O Renascimento do LSD e Outros Psicodélicos

Assista o vídeo abaixo, legendado! Aprenda um pouco mais sobre a jornada dos psicodélicos, desde a seu surgimento, proibição e controvérsias no século passado, que perduram até os últimos anos, e as novas fronteiras da pesquisa científica sobre os potenciais benéficos dessas substâncias.

 

Em centros de pesquisa respeitados nos Estados Unidos e em outros países, os cientistas passaram muito tempo de suas vidas profissionais em programas de reabilitação de drogas. Mas não por que eles tenham um problema com o vício. O que eles estão tentando fazer é reabilitar as próprias drogas.

O foco deles está em substâncias alteradoras da mente que entraram na obscuridade devido à proibição, cerca de meio século atrás, e o LSD está entre elas. Juntamente com outros psicodélicos, o LSD foi amaldiçoado como sendo uma substância de alto potencial de abuso e que não oferece nenhum benefício medicinal e psiquiátrico. Mas nos últimos anos, pesquisadores têm procurado resgatar os alucinógenos do exílio examinando sua eficácia no tratamento de certas desordens da mente, e talvez até mesmo no seu papel importante para compreender a natureza da consciência e da espiritualidade.

O trabalho desses cientistas agora foi compilado no vídeo acima, que examina as principais características históricas desse psicodélico tão famoso.

Substâncias psicoativas, geralmente extraídas de cogumelos mágicos, têm sido parte da cultura humana das Américas Central e Sul, e até mesmo do Saara, por milhares de anos. Mas não é preciso olhar tão longe no passado: 1938 já é suficiente. Esse foi o ano em que Albert Hofmann, um químico suíço pesquisando por uma combinação química para combater problemas de circulação, acabou sintetizando a dietilamida do ácido lisérgico: o LSD, ou o ácido, como é popularmente conhecido.

Cinco anos depois, o Dr. Hofmann, que morreu no ano de 2008 na idade de 102 anos, ingeriu acidentalmente uma pequena dose de sua criação e descobriu seus potenciais expansores da mente na primeira viagem de LSD conhecida. Muitas outras jornadas se seguiriam, para ele e diversos outros indivíduos.

Nos anos 50 e 60, os pesquisadores exploraram o LSD como uma ferramenta para o tratamento de doenças mentais e diversos vícios.  Alguns segmentos do governo americano tinham suas próprias ideias. A CIA testou as possibilidades do ácido como uma poção da verdade, ou talvez como um veículo para o controle da mente. O exército quis saber se o LSD poderia ser utilizado para desorientar as tropas inimigas.

Então surge a aurora que todos se lembram quando pensam nos anos 60: a era de aquário, com hippies amorosos, roupas tie-die, óculos gigantescos e sons psicodélicos. O LSD estava disponível amplamente. Muitas pessoas jovens se convenceram que uma sociedade inteira baseada em psicodélicos poderia atingir uma consciência elevada – “a revelação mística do cristal e a libertação real da mente” – relembrando a banda “Hair”.

Muitas pessoas foram influenciadas por Timothy Leary, um psicólogo clínico na Universidade de Harvard, que se tornou o guru das viagens de ácido, pregando de maneira apaixonada sobre os psicodélicos. “Turn on, tune in, drop out”, dizia Leary, que morreu em 1996. A recomendação foi infinitamente citada. Seus discípulos fervorosos o seguiram ao pé da letra, e muitas vezes, o seguiram em seus excessos.

Entre aqueles cujo foco era o estudo da mente humana, uma visão compartilhada pela maioria era a de que Leary tinha ido longe demais, dando à ciência um nome ruim no processo. Preocupações políticas ficaram ainda piores. Oficiais eleitos do presidente temeram que a juventude da américa estavam escorregando em um precipício de drogas.

Histórias abundaram sobre suicídios, assassinatos e outros horrores cometidos por jovens sob efeitos do LSD, ou durante um flashback. Nem todas as lendas eram verdade. Naturalmente, as autoridades federais concluíram que o comportamento perigoso já era suficiente para eles entrarem em ação.

Proibições contra LSD e outros alucinógenos, como a psilocibina e a mescalina, foram codificadas no Ato de Substâncias Controladas de 1970. Nos anos 1980, o MDMA, ou ecstasy – se juntou à lista 1 de substâncias controladas, as que, segundo a lei, são as mais perigosas e que não apresentam uso médico algum.

Logo em seguida, as pesquisas científicas e exploração dessas substâncias se tornaram escassas. Qualquer aproximação do LSD, que Albert Hofmann chamou de sua “criança problema”, era um pedido para ter sua carreira totalmente destruída.

Nos anos recentes, entretanto, drogas psicodélicas estão entrando novamente nas mídias de massa.

Essencialmente, cientistas modernos estão continuando os que os dos anos 50 e 60 já haviam feito. Eles estão estudando o potencial dos alucinógenos para auxiliar os fumantes a largarem o vício, a se livrarem de problemas com álcool e outras drogas, na diminuição de cefaléias em salva e a depressão, e no tratamento de transtornos como o obsessivo compulsivo e os estresses pós-traumáticos. Instituições em que tais pesquisas estão em andamento incluem a New York University, a Johns Hopkins University, a University of California, o Psychiatric University Hospital em Zurique, e o Imperial College of London.

O interesse da pesquisa sobre a psilocibina é muito aguçada na américa. Esse é um ingrediente psicoativo nos fungos conhecidos como cogumelos mágicos. O que auxilia nesse processo é a ausência da carga negativa que continua assombrando o LSD, disse Matthew W. Johnson, um professor de psiquiatria e ciência comportamental na Johns Hopkins.

O que também ajuda é o fato de que os cientistas trabalham em uma nova situação legal para algumas drogas. A maconha, por exemplo, é uma substância controlada 1, mas já está legalizada em alguns estados americanos.

A psilocibina e outros alucinógenos, embora não viciantes, permanecem um tabu em todas as partes. Os pesquisadores precisam de uma autorização legal da FDA (Food and Drug Administration) e a aprovação de comitês profissionais. Seus experimentos não se assemelham em nada ao uso livro do ácido dos anos 60. Os pacientes são introduzidos  e preparados no que eles podem esperar da experiência, e então são monitorados com cuidado.

Considerando que a morte nos aguarda, um objetivo intrigante do uso dos psicodélicos para aliviar a ansiedade profunda – estresse existencial, alguns a chamam – naqueles que estão próximos de enfrentá-la. Elas são pessoas como Sherry Marcy, uma mulher de Ann Arbor, que descobriu que tinha câncer endometrial.

Ela sucumbiu à depressão. Quatro anos atrás, Marcy, que agora tem 73 anos, foi para Johns Hopkins para duas sessões de tratamento com psilocibina. O alívio que ela sentiu continua com ela.

“Não foi algo psicodélico para mim”, ela disse em uma entrevista com a Retro Report. “Era somente eu – de volta. Eu não sei como eu fiz aquilo, exatamente. É como se você levantasse a cabeça e olhasse por um longo período de tempo, e então você começa a ver as coisas novamente”.

Os cientistas estão tentando descobrir como exatamente a droga ajuda esses pacientes a se livrarem do medo. Além disso, eles têm observado efeitos positivos permanentes, e até mesmo despertares espirituais em alguns casos. Se administrados com cuidado, eles dizem, os psicodélicos podem reorientar as percepções dos pacientes do seu lugar no universo e colocá-los longe de pensamentos negativos. Em um artigo do New Yorker de 2015, um pesquisador inglês, Robin Carhart-Harris, chamou o fenômeno de “sacudir o globo de neve”.

Os estudos têm sido em escala pequena, e os resultados, enquanto encorajadores, são preliminares. É necessário cuidado, o Dr. Johnson da Hopkins informou à Retro Report, tanto pelo rigor científico, quanto pelos potenciais perigos dos psicodélicos.

A senhora Marcy, que agora está livre do câncer, diz que Timothy Leary acertou em um terço de sua frase. “O “turn on” não deve ser enfatizado, ela disse. “O “drop out” é um erro absoluto. Mas o crucial é o “tune in”.

“Eu entrei em sintonia”, ela disse. “Em sintonia com o mundo, comigo mesma, com as coisas que eu costumava amar, com os meus relacionamentos, com a minha família. Sintonize-se: tudo se trata disso”.

Fonte

O que o LSD pode nos ensinar sobre a natureza humana.

Eu estava em São Francisco semana passada, visitando meu irmão e revisitando os anos que passei lá quando jovem. Nós andamos pelo parque Golden Gate, dois caras na casa dos 60, admirando as gigantes sequoias, jardins exóticos, e as pastagens verde-douradas em cascata ao oeste, em direção ao oceano. E relembramos a nossa viagem de ácido épica em 1969, neste mesmo lugar, quando estávamos preparados para aventura e autodescoberta.

Nós éramos em quatro. Cada um de nós engoliu nossos pequenos comprimidos roxo — Feliz aterrizagem, pessoal!” — então começamos andar em direção ao oeste pelo parque. Cerca de meia hora depois vieram os surtos de energia em nossos estômagos, antecipação de algo enorme prestes a acontecer, entusiasmo e medo como se aproximar à beira de uma cachoeira desconhecida. O parque estava tão bonito. O canto dos pássaros estava por toda parte, com mais nuances do que havia alguma vez percebido.

E então o mundo se transformou. Os padrões dos galhos, o aroma do eucalipto, a confusão das outras pessoas, cachorros latindo, pássaros cantando, misturado e desintegrado ao mesmo tempo. Meu senso de “Eu” esticou, estendendo os limites da minha percepção como um desabrochar de um bouquet. Perdi a noção de quem eu era, onde estava, onde eu terminava e o mundo exterior começava… e então tudo isso se desintegrando, reconvergindo e se embaralhando de alguma formou se colapsou em uma sonora unicidade, o zumbido ensurdecedor de um universo totalmente pacífico.

Holotropics (113)

LSD era assustador, belo, e incompreensivelmente, transformador de vidas —  você pode dizer “educacional” com um sorriso irônico — para os não iniciados. Não apenas isso. Juntamente com outras drogas psicodélicas que formaram nossa subcultura, tornou-se símbolo de um momento e lugar únicos. Era um farol para um bando de crianças com intenção de descobrir algo verdadeiro e universal subjacente aos absurdos políticos e sociais da sociedade mainstream, Nixon, a guerra do Vietnã, e todo o resto.

O que nós procuramos no LSD era o que os humanos sempre haviam procurado — o significado oculto por trás da estupidez transitória dos esforços humanos que não levam a nada. O que buscávamos era a iluminação que Buda ansiava em nos mostrar, e que por milhares de anos permaneceu tão elusiva.

Era isso apenas uma loucura idealista, uma febre de droga? Temos nossas cabeças enfiadas até nossos traseiros, imaginando a beleza suprema porque estávamos tão completamente no escuro, tão narcisistamente especializados, tão sem inspiração pelos desafios que nossos pais e mentores desejavam que nós enfrentássemos?

 

“O BÓSON DE HIGGS DA NEUROCIÊNCIA”

Quando cheguei em casa novamente, três dias atrás, alguns experimentos neurocientíficos haviam sido publicados em dois jornais simultaneamente, alegando mostrar exatamente o que ocorria no cérebro quando alguém toma LSD. Em dois dias, essas descobertas migraram de publicações cientificas para jornais e mídia pelo mundo, incluindo o The Guardian. Um dos autores líderes da pesquisa, David Nutt, um respeitado neurofarmacologista, foi citado dizendo “Isso foi para a neurociência o que o bóson de Higgs foi para a física de partículas. ”

Embora isso possa exagerar seu caso, nós podemos perdoar o entusiasmo de Nutt: os achados são, de fato, extraordinários. Voluntários saudáveis foram injetados com LSD enquanto deitavam em um scanner MRI, e submetidos a diversos outros métodos de neuroimagem ao mesmo tempo. Isso somou um arsenal de medidas que os pesquisadores psicodélicos de décadas passadas podiam apenas sonhar. Com certeza não era o parque Golden Gate, mas deitados naquela câmara magnética, com os seus olhos fechados e cérebros abertos, com fluxos de números espirrando de seus lobos em arquivos de dados que logo seriam traduzidos em imagens, esses indivíduos observaram intrincadas alucinações do LSD se desdobrarem por trás de suas pálpebras. E ao mesmo tempo reportaram experiências de “dissolução do ego” muito parecida com aquela que experimentamos no parque.

O que foi mais notável sobre a pesquisa foi que o nível de dissolução de ego relatada pelos participantes se correlacionava com uma transformação neural especifica. Para enfrentar o dia-a-dia pragmático e as demandas da sobrevivência, a atividade cerebral naturalmente se diferencia em diversas redes distintas, cada uma responsável por uma função cognitiva particular.

As três redes mais intimamente examinadas por esses cientistas incluem a rede que presta atenção no que é mais notável, a rede para solução de problemas, e a rede para refletir sobre o próprio passado e futuro. Existe também uma segregação natural entre área de cognição de alto nível (abstrato) e área de percepção baixo nível (concreto), mais notavelmente no córtex visual. Essas distinções são tidas como um design essencial de um cérebro humano funcional.

O impacto do LSD era para diminuir a conexão dentro de cada uma dessas redes, relaxando os laços que as mantinha intactas e distintas, enquanto aumenta a conversa cruzada entre elas. Em outras palavras, a etiqueta normal do cérebro requer segregação entre as redes que possuem diferentes funções, e essa etiqueta foi explodida em pedaços.

Agora a maioria das partes do cérebro estavam se comunicando com a maioria das outras partes do cérebro. Experiências sensoriais completas, como a visão, misturadas com a cognição abstrata, e as abstrações cognitivas reformulou as imagens visuais. Talvez seja isso que explique o intrincado padrão fractal que as pessoas enxergam nos galhos de um arbusto quando estão viajando no ácido. A percepção de relevância e o refinamento do senso de “eu” foram misturadas juntas como batatas e molho. O cérebro e seu proprietário não mais distinguiam o que era mais importante, como realizar tarefas, e quem de fato julga a importância daquilo que precisa ser feito.

 

Os cérebros dos participantes permanecendo despertos com os olhos fechados, sob um placebo, esquerda, e a droga LSD, direita, visualizadas usando MRI funcional. Foto: Imperial College London-The Beckley Foundation/Reuters

RELIGIÃO VS. PSICODÉLICOS

Há alguns milhares de anos, o Buda definiu a personalidade humana como um ciclo recursivo de hábitos — hábitos de aquisição, de desejo e apego. Eles levam à busca de prazeres que temos certeza que vão evanescer-se e a evitar o sofrimento que não pode ser evitado num ciclo de vida, envelhecimento e morte. Em resposta, seus seguidores escolheram o asceticismo, a prática de excesso de controle. Dos monges Budistas que se livraram do conforto e os sadhus Hindus com seus rituais de auto-mortificação novas religiões evoluíram.

Houve intermináveis listas de editais Judeus, Muçulmanos, e Cristãos que ainda impõe-se: o que não era permitido fazer, em quais dias, quais as consequências de seu fracasso. Nossas tentativas de libertar-se do hábito, da universalidade do costume local, verdade da ilusão, de modo geral juntaram-se a um conjunto de regras para aumentar o controle, particionar e segregar, desenhar hierarquias e obedecer códigos.

Parece que nossos cérebros, com sua tendência intrínseca para analisar e segregar, foram projetados para inclinar-se em direção ao controle excessivo em resposta às dificuldades da existência. Ou, mais precisamente, nós temos a tendência de ter controle excessivo, porque se manifesta como um principio fundamental do design cerebral.

Mas a natureza nos proveu com diferente antídotos para o isolamento e irrelevância. LSD foi criado em um laboratório na Suíça em 1930. Mas outros químicos com as mesmas propriedades psicodélicas habitam a carne de cactos por toda a America do Norte (mescalina), cogumelos encontrados na maior parte do hemisfério norte (psilocibina), e a vinha da Amazônia (DMT-ayahuasca). Esses compostos químicos evoluídos desfaz as travas que nossos cérebros constroem para nos manter limitados, buscando vitórias de curto prazo sobre fracassos inevitáveis. Os humanos se reuniram, cultivaram, destilaram, e produziram todo tipo de drogas por milhares de anos. Algumas delas aliviam a dor e conferem conforto. Outras fornecem energia que as vezes precisamos pra completar nossas tarefas. E nosso velho amigo álcool nos ajuda a relaxar e se divertir. Mas os psicodélicos não contribuem em nada para o nosso funcionamento diário. Pelo contrário, nós usamos para enxergar o quadro maior, para conectar-se com uma realidade que é difícil de ver usando nosso cérebro em funcionamento normal. Nós somos literalmente “mentes-pequena” na maior parte do tempo. E embora meditação e mindfulness (atenção plena) no coloca em direção à abertura, aceitação e abandono de nossos egos, os humanos continuam a se voltar para os psicodélicos para despertar-nos para as possibilidades de uma perspectiva universal.

Nem todas as drogas são criadas iguais, e eu nunca vou encorajar ninguém a aliviar seu desconforto existencial com heroína ou anfetaminas, ambas as quais eu já tomei. Mas os psicodélicos possuem um valor que não posso evitar de admirar. E agora nós entendemos mais sobre como eles fazem o que fazem. Um simples código libera os portões em nossos cérebros, portões que normalmente agem como muralhas.

Eu espero que essas descobertas dissipem apenas o suficiente para encorajar-nos a continuar explorando.


Matéria escrita originalmente por Marc Lewis para o The Guardian em 15/04/2016

Os efeitos do LSD sobre Cromossomos, Mutação Genética, Desenvolvimento Fetal e Malignidade

 

Apêndice II do LSD Psychotherapy,

© 1980, 1994 por Stanislav Grof
Hunter House Publishers, Alameda, Califórnia.
ISBN 0-89793-158-0 (edição de 1994, paperback)


Na última década, uma nova dimensão grave foi adicionado à controvérsia sobre o LSD. Uma série de trabalhos científicos foram publicados indicando que LSD pode causar mudanças estruturais nos cromossomos, mutações genéticas, distúrbios do desenvolvimento embrionário, e degeneração maligna das células. No entanto, um número comparável de publicações contestam a veracidade dessas alegações. Alguns são estudos experimentais independentes que mostraram resultados negativos, outros criticam os documentos originais por graves deficiências conceituais e metodológicas. Apesar de todo o trabalho experimental feito nesta área, em que há grande dispêndio de tempo e energia, os resultados são ambíguos e contraditórios. Parece oportuno incluir neste livro uma revisão crítica de toda a pesquisa relevante, porque a questão é extraordinariamente importante para o futuro da psicoterapia com LSD.

A discussão a seguir é baseada quase que exclusivamente no estudo cuidadoso da literatura existente. Tenho muita experiência de pesquisa em primeira mão nesta área, e a genética não é a minha área primária de interesse e experiência. No estudo realizado com LSD no Instituto de Pesquisa Psiquiátrica em Praga, nós não examinamos o efeito do LSD nos cromossomos ou suas implicações para a hereditariedade; naquele tempo não havia observações experimentais ou clínicas que sugerissem a necessidade de tais estudos. O primeiro trabalho que atraiu a atenção dos cientistas para esta área não apareceu até o final dos anos 1960. Após minha chegada nos Estados Unidos, participei de um grande estudo concentrando-me em alterações estruturais dos cromossomos nas células brancas do sangue após a administração de LSD. Este foi um dos poucos estudos genéticos, utilizando LSD puro farmacêutico, numa abordagem duplo-cego, e comparação das amostras antes e após a administração do fármaco.

O material discutido nesta revisão será dividido em vários grupos temáticos. O primeiro grupo inclui artigos descrevendo as alterações estruturais dos cromossomas produzidos por LSD ‘in vitro’, nestas experiências várias concentrações de LSD foram adicionadas às culturas de células de tecidos vegetais humana, animal, ou em um tubo de ensaio. O segundo grupo envolve estudos ‘in vivo’ de LSD; neste tipo de investigação do efeito, o LSD é estudado após a substância ter sido ingerida ou injetada em animais ou em seres humanos. Os trabalhos do terceiro grupo descrevem os resultados de experimentos que estudam a influência do LSD sobre os genes, e seus efeitos mutagênicos. Ele inclui um pequeno número de trabalhos relacionados com o mecanismo pormenorizado da ação de LSD no ácido desoxirribonucleico (DNA), o constituinte mais importante dos cromossomas. O quarto grupo consiste de publicações que descrevem as consequências da administração do LSD no crescimento, desenvolvimento e diferenciação de embriões humanos e animais. Finalmente, o quinto grupo compreende documentos sobre a possível ligação entre o LSD e o desenvolvimento de alterações malignas nas células, especialmente no caso de leucemia.

Nas seções seguintes, os achados mais relevantes destas cinco categorias temáticas serão brevemente revisados e avaliados criticamente.

 

O EFEITO DO LSD NA ESTRUTURA CROMOSSÔMICA

A possibilidade de indução de alterações estruturais nos cromossomas por agentes exógenos, tais como radiação, vírus, e uma variedade de produtos químicos, tem sido um assunto de grande interesse científico por um longo tempo. A controvérsia sobre genética e LSD começou em 1967, quando Cohen, Marinello e Back publicaram um artigo sugerindo que LSD deveria ser adicionado à lista de substâncias capazes de causar anormalidades nos cromossomos. Por causa do uso generalizado de LSD, esta informação criou vívido interesse no meio científico, e um número de investigadores concentraram sua atenção sobre esta área. Duas abordagens principais foram utilizadas nestes estudos; em alguns foi estudado o efeito do LSD nos cromossomas no tubo de ensaio (in vitro), em outras no organismo vivo (in vivo). As células que foram estudadas na maioria dos casos, foram as células brancas do sangue (linfócitos).

Nos estudos ‘in vitro’, as amostras de sangue foram retiradas de pessoas normais e saudáveis, sem histórico de uso de drogas por injeção, exposição à radiação, ou infecção viral recente. Após incubação a 37 ° centígrados, em meios apropriados, colcemide foi adicionado para parar a divisão celular na fase de metáfase. As células foram então colhidas, transformadas em preparações citológicas especificamente coradas e examinadas por microscopia de contraste de fase. Durante o período de incubação, o LSD dissolvido em água destilada estéril foi adicionado às culturas experimentais em várias concentrações.

Nos estudos ‘in vivo’, as amostras de sangue foram retiradas de indivíduos que haviam sido expostos a qualquer um ‘street acid’ (material ilícito supostamente contendo LSD) ou LSD farmacêutico puro. Na maioria desses estudos, os cromossomos foram examinados após a exposição ao LSD (abordagem retrospectiva); numa minoria destes estudos, os exames foram realizados antes e depois da administração do fármaco (abordagem potencial). O procedimento técnico empregue nos estudos ‘in vivo’ não diferiu significativamente do que foi descrito para a abordagem ‘in vitro’. Um subgrupo especial e bastante importante dos estudos ‘in vivo’ são os relatórios sobre a influência do LSD sobre os cromossomos das células germinativas (cromossomos meiose).

 

OS ESTUDOS ‘IN VITRO’

Cohen, Marinello e Back adicionaram LSD para leucócitos humanos cultivados obtidos a partir de dois indivíduos saudáveis. Usaram cinco concentrações variando, 001-10,0 microgramas de LSD por centímetro cúbico (cc), e o tempo de exposição foi de 4, 24, e 48 horas. A incidência de quebras cromossômicas para células tratadas foi de pelo menos o dobro de células de controle para todos os tratamentos, exceto na concentração mais baixa em tempo (0,001 microgramas de LSD por cc, durante quatro horas), onde não houve diferença entre as células tratadas e controle. Não houve relação linear simples entre a frequência dessas aberrações e a dosagem de LSD ou duração da exposição. Em um estudo posterior, Cohen, Hirschhorn e Frosch descreveram os resultados de um estudo mais amplo, no qual utilizaram culturas de leucócitos periféricos de seis pessoas normais, saudáveis; as concentrações de LSD e os tempos de exposição foram os mesmos que no estudo original. Eles encontraram uma inibição significativa da divisão celular (mitose) em adição do fármaco, em qualquer concentração. A supressão da mitose foi diretamente proporcional à duração da exposição. A menor frequência de quebra cromossômica entre os controles foi de 3,9 por cento das células; entre as culturas tratadas, a menor frequência foi quase duas vezes o controle (7,7 por cento) e variou de mais de quatro vezes o valor controle (17,5 por cento).

Em 1968, Jarvik et al. tentaram replicar algumas das experiências ‘in vitro’ do grupo de Cohen. Além de LSD, eles usaram como teste as substâncias ergonovina (a droga comumente usada na prática obstétrica), aspirina e streptonigrine. Eles encontraram uma maior incidência de quebras de cromossomas nas amostras de LSD (10,2 por cento com a gama de 0,0-15,0), em comparação com as amostras de controle (5,2 por cento, com a gama de 0,0-9,0). Eles descobriram, no entanto, aproximadamente a mesma taxa de ruptura com aspirina (10,0 por cento) e ergonovina (9,6 por cento). A concentração de LSD em sangue utilizadas neste estudo se aproxima do nível alcançado uma a quatro horas após a injeção de 1.000 microgramas de LSD. Por outro lado, o nível de aspirina utilizada foi consideravelmente abaixo do nível terapêutico comum. Streptonigrine, uma substância com um efeito dramático bem conhecido nas cromossomas, promoveu uma ruptura induzida em 35 por cento das células examinadas de cromossomas. É interessante notar que dois dos oito casos descritos neste documento não responderam ao LSD com um aumento de quebras cromossômicas.

Corey et al. realizaram um estudo ‘in vitro’, em dez indivíduos; 1 micrograma por cc de LSD foi adicionado à cultura durante as últimos vinte e quatro horas de incubação. Os autores encontraram um aumento de quebras cromossômicas em todos os dez indivíduos. Embora a concentração ‘in vitro’ de LSD tenha sido muito maior do que qualquer dosagem ingerida comparavelmente conhecida, o aumento significativo de 4,65 quebras por 100 células foi pequena em comparação com a gama de frequências (0,0-15,2) observada nas culturas não tratadas.

Neste contexto, é interessante mencionar que Singh, Kalia e Jain encontraram uma maior incidência de quebras cromossômicas nas células da raiz cevada como resultado da exposição ao LSD na concentração de 25 microgramas por cc. Por outro lado, MacKenzie e Stone relataram resultados negativos das experiências com linfócitos, fibroblastos de hamsters e sobre a planta ‘Vicia faba’.

Os achados de alterações estruturais nos cromossomos após a administração de LSD acima mencionados se tornou a base de especulações sobre a possível influência dessa droga sobre mutações genéticas, desenvolvimento fetal e malignidade. Na atmosfera de histeria nacional então existente, o relatório original de Cohen, Marinello e Back que foi amplamente divulgado pelos meios de comunicação de massa. Como resultado, o significado de suas descobertas foram consideravelmente mais enfatizados, e muitas conclusões prematuras foram atraídas para as quais não havia justificativa científica suficiente.

Vários fatos importantes têm de ser levados em consideração antes de podermos tirar conclusões substanciais dos achados de aumento de quebras cromossômicas associadas com LSD nos experimentos ‘in vitro’. Deve-se ressaltar que as próprias conclusões não foram completamente consistentes. Em vários estudos não havia indícios de aumento de quebras cromossômicas após a exposição ao LSD. Além disso, as concentrações de LSD e durações de exposição utilizadas nestes estudos eram geralmente muito maiores do que aqueles que ocorrem no organismo humano depois da ingestão de LSD em dosagens normalmente utilizadas. Cohen, Marinello e Back, eles próprios não encontraram aumento de ruptura dos cromossomas na concentração mais baixa em tempo (0,001 microgramas de LSD por cc, durante quatro horas). Loughman et al. salientou que é precisamente a concentração mais baixa e a duração de exposição utilizado neste estudo que mais se aproxima da concentração esperada no sangue, fígado e outros órgãos após uma dose de 100 microgramas de LSD ingeridas por um homem de 70 kg. Se a degradação metabólica do LSD é considerada, então a concentração eficaz ‘in vivo’ do LSD inalterado seria consideravelmente inferior a este, aproximando 0,0001 microgramas por cc, uma concentração utilizada apenas por Kato e Jarvik, que não encontrou nenhum aumento na quebra desta dosagem.

Em geral, todo cuidado é necessário na extrapolação dos resultados ‘in vitro’ para a situação no organismo vivo. O organismo humano intacto difere de células isoladas no tubo de ensaio em sua enorme complexidade e na sua capacidade de desintoxicar e excretar compostos nocivos. As substâncias que são tóxicas ‘in vitro’ não têm necessariamente o mesmo efeito ‘in vivo’. Além disso, algumas das técnicas utilizadas nos estudos em vitro pode criar uma situação artificial e introduzir fatores que não existem no organismo vivo. Esta questão tem sido discutida em detalhes em uma excelente revisão sobre LSD e dano genético por Dishotsky et al. Estes autores apontam para o fato de que todos os estudos em culturas de linfócitos foram utilizadas modificações de uma técnica na qual os linfócitos são estimulados por fito-hemaglutinina para entrar no ciclo celular reprodutivo. No estado normal ‘in vivo’, linfócitos pequenos se encontram numa fase de crescimento que precede a síntese de DNA; eles não crescem, se dividem ou entram no ciclo celular. Assim, nos estudos ‘in vitro’, os linfócitos são expostos a agentes químicos durante a fase de desenvolvimento do ciclo celular, incluindo a síntese de DNA, o qual normalmente não ocorrem nessas células do corpo. Danos a um linfócito nesta fase geralmente não se manifestará como no tipo cromátide de mudança de uma divisão subsequente. A maioria, se não todas as alterações do tipo de cromatídeos, são iniciadas por processos técnicos, e a grande maioria de lesões relatados na ‘in vitro’ e ‘in vivo’ eram do tipo cromatídeos. As conclusões de um aumento da taxa de ruptura cromossômica em linfócitos expostos ao LSD ‘in vitro’ deve, portanto, ser interpretados com grande cautela.

Muitos estudos recentes acerca das mudanças estruturais causadas nos cromossomos por LSD deram a impressão de que este efeito foi algo específico e único. A maioria desses relatórios têm silenciosamente ignorado um fato que teria feito a questão muito menos interessante e sensacional. As alterações na estrutura cromossômica descrita não são exclusivamente causada por LSD; que pode ser induzida por uma variedade de outras condições e substâncias. Os fatores que têm sido conhecidos por causar a ruptura cromossômica ‘in vitro’ incluem radiação, mudanças de temperatura, variações de pressão de oxigênio, impurezas na água da torneira, a menos que seja destilada duas vezes, e uma variedade de vírus comuns. A longa lista de substâncias químicas que aumentam as taxas de ruptura cromossômicas contém muitos medicamentos comumente usados, incluindo a aspirina e outros salicilatos, adoçantes artificiais, o inseticida DDT, morfina, cafeína, teobromina, teofilina, tranquilizantes do tipo phenothiazine, algumas vitaminas e hormônios, e muitos antibióticos tais como aureomicina, cloromicetina, terramicina, estreptomicina e penicilina.

Neste contexto, é interessante citar Sharma e Sharma, que escreveram um resumo alargado da literatura sobre quebras cromossômicas induzidas quimicamente: “Desde a primeira indução de mutações cromossômicas por produtos químicos e a demonstração de definitivas quebras cromossômicas por Oehlkers, uma vasta multidão tão grande de produtos químicos têm mostrado possuir propriedades que quebram os cromossomos, que o problema tornou-se cada vez mais complexo”. Jarvik, discutindo o papel por Judd, Brandkamp e McGlothlin, foi ainda mais explícito: “… e é provável que qualquer composto adicionado no momento oportuno, na quantidade adequada, para o tipo de célula apropriada, irá causar quebras cromossômicas”.

Devido às limitações da abordagem ‘in vitro’, os estudos ‘in vivo’ são preferidos para avaliar os possíveis perigos genéticos associados com a administração de LSD. Infelizmente, dos vinte e um relatórios que foram publicados por dezessete laboratórios, muitos têm graves deficiências metodológicas e são mais ou menos inadequados, enquanto os relatórios individuais contradizem uns aos outros e os seus resultados globais são inconclusivos. Duas principais abordagens têm sido utilizadas em estudos ‘in vivo’. Em catorze desses projetos, os indivíduos foram expostos a substâncias ilícitas de composição e potências desconhecidas, alguns dos quais foram alegados como LSD. Em onze estudos, os indivíduos foram expostos a quantidades conhecidas de LSD farmacêutico puro em ambientes experimentais ou terapêuticos.

Dishotsky et al. publicaram uma revisão em que apresentou uma sinopse dos estudos desse tipo realizadas antes de 1971. De acordo com essa avaliação, de um total de 310 indivíduos estudados, apenas 126 foram tratados com LSD puro; os outros 184 indivíduos foram expostos a ilícitos ou “suposto” LSD. Dezoito dos 126 indivíduos (14,29 por cento) no grupo que recebeu LSD puro mostrou uma maior frequência de aberrações cromossômicas do que os controles. Em contraste, 89 dos 184 indivíduos (48,9 por cento) no grupo que tomou LSD ilícito mostrou um aumento na incidência de aberrações de mais de três vezes a frequência relatada por matérias dados como LSD farmacologicamente puro. Apenas 16,67 por cento (18 de 108) de todos os entrevistados que disseram ter danos cromossômicos receberam LSD puro. Há, portanto, uma boa razão para discutir as duas categorias de estudos ‘in vivo’, aqueles com puro e aqueles com “suposto” LSD, separadamente.

 

LSD ILÍCITO E O DANO CROMOSSÔMICO

Os resultados iniciais de danos cromossômicos em usuários de LSD ilícito foram relatados por Irwin e Egozcue. Eles compararam um grupo de oito utilizadores de LSD ilícito com um grupo de nove controles. Os usuários tiveram uma taxa de quebra média de 23,4 por cento, mais que o dobro da taxa de 11,0 por cento nos controles. Apenas dois dos oito usuários não tiveram aumentada as taxas de ruptura. Em um estudo posterior e mais extenso realizado por Egozcue, Irwin e Maruffo, a taxa de quebra média de quarenta e seis usuários de LSD ilícito foi 18,76 por cento (com um intervalo entre 8 e 45 por cento); este foi mais que o dobro da taxa de 9,03 por cento encontrados em células de controle. Apenas três dos quarenta e seis usuários não tiveram uma taxa de ruptura maior do que a taxa média de controle. Além disso, os autores estudaram os cromossomos de quatro crianças expostas ao LSD no útero. Todos os quatro apresentaram taxas de ruptura acima do valor de controle de média. Não houve evidência de doença ou malformação física em qualquer destas crianças.

Estes resultados foram apoiados por Cohen, Hirschhorn e Frosch, que estudaram dezoito indivíduos expostos ao LSD ilícito. Eles descreveram um aumento da quebra cromossômica neste grupo (média de 13,2 por cento), o que era mais do que o triplo do grupo controle (3,8 por cento). Os autores também examinaram os cromossomos de quatro filhos de três mães que tomaram LSD durante a gravidez. A frequência de quebras cromossômicas foi elevada em todos os quatro, e foi maior nas duas crianças que foram expostas ao LSD durante o terceiro e quarto meses de gravidez do que nos dois bebês expostos a baixas doses de LSD no final da gravidez.

Num artigo posterior, Cohen et al. relataram que treze adultos expostos a LSD ilícito apresentaram taxas de quebras cromossômicas que estavam acima da média controle. Em nove crianças expostas ao LSD ilícito ‘in utero’, eles encontraram uma quebra média de 9,2 por cento, em comparação com 4,0 por cento em quatro crianças cujas mães haviam usado LSD ilícito antes, mas não durante a gravidez. A taxa de ruptura no grupo controle foi de 1,0 por cento. Todos, mais dois filhos, tinham sido expostos a outras drogas durante a gravidez; todos estavam em boas condições de saúde e não apresentaram defeitos de nascimento.

Nielsen, Friedrich e Tsuboi constataram que os seus dez indivíduos expostos ao LSD ilícito tiveram uma taxa de quebra média de 2,5 por cento; esta foi significativamente maior do que a do grupo de controle (0,2 por cento). No entanto, a taxa de 2,5 por cento alegadamente patológica, é menor do que a dos controles em outros estudos positivos.

Um número de pesquisadores não foram capazes de demonstrar o aumento quebras cromossômicas em usuários de LSD. O papel sinóptico feito por Dishotsky et al., cita nove grupos de pesquisadores que relataram resultados negativos dos estudos semelhantes. No presente momento, por conseguinte, os resultados dos estudos ‘in vivo’ são considerados bastante controversos, e no melhor dos casos, inconclusivos.

Muitos investigadores têm tentado oferecer explicações para as discrepâncias existentes entre os relatórios positivos e negativos. Alguns criticaram a taxa de ruptura para os controles nos estudos de Cohen et al. (3,8 por cento) e Irwin e Egozcue (11,9 por cento e 9,03 por cento) como sendo anormalmente elevada. Outros sugeriram que os altos valores de controle poderiam ter resultado de contaminação viral das culturas, meios que interferem com o reparo do cromossomo, variação técnica em cultura de células, e a abordagem da avaliação de cromossomo insuficientemente fortificada. Também foi apontado que nesses estudos, do tipo de cromossomos e do tipo cromátide nas mudanças não foram relatados separadamente, mas foram combinados e então convertidas em “números equivalentes de pausas”. A combinação dos dois tipos de aberrações em um único índice obscurece a distinção entre danos nos cromossomas real que ocorrem ‘in vivo’ e danos que surgem no decurso da cultura de células.

No entanto, esses fatores não podem explicar as discrepâncias entre os resultados de várias equipes de investigadores. Se o fizessem, as aberrações decorrentes desses efeitos seriam distribuídos aleatoriamente entre os grupos expostos ao LSD ilícito e os grupos controle. Como a distribuição é desigual, esses fatores não explicam as taxas de ruptura significativamente elevadas em oitenta dos oitenta e seis indivíduos expostos ao LSD ilícito estudados por Cohen et al. e por Irwin e Egozcue.

Uma pista muito mais importante para a compreensão desta controvérsia parece estar relacionada a determinadas características do grupo dos “usuários de LSD”. Nesse tipo de pesquisa, os investigadores dependem da recordação e confiabilidade dos sujeitos na determinação do tipo de drogas que eles usaram no passado, o número e a frequência das exposições, as alegadas doses e intervalo desde a última exposição. Mesmo nos casos em que os relatórios são precisos, os indivíduos geralmente não sabem o conteúdo e a qualidade das amostras que estão usando. O conteúdo de LSD puro nas amostras de LSD ilícitas é quase sempre questionável, há várias impurezas e adições bastante frequentes. As amostras analisadas no passado tem demonstrado que contêm anfetaminas, mescalina, DOM (4-metil-2, 5-dimethoxyamphetamine, também chamado STP), fenilciclidina (phenylcyclohexylpiperidine, PCP ou “pó de anjo”), benactizina e mesmo estricnina. Além disso, todos os sujeitos testados utilizaram ou abusaram de outras drogas além do LSD. Estes medicamentos incluíram, entre outros, Ritalina, fenotiazinas, álcool, anfetaminas, cocaína, barbitúricos, heroína e outros opiáceos, e várias substâncias psicodélicas, como a maconha, haxixe, a psilocibina, a mescalina, STP, metilenodioxianfetamina (MDA), e dimetiltriptamina (DMT) . Dadas as circunstâncias, se questiona a lógica de se referir a este grupo em trabalhos científicos como “usuários de LSD”. A maioria destes pacientes eram, na verdade, os utilizadores de múltiplas drogas ou abusadores expostos a uma variedade de produtos químicos de composição, qualidade e potências desconhecidas.

Além disso, tem sido repetidamente relatado que essa população sofria de desnutrição e tinha muito elevadas as taxas de doenças venéreas, hepatite e várias outras infecções virais. Foi mencionado acima que os vírus são um dos fatores mais comuns a causarem lesões cromossómicas; o possível papel da desnutrição continua a ser avaliado. Dishotsky et al. concluíram suas revisões dos estudos ‘in vivo’ envolvendo LSD ilícito, relacionando os achados de aumento de quebras cromossômicas a uma combinação de fatores, como ao longo prazo excessivo de exposição a agentes químicos ilícitos, a presença de contaminantes tóxicos, a via de administração intravenosa e a debilidade física de muitos usuários de drogas. De acordo com eles, os resultados positivos, quando encontrados, estão relacionados com os efeitos mais gerais do abuso de drogas e não, como inicialmente relatado, especificamente para o uso de LSD.

 

LSD PURO E O DANO CROMOSSÔMICO

Estudos cromossômicos de pessoas que receberam LSD farmacêutico puro num quadro experimental ou terapêutico são muito mais relevantes e confiáveis como fonte de informação do que os estudos de usuários de drogas ilícitas. Nestes estudos, não há incerteza quanto a pureza, a dosagem, frequência de exposição e o intervalo entre a última exposição e amostragem de sangue. Duas abordagens diferentes podem ser distinguidas nos estudos cromossômicos usando LSD puro. Os estudos do primeiro tipo são retrospectivos e usaram um design “post hoc”; examinam as alterações cromossômicas em indivíduos que foram expostos ao LSD puro no passado. Os estudos do segundo tipo são em perspectiva; os padrões cromossômicos são examinados antes e após a exposição ao LSD, e cada sujeito serve como seu próprio controle.

‘Estudos Retrospectivos de Mudanças Cromossômicas nos Usuários de LSD Puro’. Uma revisão dos estudos nesta categoria revela que apenas dois grupos de investigadores relataram um aumento da taxa de quebras cromossômicas em seus assuntos. Cinco outras equipes não conseguiram confirmar estes resultados positivos.

Cohen, Marinello e Back relataram em seus estudos iniciais que eles encontraram danos cromossômicos nas células brancas do sangue de um paciente esquizofrênico paranoico que tinha sido tratado quinze vezes no passado com LSD em doses entre 80 e 200 microgramas. Nielsen, Friedrich e Tsuboi examinaram os cromossomos de cinco pessoas tratadas com LSD e não encontraram “nenhuma correlação entre qualquer medicamento específico e a frequência de falhas, quebras, e células hiperdiploide”. Os autores mais tarde reagruparam seus dados, formando pequenos grupos em função da idade e do sexo. Após esta revisão do material original, eles concluíram que o LSD induzia danos cromossômicos. Tjio, Pahnke e Kurland criticaram este estudo com base no número insuficiente de células analisadas para uma determinação fiável de taxas de ruptura. Três dos cinco indivíduos/LSD estudados não tinham aberrações cromossômicas, e os dois indivíduos restantes foram responsáveis por todas as seis quebras encontradas. Além disso, a taxa de quebra de 1,7 por cento ainda está dentro dos valores reportados para a população em geral. Outro estudo realizado pela Nielsen, Friedrich e Tsuboi, que geraram um aumento da taxa de quebra de 4,3 por cento em um grupo de nove ex-usuários de LSD tem sido criticado por Dishotsky et al., com base na sua abordagem diferente para a análise de dados.

Sparkes, Melnyk e Bozzetti não encontraram um aumento na quebra de cromossomas em quatro pacientes tratados com LSD no passado por razões médicas, resultados negativos também foram relatados por Bender e Siva Sankar, que examinaram os cromossomos de sete filhos esquizofrênicos que tinham sido tratadas no passado, por administração prolongada de LSD. Estas crianças receberam diariamente LSD em duas doses divididas de 100 a 150 microgramas por um período de semanas ou meses. A frequência de ruptura dos cromossomas neste grupo foi inferior a 2 por cento e não diferiu da do grupo de controle.

Siva Sankar, Rozsa e Geisler estudaram os padrões de cromossomos em quinze crianças com problemas psiquiátricos que receberam LSD, UML ou uma combinação de ambos. LSD foi administrado diariamente; a dose média para a totalidade do grupo foi de 142,4 microgramas por dia por paciente, e a duração do tratamento variou de 2 a 1366 dias. A taxa de ruptura para o grupo tratado com o LSD foi de 0,8 por cento, para o grupo tratado com ambos LSD e UML 1,00 por cento. Isto não foi significativamente mais elevada do que a taxa de quebra nos controles. Os pacientes neste estudo receberam LSD dois a quatro anos antes de os estudos cromossômicos. Os autores admitiram que os efeitos do LSD sobre os cromossomos de leucócitos pode ter sido retificado por um longo período de tempo. Em qualquer caso, isto indica que a terapia de LSD e seus efeitos sobre os cromossomas não é duradoura.

Tjio, Pahnke e Kurland publicaram os resultados da análise dos cromossomos de um grupo de oito indivíduos “normais” que receberam LSD puro em experimentos de pesquisa 1-26 vezes, dois a quinze meses antes de dar a amostra de sangue. A taxa de aberração cromossômica total média para este grupo foi de 2,8 por cento, e a taxa individual em nenhum deles ultrapassou o pré-LSD médio de 4,3 por cento encontrados nas amostras por pacientes.

Corey et al. relataram o resultado de um estudo cromossômico retrospectivo de dezesseis pacientes, cinco dos quais tinham sido tratados apenas com LSD, cinco com mescalina, e seis com LSD mais mescalina. Nos onze indivíduos que foram tratados clinicamente com doses de LSD que variam de 200 microgramas para 4.350 microgramas, a frequência de quebras cromossômicas não diferiu daquela encontrada nos treze controles. As respectivas frequências foram de 7,8 por cento para o LSD, 5,6 por cento para a mescalina, 6,4 por cento para LSD mais mescalina, e 7,0 por cento para o grupo controle.

Em um estudo inédito, Dishotsky et al. examinaram os cromossomos de cinco indivíduos expostos no passado com LSD puro. A taxa de ruptura média neste grupo (0,40 por cento) não foi significativamente diferente do das oito pessoas de controle (0,63 por cento). Em seu artigo de revisão, Dishotsky et al. indicam que cinquenta e oito de setenta (82,9 por cento) dos indivíduos estudados após o tratamento com LSD puro não tiveram danos cromossômicos. Por causa de dados incompletos sobre nove dos restantes doze sujeitos, eles não foram capazes de calcular a percentagem exata de indivíduos com taxas de ruptura elevadas. No entanto, eles estimaram que este valor se situaria entre 17,1 por cento e 4,9 por cento. Todos, exceto um dos doze temas, foram relatados por uma única equipe de investigadores. Os autores concluíram que, em vista dos procedimentos, dados incompletos, reanálise questionável dos dados, e as taxas de ruptura relatados como baixos, não há nenhuma evidência definitiva deste tipo de experimento que o LSD puro provoca danos cromossômicos.

‘Estudos Prospectivos de Mudanças Cromossômicas em Usuários de LSD Puro’. Os estudos que compararam as alterações cromossômicas, antes e após a exposição ao LSD puro, representam a abordagem científica mais adequada para o problema do ponto de vista metodológico, e são a fonte mais confiável de informações científicas. O primeiro relatório nesta categoria foi publicado em 1968 por Hungerford et al. que examinou os cromossomos de três pacientes psiquiátricos antes e após administrações terapêuticas repetidas de LSD. Amostras de sangue foram coletadas de todos os pacientes antes de qualquer terapia de LSD, uma hora antes e uma hora e 14 horas após cada dose; amostras de acompanhamento foram feitas em intervalos de um a seis meses. Observou-se um aumento de aberrações cromossômicas após cada uma das três injeções intravenosas de LSD. O aumento foi pequeno em dois dos três indivíduos; Contudo, os números dicêntricos e multiradial apareceram somente após o tratamento, e fragmentos acêntricos apareceram com mais frequência após o tratamento. No estudo que deu seguimento, um retorno aos níveis anteriores foi observado em todos os três pacientes. Os dados deste estudo indicam que o LSD puro pode produzir aumentos transitórios de anormalidades cromossômicas, mas que estes não são mais evidentes depois de um mês após a administração da dose final. Os resultados foram ligeiramente complicados pela administração de clorpromazina (Torazina), que por si só pode produzir aberrações cromossômicas. É interessante notar que o estudo de Hungerford é o único em que o LSD foi administrado por via intravenosa.

 

AS ALTERAÇÕES CROMOSSÔMICAS EM CÉLULAS GERMINAIS

No passado, os resultados positivos de alguns estudos cromossômicos foram usados como uma base de longo alcance para especulações sobre os perigos hereditários associados ao LSD. Jornalistas, e também vários trabalhadores científicos, descreveram suas visões apocalípticas sobre a descendência de usuários de LSD. Tais especulações eram bastante prematuras, e insuficientemente fundamentadas em dados experimentais. O raciocínio que se refere a alterações estruturais dos cromossomos como “dano” e relaciona-os automaticamente para riscos genéticos tem graves lacunas na sua lógica. Na realidade, não é muito claro se ou não as mudanças estruturais nos cromossomos das células brancas do sangue têm qualquer significado funcional, e se eles estão associados com anormalidades genéticas. Existem muitas substâncias químicas que causam quebras cromossômicas, mas não têm efeitos adversos sobre a mutação genética ou o desenvolvimento fetal. A complexidade deste problema pode ser ilustrado com o caso de vírus. Uma variedade de doenças virais (como herpes simplex e herpes, sarampo, catapora, gripe, febre amarela, e, possivelmente, caxumba) induziram dano cromossômico marcado sem causar malformações fetais. De acordo com Nichols, uma das exceções é a rubéola (sarampo alemão), uma doença que é conhecida por causar malformações fetais graves, quando adquirida pela mãe no primeiro trimestre da gravidez.

Além dos problemas metodológicos envolvidos e a inconsistência das conclusões acima discutidas, um fato mais importante tem de ser levado em consideração. Em todos os estudos citados, o efeito de LSD ilícito ou puro, ‘in vitro’ ou ‘in vivo’, foi avaliado nos cromossomas das células brancas do sangue. Sem conclusões diretas sobre os perigos hereditários associados com a administração de LSD pode ser desenhado com base nestes estudos que os linfócitos não estão envolvidos nos processos reprodutivos. Especulações sobre tais perigos poderiam ser feitas apenas com base em achados cromossômicos em células germinativas, tais como os espermatozoides e óvulos, ou as células precursoras. Infelizmente, os poucos estudos existentes sobre os cromossomos de células germinativas (os chamados cromossomos meióticos) apresentaram resultados inconclusivos tanto quanto os estudos dos cromossomos de células somáticas.

Skakkebaek, Phillip e Rafaelsen estudaram cromossomos meióticos de seis camundongos saudáveis do sexo masculino injetados com altas doses de LSD (1.000 microgramas por kg); o número de injeções e os intervalos entre as exposições foram variadas. Várias quebras cromossômicas, lacunas e fragmentos não identificáveis foram encontrados nos animais tratados, mas, com poucas exceções, não nos animais de controle. Os autores consideram que a sua tentativa de encontrar evidências de que altas doses de LSD podem influenciar cromossomos meióticos em camundongos. Eles admitiram que o número de anormalidades foram pequenas e os erros técnicos não podem ser excluídos, mas concluíram que as alterações encontradas poderiam ter influência sobre a fertilidade, o tamanho da maca, e o número de malformações congênitas. Num estudo posterior, Skakkebaek e Beatty injetaram em quatro camundongos, por via subcutânea, doses de 1.000 microgramas de LSD por kg duas vezes por semana durante cinco semanas. Análise realizada numa base cega mostrou uma frequência elevada de anormalidades em dois dos ratos tratados. Além disso, os espermatozoides de ratinhos tratados com LSD também mostraram diferenças morfológicas, com um lado convexo mais arredondado da cabeça, cabeças mais amplas, em geral. O significado prático destes resultados é consideravelmente reduzido pelo fato de que as dosagens usadas superam qualquer coisa usada na prática clínica. Uma dose comparável em humanos viria a 60,000-100,000 microgramas por pessoa, o que é 100 a 1000 vezes mais do que as doses normalmente utilizadas em trabalho experimental e clínica com LSD.

Outro resultado positivo de danos cromossômicos meióticos induzidos por LSD foi relatado por Cohen e Mukherjee. Estes autores injetaram em treze ratinhos machos uma única dose de LSD a uma concentração de 25 microgramas por kg. Neste estudo as células meióticas foram aparentemente menos vulneráveis do que as células somáticas. No entanto, houve um aumento de dez vezes em danos nos cromossomos óbvios entre os ratinhos tratados com o LSD. Este atingiu um máximo entre dois e sete dias após a injeção, com uma diminuição subsequente e retorno a níveis quase normais depois de três semanas. Com base nas evidências de estudos citogenéticos clínicos em humanos, os autores concluíram que as anomalias cromossômicas desse tipo pode levar à redução da fertilidade, anomalias congênitas e perda fetal.

Os outros estudos existentes sobre o efeito de LSD em células meióticas trouxe resultados essencialmente negativos. Egozcue e Irwin estudaram os efeitos da administração de LSD em ratinhos e macacos Rhesus. Os ratinhos neste estudo receberam 5 microgramas de LSD por kg diariamente numa série de injeções crescente de um a dez. Quatro adultos machos de macacos Rhesus ingeriram doses de 5, 10, 20 ou 40 microgramas de LSD por kg. Seis meses após a dose única do LSD, três dos quatro macacos receberam outras doses cada, em intervalos de dez dias, de 40 microgramas de LSD por kg em doses. Os autores relataram resultados essencialmente negativos em ambos os ratos e os macacos. Em camundongos, obtiveram quebras cromossômicas ocasionais e fragmentos foram observados em proporções semelhantes nos grupos controles e experimentais. Nos macacos Rhesus, não foram encontradas diferenças significativas, antes ou após o tratamento agudo ou crônico.

Jagiello e Polani publicou os resultados de um estudo detalhado e sofisticado do efeito do LSD sobre as células germinativas do rato. Eles realizaram experiências agudas e crônicas em ambos os sexos de camundongos, masculino e feminino. A dosagem de LSD em experiências crônicas variaram entre 0,5-5,0 microgramas; nas experiências agudas foi administrada uma dose única subcutânea de 1.000 microgramas de LSD por kg. Os resultados deste estudo foram essencialmente negativos. Os autores atribuíram as discrepâncias com outros estudos para o modo de administração, posologia e da estirpe animal envolvida.

Em dois dos estudos existentes, os efeitos do LSD nos cromossomas meióticos foram testados na mosca da banana, ‘Drosophila melanogaster’, um organismo que tem desempenhado um papel importante na história da genética. Em um desses estudos, Graça, Carlson e Goodman injetaram num macho concentrações de 1, 100 e 500 microgramas por cc. A dosagem utilizada é equivalente a cerca de um litro da mesma solução em seres humanos (1000, 100.000 e 500.000 microgramas, respectivamente). Nenhuma quebra cromossômica foi observada nos espermatozóides pré-meióticos, meiose ou pós-meiótico. Os autores concluíram que o LSD é uma classe bastante distinta da de radiação ionizante e gás mostarda. Se é um agente mutagênico ou radiomimético em cromossomas humanos, não é um muito poderoso. Em outro estudo, Markowitz, Brosseau e Markowitz alimentaram com LSD as os machos da fruta em uma solução de sacarose a 1 por cento durante vinte e quatro horas; as concentrações utilizadas foram de 100, 5.000 e 10.000 microgramas por cc. Nestas experiências, o LSD não teve nenhum efeito detectável sobre a ruptura dos cromossomas. Os autores concluíram que o LSD é um agente de quebra do cromossomo relativamente ineficaz em ‘Drosophila’.

Considerável cautela é necessária à extrapolação dos dados sobre o efeito de LSD nos cromossomos meióticos obtidos a partir de experimentos com animais para os seres humanos, por causa de uma pouco ampla variabilidade entre espécies. O único relatório sobre o efeito de LSD em células germinais humanas foi publicada por Hulten et al. Esses autores examinaram a biópsia testicular em um paciente que tinha usado doses maciças de LSD ilícito no passado, até a uma alegada 1.000 microgramas. Por um período de quatro semanas, ele praticou a administração dessas doses diárias. Não houve evidência de um aumento da frequência de aberrações cromossômicas estruturais no tecido germinal dos testículos.

Concluindo esta discussão dos efeitos do LSD na estrutura cromossômica, pode-se dizer que os resultados dos estudos existentes são inconclusivos apesar do fato de que as dosagens utilizadas em muitas experiências excedem em muito as doses utilizadas na prática clínica. Se LSD provoca alterações estruturais nos cromossomos ou não, continua a ser uma questão em aberto. Se isso acontecer, as circunstâncias, a dosagem e o intervalo em que estes ocorrem não foram estabelecidos, e a interpretação dessas mudanças e da sua importância funcional é ainda mais problemática. Esta questão não pode ser respondida, mesmo com base em resultados de estudos cromossômicos metodologicamente perfeitos. Em pesquisas futuras, muito mais ênfase deve ser colocada no estudo do efeito de LSD em mutação genética e desenvolvimento embrionário.

 

EFEITOS MUTAGÊNICOS DO LSD

No passado, o animal experimental clássico para o estudo de mutações genéticas foi a mosca de banana, ‘Drosophila melanogaster’. Vários estudos existem em que o efeito do LSD em mutação genética tem sido observado nesta mosca. Grace Carlson e Goodman estudaram os efeitos mutagênicos de injeções intra-abdominais de LSD em concentrações que variam de 1 a 500 microgramas por cc. Eles não encontraram um aumento na mutações induzidas no grupo tratado com LSD. Na base destes resultados negativos, os autores consideram ser improvável que o LSD induza a mutação em seres humanos. Markowitz, Brosseau e Markowitz alimentaram com LSD moscas machos, em concentrações de 100, 5.000 e 10.000 microgramas por cc. Neste experimento, o LSD produziu um aumento significativo na frequência de mutações letais recessivas ligadas ao sexo. Os autores concluíram que o LSD em concentrações elevadas é um agente mutagênico fraco em Drosophila.

Em vários estudos realizados em ‘Drosophila’, a menor concentração de LSD não teve efeitos mutagênicos, mas um aumento da frequência de mutações induzidas foi observado após doses excessivas. Vann relatou que doses de 24 mil microgramas por kg não produziu nenhum aumento significativo na frequência de letais recessivos, enquanto que uma dose de 470 mil microgramas por kg o fez. Browning administrou injeções intraperitoneais de 0,3 microlitros de uma solução contendo 10.000 microgramas por cc de LSD; esta dosagem corresponde a cerca de 4.000.000 microgramas por kg de peso corporal. Fora de setenta e cinco moscas, apenas quinze sobreviveram a esse procedimento, e dez eram férteis. Nestas circunstâncias, um aumento significativo em mutações letais recessivos no cromossomo X de moscas macho foi observado pelo autor. A diluição 1:1 da solução inicial, quando injetado em cem machos, resultou em trinta e cinco sobreviventes das quais trinta estavam férteis; a frequência de mutações marcadamente caiu. Sram concluiu, com base em suas experiências com LSD na mosca ‘Drosophila’ que o LSD produz mutações genéticas e cromossômicas apenas quando utilizado em concentrações muito elevadas, é um mutagênico fraco; este achado está de acordo com o básico da literatura existente sobre os efeitos mutagênicos de LSD.

Os efeitos do LSD foram também testados em outro sistema genético padrão, ou seja, o fungo ‘Ophistoma multiannulatum’. Zetterberg expôs as células deste fungo de 20-50 microgramas por cc de LSD; ele não encontrou qualquer diferença entre as células tratadas e controle. Os dados sobre moscas ‘Drosophila’ e fungos sugerem que o LSD é um agente mutagênico fraco que só é eficaz em doses muito superiores aos comumente usado por seres humanos.

Existem vários estudos interessantes com foco na interação de LSD com ácido desoxirribonucleico (DNA) e ácido ribonucleico (RNA); estes estudos podem contribuir para a nossa compreensão do mecanismo de interação entre o LSD e os cromossomos ou genes. Yielding e Sterglanz, usando métodos espectrofotométricos, foram capazes de demonstrar a ligação do LSD, o seu isómero óptico inativo, e o seu análogo bromado inativo por ADN helicoidal do timo de vitela. A ligação não ocorreu com RNA ou DNA de levedura ‘nonhelical’, sugerindo que esta ligação é específica para DNA helicoidal.

Wagner conclui, com base em suas experiências, que o LSD interage diretamente com o DNA de timo de vitela purificada, provavelmente por intercalação, causando alterações conformacionais no DNA. De acordo com ele, é pouco provável que isso poderia influenciar a estabilidade interna da hélice de DNA o suficiente para causar ruptura cromossômica. No entanto, isso pode levar à dissociação de histonas, que poderiam tornar o DNA suscetível ao ataque enzimático. Smythies e Antun realizaram experimentos semelhantes e chegaram à conclusão de que o LSD se liga a ácidos nucleicos por intercalação. De acordo com Dishotsky et al., a evidência de LSD em intercalação na hélice do DNA fornece uma pista para o mecanismo físico envolvido nos efeitos mutagênicos de altas doses de LSD em ‘Drosophila’ e do fungo, como revisado acima.

Nosal investigou os efeitos do LSD sobre as células de Purkinje do cerebelo de ratos em crescimento. Estes estudos foram especificamente focados na ação de ribonucleoproteína (RNP) do sistema de núcleo-ribossomo diferenciação. Só as grandes doses de LSD (100-500 microgramas por kg) pareciam induzir mudanças na estrutura e coloração das propriedades deste sistema celular.

Obviamente, muito mais pesquisas são necessárias para o esclarecimento final da interação interessante entre LSD e várias substâncias químicas envolvidas nos mecanismos genéticos.

 

EFEITO TERATOGÊNICO DO LSD

Tem sido frequentemente hipótese no passado, que o LSD poderia ser uma causa potencial de abortos, perda fetal e malformações congênitas. Os estudos experimentais reais do efeito do LSD no desenvolvimento embrionário têm sido feitos principalmente em roedores. Como a transferência transplacentária livre de LSD foi demonstrada em um estudo realizado por autoradiografia de Idanpään-Heikkilä e Schoolar, é concebível que ele pode influenciar o desenvolvimento do feto. Neste estudo, o LSD injetado, rapidamente passa a barreira placentária para o feto; no entanto, de acordo com os autores, a afinidade relativamente elevada de LSD para os órgãos maternos pareceram diminuir a quantidade de droga disponível em transferência para o feto em si.

Os dados experimentais de camundongos, ratos e hamsters têm sido bastante controversos. Auerbach e Rugowski relataram uma alta taxa de malformações embrionárias em ratos após doses relativamente baixas de LSD administrados no início da gravidez. Em todos os casos as malformações induzidas envolviam defeitos cerebrais característicos. Anomalias na mandíbula inferior, mudanças na posição dos olhos e de alterações do contorno facial foram frequentemente associados com estes defeitos. Não houve efeito observável sobre o desenvolvimento embrionário e se a exposição ao LSD ocorreu mais tarde do que o sétimo dia de gestação. Estes resultados foram parcialmente apoiados por Hanaway, que experimentou LSD em ratinhos de uma estirpe diferente. Usando doses comparáveis, ele descreveu uma alta incidência de anormalidades na lente; no entanto, ele não foi capaz de descobrir qualquer malformação do sistema nervoso central, mesmo em exame histológico. DiPaolo, Givelber e Erwin administraram LSD para ratos e hamsters grávidas. A quantidade total de LSD injetado em camundongos variou de 0,5 microgramas até 30 microgramas por animal grávida; Hamsters sírios foram injetados com uma única dose que varia entre 10 e 300 microgramas. Os autores concluíram que a investigação não conseguiu demonstrar se o LSD é teratogênico em camundongos e hamsters sírios. Eles interpretaram o aumento da frequência de embriões malformados em algumas das experiências, como uma indicação de um efeito de potenciação de LSD em diferenças nos limiares individuais. É necessário ressaltar que as doses utilizadas neste estudo foram de 25 a 1.000 vezes a dose humana. Alexander et al. administraram 5 microgramas por kg de LSD a ratas prenhes. Eles descreveram um aumento significativo da frequência de natimorto e retardo de crescimento em duas das suas experiências em que o LSD foi administrado no início da gravidez. Na terceira experiência, onde os animais receberam injeções únicas similares de LSD no final da gravidez, não houve qualquer efeito óbvio na prole. Geber relatou um estudo em hamsters grávidas no qual ele administrou LSD, mescalina e um derivado bromado de LSD. Ele descreveu um acentuado aumento da frequência de nanismo, fetos mortos e fetos reabsorvidos nos grupos experimentais. Além disso, ele observou uma variedade de malformações do sistema nervoso central, tais como exencefalia, espinha bífida, meningocele interparietal, onfalocele, hidrocefalia, mielocele e hemorragias de áreas cerebrais locais, bem como edema ao longo do eixo da coluna vertebral e em várias outras regiões do corpo . As dosagens de LSD utilizados nesta experiência variou entre 0,8 microgramas por kg e 240 microgramas por kg. No entanto, não houve correlação entre a dose e o percentual de malformação congênita. O LSD e a mescalina produziram malformações semelhantes; mescalina parecia ser um agente teratogênico menos potente, como julgado pela dose.

Existem uma série de estudos em que os resultados negativos foram relatados em todas as espécies mencionadas. Roux, Dupois e Aubry, administraram doses de LSD de 5-500 microgramas por kg por dia para camundongos, ratos e hamsters. Não houve aumento da mortalidade fetal ou diminuição do peso médio dos fetos para qualquer grupo de animais experimentais. Não houve aumento significativo na incidência de malformações externas, e cortes realizados em aproximadamente 40 por cento dos animais experimentais não mostraram quaisquer malformações viscerais. Os autores concluíram, com base nos resultados, que nas três espécies estudadas, não foram observadas abortivos, fatores de crescimento deprimentes embrionários ou teratogênicos, mesmo após doses enormes.

Pelo menos quatro estudos sobre o efeito teratogênico do LSD realizados em ratos trouxe resultados negativos. Warkany e Takacz não encontraram anormalidades em seus ratos Wistar experimentais, apesar do fato de que eles usavam grandes doses de LSD (até oitenta vezes, dado por Alexander et al.), o único achado foi uma redução no tamanho de um dos jovens. Nosal administrou LSD a ratos fêmeas grávidas em doses de 5, 25 e 50 microgramas por kg no quarto e sétimo dias de gestação. Ele não observou malformações externas da cabeça, coluna vertebral e extremidades, ou lesões macroscópicas do sistema nervoso central e vísceras. Não houve diferenças em relação aos controles quanto à mortalidade e a reabsorção fetal ou redução no número e tamanho das crias, mesmo com dosagens mais elevadas. Os resultados negativos também foram obtidos em dois estudos realizados e publicados por Uyeno.

Fabro e Sieber (35) estudaram o efeito de LSD e talidomida no desenvolvimento fetal de coelhos brancos. A talidomida teve um efeito embriotóxico marcado e produziu um aumento na incidência de reabsorção, redução do peso fetal média, e malformações induzidas de fetos. Coelhas grávidas dado LSD em uma dosagem de 20 ou 100 microgramas por kg de peso corporal ninhadas produzidas as quais não foram significativamente diferentes dos controles. Diminuição do peso fetal médio em 28 dias foi o único efeito que poderia ser detectada nas ninhadas de não tratados com doses diárias tão elevadas como 100 microgramas por kg.

Como enfatizou Dishotsky et al., uma visão do conjunto de estudos com roedores, indica uma ampla gama de indivíduos, tensão, e susceptibilidade das espécies para os efeitos do LSD. O efeito, quando encontrado, ocorre num momento altamente específico no início da gestação; nenhum efeito foi relatado com exposições ocorridas no final da gravidez. Extrema cautela é necessária à extrapolação dos resultados dos estudos com roedores com a situação humana, uma vez que o desenvolvimento fetal e crescimento dessas espécies é marcadamente diferente. Roedores carecem das vilosidades coriônicas na placenta, de modo que o sangue fetal é separado dos seios maternos apenas por paredes endoteliais. Isso faz com que os roedores sejam muito mais sensíveis do que os humanos ao potencial teratogênico de uma determinada substância.

No estudo experimental existente apenas em primatas, Kato et al. administraram múltiplas injeções subcutâneas de LSD em macacos Rhesus grávidas. Dos quatro animais tratados, um teve um bebê normal, dois eram natimortos com deformidades faciais e um morreu de um mês. Os dois animais de controle tiveram prole normal. A dose usada neste estudo foi de mais do que 100 vezes a dose experimental normal para o ser humano. Os próprios autores concluíram que o pequeno tamanho de sua amostra tornou impossível tirar qualquer conclusão definitiva.

As informações sobre a influência do LSD sobre o desenvolvimento de embriões humanos é escassa e só existe sob a forma de observações clínicas. Por razões óbvias, este problema não pode ser abordado de forma experimental em seres humanos. Há seis casos notificados de crianças malformadas nascidas de mulheres que ingeriram LSD ilícito, antes ou durante a gravidez. Abbo, Norris e Zellweger descreveram uma criança que nasceu com uma anomalia congênita do membro. Ambos os pais da criança tinha tomado LSD de alegada desconhecida pureza e quantidade a partir de uma fonte não identificada em um número indefinido de vezes. A mãe ingeriu LSD quatro vezes durante a gravidez, duas vezes durante os primeiros três meses, que é o tempo em que os membros são diferenciados. Zellweger, McDonald e Abbo relataram o caso de uma criança que nasceu com uma deformidade complexa unilateral da perna. Esta anomalia, a chamada síndrome aplástica fibular, inclui ausência de fíbula, arqueamento anterior da tíbia encurtada, ausência de raios laterais do pé, encurtamento do fêmur, e luxação do quadril. Os pais desta criança tomou LSD ilícito, a mãe no dia 25 e três vezes entre o dia 45 e 98 depois de seu último período menstrual. Os autores enfatizaram o fato de que a sétima semana de gestação é o período de diferenciação mais ativo dos membros inferiores; este também foi estabelecido para a embriopatia talidomida. Hecht et al. observaram malformação do braço, no caso de uma criança cujos pais tinham tomado LSD e fumavam maconha. A mãe usou quantidades desconhecidas de LSD antes e durante a gravidez precoce. Os autores concluíram que a relação da deformação ao LSD, neste caso, não é clara. Carakushansky, Neu e Gardner relataram um caso similar. Tratava-se de uma criança com um déficit de terminal transversal das porções de dedos na mão esquerda e sindactilia da mão direita com os dedos mais curtos. Esta malformação é caracterizada por uma insuficiência dos dedos para separar e funcionar independentemente. A mãe acreditava ter sido exposta ao LSD e maconha durante a gravidez. Eller e Morton apresentaram um relatório de um bebê severamente deformada com uma anomalia envolvendo desenvolvimento defeituoso da parte torácica do esqueleto (displasia spondylothoracic). Esta condição rara havia sido descrita anteriormente apenas em filhos de pais porto-riquenhos. A mãe, neste caso, tomou LSD uma vez em torno do momento da concepção. Os autores questionam a relação causal entre o LSD e a deformidade. Finalmente, Hsu, Strauss e Hirschhorn publicaram o relatório de um bebê do sexo feminino nascido com malformações múltiplas, de pais que eram ambos usuários de LSD antes da concepção. Durante a gravidez, a mãe também usou maconha, barbitúricos e metedrina. As malformações neste caso foram associadas com aberrações cromossômicas que indicam a chamada síndrome de trissomia 13.

Berlin e Jacobson estudaram 127 gestações em 112 mulheres em que um ou ambos os pais admitiram tomar LSD antes ou após a concepção da criança. Segundo os autores, sessenta e duas gravidezes resultaram em nascidos vivos, seis dessas crianças tinham anormalidades congênitas, com um óbito neonatal. Um dos cinquenta e seis recém-nascidos normais morreu de uma hemorragia intrapulmonar. Sessenta e cinco gestações foram interrompidas por aborto; sete abortos foram espontâneos e quatro desses fetos eram anormais. Fora de catorze abortos terapêuticos, havia quatro fetos anormais. A taxa de defeitos do sistema nervoso central foi de cerca de dezesseis vezes maior do que na população normal. Uma das descobertas em todos os espécimes de aborto foi o fracasso da fusão do córtex. Três das seis crianças anormais nascidas vivas tinham mielomeningocele e hidrocefalia; um tinha apenas hidrocefalia. Os próprios autores enfatizaram que as mães neste estudo foram de uma população de muito alto risco obstétrico, por muitas razões. Além da ingestão alegada de LSD, houve uso de múltiplas drogas (15 por cento usaram narcóticos), doenças infecciosas e desnutrição. A maioria dos abortos terapêuticos foram feitos por razões psiquiátricas. Trinta e seis por cento das mulheres tinham sido submetidos a extensas investigações radiológicas para queixas abdominais.

Berlin e Jacobson estudaram, bem como todos os relatórios de casos mencionados anteriormente de anormalidades fetais, crianças nascidas de pais que ingeriram substâncias ilícitas de dosagem e origem desconhecidas, que foram consideradas como LSD; até o momento não há relatos de malformações congênitas na prole humana exposta a LSD puro. Além disso, como Blaine apontou em sua crítica bastante amarga e enfática do papel por Eller e Morton, não há nenhuma evidência científica nessas histórias de casos individuais de uma relação causal entre a ingestão de substâncias ilícitas e o desenvolvimento posterior da malformação embrionária. Os resultados poderiam representar coincidências puras e estar relacionados com qualquer número de situações que contribuem para anomalias congênitas, como a nutrição materna, fisiológica, estados psicológicos e patológicos, as circunstâncias socioeconômicas, ou várias práticas culturais. Diferenças no tipo e gravidade das malformações pode ser devida a fatores genéticos, tanto embrionárias e parentais.

Não existe uma quantidade considerável de evidências clínicas contradizendo ou limitando as conclusões anteriores. Três estudos com foco principalmente na frequência das interrupções cromossômicas em crianças expostas ao LSD ilícito ‘in utero’ relataram as taxas de ruptura elevadas dos cromossomos. No entanto, todas as quatorze crianças estudadas estavam em boas condições de saúde e não tinham indicações de defeitos congênitos. É interessante notar, neste contexto, que a hipótese de uma possível ação teratogênica do LSD foi originalmente derivada a partir de observações de aumento da quebra de cromossomas. Na maioria dos casos notificados de malformações congênitas reais atribuídas ao LSD, os achados cromossômicos foram normais. Por outro lado, as crianças expostas ao LSD ‘in utero’ e relatados como tendo danos cromossômicos não mostraram anormalidades físicas. Embora não seja comum, por razões óbvias, a publicar histórias de casos com resultados negativos, Sato e Pergament apresentaram em sua discussão do caso de Zellweger et al. Eles descreveram um recém-nascido cuja mãe tinha tomado LSD antes e durante a gravidez precoce seis vezes. A gravidez foi normal e ela deu à luz em prazo total a uma menina saudável. As doses alegadas de LSD tomadas pela mãe foram suficientes para produzir um efeito psicodélico. Ela tomou LSD durante a fase crítica para a produção de deformidades nos membros, como no caso de Zellweger, mas sem deformidades fetais.

Aase, Laestadius e Smith observaram um grupo de dez mulheres grávidas que foram verificadas como tendo ingerido LSD em dosagens alucinatórias. Essas mulheres, posteriormente, tiveram dez crianças saudáveis. Não houve evidência de efeitos teratogênicos ou dano cromossômico em qualquer um desses dez bebês considerados de terem sido expostos ao LSD no útero. Os autores apontam um fato mais interessante, que todas as crianças entregues eram meninas. A baixa probabilidade de este ser um acontecimento aleatório sugere que o LSD pode ter uma influência sobre a proporção entre sexos. Healy e Van Houten calcularam que a probabilidade de toda a série de dez gestações de crianças do mesmo sexo é de 1:1024. Eles sugeriram que o LSD poderia melhorar a incompatibilidade imunológica básica entre fetos masculinos e seus hospedeiros maternos; isto resulta na detecção do tecido fetal como antigênico. Uma hipótese semelhante foi oferecida no passado como uma explicação sobre a observação de que mulheres que se tornaram esquizofrênicas no prazo de um mês da concepção deram a luz apenas a descendentes do sexo feminino.

McClothlin, Sparkes e Arnold estudaram 148 gestações humanas após a ingestão de LSD; isso era parte de um estudo maior de 300 pessoas escolhidas aleatoriamente em uma população de 750 que receberam LSD por via oral em um cenário experimental qualquer ou psicoterápico. O número de sessões variaram entre um e oitenta e cinco, e as doses habituais eram 25-400 microgramas. Para vinte e sete gravidezes, houve a utilização adicional de LSD em condições não-médicas. Em uma pequena porcentagem maconha (8 por cento) e fortes psicodélicos, como o peiote, mescalina e psilocibina também foram utilizados. Os autores não encontraram evidências de que o uso de LSD em doses razoáveis por homens antes da relação que levaram à concepção, estavam relacionados a um aumento da taxa de abortos, nascimentos prematuros ou defeitos de nascimento. No entanto, eles encontraram alguma evidência de que o uso de LSD pelas mulheres antes da concepção pode aumentar a incidência de abortos espontâneos; o nexo de causalidade entre esses dois eventos não é claro e requer mais pesquisas. Havia pouco para sugerirem que a exposição de um dos pais para o LSD antes da concepção e nos montantes descritos neste estudo aumentou o risco de ter um filho com um defeito congênito. O único risco aumentado observado no presente estudo, portanto, foi uma possível maior incidência de abortos espontâneos entre as mulheres expostas ao LSD. Abortos espontâneos ocorreram significativamente mais frequentemente quando a mãe tinha tomado LSD do que quando o pai tinha tomado. Os autores ofereceram duas explicações para esse achado: (1) O período necessário para o processo de maturação dos óvulos é muito longo; leva vários anos, em comparação com algumas semanas para os espermatozoides. (2) Em metade dos casos, foram dados às mães LSD médico para fins terapêuticos. É um fato bem conhecido que há maior estresse emocional em pacientes neuróticos aumenta a incidência de abortos, e isso sugere que a conexão encontrado na amostragem entre LSD e aborto não pode ser causal em tudo, mas mera coincidência.

Arendsen-Hein apresentaram no Congresso da Associação Médica Europeia para Terapia Psicolítica, em Wurzburg, em 1969, dados sobre a descendência de 4.815 ex-pacientes de LSD de vários países europeus, incluindo a Inglaterra. De 170 crianças nascidas, esses pacientes, depois de terem concluído a terapia com LSD, envolvidos frequentemente em múltiplas exposições, apenas dois apresentaram anomalias congênitas. Uma criança teve uma luxação da articulação do quadril esquerdo; outra criança, nascida de um casal em que o pai usava LSD, teve o dedo mindinho e o dedo anelar por um lado crescido juntos (sindactilia). Duas mulheres desta amostra tomaram LSD dentro de 14 dias após a concepção (em um caso de 400 microgramas), e os dois filhos estavam normais. Assim, de 170 crianças, apenas duas apresentaram patologia; o autor sentiu que mesmo nesses dois casos, as anomalias eram de um tipo comum e não poderia ser atribuída ao LSD, por qualquer motivo somente.

A evidência experimental e clínica para os efeitos teratogênicos do LSD podem ser resumidos como se segue. Aumento da incidência de malformação congênita tem sido relatada em camundongos, ratos e hamsters; no entanto, existem uma série de documentos que contradizem esses achados. As informações a partir de experimentos em primatas inferiores, ainda que preliminar, sugere um possível efeito teratogênico e merece uma investigação mais aprofundada. Existem vários relatos de casos de crianças malformadas nascidas de usuários de LSD ilícito, e um estudo sugerindo uma alta incidência de defeitos congênitos e abortos neste grupo. A relação causal dessas malformações ao uso de LSD não foi estabelecida. A composição química desconhecida das amostras do alegado LSD, bem como a existência de muitas outras variáveis importantes que caracterizam o grupo de “usuários de LSD” (tais como infecções, desnutrição, uso múltiplo de drogas e distúrbios emocionais) deixaram todas as conclusões em aberto para a pergunta. Não há indicações de um risco aumentado de abortos espontâneos relacionados com a utilização de LSD. Não há nenhuma evidência neste momento que o LSD puro causa defeitos de nascimento ou perda fetal em seres humanos. No entanto, para fins clínicos práticos, gravidez deve ser considerada uma contraindicação para a administração de LSD. Isso não é algo único e específico para LSD; cautela semelhante é necessária em relação a muitas outras substâncias. O equilíbrio entre o organismo materno e o desenvolvimento do feto, especialmente no primeiro trimestre de gravidez, é muito precário e pode ser perturbado por uma ampla variedade de influências externas.

 

EFEITOS CANCERÍGENOS DO LSD

Tem sido repetidamente mencionado na literatura que o LSD pode ter potencial carcinogênico. Esta especulação apareceu pela primeira vez no jornal por Cohen, Marinello e Back. Os autores chegaram a essa conclusão a partir de suas descobertas de uma acentuada maior frequência de quebra cromossômica em uma figura de câmbio do cromossomo quadriradial em um paciente com esquizofrenia paranoide que havia sido submetido à extensa psicoterapia com LSD. Esta é uma combinação que ocorre em três doenças hereditárias: a síndrome de Bloom, anemia e ataxia teleangiectatica de Fanconi. Estes distúrbios estão relacionados com uma incidência elevada de leucemia e outras doenças neoplásicas. Os autores também apontaram que as células de origem neoplásica mostraram uma variedade de aberrações cromossômica, muitas das quais não são diferentes das que tinham encontrado em indivíduos após a ingestão de LSD. Além disso, alguns dos agentes conhecidos para a produção de aberrações cromossômicas semelhantes, tais como vírus e várias radiações, são conhecidos cancerígenos.

A hipótese cancerígena foi apoiada pelo achado de Irwin e Egozcue, de que nove indivíduos que tinham tomado LSD ilícito tinha fragmentos cromossômicos que assemelhavam-se a chamada Philadelphia (Ph.) Cromossomo, geralmente associado a leucemia granulocítica crônica. Grossbard et al. encontraram um cromossomo Ph1-como em todos os trinta e cinco leucócitos periféricos de um indivíduo que tinha usado LSD e outras drogas ilícitas e que mais tarde desenvolveu leucemia aguda.

Várias sérias objeções podem ser levantadas contra essa hipótese. Em primeiro lugar, a evidência de que o LSD puro provoca aberrações cromossômicas são bastante problemáticas e inconclusivas. Em segundo lugar, a causa das lesões cromossômicas nos transtornos herdados, acima mencionados, não é conhecido, nem foi estabelecido se essas lesões têm qualquer relação com os desenvolvimentos neoplásicos subsequentes. Existem muitos agentes de quebra de cromossomas que não estão associadas com a leucemia, e outras figuras de rearranjo quadriradial também foram encontradas nas células brancas do sangue de indivíduos normais. Em terceiro lugar, a comparação de Cohen dos efeitos do LSD com os de radiação não parece ser bem fundamentada pelos achados clínicos e experimentais. De acordo com Dishotsky et al., lesões cromossômicas de longo prazo de injeção após o LSD, foi avaliado em três estudos retrospectivos. Em dois relatos de indivíduos estudados antes e depois, eles tomaram LSD (abordagem prospectiva), o dano ocasional que foi encontrado foi, sem exceção, transitório, o que sugere uma reversibilidade do efeito, ao contrário do que se relaciona com a radiação. Em quarto lugar, o cromossomo Ph1-apreciado foi relatado em apenas dois estudos; em ambos foi encontrado em leucócitos periféricos. Na leucemia granulocítica crônica, o cromossoma Ph1 é característica única de células mieloides e eritroides, que normalmente não se dividem no sangue periférico. Dishotsky et al. faz citação de Nowell e Hungerford, que inicialmente descrevram esta lesão: “Um cromossomo compatível com o Ph teria que ser observado em outras células do sangue do que os linfócitos a ser relevante para a questão da leucemia granulocítica crônica”.

Apenas dois casos de leucemia foram relatados em indivíduos que foram tratados no passado com LSD puro. Em ambos ele continua a ser estabelecido se a associação representa uma relação causal ou uma coincidência. Em um desses casos, relatados por Garson e Robson, houve uma “notável incidência de neoplasias malignas fortemente sugestivas de uma predisposição familiar à doença maligna de infância”. No presente momento a hipótese cancerígena parece estar bastante mal apoiada por dados experimentais e clínicos e permanece no reino da pura especulação. Não parece haver nenhuma evidência definitiva de que o LSD é um agente cancerígeno.

 

RESUMO E CONCLUSÃO

Dois terços dos estudos ‘in vitro’ existentes relataram algum grau de aumento da quebra de cromossomas, após a exposição ao LSD ilícito ou puro. Com uma exceção, essas mudanças foram observadas com concentrações de LSD e durações de exposição que excedeu em muito as doses normalmente utilizadas em seres humanos. Em nenhum dos estudos estava lá uma relação clara de dose-resposta. Desde achados semelhantes foram relatados com muitas substâncias comumente usadas, incluindo adoçantes artificiais, aspirina, cafeína, tranquilizantes fenotiazínicos e antibióticos, não há nenhuma razão para que LSD deva ser destacado e colocado em uma categoria especial. Não há justificativa para se referir às mudanças estruturais dos cromossomos como “dano cromossômico”; sua relevância funcional e relação com hereditariedade ainda não foi estabelecida. Além disso, o fato de que os experimentos ‘in vitro’ contornam o sistema excretor e desintoxicantes presente no organismo integrante, lança dúvidas sobre a relevância global dos resultados ‘in vitro’.

Nos estudos cromossômicos ‘in vivo’, a maioria dos resultados positivos foi relatado em pessoas que haviam sido expostos ao ilícito, “suposto” LSD. Dishotsky et al., em sua excelente revisão sinóptica dos estudos cromossômicos feitos no passado, resumiu as provas existentes nos jornais ‘in vivo’ da seguinte forma:. “Em vinte e um estudos ‘in vivo’ cromossômicas, foram registrados um total de 310 indivíduos. Destes, 126 foram tratados com LSD puro, os outros 184 foram expostos ao ilícito, alegando ser LSD. Apenas 18 dos 126 (14,3 por cento) dos indivíduos do grupo de LSD puro foram relatados para ter frequência de aberrações cromossômicas acima das taxas médias de controle. Em contraste, 89 de 184 (48,9 por cento) dos indivíduos no grupo LSD ilícito tinham elevadas frequências de aberrações. De todos os entrevistados que disseram ter danos cromossômicos, apenas 18 dos 108 (16,7 por cento) foram expostos a LSD puro. A frequência de indivíduos com danos cromossômicos relatados entre os usuários de drogas ilícitas foi quase o triplo que associado com o uso de LSD farmacologicamente puro. “Estes resultados indicam que aberrações cromossômicas quando encontradas foram relacionados com os efeitos mais gerais do abuso de drogas e não do LSD por si só; é altamente improvável que o LSD puro, ingerido em doses moderadas, produza aberrações cromossômicas nas células brancas do sangue”.

Os resultados positivos em alguns dos estudos cromossômicos usando leucócitos humanos foram interpretados como uma indicação de danos genéticos e de perigo para as gerações futuras. Para ser relevante genético direto, no entanto, o dano cromossômico teria que ser demonstrado nas células germinais, os espermatozoides e óvulos, ou suas células precursoras. Vários estudos existentes sobre o efeito do LSD nos cromossomas meióticos foram inconclusivos, apesar do uso de doses excessivas. Os estudos de mutação em ‘Drosophila melanogaster’ não indicam nenhum efeito mutagênico, 28-500 microgramas de LSD por cc e um efeito mutagênico definitivo de 2,000-10,000 microgramas de LSD por cc. O fato de que as dosagens verdadeiramente astronômicas tem que ser utilizado para induzir mutações em ‘Drosophila’ mostra o LSD como um mutagênico bastante fraco; que é pouco provável que seja mutagênico em qualquer concentração usada por indivíduos humanos.

Em alguns dos primeiros estudos, o LSD foi implicado como uma potencial causa de malformações congênitas, abortos e perda fetal. Os relatórios originais dos efeitos teratogênicos em hamsters, ratos e camundongos não foram confirmados por estudos posteriores. As experiências em roedores indicaram uma vez vasta gama de tensão individual e susceptibilidade das espécies para os efeitos do LSD. É altamente questionável se e em que medida os resultados de tais investigações podem ser extrapolados para a situação em humanos. Houve seis casos concretos relatados de crianças malformadas nascidas de pais que usaram LSD ilícito. Apenas uma equipe de trabalhadores relataram um aumento da frequência de malformações congênitas na prole de usuários de LSD ilícito. Em relação à alta frequência de defeitos congênitos inexplicáveis “espontâneos” e ao abuso generalizado de LSD, as observações acima podem ser coincidência. O aumento da ocorrência de malformações em utilizadores LSD relatados em um dos estudos podem ser explicados por muitas outras variáveis que caracterizam este grupo, e não há nenhuma razão lógica para implicar LSD como o fator único ou mais importante. No presente momento não há evidências claras de que o LSD puro é teratogênico em humanos. No entanto, em virtude da elevada vulnerabilidade do feto em desenvolvimento para uma grande variedade de substâncias e condições, a administração de LSD está contraindicado para o período de gestação.

Não há dados clínicos ou experimentais que demonstrem que o LSD tem propriedades cancerígenas, como sugerido por alguns dos primeiros estudos. Já foi detectado que não há nenhum aumento na incidência de tumores entre os utilizadores de LSD. Relatos de casos de leucemia e tumores malignos na população de usuários de LSD têm sido extremamente raros. Nos três relatos de casos existentes de leucemia, não houve nenhuma prova ou mesmo indício de uma relação causal, e a associação de leucemia com o uso de LSD pode ter sido apenas uma coincidência.

Como esta análise mostra, não existe nenhuma evidência experimental ou clínica convincente para provar que as doses comumente utilizados de LSD puro produza mutações genéticas, malformações congênitas ou tumores malignos. Na medida em que está em causa o LSD ilícito, a situação é muito mais complexa, e os resultados dos estudos de usuários de LSD ilícito não deve ser considerado relevante para a questão dos perigos biológicos do LSD. Incertezas sobre a dosagem, e a contaminação de amostras de drogas psicodélicas por várias impurezas e aditivos no mercado negro contribuem com uma dimensão muito importante para os já graves problemas psicológicos associados com a autoexperimentação sem supervisão. Watch UK online porn https://mat6tube.com/ Diana Dali, Patty Michova, Alina Henessy, Kira Queen etc.

Não há absolutamente nenhuma indicação nos dados de pesquisas disponíveis atualmente que o uso responsável experimental e terapêutico de LSD por profissionais experientes deve ser interrompido.

FONTE psychedelic-library.org 

Agradecemos imensamente a tradução feita pelo colaborador Cezar Braga.
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A terapeuta que foi presa por usar LSD e MDMA com os pacientes

Notoriamente ilegal e sinônimo de hedonismo, o LSD e Ecstasy começaram a vida como ajuda à psicoterapia. Sam Wong encontra o grupo de psiquiatras que estão trabalhando para recuperá-los para a medicina novamente.

Às 6:30 da manhã na quinta-feira , 29 de outubro de 2009,a campainha de Friederike Meckel Fischer tocou. Havia dez policiais lá fora. Eles vasculharam a casa, colocaram algemas em Friederike- uma pequena mulher em seus sessenta anos- e em seu marido, e os levaram a uma prisão preventiva. O casal teve suas fotografias e impressões digitais tiradas e foram colocados em celas separadas isoladamente. Depois de algumas horas, Friederike, uma psicoterapeuta, foi levada para interrogatório.

O oficial leu de volta para ela à promessa de sigilo que ela tinha feito cada cliente fazer no início de suas sessões de terapia de grupo. “Então eu sabia que eu estava realmente em apuros”, diz ela.
“Eu prometo não divulgar o local ou nomes das pessoas presentes ou a medicação. Prometo não prejudicar a mim ou aos outros de forma alguma durante ou após esta experiência. Eu prometo que vou sair dessa experiência mais saudável e mais sábia. Eu assumo a responsabilidade pessoal para o que eu faço aqui”.

A polícia suíça havia sido contatada por uma ex-cliente cujo marido a deixou depois dela ter feito terapia. Ela alegou responsabilidade a Friederike.

As 16:00 os pacientes eram convocados a discutir suas experiências, então um motorista levava-os para casa, as vezes ainda enquanto eles estavam sob a influência da droga

O que colocou Friederike em apuros foram seus métodos de terapia não-ortodoxas. Juntamente com sessões separadas de conversas terapêuticas convencionais, ela ofereceu um catalisador, uma ferramenta para ajudar seus clientes a se reconectar com seus sentimentos, com as pessoas ao seu redor, e com experiências difíceis em suas vidas. Esse catalisador foi o LSD. Em muitas de suas sessões, eles também usariam outra substância: MDMA, ou Ecstasy.

Friederike foi acusada de colocar seus clientes em perigo, tráfico de drogas para lucro próprio, e pondo em risco a sociedade com “drogas intrinsecamente perigosas”. Tal terapia psicodélica está na periferia de ambos: psiquiatria e sociedade. No entanto, o LSD e MDMA começaram a vida como medicamentos para a terapia e novos ensaios estão testando se eles poderiam ser usados novamente.


 

Em 1943, Albert Hofmann, um químico no laboratório de farmacêutica Sandoz, em Basileia, na Suíça, estava tentando desenvolver drogas para contrair os vasos sanguíneos, quando ele acidentalmente ingeriu uma pequena quantidade de dietilamida do ácido lisérgico, o LSD. Os efeitos o sacudiram. Como ele escreve em seu livro LSD: Minha Criança Problema:

“Os objetos, bem como a forma de meus colegas no laboratório começaram a sofrer mudanças ópticas… A luz era tão intensa a ponto de ser desagradável. Eu tirei as cortinas e imediatamente caí em um estado peculiar de “embriaguez”, caracterizada por uma imaginação exagerada. Com os olhos fechados, imagens fantásticas de extraordinária plasticidade e cor intensa pareciam surgir para mim. Depois de duas horas, este estado gradualmente desapareceu e eu era capaz de comer o jantar com um bom apetite”.

Intrigado, ele decidiu tomar o medicamento uma segunda vez na presença de seus colegas, um experimento para determinar se era realmente a causa. Os rostos de seus colegas logo apareceram “como máscaras coloridas grotescas”, ele escreve:

“Eu perdi todo o controle de tempo: o espaço e o tempo tornaram-se mais e mais desorganizados e eu fui tomado com um medo de que eu estava ficando louco. A pior parte era que eu estava claramente consciente da minha condição que eu era incapaz de parar. Às vezes eu senti como estando fora do meu corpo. Eu pensei que eu tinha morrido. O meu ‘ego’ foi suspenso em algum lugar no espaço e vi meu corpo morto no sofá. Eu observei e registrei claramente que o meu ‘alter ego’ estava se movendo ao redor da sala, gemendo”.

Mas ele parecia particularmente impressionado com o que ele sentia na manhã seguinte: “O café da manhã tinha um sabor delicioso e foi um prazer extraordinário. Quando mais tarde eu saí para o jardim, onde o sol brilhava, depois de uma chuva de primavera, tudo brilhava em uma nova luz. O mundo era como se tivesse sido recém-criado. Todos os meus sentidos vibrando em uma condição de maior sensibilidade que persistiu durante todo o dia”.

Hofmann sentiu que era de grande importância que ele poderia lembrar a experiência em detalhes. Ele acreditava que a droga poderia de ser um enorme valor para a psiquiatria. Os laboratórios Sandoz, depois de assegurar que era não-tóxico para ratos, camundongos e seres humanos, logo começaram a oferecê-los para uso científico e médico.

Um dos primeiros a começar a usar a droga foi Ronald Sandison. O psiquiatra britânico visitou Sandoz em 1952 e, impressionado com a pesquisa de Hofmann, voltou com 100 frascos do que foi então chamado Delysid. Sandison imediatamente começou dando a pacientes no Hospital Powick em Worcestershire, que estavam deixando de fazer progressos na psicoterapia tradicional. Após três anos, os chefes do hospital estavam tão satisfeitos com os resultados que eles construíram uma nova clínica LSD. Os pacientes que chegavam na parte da manhã, tomavam o seu LSD, em seguida, deitavam-se em salas privadas. Cada um tinha um toca-discos e um quadro negro para desenhar, e enfermeiras ou registradores iam verificar-los regularmente. Ás 16:00 os pacientes eram convocados a discutir suas experiências, e em seguida, o condutor os levava para casa, por vezes, enquanto eles ainda estavam sob a influência da droga.

Dra. Friederike Meckel Fischer
Dra. Friederike Meckel Fischer

Na mesma época, outro psiquiatra britânico, Humphrey Osmond, trabalhando no Canadá, fez experiências com o uso de LSD para ajudar alcoólicos a parar de beber. Ele relatou que a droga, em combinação com a psiquiatria de suporte, alcançou taxas de abstinência de 40-45 por cento, muito maior do que qualquer outro tratamento no momento, ou antes. Em outros lugares, os estudos de pessoas com câncer terminal mostraram que a terapia com o LSD poderia aliviar a dor, melhorar a qualidade de vida e aliviar o medo da morte.

Nos EUA, a CIA tentou dar LSD para membros inocentes do público para ver se era possível fazê-los desistirem de segredos. Enquanto isso na Universidade de Harvard, Timothy Leary, incentivado por, entre outros, o poeta beat Allen Ginsberg distribuiu a substância para artistas e escritores, que, então, descrevem as suas experiências. Quando surgiram rumores de que ele estava dando drogas para estudantes, oficiais da lei começaram a investigar e a universidade alertou os estudantes contra a tomar o medicamento. Leary aproveitou a oportunidade para pregar sobre o poder da droga como uma ajuda para o desenvolvimento espiritual, e logo foi demitido de Harvard, o que alimentou ainda mais a sua notoriedade e a da droga. O escândalo chamou a atenção da imprensa e logo todo o país tinha ouvido falar de LSD.

Em 1962, a Sandoz teve a sua distribuição de LSD cortada, devido ao resultado das restrições ao uso de drogas experimentais provocadas por um escândalo de drogas completamente diferente: defeitos congênitos ligados à droga contra enjôos matinais – talidomida. Paradoxalmente, as restrições coincidiram com um aumento da disponibilidade do LSD- a fórmula não foi difícil ou dispendiosa de obter, e aqueles que foram determinados para sintetizar poderiam realizar com dificuldade moderada e em grandes quantidades.

Ainda assim, o pânico moral em cima dos efeitos sobre as mentes dos jovens eram abundantes. As autoridades também estavam preocupados com a associação de LSD com o movimento de contracultura e a disseminação de pontos de vista anti-autoritários. Logo em seguida foram solicitadas proibições pra toda a nação, e muitos psiquiatras deixaram de usar o LSD à medida que sua reputação negativa ia crescendo.

Uma das muitas histórias na imprensa falou de Stephen Kessler, que assassinou sua sogra e afirmou mais tarde que ele não se lembrava do que tinha feito enquanto estava “voando com o LSD”. No julgamento, foi revelado que ele havia tomado LSD um mês antes, e no momento do assassinato estava embriagado apenas com álcool e comprimidos para dormir, mas milhões acreditavam que o LSD o tinha transformado em um assassino. Outro relatório contava de estudantes universitários que ficaram cegos depois de olharem para o sol no LSD.

Duas subcomissões do Senado dos Estados Unidos, realizadas em 1966, ouviram de médicos que afirmaram que o LSD causava psicose e “a perda de todos os valores culturais”, bem como de apoiadores do LSD como Leary e do senador Robert Kennedy, cuja esposa Ethel foi dito ter sido submetida a terapia de LSD . “Talvez, em certa medida, perdemos de vista o fato de que ele pode ser muito, muito útil em nossa sociedade, se usado corretamente”, disse Kennedy, desafiando a Food and Drug Administration para fechar programas de investigação sobre o LSD.

A posse de LSD se tornou ilegal no Reino Unido em 1966 e nos EUA em 1968. O uso experimental por pesquisadores ainda era possível com licença, mas com o estigma associado ao status legal de drogas, estes se tornaram extremamente difíceis de obter. As pesquisas pararam, mas o uso recreativo ilegal continuou.


 

Na idade de 40, após 21 anos de casamento, Friederike Meckel Fischer se apaixonou por outro homem. Infelizmente, como ela logo descobriu, ele estava usando ela para sair de seu próprio casamento. “Eu tinha uma dor dentro de mim com o fato desse homem ter me deixado, e com o meu marido que eu não conseguia me conectar”, diz ela. “Foi como se eu estivesse fora de mim mesmo.”

Sua solução era se tornar uma psicoterapeuta. Ela diz que nunca pensou em ir fazer terapia, que na Alemanha Ocidental em 1980, foi reservada apenas para as condições mais graves. Além do que, sua educação lhe ensinou a fazer as coisas por si mesmas, em vez de procurar a ajuda de outros.

Friederike na época trabalhava como médica do trabalho. Ela reconheceu que muitos dos problemas que ela viu em seus pacientes foram enraizados em problemas com seus chefes, colegas ou familiares. “Eu vim à conclusão de que tudo o que eles estavam tendo problemas estava ligado a questões de relacionamento”, diz ela.

Um ex-professor dela recomendou que ela tentasse uma técnica chamada respiração holotrópica. Desenvolvido por Stanislav Grof, um dos pioneiros da psicoterapia com o LSD, esta é uma forma de induzir estados alterados de consciência através respirações aceleradas e profundas, como a hiperventilação. Grof tinha desenvolvido a respiração holotrópica em resposta à proibição de consumo de LSD ao redor do mundo.

Ao longo de três anos, viajou várias vezes para os EUA em feriados, e Friederike foi submetida a treinamento com Grof como facilitador na respiração holotrópica. No final do mesmo, Grof a encorajou a tentar psicodélicos.

No último seminário, um colega lhe deu duas pequenas pílulas azuis como um presente. Quando ela voltou para a Alemanha, Friederike partilhou uma das pílulas azuis com seu amigo Konrad, que mais tarde se tornou seu marido. Ela diz que se sentiu levantada por uma onda e jogada em uma praia branca, capaz de acessar partes de sua psique que antes estavam fora dos limites. “A primeira experiência foi impressionante para mim”, diz ela. “Eu só pensei: ‘É isso. Eu posso ver as coisas. “E comecei a sentir. Isso foi, para mim, inacreditável. ”

As pílulas eram MDMA, uma droga que tinha sido o centro das atenções em 1976 quando o químico americano Alexander ‘Sasha’ Shulgin redescobriu 62 anos depois que foi patenteado pela Merck e depois esquecido. Em uma história com as origens parecidas com a do LSD, após tomá-lo, Shulgin observou sentimentos de “euforia pura” e “força interior sólida”, e sentiu que podia “falar sobre assuntos profundos ou pessoais com clareza especial”. Ele apresentou a seu amigo Leo Zeff, um psicoterapeuta aposentado que trabalhou com LSD e acreditava que a obrigação de ajudar os pacientes tomou prioridade sobre a lei. Zeff tinha continuado a trabalhar com LSD secretamente após a sua proibição. O potencial de MDMA tirou Zeff da aposentadoria. Ele viajou ao redor do EUA e na Europa para instruir terapeutas em terapia com MDMA. Ele o chamou de “Adão”, por colocar o paciente em um estado primordial de inocência, mas, ao mesmo tempo, ele havia adquirido outro nome em casas noturnas: Ecstasy.

O MDMA tornou-se ilegal no Reino Unido por uma decisão em 1977 que pôs toda a família química na categoria mais rigorosamente controlada: classe A. Nos EUA, a Drug Enforcement Administration (DEA), criado por Richard Nixon em 1973, declarou uma proibição temporária, em 1985. Em uma audiência para decidir seu status permanente, o juiz recomendou que ele devesse ser colocado no “Schedule III”, o que permitiria o uso por terapeutas. Mas a DEA anulou a decisão do juiz e colocou MDMA no Schedule I, a categoria mais restritiva. Sob a influência americana, a Comissão das Nações Unidas sobre Narcóticos deu ao MDMA uma classificação semelhante dentro da lei (embora um comitê de peritos formado pela Organização Mundial da Saúde argumentou que tais restrições graves não eram justificadas).

Substâncias em Schedule I são permitidas o uso em pesquisas no âmbito da Convenção das Nações Unidas sobre Substâncias Psicotrópicas. Na Grã-Bretanha e nos EUA, os pesquisadores e suas instituições devem solicitar licenças especiais, mas estes são caros para obter, e encontrar fabricantes que irão fornecer drogas controladas é difícil.

Mas, na Suíça, que na época não fazia parte da convenção, um pequeno grupo de psiquiatras persuadiram o governo a permitir o uso de LSD e MDMA em terapia. De 1985 até meados da década de 1990, foi autorizado aos terapeutas licenciados dar a droga para quaisquer pacientes, para treinar outros terapeutas no uso das drogas, e para uso próprio, com pouca supervisão.

Ele o chamou de “Adão”, porque coloca o paciente em um estado primordial de inocência

Acreditando que o MDMA podia ajudá-la a ganhar uma compreensão mais profunda de seus próprios problemas, Friederike procurou por um lugar onde tivesse um curso de “terapia psicolítica” na Suíça. Em 1992, ela e Konrad foram aceitos em um grupo de treinamento executado por um terapeuta licenciado chamado Samuel Widmer.

O curso acontecia no fim de semana a cada três meses na casa de Widmer em Solothurn, uma cidade a oeste de Zurique. A formação central consistia em tomar as substâncias um número de vezes, 12 no total, para conhecer os seus efeitos e passar por um processo de auto-exploração. Friederike diz que as experiências com drogas mostraram-lhe como toda a sua vida tinha sido colorido pela perda de seu pai com a idade de cinco anos e as dificuldades de crescer em pós-guerra na Alemanha Ocidental.

“Eu posso detectar relações, interconexões entre coisas que eu não podia ver antes”, diz ela sobre suas experiências com MDMA. “Eu poderia olhar para as experiências difíceis em minha vida sem ser imediatamente atirada para elas novamente. Eu poderia, por exemplo, ver uma experiência traumática, mas não se conectar a sensação horrível do momento. Eu sabia que era uma coisa horrível, e eu podia sentir que eu tive medo, mas eu não senti o medo.”


 

Pessoas em experiências psicodélicas, muitas vezes falam de experiências profundas e espirituais. Voltando na década de 1960, Walter Pahnke, um estudante de Timothy Leary, realizou uma experiência notória em Chapel Marsh da Universidade de Boston mostrando o que os psicodélicos poderiam induzir.

Ele deu a dez voluntários uma grande dose de psilocibina- o ingrediente ativo nos cogumelos mágicos – e deu a dez voluntários um placebo ativo, ácido nicotínico, o que causou uma sensação de formigamento, mas sem efeitos mentais. Oito pessoas do grupo da psilocibina tiveram experiências espirituais, comparado com uma pessoa do grupo de placebo. Em estudos posteriores, os investigadores identificaram características fundamentais de tais experiências, incluindo inefabilidade, a incapacidade de colocar em palavras; paradoxalidade, a crença de que as coisas contraditórias são verdadeiras ao mesmo tempo; e a sensação de se sentir mais ligado a outras pessoas ou coisas.

“Eu sinto que há espaço em torno de mim. Parecia quando minha mãe ainda estava viva, quando eu conheci o meu parceiro, e tudo era uma espécie de OK, e foi tão perceptível porque eu não tinha tido isso em um bom tempo.”

“A experiência pode ser realmente útil quando eles sentem uma conexão mesmo com alguém que lhes causou ferida, e uma compreensão de que o que pode ter causado a eles para se comportarem da maneira que eles fizeram”, diz Robin Carhart-Harris, pesquisador de psicodélicos no Imperial College London. “Eu acho que o poder de alcançar esses tipos de realizações realmente mostra o incrível valor de psicodélicos e captura o porquê eles podem ser tão eficazes e valiosos na terapia. Eu acho que só pode realmente acontecer quando as defesas se dissolverem. Defesas que ficam no caminho dessas realizações”.

Ele compara o sentimento de conexão com coisas além de si mesmo ao “efeito de visão geral” sentida pelos astronautas quando eles olham para trás na Terra. “De repente, eles pensam: ‘Que bobagem minha e das pessoas em geral a ter conflitos bobos que achamos que são enormes e importantes.” Quando você está no espaço, olhando para a totalidade da Terra, o coloca em perspectiva. Eu acho que um tipo semelhante de visão geral é engendrado por psicodélicos. ”

Carhart-Harris está a realizar o primeiro ensaio clínico para estudar a psilocibina como um tratamento para a depressão. Ele é um dos poucos pesquisadores em todo o mundo que estão indo adiante com a pesquisa sobre terapia psicodélica. Doze pessoas participaram no seu estudo até agora.

Eles começam com uma varredura do cérebro, e uma longa sessão de preparação com os psiquiatras. No dia da terapia, eles chegam às 9 da manhã, preenchem um questionário e fazem testes para se certificar de que eles não tenham tomado outras drogas. A sala de terapia foi decorada com cortinas, enfeites, luzes brilhantes coloridas, velas elétricas, e um aromatizador. Um estudante PhD, que também é músico, preparou uma lista de reprodução, que o paciente pode ouvir através de fones de ouvido ou de alto-falantes de alta qualidade na sala. Eles passam a maior parte da sessão deitados em uma cama, explorando os seus pensamentos. Dois psiquiatras sentam com eles e interagem quando o paciente quer falar. Os pacientes têm duas sessões de terapia: um com uma dose baixa, em seguida, uma com uma dose alta. Depois disso, eles têm uma sessão de acompanhamento para ajudá-los a integrar as suas experiências e cultivar maneiras mais saudáveis de pensar.

Eu encontrei Kirk, um dos participantes, dois meses após a sua sessão de alta dose. Kirk tinha estado depressivo, especialmente desde a morte de sua mãe há três anos. Ele experimentou repetitivos padrões de comportamento, dando voltas e voltas em uma pista de pensamentos negativos, diz ele.

“Eu não estava tão motivado, eu não estava fazendo tanto, eu não estava exercendo mais, eu não estava tão social, eu estava tendo um pouco de ansiedade. Apenas foi se deteriorando. Cheguei ao ponto em que eu me senti bastante desesperado. Não se encontrava realmente o que estava acontecendo na minha vida. Eu tinha um monte de coisas boas acontecendo na minha vida. Eu estou empregado, eu tenho um trabalho, eu tenho família, mas realmente era como um atoleiro que você afunda.”

No auge da experiência com drogas, Kirk foi profundamente afetado pela música. Ele entregou-se a música e sentiu-se tomado de temor. Quando a música estava triste, ele pensou na sua mãe, que estava doente há muitos anos antes de sua morte. “Eu costumava ir para o hospital e vê-la, e uma grande parte do tempo que ela estava dormindo, então eu não a acordava; Eu tinha acabado de se sentar na cama. E ela estaria ciente de que eu estava lá e acordaria. Foi uma sensação muito amorosa. Eu passei por esse momento muito intensamente. Eu acho que foi muito bom em uma maneira. Eu acho que ajudou a deixar ir.”

Durante as sessões de terapia, houve momentos de ansiedade quando os efeitos da droga começaram a tomar conta, quando Kirk sentiu frio e tornou-se preocupado com a sua respiração. Mas ele foi tranqüilizado pelos terapeutas, e o desconforto passou. Ele viu cores brilhantes, “como estar no parque de diversões”, e sentiu vibrações permear seu corpo. Em um ponto, ele viu o deus elefante hindu Ganesha olhando para ele, como se estivesse olhando uma criança.

Embora a experiência tivesse o afetado, ele notou pouca melhora em seu estado de espírito nos primeiros dez dias depois. Então, enquanto estava fazendo compras com amigos em um domingo de manhã, ele sentiu uma agitação.

“Eu sinto que há espaço em torno de mim. Parecia quando minha mãe ainda estava viva, quando eu conheci a minha parceira, e tudo era uma espécie de OK, e foi tão perceptível porque eu não tinha tido isso em um bom tempo.”

Houve altos e baixos desde então, mas no geral, ele se sente muito mais otimista. “Eu não tenho mais aquela negatividade. Estou sendo mais social; Eu estou fazendo coisas. Esse tipo de peso, que suprimiu o sentimento se foi, o que é incrível, realmente. Isso levantou uma pesada capa de cima de mim”.

Fischer dando uma palestra sobre psicoterapia com psicodélicos.

Outro participante, Michael, vinha lutando contra a depressão há 30 anos, e tentou quase todos os tratamentos disponíveis. Antes de tomar parte no julgamento, ele tinha praticamente desistido. Desde o dia de sua primeira dose de psilocibina, ele se sentiu completamente diferente. “Eu não podia acreditar o quanto ela tinha me mudado tão rapidamente”, diz ele. “A minha abordagem à vida, a minha atitude, a minha maneira de olhar o mundo, apenas tudo, dentro de um dia.”

Uma das partes mais valiosas da experiência o ajudou a superar o medo arraigado de morte. “Eu senti como se estivesse sendo mostrado o que acontece depois da vida após a morte”, diz ele. “Eu não sou uma pessoa religiosa e eu me sinto pressionado a dizer que eu era nada espiritual também, mas eu senti como se tivesse experimentado alguma coisa disso, e experimentei a sensação de uma vida futura, quase como uma pré-visualização, e eu me senti totalmente calmo, totalmente relaxado, totalmente em paz. Para que, quando chegar esse momento para mim, eu não tenha medo nenhum”


 

Durante seu treinamento com Samuel Widmer, Friederike também trabalhou em uma clínica de dependência. O insight de suas experiências com drogas deu-lhe nova empatia. “De repente, eu poderia entender meus clientes na clínica com sua dependência de álcool”, diz ela. “Eles estavam lidando de forma diferente do que eu tinha feito. Eles tinham quase os mesmos problemas ou sintomas que eu tinha só que eu não tinha começado a beber. “Mas só alguns deles foram capazes de se abrir sobre como essas experiências os fizeram sentir. Ela perguntou-se: poderia uma experiência com MDMA ajudá-los a liberar essas emoções?

MDMA é um parente mais doméstico dos clássicos psicodélicos-psilocibina, LSD, Mescalina, DMT. Eles têm efeitos que podem ser perturbadores, como distorções sensoriais, a dissolução do senso de si mesmo, e o reviver vívido de memórias assustadoras. Os efeitos do MDMA são mais curtos na duração, tornando-o mais fácil de manusear em uma sessão de psicoterapia.

Friederike abriu seu próprio consultório particular de terapia psicodélica em Zurique no ano de 1997. Durante os próximos anos, ela começou a hospedar sessões de terapia com grupos aos fins de semana com psicodélicos em sua casa, convidando os clientes que tinham falhado a fazer progressos na terapia de fala convencional.

Desde os anos 1950, os psiquiatras têm reconhecido a importância do contexto para determinar que tipo de experiência o usuário de LSD teria. Eles enfatizaram a importância de “set” – mentalidade do usuário, suas crenças, expectativas e experiências e “setting” – o meio físico onde a droga é tomada, os sons e as características do ambiente e as outras pessoas presentes.

Um ambiente de apoio e um terapeuta experiente podem diminuir o risco de uma bad trip, mas experiências assustadoras ainda acontecem. De acordo com Friederike, elas são parte da experiência terapêutica. “Se um cliente é capaz de passar por ou deixa-se conduzir através e trabalhar com, a bad trip se transforma no passo mais importante no caminho para si mesmo”, diz ela.

“Mas sem uma definição correta, sem um terapeuta que sabe o que está fazendo e sem o compromisso do cliente, acabamos em uma bad trip“.

Seus clientes iam pra sua casa numa sexta-feira à noite, falar sobre seus problemas recentes e discutir o que eles queriam alcançar na sessão de drogas. No sábado de manhã, eles sentavam-se em um círculo no tatame, faziam a promessa de sigilo, e cada um tomava uma dose pessoal de MDMA proposto por Friederike com antecedência. Friederike iria começar com o silêncio, em seguida, tocar música, e falar com os clientes individualmente ou como um grupo para trabalhar através de seus problemas. Às vezes, ela pedia a outros membros do grupo para assumir o papel de membros da família de um cliente, e juntos a discutir os problemas em seu relacionamento. Na parte da tarde eles iriam fazer o mesmo com o LSD, o que muitas vezes permitem que os participantes se sintam como se estivessem revivendo memórias traumáticas. Friederike os guiava através da experiência, e ajudava-os a entender isso de uma maneira nova. No domingo, eles discutiam as experiências do dia anterior e como integrá-los em suas vidas.

A prática de Friederike, no entanto, era ilegal. As licenças terapêuticas para usar as drogas foram retiradas pelo governo suíço por volta de 1993, após a morte de um paciente na França sob o efeito da ibogaína, outra droga psicotrópica. (Determinou-se mais tarde que ele morreu de uma doença cardíaca não diagnosticada).


 

Os primeiro pesquisadores do LSD não tinham nenhuma maneira de olhar para o que estava fazendo dentro do cérebro. Agora temos scans cerebrais. Robin Carhart-Harris realizou esses estudos com a psilocibina, LSD e MDMA. Ele me diz que há dois princípios básicos de como os psicodélicos clássicos operam. A primeira é a desintegração: as partes que compõem redes diferentes no cérebro tornam-se menos coesivas. A segunda é a desagregação: os sistemas que se especializam em funções específicas de como o cérebro se desenvolvem, tornam-se, em suas palavras, “menos diferentes” uns dos outros.

Estes efeitos de alguma forma podem explicar como os psicodélicos poderiam ser terapeuticamente úteis. Certas doenças, como depressão e dependência, estão associados a padrões característicos de atividade cerebral que são difíceis de romper.

“O cérebro entra por esses padrões, padrões patológicos e os padrões podem se enraizarem. O cérebro gravita facilmente por esses padrões e fica preso neles. Eles são como redemoinhos, e a mente é sugada para dentro destes redemoinhos e fica presa. “

Psicodélicos dissolvem padrões e organizações, e introduzem “uma espécie de caos”, diz Carhart-Harris. Por um lado, o caos pode ser visto como uma coisa ruim, ligada com coisas como psicose, uma espécie de “tempestade na mente”, como ele diz. Mas você também pode ver o caos como tendo valor terapêutico.

“A tempestade poderia vir e lavar alguns dos padrões patológicos e padrões arraigados que se formaram e estão na base da desordem. Os psicodélicos parecem ter o potencial através deste efeito sobre o cérebro para dissolver ou desintegrar-se padrões patologicamente arraigados de atividade cerebral.”

O potencial terapêutico sugerido por Carhart-Harris através de estudos com scans no cérebro persuadiu o Conselho de Pesquisa Médica do Reino Unido a financiar o tratamento com psilocibina para a depressão. É muito cedo para avaliar o seu sucesso, mas os resultados até agora têm sido encorajadores. “Alguns pacientes agora estão em remissão meses depois de ter tido o seu tratamento”, diz Carhart-Harris.

“Anteriormente suas depressões eram muito graves, então eu acho que esses casos podem ser considerados transformações. Eu não tenho certeza se existem quaisquer outros tratamentos lá fora, que realmente tenha esse potencial para transformar a situação de um paciente depois de apenas duas sessões de tratamento.”


 

No caminho da proibição de MDMA, o psicólogo americano Rick Doblin fundou a Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (MAPS) para apoiar a investigação com o objetivo de restabelecer o lugar dos psicodélicos na medicina. Quando o psiquiatra suíço Peter Oehen ouviu que eles estavam financiando um estudo sobre o uso de MDMA para ajudar as pessoas com transtorno de estresse pós-traumático (PTSD), ele pulou em um avião para conhecer Doblin, em Boston.

Como Friederike, Oehen foi treinado em terapia psicodélica, enquanto ela ainda era legal na Suíça no início de 1990. Doblin concordou em apoiar um pequeno estudo com 12 pacientes no consultório particular de Oehen em Biberist, uma pequena cidade cerca de meia hora de trem da capital suíça, Berna.

Oehen acha que a elevação de humor do MDMA, a redução do medo e os efeitos pró-sociais tornam uma ferramenta promissora para facilitar a psicoterapia para PTSD. “Muitas dessas pessoas traumatizadas foram traumatizadas por algum tipo de violência interpessoal e perderam a sua capacidade de se conectar, estão desconfiados, distantes”, diz Oehen. “Isso os ajuda a recuperar a confiança. Isso ajuda a construir uma relação sonora e respeitável no relacionamento terapêutico”. E também coloca o paciente em um estado de espírito onde eles podem enfrentar as suas memórias traumáticas sem tornar-se angustiados, diz ele, ajudando a começar a reprocessar o trauma de uma maneira diferente.

O primeiro estudo PTSD da MAPS nos EUA foi publicado em 2011, e os resultados foram de abrir os olhos. Depois de duas sessões de psicoterapia com MDMA, 10 dos 12 participantes já não preenchiam os critérios para PTSD. Os benefícios ainda eram evidentes quando os pacientes foram acompanhados de três a quatro anos após a terapia.

Os resultados de Oehen eram menos dramáticos, mas todos os pacientes que tiveram a terapia assistida por MDMA sentiram alguma melhoria. “Eu ainda estou em contato com quase metade das pessoas”, diz ele. “Eu posso ver as pessoas ainda ficarem melhores depois de anos durante o processo e resolvendo os seus problemas. Vimos isso no acompanhamento em longo prazo, que os sintomas melhoram após o tempo, porque as experiências lhes permitiam melhorar de uma maneira diferente à psicoterapia normal. Estes efeitos- estar mais aberto, mais calmo, mais disposto a enfrentar difíceis problemas – isso continua.”

Em pessoas com PTSD, a amígdala cerebral, uma parte primitiva do cérebro que orquestra respostas de medo, é hiperativa. O córtex pré-frontal, uma parte mais sofisticada do cérebro que permite que pensamentos racionais substituam o medo, é menos ativo. Estudos de imagem cerebral com voluntários saudáveis demonstraram que o MDMA tem os efeitos de aumento de opostos na resposta do córtex pré-frontal e diminuindo a resposta da amígdala.

“Eu fui abençoada por um advogado compreensivo e um juiz inteligente.”

Ben Sessa, um psiquiatra que trabalha em torno de Bristol, no Reino Unido, está se preparando para realizar um estudo da Universidade de Cardiff para testar se as pessoas com PTSD respondem ao MDMA da mesma forma. Ele acredita que as experiências negativas iniciais estão na raiz não apenas de PTSD, mas também de muitos outros transtornos psiquiátricos, e nisso os psicodélicos dão aos pacientes a capacidade de reprocessar essas memórias.

“Eu tenho estado na psiquiatria há quase 20 anos agora e cada um dos meus pacientes tem uma história de trauma”, diz ele. “Maus-tratos de crianças é a causa da doença mental, na minha opinião. Uma vez que a personalidade de uma pessoa ter sido formada na infância e adolescência e na idade adulta precoce, é muito difícil para incentivar o paciente a pensar o contrário. “O que psicodélicos fazem, mais do que qualquer outro tratamento, diz ele, é oferecer uma oportunidade para “pressionar o botão de reset” e dar ao paciente uma nova experiência de uma narrativa pessoal.”

Sessa está a planejar um estudo separado para testar MDMA como um tratamento para a síndrome de dependência do álcool – pegando o rastro de pesquisa de Humphrey Osmond com o LSD há 60 anos.

Ele acredita que a psiquiatria seria muito diferente hoje, se a pesquisa com psicodélicos tivesse procedido de uma forma livre desde os anos 1950. Psiquiatras, desde então, viraram-se para os antidepressivos, estabilizadores de humor e antipsicóticos. Estas drogas, diz ele, ajudam a gerir a condição do paciente, mas não são curativos, e também carregam efeitos colaterais perigosos.

“Nós nos tornamos tão acostumados à psiquiatria sendo um campo de cuidados paliativos da medicina”, diz Sessa. “Que nós estamos com você para toda a vida. Você vem para nós em seus 20 e poucos anos com grave transtorno de ansiedade; Eu ainda estarei cuidando de você em seus 70 anos. Estamos acostumados a isso.”

Será que as drogas psicodélicas vão ser medicamentos legais de novo? O MAPS está a apoiar ensaios de psicoterapia assistida com MDMA para PTSD nos EUA, Austrália, Canadá e Israel, e eles esperam ter provas suficientes para convencer os reguladores para aprová-lo até 2021. Enquanto isso, ensaios utilizando psilocibina para tratar a ansiedade em pessoas com câncer vêm ocorrendo na Johns Hopkins University e da Universidade de New York desde 2007.

Eu pedi para alguns psiquiatras darem suas opiniões sobre o uso legal de psicodélicos em terapia. Um dos poucos que o fizeram, Falk Kiefer, diretor médico do Departamento de Comportamento de Vício e Dependência Medicina no Instituto Central de Saúde Mental de Mannheim, na Alemanha, diz que ele é cético sobre a capacidade de as drogas mudarem comportamento dos pacientes. “O tratamento psicodélico pode resultar na obtenção de novos conhecimentos, ‘ver o mundo de uma maneira diferente”. Isso é bom, mas se ele não resultar em aprendizado de novas estratégias para lidar com o mundo real, a evolução clínica será limitada. ”

Carhart-Harris diz que a única maneira de mudar a mente das pessoas é para a ciência ser tão boa que os financiadores e reguladores não podem ignorá-la. “A idéia é que podemos apresentar dados que realmente se tornam irrefutáveis para essas autoridades que têm reservas, e podemos começar a mudar suas perspectivas e trazê-los ao redor para levar isso a sério.”


 

Após 13 dias em prisão, Friederike foi solta. Ela apareceu no tribunal em julho de 2010, acusada de violar a lei de narcóticos e colocando em risco seus clientes, o último dos quais poderia significar até 20 anos de prisão. Um número de neurocientistas e psicoterapeutas testemunharam em sua defesa, argumentando que uma porção de LSD não é uma substância perigosa e não tem efeitos prejudiciais significativos quando tomado em um ambiente controlado (MDMA não foi incluído no caso da acusação).

O juiz aceitou que Friederike tinha dado seus medicamentos aos clientes como parte de um quadro terapêutico, com uma análise cuidadosa para a sua saúde e bem-estar, e a declarou culpada de posse de LSD, mas não a culparam de pôr em perigo as pessoas. Para o crime de narcóticos, ela foi multada em 2.000 francos suíços e dada uma sentença suspensa de 16 meses de liberdade condicional de dois anos.

“Eu fui abençoada por um advogado muito compreensivo e um juiz inteligente”, diz ela. Ela ainda considera a mulher que relatou ela à polícia uma bênção, uma vez que o caso lhe permitiu falar abertamente sobre seu trabalho com psicodélicos. Ela dá palestras ocasionais em conferências psicodélicas, e escreveu um livro sobre sua experiência, que ela espera guiar outros terapeutas em como trabalhar com as substâncias de forma segura.

FONTE VICE

Agradecemos imensamente a tradução feita pelo colaborador Kaio Shimanski.
Seja você também um colaborador, entre em contato:

equipemundocogumelo@gmail.com

A Segunda Revolução Psicodélica, Parte 3 – Terence Mckenna, o Surgimento do Xamã Vegetal

Esse artigo é a terceira parte de uma série de 6. Para ler a segunda parte, clique aqui.

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Metaforicamente, o DMT é como um buraco-negro intelectual, pois uma vez que alguém saiba sobre ele, é muito difícil para outros entenderem sobre o que se está falando. Ninguém consegue ser ouvido. Quanto mais o indivíduo consegue articular sobre o que essa experiência é, menos os outros são capazes de entender. É por isso que eu creio que as pessoas que obtém a iluminação são silenciosas. Elas são silenciosas pois nós não podemos compreendê-las. O porquê do fenômeno do êxtase psicodélico não ter sido examinado por cientistas, caçadores de emoções, ou qualquer outra pessoa, eu não tenho certeza, porém recomendo a sua atenção para isso.

Terence Mckenna, O Retorno à Cultura Arcaica

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A publicação de PIHKAL TIHKAL por Alexander e Ann Shulgin resultou em uma variedade imensa de novos psicodélicos (veja a segunda parte) que estão agora disponíveis em grande escala graças à escassez do LSD após a batida policial no silo de mísseis Y2K em Kansas (veja a primeira parte). Entretanto, ao contrário da primeira revolução psicodélica, que vou iniciada primeiramente pelo psicodélico artificial LSD, e em menor escala, pela mescalina, psilocibina e DMT sintetizados laboratorialmente [1], (como listado na introdução do “A Experiência Psicodélica: Um manual baseado no Livro Tibetano dos Mortos” por Leary, Metzner e Alpert em 1964), a segunda revolução psicodélica não pode ser puramente definida por drogas “sintéticas”. Embora a falta de LSD tenha popularizado o 2C-B, 2-C-T-7, 5-MeO-DIPT, e outros compostos psicodélicos laboratoriais antes desconhecidos, ela também popularizou um renascer no interesse de enteógenos naturais das plantas [2] e a popularização do previamente pouco conhecido conceito de xamanismo vegetal e a ideia que essas plantas não são tanto “drogas psicodélicas”, mas sim, “medicinas espirituais”.

O primeiro volume de Shulgin, “PIHKAL: Uma história de amor química” focou no trabalho de Sasha com a família de compostos da fenetilamina, e enquanto essa inclui muitos outros psicodélicos verdadeiros como a mescalina e os inúmeros compostos 2C-X, foi seu trabalho com os empatógenos famosos como o MDMA e o MDA [3] que trouxeram o trabalho de Sasha para a atenção da cultura “rave” no início dos anos 90. O segundo volume de Shulgin, “TIHKAL: A continuação” [4], entretanto, explorou o trabalho de Sasha com as triptaminas, a classe de compostos que inclui os neurotransmissores importantes como a serotonina e a melatonina, psicodélicos/enteógenos naturais como a psilocibina, LSD e ibogaína, e os psicodélicos endógenos, como o DMT e o 5-metóxi-DMT. 

Considerado por muito tempo como o santo graal dos psicodélicos, o DMT era comparativamente raro no mercado ilícito de drogas até mesmo nos anos 60. Sua escassez era acompanhada de sua reputação assustadora – Grace Slick, o cantora do Jefferson Airplane, uma vez disse que “ácido é como ser sugado por um canudinho, DMT é como ser atirado de um canhão”. Ele tinha praticamente desaparecido da cultura psicodélica geral muito antes do lançamento do TIHKAL. Entretanto, não foi a publicação do TIHKAL, mas um par de livros em 1992 (um anos após o PIHKAL) por um autor pouco conhecido sem nenhum treinamento em química orgânica ou antropologia cultural que iriam ser os responsáveis por popularizar o DMT na cultura psicodélica contemporânea. Mas ao contrário do uso do DMT nos anos 60, que utilizou o DMT de forma intravenosa ou fumada, o interesse primário do autor no DMT foi como um ingrediente ativo em uma bebida amazônica obscura que naquele tempo era ainda conhecida pelo seu nome hispânico yagé, diferentemente de como é conhecida agora: uma aproximação fonética de um de seus inúmeros nomes indígenas – Ayahuasca.

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Quando o “O Retorno à Cultura Arcaica” (uma coleção de ensaios e palestras de Terence McKenna) e o “Alimento dos Deuses” (sua obra prima em plantas psicodélicas que incluiu a teoria do símio chapado) foram publicados em 1991, haviam se passado pelo menos duas décadas desde que Terence e seu irmão mais novo Dennis McKenna tinham escrito “A Paisagem Invisível” (1975), um estranho volume alquímico descrevendo uma expedição à Amazônia em busca do oo-ko-heé, um rapé xamânico que continha DMT. (Terence estava procurando uma fonte natural para a experiência sintética do DMT, que como um linguista e psiconauta, ele tinha se tornado muito envolvido). Esse primeiro livro não teve grande tiragem e se tornou uma espécie de item de colecionador para psiconautas, devido à extraordinariedade da expedição e as inúmeras ideias radicais contidas em suas páginas. (Essas ideias incluiram uma compilação recente de especulações sobre tempo e casualidade, que Terence McKenna desenvolveu em sua “Teoria da Novidade”, assim como uma previsão da chegada do eschaton: uma singularidade no fim dos tempos, que ele previu que iria acontecer em Dezembro de 2012. [5] Uma vez que a expedição tenha falhado em seu objetivo de encontrar o rapé de DMT que eles estavam procurando, os irmãos Mckenna encontraram no seu lugar exemplares de Psilocybe cubensis muito psicodélicos, e em um parte menos reconhecida do trabalho de Terence Mckenna, trouxeram os esporos desses cogumelos de volta para os Estados Unidos e ficaram os anos seguintes desenvolvendo métodos efetivos de cultivo indoor, cujos resultados foram publicados no livro popular Psilocybin: A magic Mushroom Growers Guide. [6]

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Com esse trabalho – a introdução de plantas enteógenas facilmente disponíveis [7] e que qualquer um poderia cultivar em forma de livro de instruções – os irmãos McKenna mereceriam uma menção, mas esse seria apenas o começo de carreiras extraordinárias na arena psicodélica para ambos. Dennis McKenna voltou para a universidade, e se tornou um etnofarmacologista respeitado. Durante a última década de sua vida – e agora na primeira década do século 21 – o filósofo e engenheiro memético Terence McKenna (1946 – 2000) se tornou o mais popular e reconhecido porta-voz para os psicodélicos desde Timothy Leary [8]. Foi Terence o mais responsável por evoluir a cultura psicodélica contemporânea ao seu estado atual, graças a seus escritos e palestras, muitas das quais estão sendo transmitidas em podcasts na internet desde sua morte – um meio de comunicação que ele abraçou entusiasticamente durante sua vida como uma nova forma de comunicação e expressão artística, e que agora acabou imortalizando-o.

A publicação de O Retorno à Cultura Arcaica e O Alimento dos Deuses coincidiu de fato sincronisticamente com os primeiros anos da Internet e da música eletrônica, e enquanto Timothy Leary foi um pioneiro da rede, foi Terence que a cultura “rave” dos anos 90 abraçou enfaticamente. Nos últimos anos de sua vida Terence McKenna foi com frequência o mais o palestrante mais popular e esteve nas principais conferências, assim como uma atração principal nas raves – auto declarando-se “Voz dos Cogumelos” ele tinha a habilidade de fazer uma sala inteira de dança se sentar durante os intervalos dos DJs para escutar sobre a beleza dos psicodélicos, por horas a fio às vezes. Sua capacidade extraordinária para o discurso e a descoberta de uma audiência com frequência muito cativa coincidiu mais uma vez com a revolução da Internet, e muitas conferências de Terence eram tecnologicamente evoluídas para a época (há um relacionamento de longa duração entre a comunidade psicodélica e a do vale do silício [9]), resultando em um número incrível de gravações e podcasts, muitas vezes mixados em músicas eletrônicas.

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A morte inesperada e fora do tempo aos seus 53 anos também coincidiu com a seca do LSD que se seguiu à batida policial do silo de Kansas em 2000, e o período em que os psiconautas foram forçados a considerar novas opções psicodélicas. Cogumelos mágicos tiveram sua importância aumentada na cultura psicodélica, e o interesse cresceu tanto para a ayahuasca, que começou a aparecer na américa do norte em meados de 1990, e o DMT, que tinha sido escasso por décadas, também começou a se tornar mais disponível a partir de 2000. Esse interesse nas ideias centrais de Terence, juntamente com sua popularidade nas comunidades de música eletrônica e de tecnologia – aumentaram a influência de Terence exponencialmente quando ele morreu. Um processo amplificado por sua previsão da chegada do escathon em 21 de Dezembro de 2012 – a previsão que ironicamente (e infelizmente) ele não viveu para ver.

Agora por mais de uma década desde sua morte, e mais de um ano depois dos eventos da histeria e esperança do ano 2012 que ele ajudou a criar, não há como negar a influência de Terence McKenna na cultura psicodélica contemporânea, ou até mesmo na cultura popular por si mesma. A veneração dos “cogumelos mágicos” e a reintegração da figura da Divindade; o interesse atual no DMT em suas diversas formas; a com frequência debatida suposição que os enteógenos naturais são superiores à compostos artificiais ou sintéticos, mais notavelmente o LSD; nossos conceitos sobre espíritos das plantas, xamanismo, e o aumento do turismo da ayahuasca; a ideia moderna do “renascimento arcaico” dos festivais para revigorar a espiritualidade na sociedade ocidental; a fusão dos psicodélicos e da cultura virtual; abduções e o fenômeno UFO; e claro, o fenômeno do ano de 2012: esses foram todos memes nascidos ou popularizados pelas ideias e interesses de Terence McKenna, mesmo que ironicamente, ele tenha vivido pouco para ver a mudança que ele criou em diversas formas.

Na década que se seguiu à sua morte, os pontos focais do trabalho da vida de Terence Mckenna se tornaram, para o melhor e o pior, algo como uma planta baixa para o surgimento da cultura global neo-tribal e neo-xamânica, evidenciada no Burning Man, no festival Boom!, e em outros eventos intermináveis que as representam. As ideias de Terence influenciaram a moda psicodélica, as músicas que escutamos, os psicodélicos que utilizamos (e o modo como o utilizamos), os países que visitamos, até mesmo a maneira que usamos a internet. Sua previsão de uma singularidade no fim dos tempos de nossas vidas (senão de sua própria) forneceu um códex moderno para a antiga tradução Maia, e ajudou a gerar o interesse mundial no que antes seria uma data arqueológica insignificante. Mas agora que nós estamos no outro lado do Omega Point de 2012 e tudo ainda está de pé, é a popularização da ayahuasca feita por Terence que é digna de nossa atenção.

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Durante a última década o aumento do interesse na ayahuasca tem sido extraordinário, e desde o advento do LSD nos anos 60, nenhum psicodélico capturou a imaginação artística e espiritual da mesma maneira, e o uso da ayahuasca, mesmo que muito menor que o número de usuários do LSD nos anos 60, se tornou comum o suficiente para penetrar a mídia. (Marie Claire, uma revista feminina popular, é a última publicação incomum, com um artigo sobre os círculos da ayahuasca [10]). Conhecida previamente na cultura psicodélica através do livreto de William S. Burroughs e Allen Ginsberg chamado The Yage Letters publicado em 1963, foi a popularização de Terence McKenna dessa bebida xamânica amazônica incomum  nos anos 1980-1990 que daria origem à uma “cultura da ayahuasca”. Quando os primeiros xamãs sul-americanos começaram a visitar a Europa e os EUA nos anos 90, o uso da ayahuasca se espalhou rapidamente no século 21, um processo que foi acelerado pela escassez do LSD, forçando os psiconautas a procurarem por outros caminhos para experiência psicodélica. (Há também ocorrido um interesse renovado no San Pedro e no Peyote, enquanto formas fumáveis do DMT têm reaparecido nos mercados negros pela primeira vez em décadas, juntamente com receitas para extração de plantas que são comumente disponíveis na internet.)

Proibição, pelo que parece, apenas gera diversificação, e uma diferença notável que separa a Segunda Revolução Psicodélica da Primeira é a imensa variedade de psicodélicos e empatógenos, tanto naturais como sintéticos, que estão agora disponíveis.

A cultura da ayahuasca por si só começou, em muitos sentidos, a se desenvolver fora da comunidade psicodélica tradicional, muitos na comunidade do yoga por exemplo, abraçaram a ayahuasca, com centros independentes de yoga ao redor do mundo hospedando xamãs sul-americanos e suas cerimônias que atraem muitos indivíduos com pouca ou nenhuma conexão com a comunidade psicodélica, uma vez que eles não vêm a ayahuasca como uma droga psicodélica, mas uma medicina sacramental.

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Enquanto a ayahuasca contém DMT, uma substância da lista 1 (substâncias sem nenhum uso médico e psicológico), juntamente com o LSD, o uso da ayahuasca não tem sido (até agora) perseguido nos Estados Unidos. Leis federais favoráveis em 2000 em relação às igrejas União do Vegetal (UDV) e o Santo Daime, que utilizam ayahuasca em suas cerimônias, foram interpretadas como um furo na lei para muitos, e foi sem dúvida um fator no aumento da popularidade da ayahuasca. Enquanto mais e mais celebridades ressaltam suas experiências de mudança de vida com a bebida amazônica, e mais e mais psiquiatras e psicólogos especulam sobre os benefícios da experiência, o aumento da retórica em torno da ayahuasca lembra a excitação que o LSD inspirou quando foi tornado ilegal em 1966.

É virtualmente impossível quantificar a experiência psicodélica; a ayahuasca ganhou uma reputação especial devido à visões coloridas que induz, enquanto o pináculo do LSD é geralmente representado como uma dissolução na “luz branca” mística. Quando comparados sob uma perspectiva estritamente fenomenológica, ambos possuem reputação por serem capazes de induzir o paraíso ou o inferno, e ambas experiências são longas e fisicamente desgastantes. Ambos são descritos como enteógenos reais, capazes de induzir catarses espirituais de mudança de vida; ambos tem sido bem-sucedidos no combate ao vício; e ambos se originaram como medicinas. (O LSD foi originalmente um medicamento legal). Muitas das propriedades extraordinárias atribuídas a um deles – telepatia, um aumento na sincronicidade diária, inspiração artística, conexões profundas com a natureza, experiências místicas e transpessoais – também foram atribuídas ao outro. Então onde está a diferença entre essas duas “Revoluções Psicodélicas”, ou simplesmente nós trocamos altas dosagens de um potente enteógeno fabricado em um laboratório na Suíça por um equivalente natural colhido nas florestas amazônicas?

A diferença reside não muito na fenomenologia da experiência psicodélica interna, mas no conteúdo externo; a experiência do xamã e seus ícaros, e o ritual contido nas próprias experiências. Quando o uso do LSD explodiu em 1960 após ter se tornado ilegal, o que faltou essencialmente na Primeira Revolução Psicodélica foi um ambiente seguro para a experiência. Muitas pessoas jovens caíram em situações perigosas, e as consequências culminaram na ilegalidade dos psicodélicos. O que nós aprendemos da primeira revolução psicodélica é que no ocidente, faltam as escolas místicas necessárias para integrar com sucesso e benefícios o uso dos psicodélicos em nossa sociedade. Muito da evolução da cultura psicodélica contemporânea tem sido um processo de investigação e integração da sabedoria e técnicas antigas com a experiência psicodélica anedótica que foi gerada nos últimos 50 anos.

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Primeiramente procurando conhecimento e direção em estados alterados de consciência dos Gurus e Rinpoches da Índia, então os xamãs da bacia Amazônica, e agora de uma variedade ampla do xamanismo tradicional de inúmeras culturas, a cultura psicodélica moderna se adaptou aos enteógenos disponíveis, e moveu-se de bom grado entre o laboratório e o conhecimento ancestral das plantas na procura da experiência enteógena não diluída. O chamado entusiástico de Terence McKenna do xamã como um guia psicodélico espiritual (em oposição ao curador homeopático que pode estar mais próximo à realidade) resultou em milhares de americanos e europeus viajando para o Peru, Ecuador e o Brasil na procura dessa orientação, e uma onda de xamãs sul-americanos migrou para costas estrangeiras – uma inovação psicodélica que inevitavelmente gerou uma série de imitadores locais, e infelizmente tornou a palavra “xamã” uma das mais abusadas no vocabulário atual. Canções guias da ayahuasca, chamadas de ícaros podem agora serem encontradas misturadas em música eletrônica, a palavra icaros impressa em vestimentas de festivais, e o hábito de participar de círculos de ayahuasca começou a se tornar um status “cult” em locais diversos como Asheville, Brooklyn, Los Angeles, Portland, e Santa Fe (somete para citar algumas).

Durante esse mesmo período, universitários estudando a história do ocidente e antropologia tiveram que reconciliar o fato de que muitas das maiores civilizações e religiões mundiais – incluindo os gregos, hindus e budistas – utilizaram plantas psicodélicas. Essa é uma ideia que tem sido extremamente impopular, mas é agora incrivelmente óbvia para as gerações de antropologistas e mitologistas psicodélicos nascidos desde os anos 60, muitos dos quais estão familiarizados com o trabalho de Terence McKenna. É agora amplamente aceito e concluído que a ayahuasca amazônica (e o dmt-rapé) pode ser considerada o último enteógeno sacramental [11] de uma grande era planetária marcada por pelo menos cinco culturas enteogênicas distintas, e que duraram cada uma pelo menos dois mil anos; as outras sendo o Soma nos hindus Vedanta (Índia), os kykeon dos mistérios de Elêusis (Grécia), a cultura do San pedro que teve seu pico em Chavín de Hunatar (Peru), e a variedade impressionante de psicodélicos (cogumelos cubensis, sementes de glória da manhã, cacto peyote, e toxinas de rãs) utilizados pelas culturas Maia, Tolteca e Asteca (México). [12] O xamanismo vegetal é agora reconhecido como sendo o modelo xamânico primário mundialmente, e não um “substituto vulgar do trance puro” para os métodos xamânicos tais quais os tambores e cânticos, como Mircea Eliade [13] supôs em seu texto clássico de 1951 chamado Shamanism: Archaic Techniques of Ecstacy. (Eliade mudou de opinião no final de sua vida, falando para Peter Furst em uma entrevista não muito antes de sua morte que nos anos 60 os antropologistas não tinham uma perspectiva psicodélica suficiente para reconhecer a importância dos variados ritos locais, então a evidência simplesmente não estava lá [14].)

Terence McKenna foi um dos primeiros escritores que realmente juntou a história psicodélica da humanidade e a ligação da ayahuasca com nosso passado remoto. Foram seus escritos que ajudaram a espalhar a beleza, mito e magia do povo e cultura amazônica para uma audiência maior, e apesar de sua associação com o fenômeno 2012 e a triste mescla dos dois, sua defesa das plantas enteógenas e a reintrodução do processo xamânico no mundo ocidental modeno serão sempre lembradas como sua contribuição fundamental para a cultura psicodélica. Até mesmo sua teoria do símio chapado – a ideia que a linguagem falada evoluiu quando nossos ancestrais primatas desenvolveram uma dieta que incluía cogumelos com psilocibina – pode ser algum dia popular e ser levada a sério. Sua morte com a idade de 53 anos roubou da cena psicodélica seu porta-voz mais carismático, e garantiu a imortalidade de Terence McKenna graças à tecnologia emergente da internet que ele adotou entusiasticamente, e será lembrado como um dos primeiros pod-casters famosos. [15]

[1] DOM ou STP, que também pode ser incluído nessa lista, não apareceu até 1966.

 

[2] Enteógeno (Despertando o Deus Interior); uma planta ou composto que pode induzir uma experiência mística, e é com frequência considerado sagrado.

 

[3] que são psicodélicos somente em altas dosagens (geralmente)

 

[4] Triptaminas que eu conheci e amei na sigla em inglês

 

[5] A data original da previsão de Terence McKenna foi 16 de Dezembro de 2012 (coincidindo com o que seria seu 66o aniversário); Terence mais tarde mudou a data para o dia 21, coincidindo com o calendário Maia.

 

[6] Sob os pseudônimos OT Oss e ON Oeric

 

[7] Enteógeno (Despertando o Deus Interior); uma planta ou composto que pode induzir uma experiência mística.

 

[8] e o mais controverso desde Leary!

 

[9] Veja What the Doormouse Said: How the Sixties Counterculture shaped the Personal Computer Industry (2005) por John Markhoff.

 

[10] http://www.marieclaire.com/world-reports/ayahuasca-new-power-trip

 

[11] Enquanto ambos Soma Kykeon desapareceram há muito tempo juntamente com suas identidades reais desconhecidas, a cultura do San Pedro no Peru ainda sobrevive de certa maneira, porém em uma forma sincrética cristã muito diluída, assim como os remanescentes de cultos do cogumelo no México, mas a cultura e uso amazônicos da ayahuasca representa a maior cultura enteogênica ainda em efeito no planeta, e permaneceram inalteradas até mesmo no mundo pós segunda guerra. Ironicamente, as igrejas da ayahuasca no Brasil (Santo Daime e União do Vegetal) alcançaram níveis de legalidade graças à suprema corte definindo-as também como religiões sincreístas. Essas igrejas atribuem a descoberta da ayahuasca para seus fundadores mestiços, e não para as tribos indígenas amazônicas.

 

[12] Um argumento que pode ser desenvolvido é que com a invenção do LSD, e agora com milhares de research chemicals disponíveis, nós estamos no processo de criação da 6a – e pela primeira vez global – cultura enteogênica.

 

[13] O pai da Fenomenologia de Religião, e o homem que cunhou o termo “xamã” (do sibérico) para designar curandeiros amazônicos.

 

[14] “O que nós sabíamos sobre essas coisas em 1950?” confessou Eliade para Furst.

 

[15] Pesquise por “Terence McKenna” no Google e você terá aproximadamente 1.6 milhões de resultados, muitos deles sendo podcasts e gravações.

Fonte

Os benefícios do LSD vão mudar a forma como falamos sobre drogas

Falar sobre ácido sempre envolveu apenas a viagem. Deveríamos focar nos efeitos de longo prazo.

img-thingTemos olhado para o LSD da forma errada. Ao longo do último meio século, temos focado sobre os efeitos a curto prazo de tomar ácido os variantes efeitos visuais, as cores vibrantes, a desconexão da realidade ordinária quando deveriamos estar incidindo sobre os benefícios de longo prazo, incluindo os efeitos terapêuticos que só agora os cientistas estão descobrindo. O renascimento da pesquisa psicodélica em curso, essencialmente, uma onda de estudos em pequena escala, mostra que os usuários de LSD se tratam preventivamente de doenças mentais e até certo ponto   contra o alcoolismo, depressão e Síndrome de Estresse pós-traumático. A legislação ainda faz a prescrição médica do LSD se isolar em um futuro próximo, mas a conversa sobre como ficar doidão pode ser apenas um efeito colateral do uso da substância, pode começar agora.

Os mitos que cercam LSD, perpetuados por hedonistas modernos como Lana del Rey John Misty, tornam difícil para os legisladores aceitarem-na como uma droga psiquiátrica tal qual o Prozac, o Zoloft, ou o Celexa. Mas este era de fato o uso pretendido desde o início. Albert Hofmann, ao descobrir a droga em 1943, imediatamente começou a lhe procurar aplicações psiquiátricas. E esse impulso continua forte na comunidade científica: Mais de 1.000 trabalhos de pesquisa acadêmica sobre os efeitos do LSD foram publicados antes do Verão do Amor resignificar o ácido como uma forma de se rebelar contra o status quo.
Atualmente, o FDA lista o LSD como substância de categoria 1, alegando que não há nenhum uso médico aceitável. Sob uma perspectiva científica, isso é uma mentira. Da perspectiva cultural do senso comum, é a verdade estabelecida (porém a visão está mudando)

Mais cedo, agora em fevereiro/2016, os pesquisadores britânicos Dr. Robin Carhart-Harris e David Nutt PhD (famoso pela frase “ecstasy é mais seguro que andar a cavalo”) publicaram um artigo na Psychological Medicine descrevendo a habilidade paradoxal do LSD para disparar psicoses em curto prazo enquanto deixa um resíduo de alteração cognitiva no meio e longo prazo que é decisivo para uma melhora do bem estar psicológico.

Dr. Robin Carhart-harris
Dr. Robin Carhart-harris
David Nutt PhD
David Nutt PhD

No ano passado, Carhart-Harris e Nutt também observaram os efeitos do LSD sobre o cérebro de 20 voluntários usando ressonância magnética, relatando que os primeiros resultados foram promissores para o tratamento de depressão e alcoolismo. O trabalho deles tem sido limitado por uma escassez de financiamento. Ainda assim, existem estudos suficientes para que haja meta-estudos, inclusive um recente, sobre LSD e alcoolismo, publicado no Journal of Psychopharmacology em 2012, que revelou que o uso de LSD em combinação com programas de dependência de álcool ajudou os voluntários a diminuirem o abuso da substância.

Outro estudo altamente divulgado, publicado no Journal of Nervous e Mental Disease em 2014, observou que o LSD, quando administrado ao longo de dois meses, sob condições cuidadosamente controladas, promove a redução da ansiedade em doenças terminais, a longo prazo. Este estudo, realizado na Suíça, país que acolheu a pesquisa psicodélica, enquanto o resto das Nações Unidas se apavorou na década de 1970, foi o primeiro estudo controlado do LSD publicado em mais de 40 anos.

É importante perceber que estes estudos receberam uma enorme cobertura da imprensa, porque foram publicados em revistas científicas com revisão por pares. O fato de isso não acontecer mais frequentemente não é necessariamente um reflexo da inadequação ou da escassez de outros estudos psicodélicos em curso; na verdade, aponta, pelo menos em certa medida, para o preconceito com as drogas alucinógenas, que persiste mesmo na comunidade científica. Credibilidade científica, infelizmente, é a única coisa que puxa o financiamento. Sem dinheiro, os estudos são enfraquecidos as licenças necessárias para estudar substâncias de categoria 1 são incrivelmente caras e assim torna necessário o impulso para reclassificar a substância como algo que valha a pena considerar medicamente. Sendo assim, o financiamento se torna ainda mais escasso.

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Porém os benefícios a longo prazo do LSD apresentam um tratamento para a ignorância cultural, bem como para o abuso de outras substâncias. Eles forçam a conversa sobre a droga longe dos efeitos imediatos da droga, que é uma coisa difícil de fazer, dada a qualidade extrema que esses efeitos podem tomar. O que as pessoas estão começando a perceber lentamente é a idéia de que substâncias psicoativas fazem uma coisa no curto prazo e outra a longo prazo. É bastante claro que não estamos culturalmente preparados para falar sobre os benefícios ou problemas a curto prazo. Mas podemos falar sobre os efeitos na saúde a longo prazo. Isso é essencialmente o que aconteceu com a questão sobre os cigarros, ainda que em sentido inverso. Uma conversa sobre o quão legal o cigarro faz as pessoas parecerem, se torna uma conversa sobre como eles causam câncer. Neste caso, uma conversa sobre o quão estranhas as pessoas podem se sentir com LSD, pode tornar-se uma conversa sobre seus benefícios psicológicos de longo prazo.
Uma vez que nós mudamos substancialmente a forma como falávamos sobre outras substâncias no passado, há muita esperança para o futuro. Há também o fato de que, e isso é realmente importante, boa ciência está sendo feita. Os pesquisadores da vanguarda do campo não são um bando de Josh Tillman doidões no deserto da Califórnia; eles são acadêmicos que podem, ao contrário dos rapazes a executar o divórcio do LSD de seu passado colorido com o FDA. Eles não estão nem aí para os anos 60.
Traduzido do Original em Inverse.com

Conheça o Palácio do LSD em São Francisco

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O LSD revolucionou o ocidente, e a proibição acabou impulsionando uma nova forma de arte. Nos encontramos com Mark McCloud, o colecionador de ácidos que encheu sua casa de lisergia na cidade de São Francisco.

 

Era uma vez uma substância que protagonizou a maior revolução cultural do século XX. Vinha de fábrica na forma de um líquido transparente, envasado em ampolas de vidro opaco ou conta-gotas. As imagens dos primeiros viajantes mostram jovens de camisa e cabelo curto ingerindo torrões de açúcar ou copos de água com LSD, em recintos controlados, com um psiquiatra vigiando a sessão e com o auxílio de uma enfermeira.

Com a ilegalidade, acabaram as sessões psicodélicas patrocinadas por universidades. Também acabaram os doutores anotando os resultados e as enfermeiras participando de esquizofrenias experimentais. A lei tentou travar o avanço do consumo de LSD, porém foi como apertar uma granada armada: não importa quanta força você faça, a única coisa que você irá conseguir é ficar sem uma mão.

O primeiro ácido na forma de blotter disponibilizado comercialmente foi em 1968 (depois da ilegalização: eram utilizadas tiras de papel tornassol, que reage com o LSD formando um ponto azul (blue dot acid). O formato atendeu às exigências de quase toda mercadoria ilegal: era fácil de transportar, esconder e disfarçar. Outra das razões que levaram os usuários a trocar a forma de transportar o LSD foi devido à implementação de sentenças mínimas. O princípio é básico: quantidades fixas de uma substância ilegal (em dose ou peso) eram penalizadas com tempo obrigatório de prisão correspondente. O ponto é que, antes do milagre do papel, o meio mais comum para dosar o LSD eram torrões de açúcar ou cápsulas. Assim, uma pessoa com um grama de açúcar embebido em ácido (que continha apenas uma dosagem) poderia receber a mesma pena que uma pessoa que tinha um grama puro, que poderia gerar mais de 10.000 doses. A busca de um suporte para o LSD com o menor peso possível foi vital para que os usuários não acabassem atrás das grades acusados de traficar a granel.

Mas além dos formatos, há algo totalmente indiscutível e que expressa a radicalidade do que foi uma revolução: a maneira na qual os Beatles passaram do Rubber Soul (quando eles começaram a tomar LSD por causa da influência de Bob Dylan) ao Sgt. Pepper´s Lonely Hearts Club Band é algo que só podemos atribuir à magia da Dietilamida do Ácido Lisérgico.

Cartela de LSD contendo fotografia dos integrantes da banda Beatles.
Cartela de LSD contendo fotografia dos integrantes da banda Beatles, presente no catálogo de Mark.

Instituto das Imagens Ilegais

Todo psiconauta gostaria de ir ao aniversário de Mark McCloud. Foi amigo de Albert Hofmann e de Owsley Stanley. Conhece Alex Grey, Howard marks, Alexander Shulgin e o DJ Goa Gil. Era professor de arte, até que uma viagem, uma viagem muito boa, o deixou com vontade de ele mesmo desenhar as cartelas. Foi em dezembro de 1971, quando existia o legendário Orange Sunshine de Owsley. Essa viagem, que ele levou 10 anos para assimilar, deixou de lembrança uma cartela emoldurada e pendurada na parede. Mais tarde, McCloud afirmaria que mostrar ao mundo a arte comestível do LSD era uma forma de pagar a dívida por aquela experiência.

Se os franceses foram os primeiros a integrar uma arte clandestina (o graffiti) ao sistema (fazendo logos para a Nike, Coca-Cola ou Sony), e foi o inglês Banksy quem o reconverteu em uma declaração política esculpida com pintura, Mark McCloud foi o pioneiro em reconhecer o lugar cultural que o blotter art tinha ganhado na cultura psicodélica. O desenho não faz nenhum tipo de efeito sobre a substância, é totalmente inócuo. É uma necessidade humana, tal qual pintar búfalos nas paredes de uma caverna, colorir o rosto para assustar o inimigo ou pixar as paredes de um McDonald’s.

Na iconografia psicodélica do instituto encontramos desde o Mickey e o Gato Félix até mesmo Gorbachov, Obama e personagens do filme Avatar. Encontramos também personagens de Lewis Carroll, Robert Crumb, Charles Schultz e Matt Groening. Existem dragões chineses milenários, deuses indianos, homenagens a estrelas do rock, químicos e escritores. Um artista de blotter art se apropria de uma imagem e atribui a ela um novo significado.

Nas mentes dominadas por níveis básicos de análise, como no caso dos oficiais e empregados da lei, argumentos como que os desenhos servem para identificar diferentes laboratórios, potências ou até mesmo que os desenhos são para chamar atenção das crianças pequenas. E assim, esquecem do básico: a arte não influencia, pelo menos não em um sentido estritamente químico.

A realidade é que a blotter art poderia ser a resposta do rock à pop art. “A boa arte tem sempre a capacidade de transformar sua mente”, refletiu uma vez Mark, “porém a boa arte embebida em LSD com certeza tem essa capacidade”. De certa forma, se pintar uma lata de sopa com cores vibrantes era transgressor, fazer quadros em miniatura que iriam acabar embaixo da língua de alguém ou auto-digeridos pelo ácido lisérgico em que eram embebidos é com certeza um ato desafiador.

Interior do Palácio do LSD, também conhecido como Instituto das Imagens Ilegais.
Interior do Palácio do LSD, também conhecido como Instituto das Imagens Ilegais.

Em uma entrevista, McCloud reforça a importância da blotter art comparando-a com uma missa católica. “Em uma missa, a hóstia funciona de maneira muito semelhante a um blotter. Se imprime de um lado uma lâmina de pão liso a figura do espírito santo, e no outro lado, a marca da paróquia que a produziu. Eu poderia ir de paróquia em paróquia colecionando hóstias, mas como não são populares, me inclinei a colecionar a hóstia ativa, aquela que aproxima novamente o misticismo das pessoas”.

É somente arte, amigo

Em 1987, com uma coleção respeitável e com uma exposição que começava a se mostrar em galerias de arte, começaram os problemas com os agentes do FBI. Ao iniciar sua coleção, McCloud só tinha acesso a cartelas embebidas em ácido, que logo tinha que inativar expondo-as sob luz ultravioleta para que o LSD fosse degradado em formas não psicoativas. Mas, ainda assim, o governo sustentava que a coleção de Mark, e a produção de cartelas desenhadas e perfuradas, era um disfarce para a distribuição de insumos para a fabricação de narcóticos. McCloud se permite fazer algumas ironias a esse respeito: “emoldurar é a melhor maneira de conservá-los, por que você não pode engolir as molduras”.

Os anos 90 foram agitados, e no começo dos anos 2000, sua casa foi invadida e uma coleção de mais de 400 cartelas foi confiscada. A defesa afirmou que o artista ou o produtor das cartelas não era responsável pelo uso que elas tiveram depois de serem vendidas e, por outro lado, se toda a coleção não continha nenhum LSD, não havia nenhum tipo de delito.

“Você não tem ideia do que é levantar-se todas as manhãs e ter quatro agentes lhe seguindo onde quer que você vá, apenas por fazer algo legal, algo melhor”, declarou Mark há um tempo em uma entrevista. “Não têm ideia do que é ser perseguido todos os dias de sua vida pelo trabalho artístico que você realiza”.

Durante o julgamento, em 2001, foi provado que 33 milhões de doses de LSD também podem ser 33 mil cartelas de papel secante que compõem um projeto artístico de mais de 30 anos de trabalho. Como afirmou Carlo McCormick: “A arte de McCloud é uma peça de suma importância para o folk norte-americano”.

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Você pode conferir alguns blotters catalogados, além de outras informações sobre o museu, na página Blotter Barn.

Fontes: Wired & Blotter Barn

Os Efeitos Paradoxais do LSD, explicados por cientistas

Uma renderização artística da experiência psicodélica. Cientistas dizem que o LSD tem efeitos psicológicos paradoxais.
Uma renderização artística da experiência psicodélica. Cientistas dizem que o LSD tem efeitos psicológicos paradoxais.

O LSD pode causar um estado de psicose temporário, mas também pode levar a um bem-estar mental melhorado.

Drogas psicodélicas como o LSD tem o poder de mudar radicalmente a consciência, dando surgimento a uma série de efeitos psicológicos que são positivos, negativos, místicos e simplesmente esquisitos.

As pesquisas da última década mostraram que a psicoterapia assistida com LSD pode potencialmente tratar uma série de doenças mentais, incluindo a depressão, o vício, e ansiedade no período final da vida. Por outro lado, os cientistas também usaram o LSD para replicar os efeitos da psicose.

Mas se o LSD reproduz as características de um estado mental não saudável – psicose de estágio inicial – como ele pode melhorar a saúde mental a longo prazo?

Novas pesquisas apontam para uma resposta. Um estudo do Imperial College London publicado no último dia 5 na revista Psychological Medicine confirma que o LSD produz efeitos paradoxos, incluindo sintomas semelhantes a psicoses e bem-estar psicológico. Esses efeitos podem ser o resultado da tendência que esse fármaco tem de causar “maleabilidade cognitiva”, a qual os pesquisadores descrevem como uma espécie de flexibilidade mental melhorada.

“Existe provavelmente um ponto chave no equilíbrio de pensar entre a flexibilidade de um lado – a habilidade de ser adaptativo e criativo – e no outro lado, ser capaz de focar e ser organizado”, disse ao Huffington Post o Dr. Robin Carhart-Harris, um pesquisador psicodélico e autor líder da publicação.

“De alguma maneira, é assim que a consciência comum age quando você está saudável – você atinge esse ponto chave. Talvez os psicodélicos tendam a empurrá-lo um pouco mais para o lado criativo e adaptativo”, ele falou.

Embora sua mente seja flexível, Carhart-Harris explicou, você pode correr o risco de psicose: “Ideias que estão sendo geradas sem ter uma ancoragem sólida na realidade ou na lógica.”

[su_pullquote]Talvez os psicodélicos tendam a empurrá-lo um pouco mais para o lado criativo e adaptativo”

Dr. Robin Carhart-Harris, do Imperial College London

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Os 20 indivíduos adultos saudáveis que participaram na pesquisa passaram por duas seção de laboratório separadas por um período de duas semanas. Todos receberam 75 microgramas durante uma seção e um placebo durante a outra seção.

Os pesquisadores utilizaram um questionário de estados alterados de consciência para medir as “experiências espirituais, ansiedades, imaginário complexo e outros efeitos comuns das drogas psicodélicas” de cada paciente. Eles também utilizaram um questionário separado para acompanhar os sintomas semelhantes à psicose.

Como previsto, o LSD aparentou produzir resultados psicológicos contraditórios e significativos nos participantes da pesquisa, aumentando sua flexibilidade mental e melhorando o seu humor ao mesmo tempo em que levou a alguns sintomas que lembraram psicoses.

Duas semanas após cada seção, os participantes preencheram dois questionários sobre suas personalidades e tendências em relação ao otimismo e à desilusão. Suas respostas sugerem que eles se tornaram mais otimistas e de mente aberta, expressando grande curiosidade intelectual e sede de conhecimento e experiência. O seu pensamento não pareceu se tornar mais ou menos delirante, os pesquisadores observaram.

O que está acontecendo com o cérebro para que esses resultados sejam observados? Em outro estudo recente, a mesma equipe de pesquisa no Imperial College examinou como o LSD leva à “perda do ego” e produz um estado semelhante à psicose. Suas descobertas mostraram que o LSD faz isso reduzindo a conectividade dentro das redes cerebrais, e aumenta a conectividade entre as redes cerebrais que normalmente não interagem.

Essas mudanças na conectividade podem ser a resposta para a “perda cognitiva” que os pesquisadores mencionam. Essas mudanças também podem ilustrar como os psicodélicos como o LSD e a psilocibina (encontrada nos cogumelos mágicos) podem ter efeitos terapêuticos a longo prazo, embora inicialmente pareçam produzir um estado mental de psicose.

Um estudo da John Hopkins mostrou que adicionalmente aos efeitos terapêuticos conhecidos de drogas psicodélicas para várias doenças mentais, uma sessão simples de psilocibina pode gerar experiências místicas que resultam em efeitos positivos permanentes na personalidade – notavelmente, uma maior abertura a novas experiências. Outros estudos sugerem que os psicodélicos podem ajudar a reduzir a ansiedade e as chances de suicídio.

“Seria errado exagerar na relação existente entre os psicodélicos e a psicose, por que durante o estado psicodélico agudo, pode haver uma clareza surpreendente”, Carhart-Harris notou. “As pessoas podem ter insights genuínos”.

A pesquisa foi conduzida pelo Beckley/Imperial Research Programme.

Fonte

Além de Não Prejudiciais, Psicodélicos podem Ser Benéficos

Mais um estudo falhou em demonstrar uma ligação entre a dietilamida do ácido lisérgico (LSD) ou outras drogas psicodélicas e a depressão, ansiedade e pensamentos ou comportamentos suicidas. Na verdade, os pesquisadores descobriram uma ligação entre psicodélicos e uma diminuição no tratamento psiquiátrico em regime de internamento.

Estes resultados são semelhantes aos de outros estudos recentes e soma-se a um crescente corpo de literatura indicando que as drogas psicodélicas podem não ser apenas seguras, mas na verdade serem terapêuticas quando se trata de saúde mental.

“A pesquisa sugere que os psiquiatras não devem ser preconceituosos contra as drogas psicodélicas e que, se eles têm pacientes que utilizam essas substâncias, não é necessariamente ruim para eles”, disse ao Medscape Medical News a investigadora do estudo Teri Suzanne Krebs, estudante de PhD e colega pesquisadora no Departamento de Neurociências da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia, em Trondheim.

“Os médicos devem saber que é possível prescrever drogas psicodélicas agora, hoje, embora possa haver alguma papelada envolvida”, acrescentou.

Isso, acrescentou, está escrito na Convenção das Nações Unidas de 1971 sobre Substâncias Psicotrópicas.

O novo estudo foi publicado online 05 de março no Journal of Psychopharmacology.

SEM LIGAÇÃO COM DOENÇAS MENTAIS

Para o estudo, Krebs trabalhou com Pål-Ørjan Johansen, de EmmaSofia, uma empresa sem fins lucrativos com o objetivo de aumentar o acesso ao 3,4-metilenodioxi-metanfetamina (MDMA) e psicodélicos.

Os pesquisadores utilizaram o anual National Survey on Drug Use and Health (NSDUH — Pesquisa Nacional sobre Uso de Drogas e Saúde), que recolhe dados sobre o uso de substâncias e saúde mental de uma amostra aleatória representativa da população civil não institucionalizada dos Estados Unidos. Eles reuniram dados de entrevistados com idade superior a 18 anos das pesquisas dos anos 2008 até 2011.

A amostra foi composta por 135.095 entrevistados, dos quais 19.299 (13,6% ponderada) relataram uso durante vida de uma substância psicodélica — incluindo LSD, psilocibina, mescalina ou peyote. Estes são todos psicodélicos serotoninérgicos clássicos cujo mecanismo de ação principal é a do receptor 5-HT2A.

Os pesquisadores examinaram autorrelatos de 11 indicadores de problemas de saúde mental dos últimos 12 meses, incluindo depressão, transtornos de ansiedade e pensamentos, planos e tentativas suicidas.

O estudo descobriu que os usuários de psicodélicos eram mais propensos que os não usuários a serem mais jovens, do sexo masculino, brancos, solteiros, a realizarem atividades de risco, e de terem usado outras drogas. Eles também foram mais propensos a relatarem um episódio depressivo antes dos 18 anos. É possível, disse Krebs, que a depressão infantil motive algumas pessoas a experimentar substâncias psicodélicas.

O uso vitalício de psicodélicos não foi associado com qualquer um dos indicadores de problemas de saúde mental (adjusted odds ratio [aOR] gama, 0,7–1,1), Em vez disso, o uso vitalício de psicodélicos foi associado a uma menor probabilidade de internação para tratamento da saúde mental nos últimos 12 meses (aOR , 0,8; 95% intervalo de confiança, 0,6–0,9; P = 0,01).

Os investigadores também encontraram níveis mais baixos de comportamento suicida entre os usuários de drogas psicodélicas, mas isso não foi estatisticamente significativo, disse Krebs.

Olhando para drogas psicodélicas individualmente, o estudo mostrou uma associação estatisticamente significativa entre o uso de psilocibina e uma menor probabilidade de grave distúrbio psicológico, internação hospitalar para saúde mental e prescrição de medicamentos psiquiátricos (AOR, 0,9; P = 0,007).

Uso de LSD nos últimos 12 meses foi associado a uma menor probabilidade de grave distúrbio psicológico (AOR, 0,8; P = 0,04).

No entanto, o uso de mescalina ou peyote foi associado a uma maior probabilidade de um grande episódio depressivo nos últimos 12 meses.

“Quando você está usando um monte de diferentes comparações estatísticas como esta, você espera encontrar algumas coisas apenas por acaso”, explicou Krebs. Ela observou que a significância estatística foi muito fraca e que o tamanho do efeito foi pequeno.

Assim, ela acrescentou, o uso da mescalina ou peyote não foi associado a um diagnóstico médico de depressão.

Estratificando por idade, sexo, uso de drogas ilícitas nos últimos 12 meses, ou episódio depressivo na infância não se alterou substancialmente os resultados das análises.

“FLASHBACKS” DESMASCARADOS

Os autores também discutiram o conceito de “flashbacks”. Na década de 1960, usuários de LSD relataram ter experiências psicodélicas recorrentes. Mas verificou-se que os pacientes que alegam sofrer dos chamados flashbacks foram diagnosticados com esquizofrenia e já estavam obcecados com sua experiência das drogas.

“A investigação não suporta os flashbacks; não é um fenômeno real”, disse Krebs.

Ela também disse que o conceito de Transtorno Perceptual Persistente por Alucinógenos (HPPD, em inglês), em que os sintomas visuais são vinculados ingestão de psicodélicos, estava errado.

“Se você olhar para isso de perto, é, na verdade, um fenômeno ótico comum que qualquer um poderia ter”, disse ela. “Por exemplo, se você olhar para o céu ou ir de um quarto escuro para um quarto iluminado, pode haver todos os tipos de efeitos visuais. Nunca foi demonstrado que estes sintomas são maiores em pessoas que usam drogas psicodélicas em relação àqueles que não o fazem.

É importante, disse Krebs, não confiar em anedotas, relatos de caso e perspectivas tendenciosas e para visualizar dados sobre o uso de psicodélicos do ponto de vista estatístico.

O que é bem documentada, porém, é que os psicodélicos provocam experiências espirituais e que os usuários relatam conseguir mais compreensão e aceitação de si mesmos.

Os autores citaram um recente estudo controlado e randomizado de psilocibina em que 67% dos participantes consideraram a experiência como um dos momentos pessoais mais significativos de suas vidas, e 64% relataram melhoria no bem-estar ou satisfação com a vida.

Psicodélicos provavelmente, não apenas não causam mal, mas parecem ser menos arriscados do que outras drogas e comportamentos. Na Holanda, onde os cogumelos psicodélicos são vendidos em lojas a qualquer pessoa maior de 18 anos, ambas as autoridades de saúde e policial relatam pouquíssimos problemas associados ao seu uso, disse Krebs.

“Os especialistas estimam que lá existe uma hospitalização ou ferimento grave a cada 100.000 porções de cogumelos consumidos a cada ano na Holanda”, disse Krebs.

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MITO DO VÍCIO

Krebs salientou que os psicodélicos não são viciantes e não levam ao uso compulsivo ou dependência. “Esta é a incompreensão pública mais comum sobre psicodélicos”, disse ela. “As pessoas pensam que por serem substâncias controladas, devem ser viciantes, o que não é verdade.”

Nos Estados Unidos, drogas psicodélicas são classificadas com Nïvel I (Schedule I — ver nota do tradutor no final da matéria) pela Administração do Combate às Drogas (DEA, Drug Enforcement Administration em inglês). Essas substâncias são consideradas sem nenhum valor médico e com um alto potencial de abuso.

Mas este potencial de abuso é apenas um dos mitos que continuam a cercar drogas psicodélicas, disse Krebs. Ela destacou que “abuso” não é definido, e que de acordo com o Instituto Nacional de Abuso de Drogas dos Estados Unidos, o LSD não é considerado uma droga que vicia, pois não produz o comportamento compulsivo em busca de drogas.

“E se você olhar para o texto norte-americano de 1970 da Lei de Substâncias Controladas [CSA, Controlled Substances Act em inglês], não diz nada sobre o vício / dependência.”

Uma cláusula do CSA permite que drogas sejam classificadas de qualquer maneira sem qualquer critério. “Isto foi o que aconteceu com MDMA/Ecstasy. Ele foi colocado como Nïvel I apesar de um juiz do DEA julgar que o MDMA deve ser Nível III (Schedule III) ou sem classificação”, explicou.

De acordo com Krebs, os médicos podem não estar cientes de que, segundo a Convenção de 1971 das Nações Unidas sobre Substâncias Psicotrópicas, é permitido o uso de drogas nível 1 não só para fins científicos, mas também para “fins médicos muito limitados. “Por exemplo, uma clínica licenciada na Suíça na década de 1990 forneceu LSD para mais de 100 pacientes, sem a execução de um estudo clínico formal. ”

Outro equívoco é que o uso de psicodélicos é raro. Estima-se que nos Estados Unidos, cerca de 1 em 6 adultos com menos de 65 anos usaram alguma droga psicodélica, de acordo com Krebs. As pesquisas sugerem que, assim como na década de 60, um número semelhante de pessoas tomam essas drogas nos dias de hoje, disse ela.

No entanto, outro mito que tem atormentado o campo de substâncias psicodélicas é a ideia de que há um risco maior de tentativas de suicídio e morte ou lesão sob o efeito de uma droga psicodélica, disse Krebs. “Com base em outros dados, sabemos que isso é extremamente raro.

Parece haver um interesse renovado na utilização terapêutica de drogas psicodélicas. Krebs citou um estudo aberto no Novo México que descobriu que entre os nove pacientes dependentes de álcool que tomaram duas doses de psilocibina, o consumo de álcool foi reduzido à metade após 6 meses. Estas substâncias também estão sendo estudadas para determinar seu papel na cessação do tabagismo e dependência de cocaína.

Mas alguns no campo estão preocupados com a falta de apoio da indústria farmacêutica. As empresas farmacêuticas não estão muito interessadas ​​em agentes com patentes que expiraram a muito tempo e que não são administrados diariamente.

Talvez por isso alguns pesquisadores se voltaram para o financiamento público para pagar a pesquisa psicodélica. No Reino Unido, esta tática está sendo usada para arrecadar dinheiro para um estudo de imagem cerebral com LSD. Kregs e seu co-pesquisador Johansen também estão realizando uma campanha de crowd-funding para ajudar a financiar sua pesquisa.

Embora o estudo atual não tenha encontrado uma associação estatisticamente significativa entre o uso de psicodélico e aumento da probabilidade de pensamentos, planos ou tentativas suicidas nos últimos 12 meses, um outro estudo recente fez.

Ambos os estudos usaram dados do NSDUH e abordaram questões muito semelhantes, mas o estudo anterior (Hendricks PS et al. J Psychopharmacol. Publicado on-line 13 de janeiro de 2015) incluiu cerca de 60.000 participantes e um ano adicional de análise.

“Nós encontramos um efeito estatisticamente significativo para redução de danos, e eles não o fizeram simplesmente porque tínhamos mais poder estatístico, pelo contrário, nossos odds ratios foram semelhantes e os nossos resultados são consistentes”, comentou o principal autor desse estudo anterior, Peter Hendricks, PhD, professor assistente do Departamento de Saúde Comportamental da Universidade de Alabama em Birmingham.

O Estudo do Dr. Hendricks focou principalmente no suicídio, ao passo que o estudo Krebs olhou para 11 resultados diferentes.

NOVA PESQUISA

Comentando o estudo para o Medscape Medical News, o Dr. Hendricks disse que era “muito bem feito” e “sólido”.

“Foi um estudo bem conduzido. Esta é a equipe de pesquisa que produziu algumas das pesquisas mais novas e rigorosas no passado

Embora ele veja a onda de novas pesquisas com psicodélicos como um “renascimento”, ele acredita que poderia muito bem ser uma explosão de novas pesquisas se os fundos fossem mais prontamente disponíveis. No entanto, observou ele, isso significaria a remoção de drogas psicodélicas da classificação Nível 1 do DEA.

O aparente aumento recente dos financiamentos públicos para pesquisas sobre psicodélicos reforça o fato de que a obtenção de financiamento de pesquisa de “agências endinheiradas como o NIH” ainda é um desafio, disse o Dr. Hendricks.

Grande parte da pesquisa que foi financiada parece apontar para a utilidade das drogas psicodélicas no campo de dependência, disse o Dr. Hendricks. Ele acredita que, enquanto terapias medicamentosas como a reposição de nicotina tem como alvo mecanismos específicos, os psicodélicos focam nos processos de ordem superior. “Estamos oferecendo o que pensamos ser uma experiência espiritual significativa que pode fornecer um compromisso com a abstinência, a motivação para deixar que poderia funcionar independentemente da substância específica de abuso.”

Teri Suzanne Kregs é líder de conselho e Pal-Ørjan Johansen é um membro do conselho de EmmaSofia. Dr. Hendricks relata nenhuma relação financeira relevante.

J Psychopharmacol. Publicado on-line 05 de março de 2015. Texto completo.


Nota do Tradutor — Sistema de classificação de substâncias controladas em vigência nos EUA.

  • Nível/Schedule 1: substâncias com alto potencial de abuso; sem valor medicinal; sem níveis seguros para utilização com supervisão médica. São elas -> Maconha, DMT, LSD, MDMA, Psilocibina, Peyote, Mescalina, Heroína e outras.
  • Nível/Schedule 2: substâncias com alto potencial de abuso; possuem valor medicinal; seu abuso pode levar a dependência física e psíquica severas. São elas -> Cocaína, Anfetaminas, Oxicodona, Metadona, Ópio, Morfina e outras.
  • Nível/Schedule 3: substâncias com menor potencial viciante em comparação com as substâncias da Classificação 1 e 2; possui valor medicinal; seu abuso pode levar a dependência física leve à moderada e a dependência psíquica elevada. São elas -> Esteroides Anabolizantes, Ketamina, Marinol, Di-hidrocodeína e outras.
  • Nível/Schedule 4: substâncias com baixo potencial viciante em comparação com as substâncias da Classificação 3; possuí valor medicinal; seu abuso pode levar a dependência física e psíquica leve em comparação com as substâncias da Classificação 3. São elas as benzodiazepinas como Alprazolam, Clonazepam e Diazepam, análogos Benzodiazepínicos (Droga Z) como Zolpidem e Zopiclone e outras.

Texto postado originalmente em medscape.com em 12 de março de 2.015.