State-Trait Anxiety Inventory.

A psilocibina produziu efeitos importantes e duradouros nas duas medidas de desfecho primário, assim como na maioria das medidas secundárias avaliadas no início do estudo, cinco semanas após cada sessão e aos seis meses de acompanhamento.

Das 17 medidas avaliadas, 16 revelaram efeitos significativos (ou seja, diferença entre os grupos na avaliação após a primeira sessão e/ou diferença entre as avaliações depois da primeira e da segunda sessões para o grupo da dose baixa na primeira sessão).

Os autores resumiram os destaques assim: “A dose alta de psilocibina promoveu grande redução das medidas clínicas e da avaliação do próprio paciente do humor deprimido e da ansiedade, assim como melhora em termos de qualidade de vida, significado da vida e otimismo, e diminuiu a ansiedade em relação à morte.”

Os eventos adversos foram mínimos e nenhum foi grave. Cerca de 15% dos participantes referiram náuseas ou vomitaram, e 33% sentiram algum desconforto psicológico, como ansiedade ou paranoia, depois de tomar a dose mais alta. Um terço dos participantes apresentou aumento transitório da pressão arterial.

Na New York University, o desenho também foi duplo-cego, cruzado, controlado com placebo, mas em uma das sessões o placebo foi niacina. Os desfechos primários foram ansiedade e depressão avaliados entre os grupos antes do cruzamento na sétima semana.

Quase dois terços dos participantes (62%) tinham doença em estágio avançado (III ou IV). Os tipos de câncer foram: mama ou aparelho reprodutivo (59%), gastrointestinal (17%), hematológico (14%) e outros (10%).

A maioria dos participantes do estudo era branca (90%) e de mulheres (62%). A média de idade foi de 56,3 anos.

Todos os 29 participantes tinham diagnósticos relacionados com ansiedade. Quase dois terços (59%) já tinham sido tratados anteriormente com antidepressivos ou ansiolíticos.

As medidas clínicas dos desfechos (ansiedade e depressão) foram avaliadas pelos seguintes instrumentos de medição: a Hospital Anxiety and Depression Scale, o Beck Depression Inventory informado pelo próprio paciente e o Spielberger State-Trait Anxiety Inventory.

Como no estudo da Johns Hopkins, os desfechos secundários englobaram a angústia existencial relacionada com o câncer.

A equipe da NYU informou que o grupo da psilocibina (em comparação com o grupo de controle ativo) demonstrou “melhora clínica imediata, significativa e sustentada” (por até sete semanas após a dose) em termos de redução dos sintomas da ansiedade e da depressão.

Eles descreveram a magnitude das diferenças entre os grupos da psilocibina e de controle como “grande” entre as medidas de desfecho primário, avaliadas no primeiro dia/duas semanas/seis semanas, e sete semanas após a primeira dose.

Não houve eventos adversos graves. Os mais comuns foram aumentos da pressão arterial e da frequência cardíaca (76%), cefaleias/migrâneas (28%) e náuseas (14%), todos sem significado clínico. Os eventos adversos psiquiátricos mais comuns foram ansiedade transitória (17%) e sintomas do tipo psicótico transitórios (7%).

O estudo da Johns Hopkins recebeu apoio financeiro de: Heffter Research Institute, Riverstyx Foundation, William Linton, Betsy Gordon Foundation, McCormick Family, Fetzer Institute, George Goldsmith e Ekaterina Malievskaia. Griffiths declarou fazer parte do Conselho de Direção do Heffter Research Institute. O estudo da NYU recebeu financiamento de: Heffter Research Institute, RiverStyx Foundation, New York University-Health, Hospitals Corporation Clinical and Translational Science Institute, assim como subvenções de indivíduos, inclusive Carey e Claudia Turnbull, William Linton, Robert Barnhart, Arthur Altschul, Kelly Fitzsimmons, George Goldsmith e Ekaterina Malievskaia. Os autores do estudo e o Dr. Blinderman informaram não possuir conflitos de interesse relevantes ao tema.

J Psychopharmacol. Publicado on-line em 1º de dezembro de 2016. Ross et al, artigo; Griffiths et al, artigo; http://journals.sagepub.com/doi/full/10.1177/0269881116675513

fonte
http://portugues.medscape.com/verartigo/6500757

A psilocibina pode ser um divisor de águas na psiquiatria

Dois estudos randomizados controlados semelhantes, envolvendo pacientes com câncer em estágio terminal sugerem que uma única dose alta da droga psicodélica psilocibina tem efeitos rápidos, clinicamente significativos e duradouros no humor e na ansiedade. Estes resultados podem ser um divisor de águas do tratamento psiquiátrico.

Essas novas descobertas têm o potencial de transformar o atendimento dos pacientes com câncer e sofrimento psicológico e existencial, mas além disso, de oferecer um modelo inteiramente novo para a psiquiatria, o de um medicamento que age rapidamente tanto como antidepressivo quanto como ansiolítico, e cujos benefícios se mantêm durante meses, disse ao Medscape o Dr. Stephen Ross, médico, diretor do Serviço de Dependência Química do Departamento de Psiquiatria da New York University (NYU), Langone Medical Center.

“Isso pode fazer a terra tremer e trazer para a psiquiatria uma grande mudança de paradigma”, disse.

Os resultados foram publicados on-line em 1º de dezembro no periódico Journal of Psychopharmacology.

Entusiasmo dos especialistas

Os especialistas da área, incluindo os ex-presidentes da American Psychiatric Association (APA) e os chefes dos grandes serviços de psiquiatria universitários, descreveram os resultados como “notáveis”, “muito promissores”, e como sendo um “avanço crítico” que “podem inaugurar uma nova era” no tratamento da dependência química na psiquiatria.

De acordo com estes especialistas, cujos comentários foram publicados junto com os dois estudos em uma edição especial da revista, as novas descobertas justificam a realização de estudos mais abrangentes para replicar os resultados em várias populações. Alguns especialistas instam maior consideração das questões legais, éticas e regulatórias singulares ao uso clínico da psilocibina e drogas afins.

A psilocibina, princípio ativo dos cogumelos alucinógenos, é uma droga serotonérgica que atua como agonista do receptor 2A da 5-hidroxitriptamina (5-HT 2A).

Foi sintetizada pela primeira vez em 1958, tendo sido usada na pesquisa psiquiátrica até 1970, quando o uso generalizado como entorpecente recreativo e sua associação à agitação cultural e política da época resultaram em sua reclassificação nos Estados Unidos, junto com outras drogas psicodélicas, como droga da Classe I. No entanto, nas últimas décadas, tem havido um interesse renovado pela psilocibina.

De acordo com um comentário feito pelo Dr. Alasdair Breckenridge, do Departamento de Farmacologia e Terapêutica da University of Liverpool (Reino Unido), e pelo Dr. Diederick E. Grobbee, do Julius Center for Health Sciences and Primary Caredo University Medical Center, em Utrecht (Holanda), recentes trabalhos mostraram que esta droga pode ser administrada com segurança a pacientes com depressão refratária ao tratamento e sofrimento psicológico associado a doenças terminais, bem como às pessoas com dependência de álcool ou de tabaco e transtorno obsessivo-compulsivo (TOC).

A pesquisa também sugere que a substância não é viciante, não causa dependência e tem toxicidade extremamente baixa, observam os Drs. Breckenridge e Grobbee.

Esses resultados encorajadores abriram a porta para os ensaios clínicos que estão surgindo agora.

Os dois novos estudos utilizaram um desenho duplo-cego e cruzado, e foram realizados em um ambiente supervisionado. Cada um utilizou várias ferramentas psicológicas validadas para analisar uma série de efeitos e para avaliar a segurança.

Os desfechos primários dos dois estudos foram a depressão e a ansiedade – quadros clínicos altamente prevalentes entre os pacientes com câncer, cujas doenças costumam ser resistentes aos antidepressivos e ansiolíticos, ou à psicoterapia.

Os desfechos secundários foram a avaliação da espiritualidade, do sofrimento existencial, do medo da morte e das experiências místicas. Por exemplo, alguns pacientes descreveram sentir um intenso sentido de unidade, transcendência de tempo e espaço, ou humor profundamente positivo e melhora da qualidade de vida.

A principal diferença entre os dois estudos foi no que diz respeito aos medicamentos de controle utilizados. Um estudo usou a niacina, que mimetiza a psilocibina; o outro utilizou uma dose baixa da própria psilocibina.

Experiência terapêutica importante

O estudo realizado pelos pesquisadores da New York University recrutou 29 pessoas, das quais quase dois terços tinham câncer de estágio III ou IV. Todos os pacientes haviam sido diagnosticados com algum transtorno relacionado com a ansiedade. A maioria preencheu os critérios diagnósticos de transtorno da adaptação, e os demais preencheram os critérios de transtorno da ansiedade generalizada. Quase dois terços já tinham sido tratados com antidepressivos ou ansiolíticos, mas nenhum participante estava tomando medicamentos no momento do estudo.

A média de idade dos participantes foi de 56 anos. Cerca de 55% já tinham tomado alguma droga psicodélica pelo menos uma vez na vida, o que os pesquisadores consideraram não ser surpreendente.

Durante os anos 60 e 70, dezenas de milhões de pessoas usaram drogas psicodélicas. Era muito comum experimentar pelo menos uma vez o LSD (Lysergsäurediethylamid, ácido lisérgico em alemão) ou a maconha (Cannabis sativa), disse o Dr. Ross.

Os pacientes neste estudo tomaram psilocibina (0,3 mg/kg, ou aproximadamente 21 mg/70 kg) ou niacina (250 mg), ou vice-versa após sete semanas. Ambos grupos fizeram psicoterapia com elementos de apoio psicodinâmicos e existenciais. Os pacientes tomaram a droga em um ambiente recriando uma atmosfera familiar, disse o Dr. Ross. Os pacientes e os terapeutas deram as mãos formando um círculo, e os pacientes verbalizaram as suas intenções para a sessão. Depois de tomar o comprimido, cada paciente recebeu livros de arte, músicas pré-escolhidas e máscaras para os olhos e foi convidado a direcionar a sua atenção internamente. Os terapeutas, todos experientes, checaram regularmente os pacientes.

A escala de ansiedade Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) e o registro Beck Depression Inventory (BDI) foram utilizados para capturar os relatos dos pacientes. O estudo mostrou que a psilocibina produziu uma resposta ansiolítica e antidepressiva imediata e mantida.

Com relação à pontuação no Beck Depression Inventory, no grupo que usou psilocibina na primeira sessão, cerca de 83% dos participantes preencheram os critérios de resposta antidepressiva sete semanas depois de receber a primeira dose. No grupo que usou niacina na primeira sessão, 14% preencheram os critérios de resposta antidepressiva. Com relação à pontuação na Hospital Anxiety and Depression Scale, no grupo que usou psilocibina na primeira sessão, 58% preencheram os critérios de resposta ansiolítica sete semanas depois de receber a primeira dose; no grupo que usou niacina na primeira sessão, 14% preencheram os critérios de resposta ansiolítica.

Em 6,5 meses de acompanhamento, os índices de resposta antidepressiva ou ansiolítica ficaram na faixa de 60% a 80%, dependendo do instrumento de medida utilizado.

O estudo do Dr. Ross também mostrou que a psilocibina foi associada à melhora da qualidade de vida e ao bem-estar espiritual, bem como a menor sofrimento existencial. As experiências místicas, medidas pelo Mystical Experiences Questionnaire, tiveram alta correlação com as respostas clínicas.

“Definitivamente, existe algo relacionado com a intensidade da experiência mística que é a maior causa de melhora dos pacientes”, disse o Dr. Ross.

Cerca de 70% dos pacientes classificaram a experiência com a psilocibina como “singular, ou entre as cinco melhores experiências de sua vida. Foram as mais instrutivas, memoráveis e importantes experiências terapêuticas das quais as pessoas se lembravam e sobre as quais nos falaram”, disse o pesquisador.

Não houve diferença de resposta entre os pacientes que tinham usado alucinógenos no passado e aqueles que não o tinham. Também não fez diferença se os pacientes tinham ou não alguma fé religiosa.

Resultados coerentes

O segundo estudo http://journals.sagepub.com/doi/full/10.1177/0269881116675513, realizado por pesquisadores da Johns Hopkins University, em Baltimore, Maryland, recrutou 51 pacientes com câncer. Destes, 65% tinham doença recidivante ou metastática. Todos os participantes corresponderam aos critérios diagnósticos de transtorno de adaptação crônico com ansiedade, transtorno de adaptação crônico com ansiedade e humor deprimido, transtorno distímico, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno depressivo maior ou diagnóstico duplo de transtorno de ansiedade generalizada e transtorno depressivo maior pelo DSM-IV (4ª Edição do Manual Diagnóstico e Estatístico das Doenças Mentais).

Os pacientes tomaram uma dose alta de psilocibina (22 mg/kg), seguida, cinco semanas mais tarde, por uma dose muito baixa (3 mg/70 kg, reduzida para 1 mg/70 kg durante o estudo, e que mimetizava o placebo), ou receberam uma dose baixa seguida pela dose alta cinco semanas mais tarde.

Como no estudo da New York University, os pacientes estavam em um ambiente controlado. Eles também foram estimulados a deitar em um sofá, usar uma máscara nos olhos para bloquear as distrações visuais externas, e ouvir música. Eles também foram incentivados a concentrar a atenção em suas experiências interiores durante toda a sessão.

Neste estudo, os pacientes receberam instruções que ajudaram a minimizar suas expectativas. Eles foram informados de que a psilocibina seria administrada nas duas sessões, que as doses da psilocibina poderiam variar de muito baixas para altas, e que as doses nas duas sessões poderiam ser ou não as mesmas.

“Maximizamos as expectativas tanto da parte dos voluntários como dos monitores”, disse o pesquisador responsável Dr. Roland R. Griffiths, médico e professor do Departamento de Psiquiatria e Neurociências da Johns Hopkins University, em Baltimore, Maryland, para o Medscape. “As instruções foram: ‘Nós não sabemos a dose, de modo que tentem obter o máximo que puderem desta experiência’.”

Embora este grupo não tenha feito psicoterapia formal como os pacientes no estudo da New York University, eles receberam um grande apoio da equipe do estudo.

Os resultados deste estudo “são perfeitamente coerentes” com os resultados do estudo da New York University, disse o Dr. Griffiths

A análise mostrou que a alta dose de psilocibina teve uma grande repercussão nas duas medidas dos desfechos primários avaliados pelo médico, que foram a depressão, avaliada usando a GRID-HAMD-17 (GRID-Hamilton Depression Rating Scale); e a ansiedade, avaliada usando a Hospital Anxiety and Depression Scale. Também foram observadas grandes repercussões na maioria dos desfechos secundários.

A resposta clinicamente significativa foi definida como redução de 50% ou mais em relação à pontuação inicial na GRID-HAMD-17. Ao fim de cinco semanas após a primeira sessão, 92% dos participantes que tomaram a dose elevada na primeira sessão exibiram resposta clinicamente significativa. No grupo que recebeu a dose baixa na primeira sessão, 32% exibiram resposta clinicamente significativa.

Aos seis meses, a média da resposta clínica foi de 78% para a depressão e 83% para a ansiedade. “Assim, cerca de 80% das pessoas apresentaram resposta clínica”, disse o Dr. Griffiths.

A taxa de remissão aos seis meses foi de 65% para a depressão e 57% para a ansiedade.

A ausência de psicoterapeutas treinados não interferiu nos resultados. Na verdade, o tamanho do efeito aos seis meses foi um pouco maior neste estudo, em comparação ao estudo da New York University.

“Pode ter havido outras diferenças entre os centros dos estudos, passíveis de promover a eficácia”, disse o Dr. Griffiths. “Acreditamos que ainda temos de trabalhar para obter a formação ideal, mas eu diria que tivemos excelentes clínicos.”

Experiências místicas

Os participantes que tomaram a dose alta referiram mudanças positivas em suas atitudes em relação à vida, a si mesmo, no humor, nos relacionamentos e na espiritualidade. Este estudo comportou avaliações de membros da comunidade, que também mostraram significativas mudanças positivas nas atitudes e nos comportamentos dos participantes.

Os relatórios dos avaliadores da comunidade são “os mais reveladores,” disse o Dr. Griffiths. “Se o seu cônjuge diz que você melhorou muito, isso é muito eloquente.”

Como o estudo da New York University, este estudo mostrou efeitos significativos das experiências do tipo místico em vários resultados, como significado espiritual, satisfação com a vida e significado existencial.

Foi difícil recrutar pacientes com câncer para este estudo porque muitos compreensivelmente têm medo de usar drogas psicodélicas, devido à reputação dessas substâncias e, possivelmente, por terem tido alguma experiência pessoal ruim com elas, observou o Dr. Griffiths.

O pesquisador disse que “não estava 100% confiante” de que a intervenção teria efeitos importantes, porque os pacientes eram “muito vulneráveis”. Todos estavam lidando com um quadro de câncer terminal, depressão ou ansiedade e, em alguns casos, as perspectivas dos pacientes eram “iminentemente sombrias”.

“Eu achava que havia uma possibilidade de eles saírem da experiência com mais medo ou mais prejudicados ou traumatizados”, disse o Dr. Griffiths. “Por isso, a coisa mais incrível para mim foi isso ter funcionado exatamente como para os voluntários saudáveis ​​que tinham participado de um estudo anterior.

O tipo de experiência mística que alguns pacientes experimentam com a psilocibina “permitiu a eles seguirem em frente, não se sentirem deprimidos, não se sentirem ansiosos, mas com otimismo, e eu diria até mesmo com alegria”, disse o Dr. Griffiths.

Muitos tiveram uma “compreensão maior de que a vida e a morte estão misturadas de algum modo profundo que fala com a própria natureza da consciência humana”, algo que é “intensamente terapêutico”.

A pesquisa não identificou novas questões de segurança. Em ambos estudos, houve poucos eventos adversos, como aumentos previstos da pressão arterial e do pulso, náuseas e vômitos, e ansiedade transitória ou ocasionais sintomas psicóticos. Estes últimos aparentemente tiveram remissão rápida.

Quem é quem na psiquiatria

No editorial acompanhando o estudo, o Dr. David Nutt, PhD, do Imperial College London, disse que os estudos são “divisores de água” e os “estudos controlados mais rigorosos até hoje” feitos com psilocibina. Quando solicitados a tecer comentários sobre esses estudos, os especialistas nas áreas da psiquiatria, desenhos de estudo e atendimento a pacientes terminais, todos, concordaram em fazê-lo apesar do curto prazo. Este, disse o Dr. Nutt, “é um testemunho do interesse que os dois trabalhos despertaram”.

A lista das pessoas que comentaram parece um “who’s who” da psiquiatria norte-americana e europeia, e “deve assegurar aos indecisos que esta utilização da psilocibina está em conformidade com o âmbito aceito pela psiquiatria moderna”, disse o Dr. Nutt.

Os comentaristas, de maneira geral, elogiaram os estudos, chamando-os de “bem elaborados” e “metodologicamente rigorosos”. Eles concordaram que esta é uma nova e emocionante era da psicofarmacologia psicodélica. Vários destacaram que a replicação sistemática dos principais resultados nos dois centros contribuiu para a confiança na solidez dos resultados.

No entanto, alguns analistas destacaram que, embora os estudos tenham tentado cegar os participantes e a equipe para a designação do braço de tratamento, não está claro o quão eficazes foram estes procedimentos.

“A resposta ao placebo e as expectativas são, naturalmente, questões complexas de isolar”, escreve em seu cometário o Dr. Paul Summergrad médico da Tufts University School of Medicine, em Boston, Massachusetts.

“Isto é especialmente verdade nos estudos que incluíram um percentual significativo de participantes que já tinham utilizado drogas psicodélicas e que estavam enfrentando problemas clínicos e existenciais graves. No entanto, a taxa e a velocidade de resposta a uma droga ativa, sua intensidade e duração são decididamente mais significativas do que as observadas nas respostas ao placebo entre os pacientes com depressão moderada, mesmo com grupos de pesquisa mais comprometidos e engajados”.

John D. McCorvy e colaboradores, da Divisão de Biologia Química e Química Medicinal, do Departamento de Farmacologia da University of North Carolina, em Chapel Hill, e do Psychoactive Drug Screening Program, National Institute of Mental Health, observaram que o efeito placebo é “um importante fator confusor no desenvolvimento dos novos antidepressivos, visto que o placebo pode produzir efeitos antidepressivos em 30% a 40% dos participantes”.

Em seu comentário, o Dr. Richard C. Shelton, do Departamento de Psiquiatria e Neurobiologia Comportamental, e Peter S. Hendricks, do Departamento de Saúde Comportamental da School of Public Health, ambos da University of Alabama, em Birmingham, assinalaram que os estudos não usaram uma avaliação direta da integridade dos procedimentos de cegamento.

“Nem pediram diretamente aos participantes para estimar os tratamentos aos quais foram submetidos. Seria prudente obter esta informação nos futuros estudos”.

No entanto, eles observaram que a “relevância” dos efeitos da psilocibina pode inviabilizar o cegamento completo, como costuma acontecer nos estudos com drogas psicoativas e intervenções comportamentais.

O Dr. David Spiegel, do Departamento de Psiquiatria e Ciências do Comportamento da Stanford University School of Medicine, na Califórnia, destacou que no estudo realizado por Dr. Griffiths e colaboradores, apenas 10% das pessoas inicialmente triadas ​​participaram do estudo, a maioria por não atender aos critérios de inclusão. “Então, desde o início essas pessoas estavam inclinadas a acreditar que uma droga psicodélica poderia ajudá-las neste momento da vida.”

Os especialistas que comentaram os estudos identificaram o desenho com cruzamento como uma limitação, na medida em que restringe a interpretação após o cruzamento; só os resultados antes do cruzamento podem ser considerados confiáveis como resultado do uso da droga.

No estudo do Dr. Griffiths e colaboradores, a dose baixa pode ter tido alguma atividade e, portanto, poderia ter influenciado a avaliação duplo-cego da eficácia da dose mais alta, de acordo com o Dr. Craig D. Blinderman, médico do Serviço de Cuidados Paliativos para Adultos do Departamento de Medicina do Columbia University Medical Center/New York Presbyterian Hospital, em Nova York. No estudo realizado pelo Dr. Ross e colaboradores, disse o Dr. Blinderman, o uso de um controle cego limitado pode ter contribuído para algum viés dos resultados.

Resultados generalizáveis?

De acordo com o Dr. Blinderman, os critérios de exclusão psiquiátricos limitaram os achados aos pacientes com transtorno de depressão e transtorno de ansiedade, mas não aqueles com história pessoal ou familiar de outros transtornos psiquiátricos, como esquizofrenia e transtorno bipolar.

Além disso, o tamanho relativamente pequeno da amostra, composta por uma população de maioria branca e escolarizada, impede a generalização.

Usar medidas subjetivas nos estudos é compreensível, mas “é uma fraqueza particular de qualquer estudo no qual o cegamento é inadequado”, observou o Dr. Guy M. Goodwin, do Departamento de Psiquiatria do University of Oxford Warneford Hospital, no Reino Unido.

“Qualquer sugestão que torne os participantes de um estudo experimental cientes do que o experimentador espera encontrar ou de como participantes devem se comportar é denominada de característica de demanda. Estes estudos têm características de demanda inquestionáveis”.

Avaliar o valor do tratamento com base apenas nos sintomas também é uma limitação, disse o Dr. Goodwin.

“Medidas mais objetivas de atividade, simplesmente motora ou econômica, os custos do seu tratamento do câncer, e assim por diante, também devem fazer parte do quadro das futuras pesquisas nesta área.”

O Dr. Goodwin também acredita que seria “útil” considerar os estudos com alucinógenos como estudos de tratamento psicológico, em vez de estudos farmacológicos.

“Caso os pacientes apresentem melhora duradoura decorrente da compreensão ou da reformulação da própria vida por causa da doença terminal, esta abordagem representa, na verdade, uma psicoterapia, embora conte com auxílio farmacológico.”

Quanto às experiências místicas que alguns pacientes descreveram, não está claro se estas são “a causa, a consequência ou o corolário do efeito ansiolítico ou da cognição irrestrita”, comentou o Dr. Benjamin Kelmendi, médico do Departamento de Neurociência Aplicada do National Center for PTSD, em West Haven, Connecticut e colaboradores.

“A relação entre uma experiência mística induzida por drogas psicodélicas e o desfecho terapêutico exige maior exploração, como sua indução em condições ideais e em um ambiente controlado, fornecendo assim uma intervenção terapêutica valiosa para transtornos que, de outro modo, são difíceis de tratar”, escrevem.

Mecanismo obscuro

A falta de conhecimento sobre o mecanismo pelo qual a psilocibina produz a alteração do estado de consciência com qualidades espirituais é uma questão maior, de acordo com o Dr. Jeffrey A. Lieberman, do Departamento de Psiquiatria da Columbia University, em New York e seu colega, o Dr. Daniel Shalev.

“Não podemos afirmar que os efeitos ansiolíticos e antidepressivos das drogas sejam resultados diretos de seus efeitos serotoninérgicos ou secundários ao estado alterado de consciência mística que produzem. Como outros agonistas serotoninérgicos (por exemplo, a lisurida) não produzem esta experiência psicodélica, foi sugerido que as drogas psicodélicas devem ligar-se aos receptores 5-HT2A de um modo especial, ou exibem seletividade funcional, ou de polarização do receptor”.

Alguns dos especialistas que comentaram os estudos questionaram se os benefícios observados seriam sustentados quando aplicados nas condições da “vida real”, fora das condições rigorosamente controladas destes dois estudos.

Apesar destas várias questões, os comentaristas concluíram em geral que os novos resultados justificam progredir para os ensaios clínicos de fase 3. Se confirmados em grandes estudos, com poder estatístico e população diversificada, a classificação atual da psilocibina como droga de Classe I “deve ser questionada”, escreve o Dr. Blinderman, “pois isso representaria uma modalidade de tratamento diferente de tudo que existe na psiquiatria”.

O Dr. Ross salientou que muitos dos profissionais que comentaram os estudos representam “a psiquiatria organizacional” – o mesmo tipo de liderança neste campo que ajudou a banir as drogas psicodélicas em 1970. “Então a psiquiatria organizacional voltou a aceitar isso.”

Ele advertiu que estes novos resultados não devem sugerir aos pacientes que o consumo de cogumelos alucinógenos ilícitos possa ajudá-los.

“A psilocibina deve ser restrita aos hospitais”, disse o Dr. Ross. “Isso não deve incentivar o uso recreativo; deve incentivar mais pesquisas em circunstâncias rigorosamente controladas.”

Tanto o estudo do Dr. Ross quanto o estudo do Dr. Griffiths foram financiados principalmente pelo Heffter Research Institute, organização sem fins lucrativos fundada por cientistas na década de 1990 para analisar e financiar pesquisas com a psilocibina e outras drogas psicodélicas.

Expectativas superadas

O Dr. George Greer, psiquiatra e diretor médico do Heffter Research Institute, disse ao Medscape estar “encantado” com os novos resultados, que são “melhores do que esperávamos”.

O Heffter Research Institute tem financiado estudos-piloto realizados com psilocibina, e estes novos ensaios clínicos são os maiores realizados até agora, disse ele.

“O importante é que trata-se de um novo modelo para o tratamento da ansiedade e da depressão, no qual o tratamento consiste numa única dose da droga e os benefícios são profundos e duram meses.”

“De modo que trata-se de um novo paradigma na psiquiatria. Não há nada parecido em toda a psiquiatria”.

O Heffter Research Institute está subsidiando a pesquisa do uso da psilocibina na dependência química. Existem dois grandes ensaios clínicos sobre tabagismo (na Johns Hopkins) e álcool (na New York University), e um estudo piloto na University of Alabama, em Birmingham, investigando o uso da psilocibina na dependência de cocaína, disse o Dr. Greer.

O instituto também está considerando propostas de uso da psilocibina no tratamento de depressão refratária, do transtorno obsessivo-compulsivo e possivelmente dos transtornos alimentares, disse ele.

“A psilocibina é tão singular, comparada a todos os medicamentos aprovados. É uma ferramenta com potencial de muitas coisas, e queremos explorar esses potenciais”.

O Heffter Research Institute também está apoiando a pesquisa animal sobre o impacto de uma droga semelhante à psilocibina na inflamação. Estudos em camundongos descobriram que pequenas doses da droga reduziram a inflamação e abriram as vias respiratórias. “Estamos muito animados com as possíveis implicações para a asma e a aterosclerose, mas ainda é muito cedo”, disse o Dr. Greer.

O Dr. Griffiths faz parte do conselho de administração do Heffter Research Institute. O Dr. Summergrad recebe honorários de CME Outfitters, Pharmasquire e de universidades e associações para fazer palestras não promocionais; royalties da Harvard University Press, Springer e American Psychiatric Press; e honorários de consultoria de Owl, Inc, e Quartet Health Inc, todos fora do escopo do trabalho apresentado. O Dr. Goodwin é pesquisador sênior do National Institute for Health Research (NIHR); as opiniões expressas são próprias e não necessariamente as do National Health Service, o NIHR, ou o Department of Health. Ele recebe uma bolsa do Wellcome Trust, têm ações de PIVital, e nos últimos três anos prestou consultoria, assessoria, ou foi palestrante para AstraZeneca, Merck, Cephalon/Teva, Eli Lilly, Lundbeck, Medscape, Otsuka, PIVital, Pfizer, Servier, Sunovion e Takeda. Os outros autores informaram não possuir conflitos de interesse relevantes ao tema.

J Psychopharmacol. Publicado on-line em 1º de dezembro de 2016. Ross et al, Artigo http://journals.sagepub.com/doi/full/10.1177/0269881116675512; Griffiths et al, Artigo http://journals.sagepub.com/doi/full/10.1177/0269881116675513

por Pauline Anderson
FONTE http://www.medscape.com/viewarticle/872504

Ex-fuzileiro naval tem sintomas dramaticamente reduzidos depois de terapia com droga de festas

Nigel McCourry não conseguia dormir, e quando dormia, era acordado pelos pesadelos do que havia feito no Iraque.

McCourry, que foi ao Iraque como um arvorado (cabo) em um pelotão de armas do Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA (U.S. Marine Corps), ficava parado na janela de seu apartamento em Asheville, Carolina do Norte, até 4 ou 5 da manhã, convencido de que alguém estava vindo para pegá-lo.

Nigel McCourry toca guitarra em sua nova casa em Asheville, Carolina do Norte em uma Quinta-Feira, 21 de Maio de 2015. McCourry, um ex-fuzileiro naval, sofreu de problemas de sono e ansiedade aguda provocados pelo Transtorno do Estresse Pós-Traumático, mas participou de um estudo clínico na Carolina do Sul combinando terapia e a droga MDMA, e reduziu dramaticamente seus sintomas.

Multidões o aterrorizavam. Em outras ocasiões, ele tinha a estranha sensação de viver sua vida numa perspectiva de terceira pessoa, como se estivesse assistindo um filme sobre si mesmo. E poderia facilmente tornar-se num filme de terror, especialmente quando relembrava aquele momento de 2004, durante um tiroteio ao sul de Bagdá, em que ele e um artilheiro abriram fogo num caminhão que se recusava a parar enquanto aproximava-se de seu pelotão.

Nigel McCourry senta-se para um retrato em seu antigo apatamento enquanto se muda para Asheville, Carolina do Norte.

Duas pequenas meninas, não mais que 4 e 6 anos de idade, estavam no caminhão junto ao pai. Este sobreviveu, mas as filhas não, e McCourry não conseguiu tirar de sua mente as imagens encharcadas de sangue consequentes daquele dia.

Nigel McCourry limpa e arruma seu antigo apartamente em Asheville.

Diagnóstico de TEPT (Transtorno do Estresse Pós-Traumático)

Levou sete longos anos para receber um diagnóstico da Administração de Veteranos (Veteran Administration, VA) de que ele sofria de transtorno do estresse pós-traumático. Nessa altura, em 2011, ele estava afastado da maioria de sua família e amigos e havia se isolado cada vez mais. Ele estava bebendo muito, o que “amenizava” mas não abordava a culpa, raiva e medo subjacente que ele sentia.

A VA prescreveu terapia e uma série de medicamentos — antidepressivos, antipsicóticos e ansiolíticos — que pareciam causar mais problemas do que resolvê-los.

Então sua irmão ouviu falar sobre um estudo em que um par de psicólogos estavam dando terapia intensiva a veteranos em conjunção a uma droga chamada MDMA, também conhecida como ecstasy.

McCourry havia tomado metade de um ecstasy certa vez antes, durante seu último ano de escola em um clube de dança com amigos.

“Eu não posso dizer com certeza se era MDMA, mas não foi uma noite desagradável,” disse ele.

Nigel McCourry deixa sua nova casa em Asheville.

Acontece que o estudo estava sendo conduzido na Carolina do Sul, não distante da Universidade Furman (Furman University) em Greenville, onde McCourry estava estudando bioquímica. Ele se inscreveu, e em maio de 2012 teve sua primeira sessão, que envolveu engolir uma dose de MDMA e passar as próximas seis horas conversando com dois psicoterapeutas sobre suas experiências no Iraque.

“Foi extraordinário,” McCourry disse. “Meus problemas de sono melhoraram depois da primeira sessão. Três anos depois, eu ainda tenho a garrafa de Ambien de pílulas de dormir que a VA me deu. Eu não precisei usá-las.”

McCourry fez mais quatro das sessões de seis horas de psicoterapia assistida com MDMA nos cinco meses sequentes.

“As sessões eram muito cansativas e muito desafiadoras,” ele disse. “Eu confrontei alguns de meus maiores medos subjacentes e problemas psicológicos. Depois, eu me senti exausto.”

Olhando para trás, disse McCourry, “eu não me sinto curado do TEPT, mas agora eu consigo manejar meus sintomas de uma maneira muito melhor. Agora minhas ações não causam grandes interrupções no trabalho, na escola ou com família e amigos. … Agora, eu posso ter uma namorada. Antes, eu terminava depois de duas semanas.”

McCourry agora trabalha para uma pequena empresa farmacêutica em Asheville. Ele acredita que o MDMA lhe deu uma maior compreensão de seus problemas, mas também que a droga funciona por “balancear a química do cérebro”.

“[O MDMA] prepara o cérebro para ter uma experiência de cura,” ele disse. “Quando eu estava sob o efeito do MDMA, eu senti pela primeira vez que era capaz de ver claramente os componentes individuais que trabalhavam juntos para criar o TEPT. Antes, parecia apenas um amontoado bagunçado de lixo psicológico do qual eu não conseguia trabalhar. Foi como se o MDMA me deu uma vista aérea do terreno.”

Estudo mostra bons resultados

McCourry não estava sozinho. A pesquisa da Carolina do Sul, liderada pelo psiquiatra Michael Mithoefer, descobriu que 80% dos 20 pacientes do estudo não tinham sintomas de TEPT dois meses depois da conclusão do tratamento, comparado com 25% dos que tomaram uma pílula placebo.

Estudos complementares têm mostrado sucesso a longo prazo, então a Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (Multidisciplinary Association for Psychedelic Studies, MAPS), que financiou a pesquisa, planeja mais pesquisas extensivas que irão eventualmente enlistar centenas de pacientes em todo país.

O projeto está sendo observado de perto por oficiais federais, que lutam contra uma explosão de pacientes de TEPT. Em 2013, 535.000 veteranos, incluindo 141.000 das guerras do Iraque e Afeganistão, buscaram tratamento de TEPT da VA. Muitos deles não responderam bem às drogas e terapias convencionais.

“Esta não é uma área onde já temos ótimos tratamentos,” disse o Dr. Thomas Insel, diretor da Instituto Nacional de Saúde Mental (National Institute of Mental Health). “Nós precisamos de algo diferente. Precisamos de algo novo.”

A Dr. Paula Schnurr, diretora executiva do Centro Nacional para PTSD (National Center for PTSD), um braço do Departamento de Interesses dos Veteranos dos EUA (U.S. Department of Veterans Affairs), citou estudos mostrando que 60 a 80% dos pacientes “mostravam melhoras clínicas significativas” com tratamentos existentes. Mas ela diz que os estudos da MAPS com terapia abastecida com ecstasy têm produzido descobertas que sugerem “a importância de mais pesquisas.”

A ideia básica é que, no contexto da psicoterapia, a droga de alguma forma lhe ajuda a aprender coisas ou sentir coisas que de outra maneira você não conseguiria,” disse ela. “Então eu consigo ver como as pessoas sentiriam isto como uma experiência transformadora.”
Don Lattin é um escritor aposentado do San Francisco Chronicle e o autor de cinco livros, incluindo “The Harvard Psychedelic Club.” Para mais informação sobre seu trabalho, acesse www.donlattin.com.

Nigel McCourry deixa sua nova casa em Asheville.

texto por Don Lattin publicado originalmente em sfgate.

fotos por Mike Belleme

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Agradecemos imensamente a tradução feita pelos colaborador Helcio Júnior.
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A curandeira mexicana que trouxe à tona os cogumelos mágicos para os EUA com a ajuda de um executivo de banco

Nas colinas de Oaxaca, Maria Sabina usava psicodélicos para curar

Maria Sabina tornou-se acidentalmente uma xamã nos anos 1960 e 70. (Print do Documentário deMaría Sabina. Mujer Espíritu, 1978)

“Eu percebi que os jovens de cabelos longos não precisavam de mim para comer os pequeninos. As crianças os comiam em qualquer lugar e a qualquer hora, e não respeitavam nossos costumes. ”
– Maria Sabina

Os seres humanos consomem a psilocibina, o composto psicodélico natural dos cogumelos mágicos, há mais de 10.000 anos. Até meados do século 20, o contexto era religioso. Isso mudou em 29 de junho de 1955, quando um vice-presidente do banco J. P. Morgan chamado R. Gordon Wasson viajou para o México com um fotógrafo para a casinha de barro da curandera mazateca Maria Sabina e tornaram-se, nas palavras de Wasson, os “primeiros homens brancos da história que se tem notícia a comer os cogumelos sagrados. ”

O artigo subseqüente na revista Life escrito por Wasson em 1957, “Seeking the Magic Mushroom” abriu uma caixa de Pandora que levaria, entre outras coisas, ao nascimento da contracultura psicodélica americana, a profanação do ritual com cogumelos, e, finalmente, a proibição da psilocibina em grande parte do mundo. O artigo também acabou por conduzir à ruína de Sabina uma vez que os ocidentais passaram a visitá-la aos montes.

As intenções de Wasson eram sinceras, talvez até ingênuas. Etnomicologista amador, passou os últimos trinta anos viajando com sua esposa Valentina, documentando diferentes perspectivas culturais em relação aos cogumelos selvagens.

“Nós não estávamos interessados no que as pessoas aprendiam sobre cogumelos pelos livros, mas pelo conhecimento transmitido entre as gerações”, afirmou Wasson.”Acabou que tínhamos nos deparado com uma nova área do conhecimento”

Exemplares dos cogumelos do tipo Psylocibe

Wasson descobriu que muitas culturas ao redor do mundo celebravam os cogumelos e dedicavam elaboradas cerimônias religiosas em torno de seu consumo. Ele buscou descobrir quais os tipos de cogumelos eram adorados e o por quê. Ele estava especialmente interessado nos astecas e nos primeiros relatos das expedições missionárias espanholas que descreviam a cerimônia asteca do uso do cogumelo teonanacatl, ou “carne de Deus.”

Wasson fez várias viagens para o México em busca daqueles que ainda realizavam o ritual do cogumelo, mas não foi até 1955, numa aldeia de Oaxaca conhecida por Huautla de Jiménez, que ele foi bem sucedido. Ele visitou a prefeitura e pediu a um funcionário se poderia ajudá-lo a aprender os segredos do cogumelo divino. “Nada poderia ser mais fácil”, respondeu o funcionário. O oficial levou Wasson a uma montanha onde os cogumelos cresciam em abundância, e depois para um terreno mais elevado, onde Maria Sabina vivia.

Maria Sabina era uma curandeira e xamã bastante respeitada na aldeia.Ela consumia cogumelos com psilocibina regularmente desde quando tinha sete anos de idade, e tinha realizado a cerimônia de cogumelo conhecida como “velada” por mais de 30 anos antes de Wasson chegar.

A intenção da velada, que durava toda a noite, era para a comunhão com Deus a fim de curar os doentes. Os espíritos, se efetivamente contactados, diziam a Sabina a natureza da doença e a forma como poderia ser curada. Vômitos pelos aflitos era considerada uma parte essencial da cerimônia. Cada participante do ritual ingeria cogumelos com Sabina (que normalmente ingeria o dobro) cantado invocações para chamar o divino.

Maria e seu filho Aurelio sob a influência de cogumelos. Huatla de Jimenez 1955 (LIFE)

“Eu não sou boa?” ela perguntava aos espíritos. “Eu sou uma mulher criadora, uma mulher estrela, uma mulher lua, uma mulher cruz, uma mulher do céu. Eu sou uma pessoa nuvem, uma pessoa de gota-de-orvalho-na-grama “.

Católica ao longo da vida, Sabina misturava elementos cristãos em rituais mazatecas ao guiar os participantes através de suas visões. Surpreendentemente, e em contraste com seus antecessores, o bispo local não considerou o ritual de Sabina herético. “A igreja não é contra esses ritos pagãos – se eles podem ser chamados assim,” disse o padre Antonio Reyes Hernandez.”Os sábios e curandeiros não competem com a nossa religião. Todos eles são muito religiosos e comparecem à nossa missa, até mesmo Maria Sabina”.

Sabina estava apreensiva com a chegada de Wasson, mas concordou em realizar o ritual após ser convencida pelo funcionário da aldeia, que era um amigo de confiança.Wasson e seu fotógrafo tiveram uma trip durante toda a noite com Sabina realizando a velada, enquanto tinham suas mentes expandidas. “Pela primeira vez a palavra êxtase assumiu um significado real”, Wasson escreveu mais tarde. “Pela primeira vez, essa expressão não quis dizer o estado de espírito de outra pessoa.”

A relutância de Sabina em apresentar a cerimônia a Wasson tinha menos a ver com o fato de ele ser estrangeiro e mais a ver com o fato de Wasson e seu colega não necessitarem de cura.

“É verdade que Wasson e seus amigos foram os primeiros estrangeiros que vieram para a nossa cidade em busca das santas crianças e que eles não as tomaram porque sofriam de qualquer doença”, ela lembrou .”A razão era que eles vieram para encontrar Deus”.

Wasson retornou aos Estados Unidos com uma baita de uma história. Ele despertou o interesse da revista Life, que financiou mais viagens até a aldeia para relatar e tirar fotografias do ritual mazateca. Acabou também por atrair a atenção da CIA, que estava no meio do seu programa secreto de controle de mentes utilizando drogas, o chamado Projeto MK ULTRA . Wasson involuntariamente se tornou um agente do programa após a CIA secretamente financiar suas viagens para o México ao longo de 1956 sob a proteção do Fundo Geschickter for Medical Research, uma organização de fachada.

 

 

 

Excertos do artígo de 1957 escrito por Wassson publicado na revista Life

Seeking the Magic Mushroom” se viralizou após a sua publicação em 1957. Documentos divergem quanto a fato de Sabina ter aprovado ou não o uso de suas fotografias no artigo de Wasson, que por sua vez mudou o nome de Sabina para Eva Mendez e não revelou seu nome e nem a localização da aldeia.
Wasson testemunhou nove cerimônias de cogumelos no total, todos conduzidos por Sabina. Em uma viagem, ele foi acompanhado pelo renomado micologista francês Roger Heim, que identificou as espécies de cogumelos mágicos e enviou amostras para Albert Hofmann, o químico suíço que há vinte anos havia sintetizado o LSD . Hofmann foi capaz de isolar a estrutura química da psilocibina e criar uma versão sintética. Sua empresa farmacêutica Sandoz começou a enviar doses a instituições de pesquisa e clínicas em todo o mundo.

Dr. Timothy Leary e seu cúmplice de Harvard, Dr. Richard Alpert (Dying to Know)

O psicólogo Dr. Timothy Leary, uma estrela acadêmica em ascensão em Harvard, viajou para Cuernavaca no México, em 1960, depois de ter lido o artigo. Apesar de seu sucesso profissional, ele se descreve durante este período como “um empregado institucional anônimo que dirigia para o trabalho todas as manhãs em uma longa fila de carros e voltava para casa todas as noites e bebia martinis… Como vários outros milhões da classe média, robôs, intelectuais liberais.” Ele comprou alguns cogumelos de uma curandeira local e, em vez de participar de um ritual de cogumelos, os ingeria à beira da piscina de sua casa de praia.

“Eu aprendi mais sobre meu cérebro e suas possibilidades e mais sobre psicologia nas cinco horas depois de tomar estes cogumelos do que nos últimos 15 anos estudando e fazendo pesquisas.” – Dr. Timothy Leary

Leary voltou à Harvard e, depois de garantir suas doses de psilocibina com Sandoz, iniciou o Projeto Psilocibina em Harvard com seu colega Dr. Richard Alpert. Aldous Huxley, com o seu costumeiro interesse em estados alterados de consciência, participou do trabalho.

Vitral da Marsh Chapel, na Universidade de Boston, onde Leary e Alpert administraram testes de psilocibina em alunos que se voluntariavam

Leary e Alpert desenvolveram conceitos pioneiros na terapia psicodélica, tais como o set e setting .Eles testaram se a ingestão de psilocibina poderia reduzir a reincidência em presidiários (no Experimento Concord Prison ) e catalisar experiências religiosas em estudantes de teologia (no Experimento Marsh Chapel Good Friday). Os resultados reforçaram o potencial místico e terapêutico da psilocibina, mas as experiências foram mais tarde desconsideradas devido a metodologia pouco sólida, assim como a omissão de detalhes relacionados com a ansiedade intensa experimentada por muitos dos participantes.
A tendenciosidade de Leary e seus colegas para enfatizar os aspectos positivos da experiência psicodélica, enquanto minimizavam os negativos traria consequências profundas, uma vez que os psicodélicos saíram dos laboratórios e chegaram às ruas de San Francisco, Palo Alto e Cambridge, Massachusetts no início de 1960.
“Alguns dos motivos que levaram ao fim das pesquisas com psicodélicos e os tiraram das mãos dos médicos e terapeutas”, escreveu o pesquisador de psicodélicos Rick Döblin, “pode ser atribuída em parte aos milhares de casos de pessoas que tomaram psicodélicos em condições adversas e não estavam preparados para os aspectos assustadores de suas experiências e acabaram em quartos de emergência nos hospitais”.

A festa chegou ao fim para Alpert e Leary em maio de 1963

Leary e Alpert estava fazendo mais do que simplesmente testando psicodélicos em ambientes experimentais controlados. Eles tomavam grandes dosagens todo fim de semana e recomendavam aos seus alunos a fazer o mesmo. Uma vez que a notícia chegou às autoridades, Leary e Alpert foram demitidos. Logo depois, Leary começou a sua campanha estimulando a juventude norte americana com “Tune in, Turn on, and Drop Out.” (expressão que em português seria algo do tipo “Sintonize, Se Ligue e Vai Fundo.”) Alpert viajou para a Índia e voltou barbudo, vestindo um dhoti, e chamando a si mesmo de Ram Dass. Em 1966, a psilocibina e o LSD se tornaram ilegais nos Estados Unidos.

 

Beatniks, hippies, celebridades como Bob Dylan e John Lennon, cientistas e pesquisadores de todas as frentes tumultuavam a aldeia de Huautla de Jiménez depois do artigo publicado na revista Life. Sabina recusou alguns, embora frequentemente expressasse suas dúvidas a cerca da iniciação de Wasson aos cogumelos, e sempre enfatizou sua visão sobre o verdadeiro propósito do cogumelo.
A publicidade foi desastrosa para a comunidade mazateca, que culpava Sabina por trazer desgraça para a aldeia e profanar o ritual da velada. A casa de Sabina foi incendiada, e federales frequentemente invadiam sua casa, acusando-a de vender drogas para estrangeiros. Hippies alugavam quartos em aldeias vizinhas. Turistas tinham bad trips e deliravam nus pela cidade.
Alguém pode se perguntar porque Sabina recusou tão poucos estrangeiros. Alguns relatos atribuem isso à sua bondade, outros a uma aceitação resignada de seu novo papel como embaixadora cultural do ritual de cogumelos mazateca. Ela também era conhecida por cobrar ocasionalmente os turistas por seus serviços.

O legado de Sabina trouxe turistas ao México por décadas

Na década de 1970, as autoridades mexicanas proibiram o uso de cogumelos com psilocibina. O fluxo de turistas diminuiu, mas aos olhos de Sabina, o estrago já estava feito.
“A partir do momento em que os estrangeiros chegavam para procurar Deus, as santas crianças perderam sua pureza”, disse ela.”Elas perderam a sua força; os estrangeiros as estragaram. A partir de agora elas não serão mais boas. Não há remédio para isso. ”
Wasson, por sua vez, concordou. Ele expressou remorso durante o resto de sua vida por seu papel na popularização do uso recreativo de cogumelos mágicos. “A prática levada em segredo durante três séculos ou mais foi agora arejada”, escreveu ele. “E aeração significa o fim.”
Sabina morreu sem dinheiro algum e com 91 anos em 1985. Em Oaxaca, hoje, pode-se encontrar a sua imagem sendo comercializada em camisetas, restaurantes e táxis.

 

Mais de quarenta anos depois da investigação sobre seus efeitos terapêuticos, os cogumelos mágicos continuaram banidos e estão agora a serem usados de uma maneira muito mais perto daquela que María Sabina considerava seu verdadeiro propósito: curar os doentes.

Em ensaios clínicos em todo o mundo, centenas de pacientes com câncer, viciados em drogas, e aqueles que sofrem de ansiedade e depressão estão relatando profunda mudança de vida e experiências místicas.Para muitos participantes, os benefícios de uma dose de cogumelos são de longa duração. Num estudo de 2006 buscando o potencial da psilocibina para catalisar experiências religiosas liderada pelo Dr. Roland R. Griffiths, mais de 70% dos participantes auto-avaliaram a experiência como uma das cinco mais importantes em suas vidas. Quase um terço a classificaram como a mais importante.
Em estudos conduzidos pela NYU e Johns Hopkins, cujos resultados foram publicados simultaneamente em novembro de 2016, cerca de 80% dos pacientes com câncer mostraram reduções clinicamente significativas na ansiedade e depressão que chegavam a durar cerca de oito meses após a dose inicial.

Uma sessão de estudos com psilocibina em John Hopkins

Aos participantes dos estudos foi administrada psilocibina em um cálice e eram guiados através da experiência com os olhos vendados e ouvindo uma música calma. Eles eram recomendados a “confiar, deixar ir e estar aberto.”
Os pesquisadores alertaram que os resultados positivos não devem ser tomados como um endosso do uso recreativo de cogumelos mágicos:

Os resultados positivos do estudo levam a preocupação de alguns, pelo fato de que irão levar ao aumento do uso experimental dessa substância pelos jovens de uma forma incontrolada e não monitorada, a mesma que levou a casualidades nas três últimas décadas.

No entanto, os pesquisadores concluem que “descobrir como esses estados alterados de consciência mística surgem no cérebro poderiam ter grandes possibilidades terapêuticas … Seria cientificamente míope não estudá-los mais a fundo.”
FONTE AHMED KABIL


Agradecemos imensamente a tradução feita pela colaborador Pedro Reis.
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Quando psiquiatras batalharam para manter o MDMA legal

Golias venceu, mas Davi está pronto para o segundo round

Era julho de 1984 e a agência antidrogas americana (DEA) não esperava qualquer resistência quando anunciou que pretendia tornar o MDMA uma substância controlada do tipo I – a categoria mais restrita de drogas ilícitas.

Mas enquanto a agência foi pega com a guarda baixa, seus oponentes não. Durante anos, uma comunidade de psiquiatras, terapeutas e ativistas haviam estado se preparando para a batalha silenciosamente, reunindo as evidências que precisariam para provar o caso de que a 3,4-metilenodioximetanfetamina é relativamente segura e contém potencial terapêutico significativo. Ninguém previu quão perto o pequeno grupo de defensores chegaria de superar o Golias contra quem lutavam.

Na primavera seguinte, um desfile de médicos e pesquisadores testemunhou diante de um juiz de direito administrativo, insistindo que aconselhasse a DEA a colocar o MDMA em uma classe de drogas menos restritiva, ou a evitar a restrição. “Centenas de psiquiatras e psicoterapeutas que usavam [o MDMA] informalmente, e eles o usavam para todos os tipos de coisas em ocasiões privadas”, conta Rick Doblin à Inverse. “Ele estava sendo usado para o TEPT [Transtorno de Estresse Pós-Traumático], estava sendo usado para terapia de casais, estava sendo usado para o crescimento pessoal, estava sendo usado para a espiritualidade”.

Rick Doblin faz uma selfie do lado de fora do escritório do DEA em Washington D.C. Para marcar a apresentação de um desafio legal contra a proibição do MDMA.

Doblin encabeçou a organização sem fins lucrativos que liderou a batalha contra a DEA, e fundou a Associação Multidisciplinar de Estudos Psicodélicos (MAPS), que continua a pressionar para o uso legal da MDMA e da maconha na medicina e em outros contextos. A MAPS mantém um acervo impressionante de documentos da prolongada luta legal contra a DEA.

Doblin previu que a repressão ao MDMA viria quando a droga começou a vazar das sessões terapêuticas para o público, onde foi vendido como a droga recreativa Ecstasy. Na época da audiência judicial em 1985, Doblin tinha reunido um grupo de profissionais para falar publicamente dos benefícios médicos da substância. George Greer, um psiquiatra do Novo México, disse ao juiz que ele havia orientado 79 pacientes através de sessões de terapia assistida por MDMA, e que todos eles relataram benefícios significativos sem reações adversas graves. Outro médico, Joseph Downing, relatou suas próprias experiências oferecendo terapia a pacientes sob a influência de MDMA, incluindo uma mulher que relatou que ela foi finalmente capaz de superar seu trauma de uma agressão sexual brutal somente após esse tratamento. O renomado psiquiatra de Harvard, Lester Grinspoon, instou o juiz a não proibir precipitadamente uma substância com potencial significativo para o tratamento das condições de saúde mental, o que efetivamente encerraria toda pesquisa médica, como acontecera anteriormente com o LSD.

DEA apresenta a corte evidencias de que o MDMA está sendo usado em festas. Para a agencia, uso recreacional e abusivo são a mesma coisa.

Foi uma exibição impressionante, mas os próprios defensores não tinham muita esperança em influenciar a opinião do juiz. “Nós não sabíamos que os juízes administrativos da DEA às vezes contradiziam o que a DEA queria – pensávamos que esta seria uma batalha que discutiríamos na mídia e atrasaríamos um pouco, mas no final nós perderíamos “, declarou Doblin.

O juiz Francis Young rejeitou os argumentos da DEA de que a MDMA era uma droga com alto potencial de abuso sem uso médico aceito e recomendou que fosse colocado no Anexo III dentro de um ano. Esse nível é reservado para substâncias com utilidade médica e um potencial de abuso baixo a moderado – drogas atuais nesse cronograma incluem quetamina, esteróides anabolizantes e Tylenol com codeína. “Quando o juiz disse que deveria ser o Anexo III, e que deveria permanecer disponível para os terapeutas, ficamos simplesmente chocados”, conta Doblin.

Difusor do LSD Timothy Leary celebra com Rick Doblin nos anos oitenta.

O juiz foi inequívoco ao concluir que a MDMA deveria ainda ser permitida como um dispositivo terapêutico. Ele discordou com a DEA de que uma substância deve ter aprovação da FDA para satisfazer os critérios de “uso médico aceito”. “A FDA regula o comércio de drogas, não a forma como os médicos fazem seus trabalhos”, escreveu Young. “Só se pode concluir que, no contexto da batalha sobre a maconha, a FDA perdeu temporariamente de vista a sua reconhecida falta de autoridade estatutária para regular a prática da medicina”. O juiz alertou sobre os perigos de combinar a aprovação da FDA com uso médico. Para fazer isso iria equiparar valor comercial com valor terapêutico, ignorando que alguns medicamentos úteis são por vezes não patenteáveis e não rentáveis.

O fato de uma “minoria respeitável” de médicos realmente usar MDMA em sua prática é suficiente para apoiar o “uso médico aceito”, escreveu Young. “Nenhuma evidência foi produzida de quaisquer casos onde MDMA foi usado em terapia com menos segurança do que a totalmente aceitável.”

A opinião do juiz era condenatória, mas não era o fim da história. Um juiz administrativo só tem o poder de recomendar um curso de ação – a última palavra cabe ao administrador. E o administrador da DEA, John Lawn, simplesmente incluiu o MDMA no Anexo I de qualquer maneira.

Isso levou a uma série de apelações dos advogados, e enquanto o tribunal de recurso tem o poder de obrigar a DEA, eles normalmente vão ordenar a administração de volta para a prancheta, em vez simplesmente falar o curso de ação a tomar. Assim, se o tribunal de apelações decidir que as razões da DEA para colocar MDMA no Anexo I são inválidas, a DEA pode simplesmente chegar a um novo conjunto de razões para chegar à mesma conclusão.

“As agências administrativas têm grandes oportunidades para atrasar e atrasar e atrasar, ao chegar com todos os tipos de coisas falsas, porque leva muito tempo para discuti-las nos tribunais”, diz Doblin. Se o atraso foi a estratégia, então funcionou. Embora o processo de apelações tenha resultado em que a MDMA fosse brevemente retirada do cronograma das substâncias controladas, a DEA a colocou de volta em menos de um mês depois, em fevereiro de 1988, decisão que se mantém até hoje.

Nesse ponto, os advogados voltaram sua energia para casos judiciais semelhantes envolvendo maconha, diz Doblin, em vez de apresentar um pedido de apelação. Ele já havia se separado do grupo devido a diferenças políticas – enquanto Doblin defendia publicamente a legalização completa da MDMA, muitos dos profissionais médicos do grupo preferiam a tática menos radical de pedir à DEA para manter o uso recreativo ilegal sem colocar restrições indevidas sobre o uso terapêutico e a pesquisa.

Nancy Reagan implora para a America “apenas dizer não” as drogas em 1987.

Trinta anos depois, o debate sobre os usos terapêuticos do MDMA, da maconha e de outras drogas proibidas foi revigorado graças a resultados promissores de pesquisa, uma perspectiva cultural em processo de mudança e ao trabalho árduo de defensores contra a fracassada Guerra Contra as Drogas. A organização de Doblin, MAPS, funciona como uma empresa farmacêutica sem fins lucrativos, financiando os longos e dispendiosos ensaios clínicos necessários para obter MDMA e maconha aprovados como medicamentos pela FDA.

A organização espera a aprovação para iniciar os ensaios de Fase III, a etapa final e mais árdua, até o final deste ano. Ensaios anteriores, que testaram a terapia assistida com MDMA para ansiedade e depressão em pacientes com câncer terminal e TEPT, mostraram resultados notavelmente positivos, com benefícios positivos duradouros após apenas uma ou duas sessões com o medicamento. Se os testes da Fase III forem tão bem, o uso de MDMA na psicoterapia poderia ser aprovado pela FDA até 2021, de acordo com a MAPS. Isso forçaria a mão da DEA, fazendo agência finalmente remover permanentemente a MDMA do restritivo Anexo I e reconhecendo seu uso médico aceito.

Para Doblin, já faz muito tempo, mas ele é sempre otimista. “Parece bom! Parece promissor! Está bem ao virar da esquina! “A verdadeira vergonha, diz ele, é que estamos 30 anos atrás de onde estaríamos se a DEA não tivesse imposto sua agenda proibicionista.

Doblin não acredita que a DEA tenha o interesse público e a segurança pública como motivações primárias para a proibição do MDMA. “Eu não acho que eles estavam realmente pensando que esta é uma droga terrivelmente perigosa. Acho que eles estavam pensando: esta é uma droga que causa alteração na consciência, as pessoas estão gostando, e isso fica no caminho da proibição de drogas. Não se tratava dos perigos terríveis do MDMA, e os danos cerebrais relacionados ao ecstasy foram vastamente exagerados, como podemos dizer agora, mais de 30 anos depois. Não há um monte de pessoas feridas com danos cerebrais.”

Há montanhas de evidências para apoiar a posição de que a Guerra Contra as Drogas falhou como política, e há até indícios de que, desde o início, ela foi projetada como um ataque contra inimigos políticos, e não os perigos do uso de drogas. Tome esta citação surpreendente de um assistente anterior de Nixon, como disse a um repórter de Harper em 1994:

“A campanha de Nixon, em 1968, e a Casa Branca de Nixon, depois disso, tinham dois inimigos: a esquerda e os negros contrários a guerra. Você entende o que estou dizendo? Sabíamos que não poderíamos tornar ilegal ser contra a guerra ou negro, mas ao fazer com que o público associasse os hippies com maconha e os negros com heroína e, em seguida, criminalizássemos ambos fortemente, poderíamos interromper essas comunidades. Poderíamos prender seus líderes, invadir suas casas, interromper suas reuniões e vilipendiá-los noite após noite no noticiário da noite. Sabíamos que estávamos mentindo sobre as drogas? Claro que sim.”

Dentro de trinta anos, Doblin prevê 35 mil clínicas de terapia psicodélica em todo o país, onde as pessoas possam ir para receber apoio, não só tomando MDMA, mas outras substâncias mentais e potencialmente benéficas como cogumelos mágicos e LSD. Ele ainda acredita que as drogas devem ser legais para uso recreativo, e imagina uma espécie de modelo de carteira de motorista no qual as pessoas primeiro consumiriam as drogas sob supervisão, e, com a aprovação de um profissional, receberiam permissão para comprar e levar para casa drogas para uso pessoal.
Esse é o mundo que Doblin acredita já estaríamos vivendo hoje, não fosse o apoio teimoso do governo dos EUA à proibição de drogas e à criminalização. “Nós não teríamos a crise maciça que temos agora, com 600.000 veteranos que recebem aposentadoria de invalidez da administração de TEPT para veteranos”, diz. “Seria dramaticamente, radicalmente diferente. E será radicalmente diferente daqui a 30 anos “.

https://www.inverse.com/article/19195-mdma-1980s-court-battle-psychiatrists-versus-dea

A Psiquiatria está pronta para o paradigma da cura psicodélica?

Como o uso de plantas de poder e psicodélicos podem ajudar a aliviar o sofrimento humano? Quais são as barreiras para as chamadas medicinas da floresta, como a Ayahuasca, se tornarem parte da Psiquiatria convencional? Como se projeta e conduz pesquisas sobre o uso terapêutico de tais plantas de uma maneira ética e significativa? Como irá aparentar o tratamento de transtornos mentais com estas plantas? Estas são algumas das perguntas básicas as quais eu vim lidando no decorrer dos últimos três anos, enquanto completava residência em Psiquiatria e tentava iniciar uma carreira na ciência psicodélica e sua forma de cura.

Neste breve texto, tentarei esboçar algumas respostas introdutórias para as perguntas acima, bem como discutir os desafios em integrar diferentes áreas do conhecimento com o modelo biológico atual da Psiquiatria. Eu acredito que a adoção de uma perspectiva multidimensional complexa do sofrimento humano e o aproveitamento delicado de maneiras diferentes de entender plantas psicodélicas são fatores-chave para o paradigma emergente de cura psicodélica.

 

 

Diferentes perspectivas sobre as Plantas Psicodélicas


Plantas psicoativas e fungos tem se relacionado com humanos por milhares de anos, tendo diferentes e vários papéis na sociedade, na cultura, religião e na medicina. Como resultado dessa complexa e histórica relação, existem inúmeras formas pelas quais podemos entender e falar sobre estas plantas.

A Ayahuasca como um exemplo, uma perspectiva indígena ou antropológica pode ver a bebida como não apenas sagrada, mas como uma “planta de espírito” ou “professora”, com a qual uma pessoa ou um xamã interage para produzir o efeito desejado. Essa compreensão contrasta totalmente com uma visão biomédica da Ayahuasca como uma coleção de alcaloides e outros compostos químicos, principalmente um agonista (quando uma substância química se liga em um receptor e o ativa) do receptor da serotonina 2A e um inibidor da MAO (monoamina oxidase), que alteram a conectividade da rede cerebral e a neuroplasticidade. Talvez entre essas visões existam as perspectivas psicológicas do chá como um “psicodélico”, capaz de provocar estados não-ordinários de consciência que podem trazer o insight psicológico e a mudança.

À medida em que o uso da Ayahuasca se torna mais difundido, existem várias outras maneiras de conceituá-la ou explicá-la. Perspectivas espirituais ou religiosas podem classificar o chá como “enteógeno” ou “sacramento”, capaz de catalisar profundas experiências espirituais ou místicas. Discursos mais recentes consideram a Ayahuasca como uma “ferramenta cognitiva”, ou “ferramenta evolutiva” que pode intensificar a criatividade e ajudar nossa espécie a evoluir ou viver mais harmoniosamente. Finalmente, a Ayahuasca e outras plantas psicodélicas são, muitas vezes, chamadas carinhosamente de medicinas da floresta por usuários da contemporaneidade que desejam destacar seus efeitos de cura profunda.

 

A Planta Medicinal na Era da Psiquiatria Biológica

Enquanto meu treinamento na psiquiatria enfatizou uma abordagem “biopsicossocial” para diagnóstico e tratamento, parece claro que o campo da psiquiatria como um todo tem, nas últimas décadas, priorizado a compreensão biológica do sofrimento mental. De acordo com este paradigma, doenças mentais como depressão e esquizofrenia, bem como dependências, são consideradas doenças cerebrais resultantes de circuitos neurais aberrantes e desequilíbrios químicos. Essa perspectiva visava servir a múltiplos propósitos: 1) ajudar a psiquiatria a tomar o seu lugar no meio de outras especialidades da medicina fundamentadas nas ciências biológicas; 2) desestigmatizar a doença mental e as dependências, retratando-os como doenças crônicas tratáveis, como diabetes ou algum tipo de doença cardíaca, e não como falhas morais ou resultantes de um caráter fraco; e 3) como o público crítico argumentaria, para ajudar a promover os produtos farmacêuticos como o principal meio de abordar a doença mental e aliviar o sofrimento cotidiano.

Embora não negue que este paradigma levou a avanços no nosso entendimento sobre certas doenças mentais e que pode ser utilizado como uma lente explicativa poderosa para certos pacientes, gostaria de salientar que uma compreensão estritamente biológica da doença mental é inconsistente com a minha compreensão sobre como plantas psicodélicas funcionam para trazer cura.
O paradigma biológico coloca a pessoa em situação de sofrimento como uma vítima relativamente impotente de um cérebro doente, obscurecendo as causas sociais, psicológicas e espirituais mais profundas do sofrimento e prescreve a adesão passiva à medicação como o modo primário de cura.

Em contraste, acredito que a experiência com plantas psicodélicas nos confronta poderosamente com a realidade que existimos como seres multidimensionais complexos, com mentes cerebrais, corpos, corações e espíritos, todos conectados uns aos outros e com nossos seres naturais e sociais. A partir dessa perspectiva, a fonte do sofrimento não é apenas do cérebro; o sofrimento pode surgir da doença em qualquer uma dessas camadas de existência e ser propagado através delas de formas complexas. Isso explicaria, por exemplo, como o stress social é internalizado como sintoma psicológico ou físicos.

O Desafio de Integrar o Conhecimento


A principal implicação de cunho terapêutico em ver o sofrimento mental nesta maneira multidimensional é que os tratamentos adequados devem agora ser capazes de intervir nas múltiplas camadas da existência. O principal argumento que eu gostaria de enfatizar é que esse tipo de cura multidimensional a) requer um engajamento ativo da pessoa em situação de sofrimento (bem como em psicoterapia), e b) pode ser alcançado através do uso de plantas psicodélicas medicinais utilizando as diferentes visões conceituais descritas acima. Assim, como pesquisador clínico e acadêmico, vejo o principal desafio do campo emergente da ciência psicodélica como sendo a integração de modos de conhecimento e abordagens para a cura que, anteriormente, se encontravam desconectados e conflitantes.

Dada a predominância dos quadros biológicos dentro da Psiquiatria acadêmica, desafios significativos relacionados a essa integração manifestam-se tanto ao transmitir tais ideias a colegas e agências financiadoras, quanto ao tentar traduzir essas ideias em ensaios clínicos e protocolos de tratamento. Como estudamos e utilizamos um medicamento com múltiplos ingredientes ativos que funciona de modo complexo, multidimensional e idiossincrática quando a ciência moderna é inerentemente reducionista, ao procurar moléculas únicas que têm mecanismos biológicos de ação específicos para explicar seus efeitos terapêuticos sobre os processos patológicos que podem ser vistos, reconhecidos e medidos? Como a ciência pode explicar a interação entre as propriedades físicas de uma medicina como a Ayahuasca e seus componentes metafísicos de cura que são complementares ao seu uso, como música, dieta, oração e outros aspectos do Xamanismo? Acredito que superar esses desafios de integração representa uma grande oportunidade para o campo da ciência psicodélica e, caso bem-sucedida, pode revolucionar a maneira como pensamos e tratamos a doença mental.

 

 

Integração de conhecimento: passado e presente


Felizmente, o processo de integrar diferentes tipos de conhecimento sobre as plantas psicodélicas já foi iniciado. Populações indígenas ao redor do mundo possuem séculos de conhecimento relacionados ao uso de plantas psicoativas para fins espirituais, religiosos e de cura. Relatos antropológicos e interdisciplinares e o engajamento direto entre cientistas, usuários ou praticantes dos rituais e povos indígenas (por exemplo, a Conferência Mundial de Ayahuasca) trazem as partes interessadas com diferentes perspectivas e tipos de conhecimento ao diálogo uns com os outros. No Ocidente, existem modelos “psicodélicos” e “psicolíticos” de uso de substâncias psicodélicas ao lado da psicoterapia para tratar transtornos de humor e dependência de substâncias que remontam aos anos 1950. Esses modelos serviram de base para ensaios clínicos recentes e podem ser modificados e atualizados à medida que se ganha mais conhecimento e que este vá sendo integrado.

A onda atual de pesquisa psicodélica tem sido caracterizada por trazer avançadas ferramentas científicas e métodos para suportar o estudo de substâncias psicodélicas, incluindo a neuroimagem e farmacologia molecular, bem como uma metodologia robusta de ensaio clínico utilizando o controle do placebo duplo-cego. Ao crédito destes investigadores, essa pesquisa não só trouxe novos entendimentos sobre como os psicodélicos afetam o cérebro, mas também começaram a elucidar como tais mudanças biológicas podem ser correlacionadas com a experiência psicológica e espiritual. Por exemplo, Robin Carhart-Harris demonstrou como as mudanças psicodélicas induzidas na conectividade cerebral se correlacionam com experiências específicas de tipo místico e subjetivo. Submetendo-se a tais experiências do tipo místico, tem se mostrado correlacionado com o benefício terapêutico em estudos recentes com psilocibina, o ingrediente ativo dos “cogumelos mágicos”.
O estudo de medicamentos complementares e alternativos seguiu uma trajetória similar. Nos últimos anos, estudos cada vez mais sofisticados começaram a esclarecer como práticas e modalidades que costumavam ser entendidas como espirituais ou energéticas, como meditação e acupuntura, têm efeitos biológicos e psicológicos que contribuem para seu potencial terapêutico.

Rumo à “Integração de Paradigmas Críticos”

Embora esses desenvolvimentos recentes sejam um bom sinal para o futuro da pesquisa e do tratamento com psicodélicos, eu gostaria de concluir argumentando para defender o foco sustentado entre pesquisadores e profissionais neste campo sobre integração do conhecimento, colaboração multidisciplinar e abordagens de tratamento multimodal – o que eu chamo de “integração de paradigmas críticos”.

Os atuais determinantes políticos, econômicos e filosóficos continuarão a puxar a pesquisa e o tratamento com psicodélicos em uma direção biológica. Portanto, é crítico neste tempo ressurgente para a ciência psicodélica que os pesquisadores visam integrar diferentes tipos de conhecimento e planejem protocolos de tratamento que refletem entendimentos multidimensionais complexos de como as plantas psicoativas produzem cura. Este último é crucial pois as diretrizes de tratamento são geralmente baseadas em evidências produzidas por ensaios clínicos. Assim, os modelos que nós construímos e estudamos agora estão aperfeiçoando como as plantas medicinais serão usadas na Medicina nas próximas décadas.

Vamos tratar plantas psicodélicas medicinais como qualquer outra classe de psicofármacos, tomados de modo passivo por pacientes enquanto o medicamento re-conecta com seus cérebros? Procuraremos criar formulações que minimizem seus “efeitos colaterais” psicoativos e somáticos ou purgativos, bem como foi feito com o uso psiquiátrico da ketamina? Ou esses tratamentos, de uma natureza radicalmente diferente, interagindo com nossos corpos-mente-cérebro-espírito de uma forma complexa que requer um engajamento ativo, não só durante o tempo de administração da droga, mas o antes e depois? Acredito que o entusiasmo popular por trás da cura psicodélica e os benefícios terapêuticos profundos e duradouros relatados até agora em ensaios clínicos argumentam para este último. Se a psiquiatria tradicional e as instituições sociais relacionadas irão abraçar este novo paradigma, isto ainda está para ser descoberto.

 

O autor gostaria de reconhecer as contribuições intelectuais de Jeffrey Guss M.D., Ryan Wallace M.D., e Alexander Belser M.Phil., No desenvolvimento das idéias apresentadas aqui.

FONTE


Agradecemos imensamente a tradução feita pela colaboradora Mirella Mochiutti.
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Albert Hofmann: Uma Carta para Steve Jobs: MAPS e a pesquisa do LSD

O post a seguir é adaptado do livro “This Is Your Country On Drugs: The Secret History of Getting High in America” (ainda sem versão em português). A carta é publicada respeitando os direitos autorais do inventor do LSD, Albert Hofmann. Para maiores informações sobre eventos relacionados ao livro, veja a página no Facebook ou siga Ryan Grim no Twitter.


Steve Jobs nunca se acanhou ao comentar sobre seu uso de psicodélicos e se referir à sua experiência com LSD como “uma das duas ou três coisas mais importantes que já fiz na vida.” Assim, chegando ao fim da sua vida, o inventor do LSD Albert Hofmann decidiu escrever uma carta ao criador do iPhone para ver se este se interessava em dedicar parte de seu patrimônio naquilo que já esteve uma vez na ponta da sua língua.

1976: The discoverer of the drug Lysergic Acid Diethlyamide, or LSD, Dr Albert Hofmann. (Photo by Keystone/Getty Images)1976: The discoverer of the drug Lysergic Acid Diethlyamide, or LSD, Dr Albert Hofmann. (Photo by Keystone/Getty Images)

Hofmann escreveu em 2007 uma carta até então nunca divulgada para Jobs a pedido de seu amigo Rick Doblin, que administra uma organização dedicada ao estudo dos benefícios médicos e psiquiátricos dos psicodélicos. Hofmann, um químico nascido na Suíça, morreu em abril de 2008 com 102 anos.

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A carta de Hofmann pra Jobs se encontra transcrita abaixo caso você tenha dificuldade em compreendê-la:


Caro Sr. Steve Jobs,

Saudações de Albert Hofmann. Soube pela mídia que você se diz ajudado criativamente pelo LSD no desenvolvimento dos computadores Apple e sua jornada espiritual pessoal. Estou interessado em aprender mais sobre como o LSD lhe foi útil.

Escrevo agora, pouco depois do meu 101º aniversário, para requerer-lhe que apoie a pesquisa proposta pelo psiquiatra suíço Dr. Peter Gasser para o estudo de psicoterapia LSD-assistida em pacientes com ansiedade associada a doenças fatais. Este será o primeiro estudo em psicoterapia LSD-assistida em 35 anos.

Espero que me ajude a transformar minha criança problema em minha criança solução.

Sinceramente,

A. Hofmann

Escrita logo após seu 101º aniversário, a carta apresenta uma caligrafia impressionante para um homem de sua idade. Mostrei-a para minha avó, Ruth Grim, que era oito anos mais nova que Hofmann e que fez uma análise amadora sobre a escrita enquanto Hofmann estava viajando. Sem saber de quem se tratava, ela disse por email que “tempo atrás, algo aconteceu que o fez ter uma visão deturpada sobre as coisas. Talvez ele se sentiu ameaçado. E também… criativo com suas mãos, duro consigo mesmo, pensa demais, teimoso, cuidadoso com o jeito que se expressa, não é influenciado pelo o que os outros pensam.”

Doblin diz que Hofmann frequentemente dizia que ele teve uma infância feliz e que não o caracterizaria como deturpado. Hofmann, por sua vez, geralmente se referia ao LSD como sua própria “criança problema” e em sua carta ele pede a Jobs que o “ajude a transformar a criança problema numa criança solução.”

Ele pede especificamente a Jobs que financie as pesquisas propostas pelo psiquiatra suíço Peter Gasser e direciona Jobs para a Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos de Doblin (MAPS).
Doblin e Hofmann eram próximos; Doblin deu ao doutor seu primeiro ecstasy nos anos 80 quando ainda era legal, e de acordo com ele, Hofmann amou, dizendo que finalmente ele havia encontrado uma droga que poderia usar com sua mulher, que não era fã do LSD.

Doblin me providenciou uma cópia da carta; o filho de Hofmann, Andreas Hofmann, encarregado das propriedades de seu pai, autorizou sua publicação.

De acordo com Doblin, a carta resultou numa conversa de uns 30 minutos entre ele e Jobs mas nenhuma contribuição à causa. “Ele ainda pensava ‘Vamos colocar no abastecimento de água e assim fica todo mundo louco,” se lembra um desapontado Doblin, que diz ainda não ter perdido a esperança de que Jobs viria até ele com sua contribuição.

O fato de Jobs ter usado LSD e ter afirmado do quanto isso contribuiu à sua forma de pensar está longe de ser uma exceção no mundo da tecnologia. Os psicodélicos influenciaram alguns dos principais cientistas da computação nos Estados Unidos. A história por trás destas conexões está registrada em vários livros, o melhor deles sendo provavelmente “What the Dormouse Said: How the 60s Counterculture Shaped the Personal Computer”, pelo repórter da área de tecnologia John Markoff.

De acordo com Markoff, os psicodélicos aceleraram as revoluções nos computadores e na internet ao mostrar para as pessoas que a realidade pode ser profundamente alterada por uma forma de pensar inconvencional e altamente intuitiva. Douglas Engelart é um exemplo de um psiconauta que fez isso: ajudou a inventar o mouse. Jobs da Apple disse que Bill Gates da Microsoft seria “um cara mais aberto caso tivesse tomado ácido uma vez.” Numa entrevista em 1994 para a Playboy, no entanto, Gates não negou uso de drogas quando jovem.

O pensamento diferenciado — ou aprender a Pensar Diferente, como já dizia o slogan de Jobs — é a principal característica da experiência com ácido. “Quando estou sob efeito do LSD e ouvindo algo que é puramente ritmo, sou levado para um outro mundo e para um outro estado mental onde eu paro de pensar e passo a saber,” contou Kevin Herbert para a revista Wired num simpósio que comemorava o centésimo aniversário de Hofmann. Hebert, empregado de longa data da Cisco System que com sucesso baniu o teste de drogas de tecnólogos na companhia, comenta que “resolveu seus maiores problemas técnicos enquanto viajava ao ouvir os solos de bateria do Greatful Dead.”

“Isso deve estar mudando alguma coisa na comunicação interna do meu cérebro,” disse Herbert. “O processo dentro de mim que me permite resolver problemas passa a trabalhar de forma diferente, ou talvez partes diferentes do meu cérebro passam a ser usadas.”

O Burning Man, fundado em 1986 pelos entusiastas em tecnologia de São Francisco, sempre teve a intenção de fazer um grande número de pessoas usarem diferentes partes de seus cérebros para um fim não específico, mas aparentemente esclarecedor e que beneficiasse o bem de todos. O evento foi rapidamente realocado para o deserto de Nevada pois passou a ser grande demais para a cidade. Hoje, é mais provável que você encontre por lá um engenheiro de software do que um ex-hippie. Larry Page e Sergey Brin, os fundadores do Google, participam do evento por um bom tempo, e a influência de São Francisco e Seattle na cultura tech está em todos os lugares, nos acampamentos e nas exibições montadas para os oito dias de festival. O site na internet diz lisergicamente que “tentar explicar o que é o Burning Man pra alguém que nunca esteve lá é como tentar explicar como é uma determinada cor para alguém que é cego.”

No evento em 2007, fiquei acampado no Camp Shift — Shift que em inglês significa “mudar”, “mudar sua consciência” — perto de quatro carros alegóricos alugados por Alexander e Ann Shulgin e seus amigos septo e octogenários vindo do norte da Califórnia. Estes respeitáveis senhores, os pais e mães espirituais do Burning Man, passam as noites sentados numa cadeira de plástico e sorrindo até o amanhecer. Perto da gente, um cara que eu conhecia de Eastern Shore — e que ocupava um cargo público — havia montado um mini campo de golfe com nove buracos e meio. Por que nove buracos e meio? “Porque é o Burning Man,” ele explicou. Nosso acampamento contava com palestras sobre psicodélicos e um “passeio” chamado “Dance, Dance, Immolation.” (o que em português seria “Dança, Dança, Sacrifício”). Os participantes vestiam uma roupa antiinflamável e tentavam dançar junto das luzes que piscavam. Cometa um erro, e você é engolido pelas chamas. A primeira pergunta no FAQ era, “É seguro? Resposta: Provavelmente não.”

John Gilmore foi o quinto empregado da Sun Microsystems e registrou o domínio Toad.com em 1987. O conhecido psiconauta é um dos ricaços, veterano do festival. Hoje um ativista das liberdades civis, e talvez mais conhecido por conta da Lei Gilmore, observa que “a Rede interpreta a censura como um dano e dá um jeito de contorná-la.” Ele me disse que a maioria dos seus colegas dos anos 60 e 70 usavam psicodélicos. “Os psicodélicos me ensinaram que a vida não é racional. A IBM era uma empresa muito racional,” ele disse, explicando porque a gigante do mundo corporativo foi ultrapassada por empresas até então sem grandes investimentos externos como a Apple. Mark Pesce, coinventor da LMRV (Linguagem para Modelagem de Realidade Virtual) e dedicado comparecedor do Burning Man, concordou que há uma certa relação entre expansão da mente através de químicos e avanços na tecnologia: “Os homens e mulheres, as pessoas por trás [da realidade virtual] eram todas chapadas,” ele disse.

Gilmore, no entanto, duvida que um relação direta causa-efeito entre drogas e a Internet possa ser comprovada. O tipo de pessoa que é inspirada pela possibilidade de criar novos modos de armazenar e compartilhar conhecimento, ele disse, geralmente é o mesmo tipo que se interessa pela exploração da consciência. Num nível básico, ambos são uma busca por algo fora da realidade convencional — a mesma abordagem que muitos processos criativos e espirituais têm, sendo que grande parte destes é estritamente livre de drogas. O que não deixa de ser verdade, nota Gilmore, é que muitas pessoas chegam a conclusões e certas revelações durante uma viagem. Talvez uma dessas revelações acabou se tornando um código de programação.

E talvez em outras áreas científicas também. De acordo com Gilmore, o inconformista químico/surfista Kary Mullis, famoso entusiasta do LSD, lhe disse que o ácido o ajudou a desenvolver a reação em cadeira da polimerase (PCR), um avanço crucial para a bioquímica. A descoberta lhe rendeu o Prêmio Nobel em 1993. E de acordo com o repórter Alun Reese, Francis Crick, descobridor da estrutura em dupla hélice da molécula de DNA juntamente de James Watson, disse a seus amigos que a primeira vez que ele visualizou a forma de dupla-hélice foi durante uma viagem de doce.

Não é nenhum segredo que Crick tomava ácido; ele também apoiou publicamente a legalização da maconha. Reese, que divulgou a história para uma agência de notícias depois da morte de Crick, disse que quando ele conversou com Crick sobre o que os amigos do cientista haviam lhe contado, ele “escutou atentamente, mesclando encanto e êxtase” e “não demonstrou nenhum sinal de surpresa. Quando terminei ele disse ‘Imprima uma palavra sobre isso e eu lhe processo.'”

* * * * *

Caro Ric,

Obrigado por tudo o que faz pela minha criança problema. Estou contente por contribuir com o que puder de minha parte.

Aprendi muito com sua maravilhosa carta, sobre fazer as coisas depois de esperar pelo momento certo, a forma clara e cuidadosa com que organiza e realiza o seu trabalho.

Espero que minha carta a Steve Jobs corresponda à sua expectativa, especialmente no que se refere ao escolher ter usado papel e caneta. [Doblin pediu para que Hofmann timbrasse pessoalmente a carta]. Acredito que segui a sua receita.

Acredito que o Dr. Gasser terá o seu pedido atendido .

Cordialmente –

Albert Hoffman

Fonte: huffingtonpost.com

Agradecemos imensamente a tradução feita pelo colaborador Pedro Reis.
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