Os Psicodélicos Oferecem um Caminho para o Deus Interior?

“Se ligue, sintonize e caia fora” A famosa frase de Timothy Leary ainda influencia nossa visão sobre as substâncias psicodélicas ou alucinógenas. Podemos associar os psicodélicos com os excessos da contracultura dos anos 60, e com a estática visão “linha reta” da sociedade, inundada com a cultura do medo e mal-entendidos intencionais.

O psicólogo William A. Richards quer mudar isso.

Sacred Knowledge: Psychedelics and Religious Experiences William A. Richards Columbia University Press December 8, 2015

Richard passou maior parte da sua carreira pesquisando tais substâncias -que, em linha com uma literatura estabelecida, ele prefere chamar de “enteógenos” – e seus usos terapêuticos. Sacred Knowledge:Psychedelics and Religious Experience não é apenas um somatório de sua obra – que facilmente mistura os resultados de pesquisas científicas, estudos de casos, anotações e comentários interpretativos – mas sim uma apologia para o uso de enteógenos em ambientes controlados.

Richard com certeza não está só. A investigação sobre o uso médico e psicológico e o valor dos psicodélicos já teve seu início, mas parou na década de 1970. Há muitas razões para isso, mas a inclusão de vários psicodélicos no Ato de Controle de Substâncias de 1970 sob Anexo 1 certamente não ajudou. No entanto, a investigação tem tido um pequeno aumento desse o final dos anos 90, com inúmeras instituições de renome realizando ensaios clínicos com sucesso. Tais pesquisas permanecem fora do mainstream, mas nos últimos anos tem recebido uma quantidade razoável de cobertura na mídia popular.

É difícil não ser convencido pelos argumentos de Richard. Consistente com outros estudos, ele discute o benefícios do tratamento enteogênico para uma série de doenças, incluindo dependência, depressão, ansiedade, dores crônicas, e sintomas psicossomáticos associados a doenças e traumas. Os benefícios, além disso, não são apenas físicos (no sentido de que tomar alguns ibuprofenos aliviam dores), mas psicológicos e também religiosos.
Na verdade, na opinião de Richard, é o potencial dos psicodélicos em abrir a mente para uma dimensão mística ou religiosa da existência humana que fazem deles um medicamento eficaz.

Ele é largamente desconsiderado na tentativa de entender experiências e tradições religiosas em termos de linguística, social e cultural e, por isso, tende a desabar o estudo da religião em teologia. Esse ponto persiste durante o livro, mas é clareado quando ele discute as “Fronteiras Psicodélicas na Religião”, isto é, como os enteógenos podem nos levar a ter um “entendimento melhor da ‘Mente de Deus’ e os mistérios de nosso próprio ser”. Na verdade, o próprio uso do termo “enteógeno” que literalmente significa “ Gerar Deus dentro de si” dá margens até este viés em direção a unicidade da experiência religiosa.

Tal visão leva Richard a uma quebra de distinção entre tradições religiosas, como um meio de comparar os efeitos dos enteógenos com o “sagrado”. Com uma menção a Aldous Huxley, ele favorece, como ele mesmo diz logo no início do livro, uma “visão perenialista” da experiência religiosa, uma vez que este é o lugar para onde a evidência o leva. Afirmações como a seguinte são feitas no contexto de discutir como as substâncias psicodélicas podem produzir uma experiência de “consciência mística”, e ajudam a preencher seu relato:

“Todas as grandes religiões do mundo tem palavras que apontam em direção a esse estado altamente desejado e valorizado, como o Samadhi no Hinduísmo, Nirvana no Budismo, SekhelMufla no Judaísmo, a visão beatífica no Cristianismo, BaqáWaFaná no Islamismo, e Wu Wei no Taoismo.”

Como Richard relata, sua primeira experiência pessoal com psicodélicos, que ele relata no Prefácio, ocorreu enquanto ele era um estudante graduado em Teologia e Psiquiatria na Universidade de Göttigen em 1960. Enxergando sua própria mente como um “laboratório psicológico”, ele se voluntariou para participar de uma pesquisa sobre o estudo dos efeitos da psilocibina, o ingrediente ativo de vários cogumelos psicoativos. Ao receber sua primeira dose, ele teve uma experiência de perder sua “identidade usual” e “um brilho eterno de consciência mística”.

É importante ressaltar, no entanto, que aquela experiência não veio do nada. Por sua própria vontade, ele adentrou preparado no terreno da substância . “Com base na piedade de minha criação Metodista” ele disse, “Eu silenciosamente afirmo a confiança de que Deus estaria comigo perante qualquer dificuldade em trazer de volta memórias da minha infância”

A pergunta persistente que eu tenho então é a dimensão do entendimento de Richard sobre o valor dos psicodélicos, incluindo o que eles fazem e como eles funcionam perante um entendimento particular da religião. Eu não acho que ele iria se recusar a responder tal pergunta. Embora Richards esteja ciente de que tais experiências podem ser interpretadas de formas diferentes, ele antecipa que seus entendimentos, e as categorias que ele usa para descrevê-los, se resumem a uma “escolha pessoal” em acreditar “na validade da consciência mística”.

Ao dizer isso, meu ponto não é necessariamente em lançar dúvidas sobre o trabalho de Richard. Eu estou extremamente convencido no valor terapêutico dos psicodélicos, e eu concordo com Richard de que os estudiosos da religião (e muitos teólogos) geralmente são muito céticos quando se trata de seu “objeto” de estudo, e no processo falham em ver a floresta proverbial para as árvores. Uma das coisas que Richard realiza então é em relembrar-nos a importância de estar aberto para experiências inesperadas, mesmo – ou talvez especialmente – quando elas são despertadas por psicodélicos ou qualquer número de outros materiais estranhos.

No entanto, seu entendimento sobre religião tem limitações significativas, não apenas no que se assume sobre a “religião”, mas também no que ele ignora, ou não pode dar conta.

Ao longo de “Sacred Knowledge”, por exemplo, Richard tende a minimizar as experiências negativas dos psicodélicos. Para colocá-lo em termos de sua própria estrutura, ele tende a encobrir o que Rudolf Otto chama de “mysterium tremendum” , concebendo a realidade de que os enteógenos fornecem acesso em última análise como fascinans, isto é, misericordioso e piedoso.

Na verdade, as condições nas quais os pesquisadores e profissionais da saúde administram psicodélicos dentro de um ambiente clínico suportam essa elisão: um grande cuidado é tomado para assegurar uma experiência positiva. Esta elisão, além disso, se encaixa com a sua tendência a igualar experiências autênticas de “consciência mística” com a produção de resultados psicológicos e morais. No âmbito do trabalho de Richard, os estados de consciência que os psicodélicos fornecem acesso devem levar a uma espécie de conversão no indivíduo.
Em vários pontos ele concebe os benefícios do uso “sábio” dos psicodélicos nos mais diversos termos cristão de pecado e salvação.

” … Não há práticas religiosas puras ou estados primordiais da consciência como tal, que Richards se refere como a mística. “

Tais limitações podem fazer bem para a medicina, é claro, mas determinar o que vem primeiro é como decidir em ambos o ovo ou a galinha: é melhor para ver o quadro e como as substâncias envolvidas se reforçam mutuamente.
Dito isto, apesar de eu ter problemas com a maneira putativa em que Richards articula as dimensões religiosas de uma experiência psicodélica, eu ainda acho que é possível levar o último a sério, caso ele adote uma visão diferente de trabalho.

Considere por um momento, uma sessão normal de psilocibina em um ambiente de pesquisa contemporânea. O participante, que foi analisado com antecedência de acordo com protocolos rigorosos, recebe uma dose de psilocibina sintética através de injeção. O participante então passa por sua experiência em um ambiente clínico, mas confortável. Assim, ele se deita em um sofá, geralmente usando uma máscara nos olhos, e escuta uma trilha sonora musical pré selecionada para a duração da experiência. Este tipo de controle sensorial é um componente importante. Richard diz “Pesquisas com enteógenos tendem a ser conduzidos em espaços interiores, onde o corpo pode descansar em um sofá de forma segura, e a mente pode se ver livre de “cuidar do corpo”.

Isso é muito diferente de uma cerimônia Mazatec tradicional de cogumelo, apesar de tudo. Embora o resultado de ambos, na superfície podem ser similares, não é o caso quando se aprofunda em ou outro.
Por exemplo, Maria Sabina, – a curandeira Mazateca que se tornou uma espécie de celebridade nos anos 60 entre aqueles que procuravam a iluminação induzida por químicos – foi relatado que a mesma negava aspectos enteogênicos da psilocibina, ou pelo menos os entendiam como secundários. Como Andy Letcher coloca em seu Shroom: A Cultural History of The Magic Mushroom, “Para achar Deus, Sabina como todo bom católico – ia à missa”.

Além disso, ainda não é claro que a mesma substância está sendo usada. Ao passo que os investigadores contemporâneos utilizam psilocibina sintética para alguém como Sabina, o cogumelo em si é essencial e não podem ser separados a partir de sua composição química. Ela referiu-se aos cogumelos como “os filhos dos santos”.

O meu ponto não é dizer que Richard e outros pesquisadores usam tais substâncias de forma não autêntica, como se eles estivessem apenas se apropriando para seus próprios propósitos, tais práticas tradicionais. E é importante dizer que não há práticas religiosas puras ou estados primordiais de consciência as quais Richard refere como “O místico”.

O uso de psicodélicos de Richard em um ambiente clínico, certamente fornece acesso para algo, mas esse “algo” não é necessariamente a mesma coisa sempre que tais compostos são usados. Que Richard os vê em termos religiosos prova o ponto, se nós levarmos a sério as declarações de Sabina.

Os estados de consciência alcançados através do uso de psicodélicos então, não necessariamente pré-existem a experiência, mas são, ao invés disso, produzidas nisto. Psicodélicos, nesse sentido, não são tanto de revelação como são componentes de um conjunto: o que eles significam e fazem variam dependendo de outras tecnologias, objetos e práticas que eles são colocados em relação.

Novamente, isso não elimina os efeitos muito reais dos psicodélicos em ambientes clínicos. É só levar a sério a especificidade desse ambiente: a clínica não é uma aldeia remota no México. Ao fazê-lo, eu sugiro, iria complicar a nossa compreensão dos psicodélicos e da maneira que eles interagem com ambientes diferentes.

Acrescentando, isso iria complicar também nosso entendimento de religião. Estudiosos de religião por algum tempo tem questionado vários pressupostos que sustentam a noção de “religião”, mostrando como isso, como quase tudo, é um produto complexo de várias negociações culturais, sociais, políticas, psicológicas e econômicas. A tradução dos efeitos das substâncias psicodélicas em termos religiosos, médicos e psicológicos como vemos no “Sacred Knowledge”, mostra a produção de religião em ação. E Richard nos mostra isso no mais improvável dos lugares – a clínica de pesquisa.

FONTE religiondispatches.org

Agradecemos imensamente a tradução feita pelo colaborador Kaio Shimanski.
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A conexão entre Budismo e Psicodélicos

Daniel Pinchbeck discute Dharma, karma e iluminação enteogênica com o autor de Zig Zag Zen Allan Badiner

Escrito por DANIEL PINCHBECK

A discussão se o Budismo e psicodélicos se complementam ou se obstruem sempre foi vibrante. Beber Ayahuasca é um atalho para pular a meditação e ir para a Iluminação? Ou, se você é budista praticante, é uma boa ideia ocasionalmente fugir pra floresta com alguns amigos e uma sacola de Psilocybe semilanceata? Bom, agora tem uma nova geração de buscadores espirituais que querem saber a resposta.

Eu quero saber a resposta!

Um clássico instantâneo desde o primeiro momento que apareceu em 2002, Zig Zag Zen: Budismo e Psicodélicos é uma antologia de pensamentos de algumas das mentes mais brilhantes no assunto. Recentemente foi re-publicado em uma nova edição e seu autor, Allan Badiner, é um companheiro escritor e amigo meu (Zig Zag Zen foi lançado praticamente ao mesmo tempo de meu livro, Breaking Open the Head – A Psychedelic Journey into the Heart of Modern Shamanism).

Eu liguei para Allan uma tarde conforme me apressava numa chuva fraca em direção à New York Grand Central station pegar minha filha. Ele atendeu o telefone em Big Sur.

EBB AND FLOW, SUKHI BARBER, 2014
EBB AND FLOW, SUKHI BARBER, 2014

 

Daniel: Allan, qual é a conexão essencial entre Budismo e uso de psicodélicos?
Allan: Ambos compartilham um interesse na primazia da mente, e consciência do momento atual, mas eles são muito diferentes em si, e não tem muita história compartilhada – até recentemente. A Geração Beat, hippies e a revolução cultural dos anos 60 foram todos produtos tanto de sabedorias tradicionais do Oeste – do qual budismo é uma grande parte – quanto dos sacramentos: LSD, cogumelos e peyote. Professores daquela era como Alan Watts, Allen Ginsberg, Jack Kerouac, Ram Dass e outros, todos falavam sobre budismo e psicodélicos e eu acho que o relacionamento entre eles se manifesta no contexto da busca humana por evolução. Muitas pessoas procuram a sabedoria compassiva do Dharma (a comunidade e filosofia Budista), e também uma reconfiguração psíquica que algumas substâncias derivadas de plantas oferecem devido a seu poder transformativo. Um tipo de magia prática resulta quando ‘Zig’ cambaleia (Zag) até Zen, quando um sistema ético testado pelo tempo encontra mudanças assistidas por plantas na consciência.

D: Como se interessou primariamente pela área?
A: Aos 30 eu abandonei meu trabalho como agente de Hollywood e viajei para a Índia e Sri Lanka por um ano. Antes de retornar à América, eu fui aconselhado a fazer um retiro Budista de meditação de 2 semanas em Sri Lanka. Foi horrível. Sujo, insetos por todo lado, doía ficar sentado horas por dia, vegetais cozidos as 6 da manhã de café e os mesmos vegetais para o almoço. Sem jantar. 2 dias antes de acabar, tudo mudou. Eu senti uma maré de êxtase silencioso, cheio de gratidão profunda por estar vivo, simultaneamente vivendo como se cada momento pudesse claramente ser o último – mas agradecido que não era. Tive um sentimento forte de total conexão com todos, árvores, animais, até insetos, e a própria terra.

D: Quando os psicodélicos entraram na sua vida?
A: Depois que retornei da Índia, ainda no brilho meditativo, fui a uma festa onde uma amiga querida me disse para fechar os olhos e colocar a língua pra fora. Sabendo da minha aversão por drogas, ela disse pra não me preocupar e só curtir. Mais tarde, eu estava admirando a visão extensa de Los Angeles e comecei a conversar com alguém que eu conhecia, mas não gostava. Minha voz interna tentava me dizer pra fugir! Mas eu vi qualidades nela que nunca havia notado antes e estava curtindo imensamente sua companhia. Aquele sentimento de conexão poderosa retornou – me senti enraizado na Terra, consciente da minha respiração e troca de gases que isso envolve.

D: Parece ecstasy!
A: Sim, mas enquanto alguns podem argumentar que MDMA não é um psicodélico, certamente senti como se fosse. Eu estava escrevendo uma coluna chamada ‘Mente e Espírito’ para o LA Weekly na época, e o jornalista em mim tinha que saber mais sobre isso. Isso me levou a um encontro com o lendário químico psicodélico Sasha Shulgin. Sasha descobriu 2CB, e milhares de outros químicos, e também foi responsável pela re-descoberta do MDMA nos anos 70. Seu tufo de cabelo branco e sorriso sorridente reservado me lembraram de gurus na Índia. Eu entrevistei outros pensadores visionários, como Terence McKenna, e daí eu experimentei esporadicamente com cogumelos de psilocibina e tive meu primeiro e único encontro com Ayahuasca em 1987.

D: Muitos críticos argumentam que Budismo e psicodélicos são incompatíveis. O escrito budista Ken Wilber fala sobre a distinção entre “estados e traços”. Com psicodélicos, pode ser fácil mudar o primeiro, mas muito mais difícil mudar o segundo. A ideia é que o acesso repentino a estados alterados de consciência por meio de substâncias não leva a mudanças a longo prazo na personalidade.
A: Sim, o estudioso religioso Huston Smith que escreveu o prefácio em Zig Zag Zen, disse que “enquanto o uso de psicodélicos é totalmente sobre estados alterados, Budismo é totalmente sobre traços alterados, e um necessariamente não leva ao outro.” Apesar do fato que Zig Zag Zen também apresenta essas visões contraditórias, eu estava esperando que tivesse uma tempestade de críticas, com demonstrações Budistas nas ruas de Boulder, São Francisco, e Upper West Side – todos ajudando a aumentar as vendas. Mas os Budistas – até aqueles com B maiúsculo – disseram “Budismo, drogas…ok, sim. Próximo?”

“É interessante que até mesmo entre aqueles que criticam o uso de psicodélicos, se você consegue fazer com que falem sobre sua experiência pessoal com drogas expansoras de consciência, é incrível o quão bom suas jornadas parecem.”

Em uma conversa recente, Ken Wilber observou que “pessoas que usam psicodélicos com alguma forma de prática espiritual ou meditação conseguem um enorme benefício com isso – mais do que apenas com um ou outro.”

D: Se ouve muito da proibição das drogas no Budismo. Não existe um preceito Budista que proíbe o uso de substâncias que alteram a consciência?
A: Os preceitos não são regras estritas ou mandamentos mas princípios guias para que facilite o progresso no caminho. Budistas se abstêm de matar, pegar o que não lhe é dado, condutas sexuais impróprias e discurso incorreto. De acordo com Robert Thurman, da cadeira de Budismo da Universidade de Columbia, o quinto preceito se refere especificamente à álcool, que era um problema até na época de Buddha já que geralmente leva à falta de cuidado, e o usuário quebrar os outros quatro preceitos.

D: Você acha que Buddha usava psicodélicos?
A: Pergunta muito interessante. Sabemos que plantas psicoativas, particularmente Cannabis, eram abrangentemente usadas como parte de uma prática espiritual nos tempos de Buddha, e nenhuma atitude pejorativa ou desfavorável sobre o uso de cannabis existia na época. Também sabemos que na tradição Shaivite do Hinduísmo, em particular, tem uma plantação de cannabis crescendo atrás dos templos ao redor da Índia para uso apenas pelos homens sagrados ou sadhus.
Sabemos que Buddha tentou todas as estratégias disponíveis ao longo do caminho para a iluminação, incluindo ascetismo extremo – jejum por longos períodos, se manter no solo nu sem abrigo, ficar ao lado dos ghats em Varanasi onde corpos dos mortos eram cremados. As regras para monges aspirantes e freiras eram incrivelmente específicas e detalhadas sobre o que não fazer, e em nenhum lugar tem referência a plantas psicoativas encontradas entre eles. Então parece improvável que ele selecionou esse elemento para passar à frente durante seus muitos anos de procura.

D: Por que existe hoje um interesse renovado em psicodélicos? Por que as pessoas parecem fascinadas por meditação e outras práticas esotéricas, e combinar essas práticas com psicodélicos?
A: Porque estamos oscilando na beira da destruição total dos sistemas que suportam a vida do planeta. Como o inventor do LSD Albert Hoffman disse, no ano antes de morrer aos 102 anos: “Alienação da natureza e a perda de experimentar ser parte da criação viva é a razão que causa devastação ecológica e mudança climática. Eu atribuo a importância máxima absoluta para a mudança de consciência, e eu considero os psicodélicos como catalisadores para isso.”. O Antropoceno, a era de mudanças feitas por humanos nos sistemas naturais da Terra, inaugurou um novo entusiasmo por ferramentas xamânicas e psicodélicas para a evolução.

“É uma questão legítima a se perguntar: poderiam os psicodélicos ser imperativos para a nossa sobrevivência?”

O que mais pode oferecer o tipo de potencial para evolução mental e mudança com a rapidez pedida pelo agravamento a saúde dos ecossistemas? Simultaneamente, estamos vivendo uma verdadeira revolução psicodélica na medicina. Substâncias antes consideradas sem uso médico e ilegais,agora estão sendo estudadas como terapêuticos potencialmente válidos. Como o psicólogo Ralph Metzner – contribuidor de Zig Zag Zen – observa: “Duas das mais potencialmente benéficas áreas para a aplicação de tecnologias psicodélicas é no tratamento de adições e preparação psico-espiritual para a transição final.”

D: Considerando que alguém queira experimentar psicodélicos de uma forma compatível com as práticas Budistas, tem algumas substâncias mais adequadas que outras?
A: Acho que o teste budista para a adequação de uma substância é esse: é razoavelmente esperado que ele produza mais compaixão, e um grau maior de noção de consciência? Exemplos de alguns materiais assim podem incluir Cannabis, haxixe, cogumelos de psilocibina, LSD, MDMA, ayahuasca ou peyote. Uma aproximação Budista seria empregar estratégias conhecidas de usuários experientes, como prestar uma atenção cuidadosa ao Set & Setting.
Set se refere ao estado da mente que vai entrar na experiência e a intenção do usuário em termos de quais resultados são esperados. Preparar-se espiritualmente para uma experiência psicodélica pode incluir ler as palavras de Buddha, meditar, praticar yoga ou fazer jejum. “Minha intenção é ter uma jornada inspiradora e significativa que me ajude a experienciar o amor de dar, não receber; ajude-me a trazer à tona a coragem e deixar pra trás o medo; e me ajudar a viver com a noção de que todas as coisas são conectadas no vasto organismo que chamamos de vida.”

D: Alguns locais ou situações são mais conducentes que outros?
A: Setting se refere ao local físico em que escolhemos ter a experiência, incluindo outras pessoas. Se a pessoa é inexperiente no uso de psicodélicos, pode ser uma boa ideia ter o que chamam de sitter – alguém que você confia, preocupa-se com você, para atender qualquer necessidade que você possa ter. Algumas pessoas podem apreciar estar em um local de festival com música que gostam e uma infinidade de amigos. Hidratação é sempre criticamente importante. 비트코인 베팅

Bom, isso foi informativo. Obrigada Allan, cheguei à estação. Vejo você em breve.

Zig Zag Zen: Buddhism and Psychedelics por Allan Badiner esta disponível em Synergetic Press.

 

Fonte Amuse

Agradecemos imensamente a tradução feita pela colaboradora Raphaela Lancellotti.
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Desapegando das experiências espirituais.

Pare de se agarrar aos momentos de pico e abra-se para a verdadeira compreensão.

Experiências e Compreensões Espirituais

Haverá todo tipo de experiências no caminho espiritual. Períodos positivos de desenvolvimento — aqueles que são encorajadores e reconfortantes — são uma parte importante do processo. É importante compreender, entretanto, que até mesmo experiências positivas irão flutuar. Nós raramente, ou nunca, percebemos um desenvolvimento estável delas, precisamente porque as experiências são inconstantes por natureza. Desfrutar de uma série de boas experiências não garante que elas continuarão indefinidamente; elas podem cessar de súbito. Ainda assim, elas permanecem com uma parte importante da prática espiritual, pois elas ajudam a manter a nossa motivação para continuar praticando.

face1O modo que essas experiências surgem também varia enormemente. Você pode ter algumas experiências incrivelmente comoventes, algo como um despertar espiritual que parece surgir do nada. Na verdade, essas experiências realmente não surgem do nada; condições psíquicas sempre as precederão, embora pareçam independentes para nossa experiência consciente. Elas também podem desaparecer tão rapidamente como aparecem. Em outras ocasiões, certas experiências vão crescer ao longo de um período de tempo, atingirão o pico, e então gradualmente desaparecerão novamente.

Como praticantes espirituais, somos instruídos a não atribuir demasiada importância a estas experiências. O conselho é resistir à tentação de se fixar sobre as próprias experiências. Elas vêm e vão. É necessário abrir mão delas, ou a mente irá simplesmente se fechar e se fixar na experiência, deixando pouco ou nenhum espaço para novas experiências a surgirem. Isto porque a sua fixação incentivará preocupações e dúvidas que surgem na mente e interferirão com o processo de desenvolvimento. Se não houver fixação envolvida no processo, experiências espirituais positivas irão começar a levá-lo para compreensões espirituais.

No Budismo, podemos distinguir entre experiências espirituais e compreensões espirituais. As experiências espirituais são geralmente mais vivas e intensas do que as compreensões, porque elas são geralmente acompanhadas por mudanças fisiológicas e psicológicas. Compreensões, por outro lado, podem ser sentidas, mas sua experiência é menos pronunciada. Compreensão é sobre a aquisição de insight. Portanto, enquanto compreensões surgem de nossas experiências espirituais, elas não são idênticas. Compreensões espirituais são consideradas muito mais importantes, porque elas não podem flutuar.

A distinção entre experiências e compreensões espirituais é continuamente enfatizada no pensamento budista. Se evitarmos excessivamente fixar-se em nossas experiências, estaremos sob menos stress em nossa prática. Sem esse esforço, seremos mais capazes de lidar com qualquer coisa que surja, a possibilidade de sofrer de distúrbios psíquicos será bastante reduzida, e iremos notar uma mudança significativa na textura fundamental da nossa experiência.

Há muitos relatos na literatura budista tibetana de como podem surgir perturbações espirituais, mas tudo aponta para a fixação em experiências como a causa. Fixação em nossas experiências é visto como uma outra variação de fixação no self.

No contexto geral da jornada espiritual, é importante lembrar que a autotransformação é um processo contínuo, não um evento único. Não se pode dizer, “Eu costumava ser uma pessoa não espiritual, mas agora eu fui transformado em uma pessoa espiritual. Meu velho homem está morto. ” Estamos constantemente sendo transformado quando viajamos no caminho. Embora possamos ser a mesma pessoa em um nível, em outro nível que somos diferentes. Há sempre continuidade, e ainda em cada grande momento decisivo na jornada nós nos tornamos transformados porque abandonamos certos hábitos. A jornada espiritual é dinâmica e tende sempre para a frente, porque não estamos a fixar-se nas coisas.

Desapegando-se

A jornada espiritual, então, é uma jornada de desprendimento, um processo de aprender a desapegar. Todos os nossos problemas, misérias, e infelicidades são causados pela fixação — prendendo-nos em coisas e não sendo capazes de libera-las. Primeiro temos que nós desprender de coisas materiais. Isso não significa, necessariamente, descartar todas as nossas posses materiais, mas isso implica que não devemos olhar para as coisas materiais atrás da felicidade duradoura. Normalmente, a nossa posição na vida, nossa família, nossa posição na comunidade, e assim por diante, são percebidos como a fonte de nossa felicidade. Esta perspectiva tem de ser invertida, de acordo com os ensinamentos espirituais, abrindo mão de nossa fixação em coisas materiais.

Abrir mão da fixação é efetivamente um processo de aprender a ser livre, porque cada vez que deixamos algo ir, ficamos livres dele. O que quer que nós fixamos irá nos limitar porque a fixação nos torna dependentes de algo além de nós mesmos. Cada vez que abrimos mão de algo, nós experimentamos um outro nível de liberdade.

Eventualmente, a fim de sermos totalmente livres, aprendemos a abrir mão dos conceitos. Em última análise, precisamos abandonar nossa fixação na reificação de conceitos, de as coisas serem “isto” ou “aquilo”. Pensar nisso e naquilo nós prende a um modo particular de experimentar as coisas. Mesmo experiências espirituais não serão dadas como completas, espontâneas, sem intermédios, enquanto o tipo mais sutil de distinção conceitual estiver presente. A experiência ainda vai ser mediada, adulterada, e manchada por todos os tipos de conteúdo psíquico quando fazemos discriminações. Portanto, ele permanecerá sempre impossível de ser verdadeiramente livre.

O passo final no processo de desapego é abandonar a ideia de que a corrupção material e de liberdade espiritual são inequivocamente opostos um ao outro e que nós temos que abrir mão do primeiro para alcançar o último. Enquanto isso é uma distinção importante a observar no início da jornada espiritual, temos que superar essa dualidade. Temos que transcender tanto a sedução do prazer samsárico (N.T. Samsara, do sânscrito-devanagari: संसार: perambulação; pode ser descrito como o fluxo incessante de renascimentos através dos mundos) — que acaba por ser tão ilusória — e a sedução de nosso objetivo espiritual que parece estar oferecendo a felicidade eterna. Uma vez que a atração entre estes dois polos esteja harmonizada e transcendida, estamos prontos para voltar para casa.

O desfrute do Caminho Espiritual

O objetivo final da jornada espiritual é compreender a união de sua mente e realidade final. Você descobre finalmente não apenas que você está na realidade, mas que você também incorpora essa realidade. Seu corpo comum torna-se o corpo de um buda (N.T. refere-se a palavra em sânscrito que significa “O Desperto” “O Iluminado”,e não propriamente a figura histórica, Siddharta Gautama, conhecido como O Buda), o seu discurso comum torna-se o discurso de um buda, e sua mente comum torna-se a mente de um buda. Esta é a grande transição que você tem que fazer, abandonando a sua fixação sobre a separação dos seres samsáricos e budas. Quando podemos falar sobre eles como sendo essencialmente os mesmos, quando essa transformação real ocorre dentro de um indivíduo, é verdadeiramente um grande acontecimento. É notável porque um ser comum, confuso, ainda mantém a preexistência contínua entre um ser comum e um ser iluminado, no sentido de que o que você se torna é o que você sempre foi. No final da jornada, você está simplesmente voltando para casa.

No entanto, a jornada em si era absolutamente necessária. Era necessário deixar o seu ambiente familiar e se aventurar através de vários testes e atribulações. Era necessário lidar com muitas coisas inesperadas, lutar com as suas forças demoníacas interiores. Era necessário seguir através da luta espiritual e se envolver em disciplinas vigorosas. A batalha espiritual é valiosa para a purificação da mente. Sua mente tem de purificar-se dos delírios e emoções conflitantes que são o produto de seu karma, o produto dos pensamentos e ações negativas que se acumularam em seu fluxo mental durante um longo período de tempo.

Depois de um ponto, no entanto, você tem que se afastar dessa luta. Conforme o progresso é feito no caminho, as qualidades positivas exigidas para um maior avanço se tornarão parte de você, e você vai gradualmente aprender a assimilar e se tornar essas qualidades positivas, ao invés de considerá-las como algo a ser atingido e possuído. Assim, após o foco inicial em aprender a substituir vícios com virtudes, devemos aprender a desapegarmos de nossa fixação em virtudes. Temos de parar de pensar em acumular virtudes, qualidades espirituais, experiências e compreensões como se fossem uma forma de riqueza. Nós não necessitamos de riqueza espiritual; além disso, a riqueza espiritual só pode ser acumulada pela não fixação. Todas as fixações só levam a todos os tipos de problemas — inveja, possessividade, e egoísmo, por exemplo. É então realmente que nós extraviamos e desviamos do caminho espiritual.

Conforme nossas qualidades virtuosas de amor, compaixão, alegria, coragem, determinação, resolução, mindfulness, consciência e sabedoria desenvolvem-se, nós progredimos ao longo do caminho. Em algum momento, nós temos que realizar um ato final de desapego, que é deixar de reificar todos os conceitos. Mesmo os conceitos de virtude e vício, redenção, karma e libertação tem que ser abandonados. A título de ilustração, eu gostaria de compartilhar uma história da tradição Zen.

Não é incomum para os alunos de meditação Zen manter-se em contato regular com os seus professores relativo ao seu progresso espiritual. Nesta história particular, um estudante Zen tem uma propensão para a escrever mensalmente para seu professor mensal com um relato de seu desenvolvimento. Suas cartas começaram a tomar um rumo místico, quando escreveu: “Eu estou experimentando uma unidade com o universo. ” Quando seu professor recebeu esta carta, ele apenas olhou e jogou fora. No mês seguinte, o aluno escreveu: “Descobri que o divino está presente em tudo. ” Seu professor usou essa carta para iniciar o fogo. Um mês depois, o estudante havia se tornado ainda mais em êxtase e escreveu: “O mistério do Um e Muitos se revelou para o meu espanto, ” em que seu professor bocejou. No mês seguinte, outra carta chegou, que simplesmente disse: “Não há nenhum self, ninguém nasce, e ninguém morre. ” Nesta, seu professor ergue as mãos em desespero. Após a quarta carta, o estudante parou de escrever para seu professor, e depois que um ano se passou, o professor começou a se sentir preocupado e escreveu a seu aluno, pedindo para ser mantido informado de seu progresso espiritual. O aluno escreveu de volta com as palavras “Quem se importa? ” Quando o professor leu isto, sorriu e disse: “Finalmente! Ele finalmente entendeu! ”

No final da jornada, você será capaz de se envolver em tudo, tanto o os planos materiais e espirituais, sem ser contaminado por eles, porque um ser espiritualmente compreendido não é mais afetado pelo mundo da mesma forma uma pessoa comum é. Sem passar pelos testes e tribulações desta jornada, no entanto, você nunca vai encontrar a sua casa. Você não pode simplesmente ficar em casa e dizer: “Eu já estou onde eu quero estar. ” É apenas a jornada que fará você perceber o seu verdadeiro potencial, e só no final da jornada você vai entender que o objetivo não é se separar do ponto de partida. Essa é a obtenção do estado de Buda, o estado natural de sua própria mente.


Texto escrito por Traleg Kaybgon Rinponche, presidente e diretor espiritual do Kagyu E-Vam Buddhist Institute, com sede em Melbourne Austrália. Retirado de Mind At Ease: Self-Liberation Through Mahamudra Meditation, © 2004 de Traleg Kyabgon.

A embriaguez na conquista da América Latina

Texto feito por Karina Toledo, e reproduzido diretamente do site da Agencia FAPESP

 

Ritual do Xocoatl

Mais do que mera diversão ou escapismo, o consumo de álcool, tabaco e alucinógenos entre os incas e os astecas tinha caráter ritualístico, religioso e até curativo. Já para os colonizadores europeus – embora também acreditassem no poder medicinal de certas substâncias psicoativas – a prática representava a adoração ao demônio e, portanto, deveria ser combatida.

Essa ambiguidade do discurso espanhol sobre o consumo de drogas entre os índios, no período da colonização, é tema do livro A embriaguez na conquista da América. Medicina, idolatria e vício no México e Peru, séculos XVI e XVII, lançado recentemente pela editora Alameda.

Publicada com apoio da FAPESP, a obra é fruto do trabalho de mestrado de Alexandre Camera Varella, realizado na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) sob a orientação do professor Henrique Soares Carneiro.

Com base em uma compilação de fontes da época, que inclui obras de religiosos, tratados médicos e de história natural, além de um cronista indígena cristão, Varella analisa as representações hispano-americanas sobre o consumo das bebidas fermentadas nativas, como é o caso da chicha (feita de milho), no Peru, e do pulque (feito de agave), no México.

Também são incorporados o tabaco – uma versão mais rústica e forte, usada pelos índios para induzir um estado de transe – e as bebidas derivadas do cacau e denominadas chocolate, muitas vezes preparadas com flores aromáticas ou plantas alucinógenas.

“Qualquer substância capaz de alterar o estado de consciência ou, como diziam na época, ‘tirar do juízo’, era considerada causadora de embriaguez. E a embriaguez indígena estava sempre relacionada aos rituais, seja de adivinhação ou de celebração dos deuses. Para os espanhóis isso representava idolatria. Houve, portanto, bastante resistência aos costumes indígenas, principalmente por parte dos clérigos”, contou Varella.

Curiosamente, acrescentou o historiador, tanto colonizados como colonizadores acreditavam no poder medicinal do tabaco. O espanhóis chamavam a planta de erva santa. Os indígenas a consideravam uma entidade divina.

Estátua de Xochipilli, o “Príncipe das flores” Asteca, descoberto nas encostas do vulcão Popocatepetl e agora exposto no Museu Nacional na Cidade do México. As etiquetas indicam as possíveis interpretações botânicas das figuras.

“Os colonizadores diziam que o tabaco ajudava a eliminar substâncias ruins, quando soltava o catarro, e que aliviava a digestão e as dores de cabeça. Também as bebidas alcoólicas e o chocolate eram vistos como medicinais. Existiam várias receitas. Podiam colocar uma determinada flor de qualidade ‘quente’ para combater calafrios, ou algo considerado ‘frio’ para baixar a febre”, disse o historiador – que atualmente é professor da Universidade Federal de Integração Latino-Americana, em Foz do Iguaçu.

Durante os rituais de celebração dos deuses, contou Varella, os indígenas tinham o costume de beber até perder a consciência. Em certas ocasiões, quatro dias consecutivos de festas eram realizados e o consumo de álcool era permitido até mesmo por jovens e crianças.

“Nesses momentos, era tolerada uma certa algazarra, ocorriam brigas e havia maior liberdade sexual. A ideia do vício trazida pelos religiosos, portanto, não apenas estava relacionada à idolatria como também à luxúria e à violência que poderia haver nesses momentos de bebedeira. Não se pensava na questão da dependência física ou psicológica da bebida”, contou Varella.

Fora do contexto ritualístico, porém, as sociedades indígenas eram extremamente conservadoras, disse o historiador. Não era permitido beber dentro de casa ou na rua. Na época de Moctezuma, imperador asteca do início do século 16, um nobre indígena flagrado bêbado poderia ser punido com a morte.

“Até mesmo o uso da folha de coca era bem restrito entre os andinos na era pré-hispânica. Mas, com a chegada dos espanhóis e a desestruturação dos governos indígenas, houve uma popularização do uso – tanto da bebida, quanto da coca e de outras plantas como o peiote [cacto com propriedades alucinógenas]. Isso criou uma preocupação grande entre os colonizadores e clérigos, que queriam preservar a mão de obra indígena, relacionando a mortandade não às doenças trazidas por eles, mas sim à demasiada embriaguez”, afirmou Varella.

Nesse contexto, diversas leis foram criadas – tanto em âmbito eclesiástico quanto civil – para tentar reprimir o consumo de álcool e de outras drogas entre os índios. Principalmente por razões morais, também legislavam para evitar o mau costume entre os mestiços, os negros e os espanhóis pobres que habitavam o Novo Mundo.

“As práticas sociais, porém, foram muito mais amplas do que as tentativas de repressão, que muitas vezes ficaram apenas no nível do discurso e das leis. Podemos dizer que foi a embriaguez que conquistou a América”, disse Varella.

 

A Arte e a Revolução – Terence McKenna

a-hndO renascimento arcaico é um clarim chamando·nos para recuperarmos nosso direito de nascença, por mais desconfortáveis que possamos ficar com isso. É um chamado para percebermos que a vida na ausência da experiência psicodélica sobre a qual se baseia o xamanismo primordial é uma vida trivializada, negada, escravizada ao ego e ao seu medo de se dissolver na misteriosa matriz de sentimento que está ao nosso redor. É no renascimento arcaico que reside nossa transcendência ao dilema histórico.

Há algo mais. Agora está claro que novos desenvolvimentos em muitas áreas – dentre elas a interface entre mente e máquina, a farmacologia da variedade sintética e o armazenamento e as técnicas de recuperação de dados e de imagens – estão se fundindo numa auto-imagem verdadeiramente demoníaca ou angélica de nossa cultura. Os que estão no lado demoníaco do processo têm consciência total desse potencial, e estão correndo a toda com seus planos para capturar o platô tecnológico. É uma posição a partir da qual esperam transformar praticamente todo mundo num consumidor crédulo num fascismo bege, de cuja fábrica de imagens ninguém escapará.

A resposta xamânica, a resposta arcaica, a resposta humana a essa situação deveria ser encontrar o pedal da arte e apertá-lo até o fundo. Essa é uma das funções primárias do xamanismo, e essa função é tremendamente sinergizada pelos psicodélicos. Se os psicodélicos são exoferomônios que dissolvem o ego dominante, então eles são também enzimas que sinergizam a imaginação humana e dão força à linguagem. Eles fazem com que conectemos e reconectemos os conteúdos da mente coletiva de maneiras ainda mais implausíveis, lindas e auto-realizadoras.

Se levarmos o renascimento arcaico a sério, precisaremos de uma nova imagem paradigmática que possa levar-nos rapidamente para diante e através do gargalo histórico que podemos sentir impedindo e resistindo a uma dimensão mais expansiva, mais humana e mais atenta, que insiste em nascer. Nosso sentimento de obrigação política, da necessidade de reformar ou salvar a alma coletiva da humanidade, nosso desejo de conectar o fim da história com o início da história – tudo isso deve nos impelir a ver o xamanismo como um modelo exemplar. Na atual crise global não podemos deixar de levar a sério suas técnicas, mesmo aquelas que podem desafiar os pactos divinamente ordenados da força policial.

EXPANSÃO DE CONSCIÊNCIA

Anos atrás, antes de Humphrey Osmond cunhar o termo “psicodélico”, havia uma descrição corrente para as substâncias psicodélicas; eram chamadas de “drogas expansoras da consciência” . Creio que essa é uma descrição muito boa. Considere nosso dilema neste planeta. Se a expansão da consciência não estiver no futuro humano, que tipo de futuro ele será? Para mim, a posição pró-psicodélicos é mais fundamentalmente ameaçadora para o Sistema porque, quando se pensa total e logicamente, ela é uma posição antidrogas e antivício. E não se engane; a questão são as drogas. O quão drogado você deve ser? Ou, colocando de outro modo, o quão consciente você deve ser? Quem deve ser consciente? Quem deve ser inconsciente?

Precisamos de uma definição aproveitável do que queremos dizer com “droga”. Uma droga é uma coisa que causa comportamento não examinado, obsessivo e habitual. Você não examina o comportamento obsessivo; você simplesmente o tem. Você não deixa nada se interpor no caminho de sua gratificação. Esse é o tipo de vida que nos estão vendendo em todos os níveis. Olhar, consumir e olhar e consumir mais ainda. A opção psicodélica está de lado, num canto minúsculo, jamais mencionada; entretanto ela representa o único fluxo diretamente contrário à tendência de deixar as pessoas em estados programados de consciência. Estados que não são programados por eles mesmos, mas pela Madison Avenue, pelo Pentágono, pelas 500 corporações da Fortune. Isso não é apenas uma metáfora; está realmente acontecendo conosco.

Olhando para Los Angeles de um avião, nunca deixei de perceber que a cidade é como um circuito impresso; todas aquelas rodovias curvas e ruas sem saída com os mesmos pequenos módulos instalados de cada lado. Enquanto a Reader’s Digest continuar sendo assinada e a TV ligada, esses módulos são partes intercambiáveis de uma máquina muito grande. Essa é a realidade de pesadelo que Marshall McLuhan, Wyndham Lewis e outros previram: a criação do publico como um rebanho. O público não tem história nem futuro, o público vive num momento dourado criado por um sistema de credito que liga-o inelutavelmente a uma a uma teia de ilusões jamais criticada. Essa é a conseqüência definitiva de termos rompido o relacionamento simbiótico com a matriz Gaia do planeta. Esta é a conseqüência da falta de igualitarismo; este é o legado do desequilíbrio entre os sexos; esta é a fase terminal de uma longa descida para a confusão existencial tóxica e sem sentido.

O crédito por ter-nos dado instrumentos para resistir a esse horror pertence a heróis desconhecidos, botânicos e químicos, pessoas como Richard Schultes, os Wassons e Albert Hofmann. Graças a eles está em nossas frágeis mãos, neste mais caótico dos séculos, fazer alguma coisa para resolver nossa dificuldade. A psicologia, ao contrário, esteve complacente e silenciosa. Os psicólogos ficaram contentes com a teoria behaviorista durante cinqüenta anos, mesmo sabendo em seus corações que estavam prestando um desserviço potencialmente fatal à dignidade humana, ao ignorar o potencial dos psicodélicos.


A GUERRA CONTRA AS DROGAS

Se há um momento certo para ouvir, para contar e para tentar clarear o pensamento sobre essas coisas, o momento é agora. Durante algum tempo houve um grande ataque contra a Declaração dos Direitos com o pretexto da chamada guerra contra as drogas. De algum modo, a questão das drogas é ainda mais assustadora e insidiosa para o rebanho do público do que o foi o comunismo. A qualidade da retórica que emana da comunidade psicodélica deve melhorar radicalmente. Caso contrário, perderemos o direito de reclamar nosso direito de nascença, e toda a oportunidade de explorar a dimensão psicodélica será cortada. Ironicamente, esta tragédia poderia ocorrer quase como uma nota de rodapé para a supressão dos narcóticos sintéticos e viciantes. Não se pode dizer com muita freqüência: a questão psicodélica é uma questão de direitos e liberdades civis. É uma questão relacionada às mais básicas das liberdades humanas: a da liberdade religiosa e da privacidade da mente individual.

Já se disse que as mulheres não poderiam votar porque a sociedade seria destruída. Antes, os reis não podiam abrir mão do poder absoluto porque disso resultaria o caos. E agora dizem que as drogas não podem ser legalizadas porque a sociedade se desintegraria. Isso é um absurdo pueril! Como vimos, a história humana poderia ser contada como uma série de relacionamentos com plantas, relacionamentos criados e rompidos. Exploramos várias maneiras pelas quais as plantas, as drogas e a política se misturaram cruelmente – desde a influência do açúcar sobre o mercantilismo até a influência do café sobre os trabalhadores de escritórios hoje em dia, desde a Inglaterra forçando o ópio à população chinesa até a CIA usando heroína nos guetos para acabar com a dissidência e a insatisfação.

A história é a história desses relacionamentos com as plantas. As lições a serem aprendidas podem ser trazidas à consciência, integradas na política social e usadas para criar um mundo mais atento, mais significativo, ou podem ser negadas assim como a discussão da sexualidade humana foi reprimida até que o trabalho de Freud e outros a trouxessem à luz. A analogia é válida porque o aumento na capacidade de experiência cognitiva possibilitado pelos alucinógenos vegetais é uma parte tão básica de nossa humanidade quanto nossa sexualidade. A questão de quão rapidamente nos desenvolveremos numa comunidade madura, capaz de discutir essas questões, depende totalmente de nós.


O HIPERESPAÇO E A LIBERDADE HUMANA

A coisa mais temida pelos que defendem a solução inexeqüível do “Diga não” é um mundo em que todos os valores comunitários tradicionais se dissolveram diante de uma busca infinita da autogratificação por parte de indivíduos e populações obcecados com as drogas. Não devemos descartar essa possibilidade muito real. Mas o que deve ser rejeitado é a noção de que esse futuro perturbador pode ser evitado com caças às bruxas, supressão de pesquisas e disseminação histérica de desinformações e mentiras.

As drogas fazem parte da galáxia de interesses culturais desde o início dos tempos. Somente com o advento de tecnologias capazes de refinar e de concentrar princípios ativos de plantas e preparados vegetais, as drogas se separaram do pano de fundo dos interesses culturais e se tomaram um flagelo.

De certo modo, o que temos não é um problema de drogas, e sim um problema com a administração de nossas tecnologias. Será que nosso futuro incluirá o surgimento de novas drogas sintéticas, cem ou mil vezes mais viciantes do que a heroína ou o crack? A resposta é absolutamente sim – a não ser que nos conscientizemos e examinemos a necessidade humana básica de uma dependência química e em seguida encontremos e sancionemos caminhos para a expressão dessa necessidade. Estamos descobrindo que os seres humanos são criaturas com hábitos químicos, com a mesma descrença horrorizada de quando os vitorianos descobriram que os humanos são criaturas com fantasias e obsessões sexuais. Esse processo de nos encararmos como espécie é precondição necessária para a criação de uma ordem social e natural mais humana. É importante recordar que a aventura de encarar quem somos não começou ou terminou com Freud e Jung. O argumento que este livro buscou desenvolver é que o próximo passo na aventura do autoconhecimento só pode começar quando levarmos em conta nossa necessidade inata e legítima de um ambiente rico de estados mentais induzidos através de um ato de vontade. Acredito que podemos iniciar o processo revendo nossas origens. De fato, fiz um grande esforço para mostrar que, no ambiente arcaico em que surgiu a auto-reflexão, encontramos pistas para as raízes de nossa história atormentada.


O QUE É NOVO AQUI

Os indóis alucinógenos, não estudados e legalmente suprimidos, são apresentados aqui como agentes de mudança evolucionária. Eles são agentes bioquímicos cujo impacto definitivo não está na experiência direta do indivíduo, e sim na constituição genética da espécie. Os primeiros capítulos chamaram atenção para o fato de que o aumento na acuidade visual, o aumento no sucesso reprodutivo e o aumento na estimulação das funções protolingüísticas do cérebro são conseqüências lógicas da inclusão de psilocibina na dieta dos primeiros homens. Se puder ser provada a noção de que a consciência humana emergiu da sinergia do neurodesenvolvimento mediado pelos indóis, mudará a imagem que fazemos de nós mesmos, de nosso relacionamento com a natureza e do dilema atual com o uso das drogas na sociedade.

Não há solução para o “problema das drogas” , para o problema da destruição ambiental ou para o problema do arsenal nuclear a não ser que nossa auto-imagem como espécie seja reconectada à terra. Isso começa com uma análise da confluência especial de condições que devem ter sido necessárias para que a organização animal desse pela primeira vez o salto para a auto-reflexão consciente. Uma vez que seja compreendida a centralidade da simbiose homem-planta mediada pelos alucinógenos no cenário de nossa origem, estaremos em posição de avaliar nosso estado atual de neurose. A assimilação das lições contidas naqueles eventos antigos e formativos podem estabelecer as bases para soluções destinadas a atender não somente à necessidade de a sociedade administrar o uso e o abuso de substâncias como também à nossa necessidade profunda e crescente de dar uma dimensão espiritual às nossas vidas.

(Extraído do livro “O Alimento dos Deuses”, de Terence McKenna)

Religião – Krishnamurti

por J. Krishnamurti

“Para descobrir o que é verdadeira religião, você precisa afastar tudo o que estiver no caminho dessa descoberta. Se você tem muitas janelas coloridas ou sujas e quer ver a clara luz do Sol, precisa limpar ou abrir as janelas, ou sair de casa. Da mesma forma, para descobrir o que é a verdadeira religião, você deve primeiro ver o que a verdadeira religião não é, e pôr isso à parte. Então poderá descobrir – porque, então, haverá percepção direta. Vejamos pois o que não é religião.

Cumprir rituais – isso é religião ? Você repete muitas e muitas vezes um certo ritual, um certo mantra em frente de um altar ou de um ídolo. Isso pode lhe dar uma sensação de prazer, uma sensação de satisfação; mas será isso religião? Vestir uma roupa sagrada, intitular-se indú, budista ou cristão, aceitar determinadas tradições, dogmas, crenças – tem tudo isso algo a ver com religião? Obviamente não. Por conseguinte, a religião deve ser algo que só se poderá encontrar quando a mente tenha entendido e descartado isso tudo.

Religião, no verdadeiro sentido da palavra, não trás separação. Mas, que acontece quando você é muçulmano e eu cristão, ou quando eu creio numa coisa e você nela não crê? Nossas crenças nos separam; portanto, nossas crenças nada tem a ver com religião. O fato de crermos ou não em Deus tem pouca significação; porque aquilo em que cremos ou em que deixamos de crer é determinado por nosso condicionamento. A sociedade em torno de nós, a cultura em que somos criados, imprime em nossas mentes certas crenças, certos medos e superstições a que chamamos religião; mas que nada tem a ver com religião. O fato de você crer de um modo e eu de outro depende, em grande parte, de onde tenhamos nascido, se nascemos na Inglaterra, na Índia ou na América. Assim sendo, crença não é religião, é apenas o resultado de um condicionamento.

Há além disso, a busca da salvação pessoal. Quero estar seguro; quero atingir o nirvana, ou alcançar o céu; preciso encontrar um lugar junto de Jesus, junto de Buda ou à direita de algum deus particular. Sua crença não me dá satisfação profunda, conforto; por isso tenho a minha própria crença. E será isso religião? Sem dúvida, nossas mentes precisam estar livres de todas essas coisas para podermos descobrir o que é a verdadeira religião.

E será religião simplesmente uma questão de fazer o bem, de servir ou ajudar os outros? Ou será mais que isso? O que não quer dizer que não devamos ser generosos ou bons. Mas será só isso? Religião não será algo muito maior, muito mais puro, vasto, expansivo do que qualquer coisa concebida pela mente?

Assim, para descobrir o que seja a verdadeira religião, você precisa investigar profundamente todas essas coisas e libertar-se do medo. É como sair de uma casa escura para a claridade do Sol. Então, você não perguntará o que é a verdadeira religião; você mesmo saberá. Haverá experiência direta daquilo que é verdadeiro.”

( O Verdadeiro Objetivo Da Vida – págs. 98 e 99 – Edit. Cultrix )

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A Experiência Religiosa e a Meditação

(Do livro, ainda não editado em nosso idioma, “O Despertar da Inteligência”).

“Dissemos que íamos falar sobre um problema sobremodo complexo, ou seja: Existe experiência religiosa, e que significa “meditação”? Observando, podemos ver que, em todo o mundo, o homem sempre andou buscando uma coisa existente além da morte, além dos seus problemas, uma coisa duradoura, verdadeira, eterna. Deu-lhe o nome de “Deus”, e outros mais; e a maioria acredita em tal coisa, sem jamais tê-la experimentado. Prometem algumas religiões que se crermos em certos rituais, dogmas e salvadores, e se vivermos de um dado modo, encontraremos essa coisa maravilhosa, que podemos denominar como quisermos. Os que a têm “experimentado” diretamente fazem-no segundo o seu condicionamento, sua crença, as influências ambientes e culturais a que estão submetidos.

A religião, evidentemente, perdeu o seu significado, pois sempre houve guerras religiosas. Ela não resolve os nossos problemas. As religiões separaram os povos. Poderão ter exercido determinada influência civilizadora, mas não transformaram radicalmente o homem. Para começarmos a investigar se existe a “experiência religiosa”, e o que tal experiência representa, e o porquê de a chamarmos “religiosa”, evidentemente, em primeiro lugar, se faz mister muita sinceridade. Isso não significa ser sincero em obediência a algum princípio ou crença, ou em relação a algum “compromisso”, mas, sim, ver as coisas tais quais são, sem deformá-las, não só as coisas exteriores, senão também as interiores; significa jamais iludir a si próprio. Porque é facílimo nos iludirmos ao ansiarmos por uma dada experiência, religiosa ou de outra natureza – pelo uso de drogas, etc. Estamos, então, sujeitos a nos enredarmos em alguma espécie de ilusão.

Cabe-nos descobrir diretamente o que é “experiência religiosa”. Precisamos imbuir-nos de humildade e sinceridade, a fim de não exigirmos para nós algum proveito ou ganho. Devemos, pois, atentar em nossos próprios desejos, apegos e temores, para os compreendermos a fundo, e não deixarmos a mente deformar-se de nenhuma maneira, impedindo assim toda e qualquer ilusão. E, igualmente, cumpre indagar: Que significa “experimentar”?

Não sei se já consideraram esta questão. Em regra, cansamo-nos das habituais experiências cotidianas. De todas elas estamos fartos, e quanto mais “sofisticada” ou intelectual a pessoa, tanto mais deseja viver só no agora – o que quer que isso signifique – e inventar uma filosofia do presente. A palavra “experiência” exprime passar por um certo estado, do começo ao fim, e dá-lo por acabado. Mas, infelizmente, para a maioria toda experiência deixa uma cicatriz, uma lembrança, agradável ou desagradável, e nós desejamos conservar as aprazíveis. Se ansiamos por qualquer espécie de experiência, espiritual, religiosa ou transcendental, devemos primeiramente descobrir se existe tal experiência, e também o que ela expressa. Se você passou por alguma e não é capaz de reconhecê-la, ela deixa de existir. Um dos elementos essenciais da experiência é o reconhecimento. E, havendo reconhecimento, aquilo que se experimenta já é conhecido, já foi sentido, pois, do contrário, não seria reconhecido.

Assim, ao falar de experiência religiosa, espiritual ou transcendental, a pessoa deve tê-la conhecido antes, para ser capaz de reconhecer que está experimentando algo diferente de uma experiência comum. Parece lógico e verdadeiro que a mente deve ser capaz de reconhecer a experiência, e o reconhecimento implica que a coisa já é conhecida e, por conseguinte, não é nova.

Ao desejarmos experiências no terreno religioso, nós as desejamos porque não resolvemos os nossos problemas, nossas ânsias, desesperos, temores e tristezas de cada dia; por essa razão pretendemos algo “mais”. Nessa pretensão de “mais” encontra-se a ilusão. Isso é bem lógico e verdadeiro, penso eu. Não digo que a lógica seja sempre verdadeira, mas, quando, sã e equilibradamente, nos servimos da lógica e da razão, conhecemos as limitações da razão. O desejo de experiências mais amplas, profundas e fundamentais leva-nos a alongar ainda mais o caminho do conhecido. Isso me parece claro, e espero estejamos em comunhão, em “participação” uns com os outros.

Outrossim, investigando o terreno religioso, queremos descobrir o que é a verdade, se existe uma realidade, se existe um estado mental fora do tempo. A procura implica também uma entidade que busca. E que está buscando essa entidade? Como saberá que o que descobre, em sua busca, é verdadeiro? E, ainda, se ela encontra o verdadeiro – pelo menos o que pensa ser o verdadeiro – o que ela encontra depende de seu condicionamento, de seus conhecimentos, de suas anteriores experiências; a busca torna-se, então, apenas mais uma projeção de suas passadas esperanças, temores e anseios.

A mente que está investigando – não, buscando – deve achar-se totalmente livre destas duas coisas: o desejo de experiência e a busca da verdade. Isso porque, se estamos buscando, procuramos diferentes instrutores, lemos livros vários, aderimos a vários cultos, seguimos diversos gurus, etc, etc. – como quem percorre as vitrines das lojas. Essa busca não tem nenhum significado.

Assim, ao investigarem esta questão – “Que é mente religiosa, e qual a natureza da mente que já não tem experiência alguma” – vocês devem saber se a mente pode libertar-se do desejo de experiência e pôr fim a toda atividade de busca. Impende investigar, sem nenhum “motivo” ou propósito, os fatos concernentes ao tempo e se existe um estado atemporal. Tal investigação requer que não se tenha crença alguma, não se esteja ligado a nenhuma religião ou organização dita espiritual, que não se siga nenhum guru e, portanto, não se esteja sujeito a nenhuma autoridade – inclusive, e principalmente, à deste orador. Porque as pessoas são facilmente influenciáveis, excessivamente crédulas, ainda que sejam “sofisticadas” e muito sabedoras; mas estão sempre ansiando por alguma coisa, sempre a desejar e, por essa razão, crêem.

Assim, a mente que investiga para descobrir o que é religião deve achar-se inteiramente livre de qualquer forma de crença, de qualquer forma de medo; porque o medo, conforme já explicamos, é um elemento deformador, produtivo de violência e agressão. Por conseguinte, ao investigarmos o estado religioso e seu movimento, devemos achar-nos livres do temor. Isso requer sinceridade e humildade.

No tocante à maioria de nós, a vaidade é um dos maiores impedimentos. Porque, tendo lido muito, tendo assumido compromissos com algum guru que anda a oferecer a sua filosofia, pensamos saber, pelo menos um pouco, e esse é o começo da vaidade. Ao averiguarmos uma questão tão importante como esta, precisamos fazê-lo com isenção, isto é, sem nada sabermos a seu respeito. Vocês, de fato, não sabem nada, sabem? Ignoram o que é a Verdade, o que é Deus – se tal entidade existe – o que é uma mente religiosa. Lêem livros que tratam desta questão, da qual se fala há milênios e estão vivendo com base no conhecimento e nas experiências de outros, com base na propaganda. É necessário pôr tudo isso de lado, se desejam descobrir alguma coisa; por conseguinte, a investigação desta matéria é uma coisa sumamente “séria”. Se desejam “brincar”, existem entretenimentos de toda espécie: os chamados espirituais, os de cunho religioso; mas estes não têm valor algum para o homem de reflexão.

Para investigar o que é a mente religiosa, devemos estar livres de nosso condicionamento, de nosso cristianismo, de nosso budismo, com a respectiva propaganda de milhares de anos, a fim de que tenhamos isenção para observar. Isso é sobremaneira difícil, porque tememos achar-nos sós. Desejamos segurança, externa e internamente; por isso, dependemos dos outros – do sacerdote, do guia espiritual, do guru que diz: “Experimentei e, portanto, sei”. Temos de estar completamente sós – mas não, isolados. Há vasta diferença entre estar isolado e estar completamente só, ser um todo não fracionado. O isolamento é um estado de espírito em que cessaram as relações e, em nossa vida e atividades diárias, erguemos (consciente ou inconscientemente) uma muralha em torno de nós para não sofrermos danos. Esse isolamento, naturalmente, impede qualquer espécie de relação. “Estar só” implica que a pessoa não depende de outra, psicologicamente, não está apegada a ninguém; isso não é dizer que não há, então, amor; o amor não é apego. “Estar só” significa que, profundamente, interiormente, não existe nenhum movimento de medo e, por conseguinte, nenhum movimento de conflito.

Se me acompanharam até aqui, podemos passar a investigar o que exprime disciplina. Geralmente, disciplina é para nós uma espécie de “treinamento”, de repetição, um meio de vencer um obstáculo, ou de resistir, reprimir, controlar, ajustar. Tudo isso está implicado na palavra “disciplina”, tal como a consideramos. Já o significado etimológico da palavra é “aprender”.

A mente que quer aprender deve ter curiosidade, vivo interesse; e, quanto à mente que “já sabe”, esta não tem possibilidade de aprender. Disciplina, por conseguinte, significa aprender por que razão controlamos, reprimimos, por que razão há medo, porque nos ajustamos, comparamos e, conseqüentemente, nos vemos em conflito. O próprio ato de aprender produz ordem; não a ordem criada segundo um plano ou padrão: na mesma investigação da confusão, da desordem, existe ordem. Em regra, vivemos confusos por dúzias de razões, que, por ora, não precisamos examinar. Necessitamos aprender sobre a confusão, sobre a vida desordenada que estamos levando; não nos cabe tratar de estabelecer a ordem na confusão, ou na desordem, mas, sim, aprender sobre a confusão e a desordem. Assim, enquanto aprendemos, nasce a ordem.

A ordem é uma coisa viva, e não uma coisa mecânica; a ordem, por certo, é virtude. Na mente que se acha confusa, que se ajusta, que imita, não existe ordem, porém conflito. E em conflito a mente se acha em desordem e, deste modo, é sem virtude. Com esse investigar, com esse aprender, vem a ordem, e a ordem é virtude. Observem-se, vejam o estado de desordem em que se encontra sua vida – tão confusa e mecânica! Nesse estado, queremos descobrir uma maneira moral de viver com ordem e com uma mente sã. Como pode a pessoa confusa, que apenas sabe obedecer ou imitar, ter qualquer espécie de ordem, qualquer espécie de virtude? Examinando-se a moralidade social, vê-se que é totalmente imoral; poderá ser “respeitável”, mas o que é respeitável é quase sempre sem ordem.

A ordem é necessária, porque só com ela é possível uma ação plena, e ação é vida. Mas nossa ação produz desordem; há a ação política, a ação religiosa, a ação atinente aos negócios, à família; todas essas ações são fragmentárias e, portanto e naturalmente, contraditórias. Você é um duro homem de negócios e, em casa, um meigo ente humano – pelo menos mostra sê-lo; aí há contradição e, por conseguinte, desordem. A mente em desordem não tem possibilidade de compreender o que é virtude. E, hoje em dia, com a licença existente em todos os sentidos, não existe ordem nem virtude. A mente religiosa necessita dessa ordem não obediente a nenhum padrão ou plano estabelecido por você ou por outrem. Mas, essa ordem, esse senso de retidão moral, só vem quando se compreende a desordem, a confusão, o caos em que estamos vivendo.

O que acabamos de dizer visa a mostrar como lançar as bases da meditação. Se não lançarmos essas bases, a meditação se tornará uma fuga. Com essa espécie de meditação pode-se ficar brincando toda a vida, e é isso o que a maioria das pessoas está fazendo: vivendo vidas medíocres, confusas, desordenadas e encontrando maneiras de quietar a mente, pois há tanta gente a prometer “uma mente quieta” (o que quer que isso signifique).

Assim, para a mente ardorosa, pois trata-se de uma coisa importante e não de uma brincadeira é necessário estar-se livre de toda crença, de toda e qualquer ligação porque nós estamos ligados ao todo da vida, e não a um fragmento dela. Em maioria estamos vinculados a alguma revolução física, política, a um movimento religioso, a uma espécie de vida espiritual, monástica, etc. Todas essas coisas são ligações fragmentárias. Falamos sobre liberdade porque dela necessitamos para ligarmos o nosso ser, a nossa energia, vitalidade e paixão à totalidade da vida e não a uma de suas partes. Podemos então começar a investigar o que significa meditar.

Não sei se já consideraram esta questão da meditação. Provavelmente alguns de vocês têm “brincado de meditar”, procurando controlar seus pensamentos, seguir diferentes sistemas, mas isso não é meditação. Temos de abrir mão de todos os sistemas que se nos têm oferecido: sistema Zen, Meditação Transcendental, etc. – armadilhas trazidas da Índia e da Ásia, nas quais tanta gente se deixa aprisionar. Precisamos examinar a questão dos sistemas, dos métodos, e espero tenham vontade de fazê-lo; porque nós estamos participando, todos juntos, no exame deste problema.

Quando temos de seguir um sistema, que sucede à nossa mente? Que implicam os sistemas e os métodos? Um guru. Não sei porque eles se denominam, a si próprios, “gurus”. Não encontro um termo suficientemente forte com que reprovar a classe dos gurus, com sua autoridade (eles pensam que sabem). O homem que diz “Eu sei”, esse homem não sabe. Ou, se ele diz “Experimentei a Verdade”, desconfiem dele decididamente. São estes os que oferecem os sistemas. Um sistema envolve: praticar, seguir, repetir, alterar “o que realmente é” e, por conseguinte, aumentar o conflito. Os sistemas tornam a mente mecânica, não libertam ninguém; poderão prometer a liberdade no fim de tudo, mas a liberdade está no começo e não no fim. Se querem investigar a verdade sobre qualquer sistema, sem terem liberdade, logo de início, acabarão então, fatalmente, adotando um método e com a mente incapacitada de ser sutil, ágil, sensível. Podem, pois, abandonar completamente todos os sistemas. O importante não é controlar o pensamento, mas compreendê-lo, compreender as origens, os começos do pensamento, que se acham na própria pessoa. Quer dizer, o cérebro armazena “memórias” (isso vocês mesmos podem observar, e não necessitam de ler livros sobre a matéria); se ele não armazenasse “memórias”, seria completamente incapaz de pensar. A memória é o resultado da experiência, do conhecimento, de cada um ou da comunidade, da família, da raça, etc. O pensamento brota daquele reservatório de “lembranças”. O pensamento, portanto, jamais é livre, é sempre velho; não existe essa coisa chamada “liberdade de pensamento”.

O pensamento, em si, não pode ser livre, embora fale sobre liberdade; em si próprio, ele é o resultado das “memórias”, experiências e conhecimentos trazidos do passado; em conseqüência, ele é velho. Todavia, necessitamos desse acervo de conhecimentos, pois, sem ele não poderíamos funcionar, não poderíamos falar uns aos outros, não poderíamos voltar para casa, etc. O conhecimento é de essencial importância.

Compete-nos descobrir se, na meditação, o conhecimento tem fim, se nela estamos livres do conhecido. Se a meditação é a continuação do conhecimento, a continuação de tudo o que o homem acumulou, não há, então, nela, liberdade. Só há liberdade se compreendemos a função do conhecimento e, por conseguinte, dele nos achamos livres.
Estamos explorando o campo do conhecimento, para vermos quando deve funcionar e quando se torna um empecilho à investigação mais profunda. Se as células cerebrais continuam ativas, só podem funcionar no campo do conhecimento. É só isso que o cérebro pode fazer, ou seja, funcionar no campo da experiência, do conhecimento, no campo do tempo, vale dizer, no passado. Meditação é descobrir se existe um campo ainda não contaminado pelo conhecido.

Se, meditando, continuo com o que antes aprendi, com o que já sei, estou então vivendo no passado, no campo de meu condicionamento. Nesse campo não há liberdade. Posso adornar a prisão em que estou vivendo, fazer coisas diversas dentro dela, mas há sempre uma limitação, uma barreira. Cumpre, pois, descobrir se as células cerebrais, evolvidas através de milênios, podem estar totalmente quietas e em correspondência com uma dimensão desconhecida. Quer dizer, pode a mente tornar-se tranqüila?

Foi sempre esse o problema das pessoas religiosas, através dos séculos, reconhecendo que se necessita de total serenidade, porque só então se pode ver. Se estamos a tagarelar, com o espírito em movimento, a correr para todos os lados, é óbvio que não podemos ver nem escutar totalmente. Assim, dizem as pessoas religiosas: “Controle a mente, segure-a, coloque-a numa prisão”; não descobriram uma maneira de pôr a mente num estado de completa e absoluta quietude. Dizem: “Não cedam a nenhum desejo, não olhem para uma mulher, para os belos montes, para as árvores e a beleza da Terra, porque se o fizerem, aquela beleza poderá sugerir-lhes a lembrança de uma mulher ou um homem. Portanto, controlem-se, perseverem, concentrem-se”. Assim fazendo, os põem em conflito e, desta maneira, haverá mais o que controlar, mais o que superar. Sucede isso há milênios, por se ter percebido a necessidade de uma mente tranqüila. Ora, como pode a mente serenar sem esforço, sem controle, sem se lhe traçarem limites? No momento em que se pergunta “como?”, cria-se a necessidade de um sistema. Portanto, aqui não há como”.

Pode a mente quietar-se? Não sei o que irão fazer ao perceberem verdadeiramente a necessidade de terem aquela mente que, estando absolutamente quieta, se torna sobremodo sensível e sutil. Como pode isso verificar-se? Esse é um problema de meditação, porque só essa é a mentalidade religiosa. Só ela é capaz de ver o todo da vida como uma unidade, como um movimento unitário, não fragmentado. Essa mentalidade, por conseguinte, atua totalmente e não fragmentariamente, porque sua ação emana da quietude completa.

A verdadeira base é uma vida de relação total, uma vida com ordem e, por conseguinte, virtude, uma vida interior simples e, portanto, austera – a austeridade da simplicidade profunda, própria da mente isenta de conflito. Se lançarem essa base, facilmente, sem esforço algum (porque, tão logo se introduz o esforço, há conflito), verão a sua genuína valia. É, conseqüentemente, a percepção de “o que é” que realiza a transformação radical.

Só a mente tranqüila pode compreender que, em sua quietude, há um movimento bem diverso, de diferente dimensão, de outra qualidade. Esse movimento, sendo inefável, não pode ser expresso em palavras. O que pode ser descrito só nos leva até este ponto: o ponto em que, tendo lançado a base correta, percebemos a necessidade, o valor e a beleza da serenidade espiritual.

Para a maioria, a beleza se encontra em alguma coisa: um edifício, uma nuvem, a forma de uma árvore, um lindo rosto. A beleza está “lá fora” ou faz parte da natureza da mente em que não há atividade egocêntrica? Porque a meditação, tão importante como a alegria que nela encontramos, é a compreensão da beleza. A beleza, com efeito, é o total abandono do “eu”; e os olhos que abandonaram o “eu” podem ver as árvores e sua pujança, e a formosura de uma nuvem. Isso acontece quando não existe nenhum centro constituído pelo “eu”. É uma coisa que sucede a qualquer de nós, – não é verdade? – ao vermos, por exemplo, uma majestosa montanha que subitamente se nos descortina. Tudo foi varrido para o lado, exceto aquela majestade. A montanha, a árvore, nos absorve completamente.

Algo semelhante sucede a uma criança que se diverte com um brinquedo; o brinquedo a absorve e, se se quebra, ela volta a suas ocupações habituais, suas travessuras, seus choros. Conosco se dá a mesma coisa, ao vermos a montanha ou a árvore solitária no alto de um monte, elas nos absorvem. E nós desejamos absorver-nos em alguma coisa – numa idéia, numa atividade, num compromisso, numa crença, ou noutra pessoa tal qual a criança com seu brinquedo.

A beleza, pois, significa sensibilidade – um corpo sensível, graças a uma alimentação adequada e a uma maneira correta de viver. A mente se torna, então, naturalmente quieta. Não é possível aquietar a mente, porque você é que é o causador de todos os males, você é que se acha perturbado, ansioso, confuso. Como pode torná-la tranqüila? Mas, ao compreender o que é quietude e o que é confusão, ao entender o que é sofrimento e que é possível acabar com ele, e, também, ao compreender o que é o prazer – então, dessa compreensão, surge uma mentalidade serena; não precisamos buscá-la. Devemos partir do começo, e o primeiro passo é o último passo. Eis o que é meditação.”

INTERROGANTE: Faz o senhor a apologia da beleza das montanhas, dos montes, do céu. Essa apologia não é útil para o comum das pessoas. A apologia que serve é a da sordidez.

KRISHNAMURTI: Está bem; façamos a apologia das ruas imundas de Nova Iorque, a apologia da miséria, da pobreza, dos guetos, das guerras, para as quais cada um de nós contribuiu. Vocês sentem de outro modo, porque se separaram, se isolaram; portanto, não estando em relação com os outros, corrompem-se e permitem que a corrupção se espalhe pelo mundo. Eis porque a corrupção, a poluição, as guerras, o ódio, não podem ser sustados por nenhum sistema político ou religioso, por nenhuma organização. Cumpre haver transformação. Não o percebem? Precisam deixar de ser o que são. Não à força de “querer”; meditação é expurgar a mente da vontade. Verifica-se, então, uma ação de espécie inteiramente diferente.

INTERROGANTE: Se pudermos alcançar o privilégio de nos conscientizarmos, como poderemos ajudar àqueles que se acham condicionados, àqueles que abrigam um profundo ressentimento?

KRISHNAMURTI: Permita-me interrogá-lo porque usa a palavra “privilégio”. Que há de sagrado ou de “privilegiado” em estar-se conscientizado? Essa é uma coisa natural, não acha? – estar ciente. Se você tiver ciência de seu condicionamento, da agitação, da sordidez, da miséria, da guerra, do ódio, existentes no mundo – se de tudo isso estiver inteirado, estabelecerá uma relação tão completa entre você – que ficará em relação com todos os outros entes humanos. Verá, então, que não causará dano aos outros; eles é que causam dano a si próprios. E, assim o que se pode fazer é sair pelo mundo a pregar, a falar – mas não com o desejo de ajudá-los, compreende? Esta é a coisa mais terrível que se pode dizer: “Quero ajudar a outrem”. Quem é você, quem sou eu, para ajudar os outros?

Senhor, a beleza da árvore ou da flor não “deseja” ajudá-lo. A você é que cabe olhar a sordidez ou a beleza; e se é incapaz de olhá-las, trate de descobrir porque se tornou tão indiferente, tão insensível, tão superficial e vazio. Se o descobrir, ver-se-á num estado em que a vida fluirá como as águas, e você nada terá de fazer.

INTERROGANTE: Qual a relação entre a percepção das coisas exatamente como são e a consciência?

KRISHNAMURTI: Você só conhece a consciência pelo seu conteúdo, e esse conteúdo são as coisas que estão sucedendo no mundo, do qual você faz parte. O esvaziar desse conteúdo não significa ficar privado da consciência, senão ingressar numa dimensão bem diferente. Sobre essa dimensão não é possível especular. O que podemos fazer é tratarmos de descobrir se é possível descondicionarmos a mente pela conscientização, pelo tornar-nos atentos.

INTERROGANTE: Eu próprio não sei o que é o amor, o que é a Verdade, ou o que é Deus. Mas diz o senhor que “amor é Deus”, em vez de “Amor é Amor”. Poderá explicar porque diz “Amor é Deus”?

KRISHNAMURTI: Eu não disse que amor é Deus.

INTERROGANTE: Lendo um de seus livros …

KRISHNAMURTI: Desculpe a interrupção … não leia livros! Daquela palavra se tem usado e abusado. Ela está “carregada” dos desesperos e esperanças do homem. Você tem o seu Deus, e os comunistas têm o deles. Assim, se me permite sugeri-lo, trate de descobrir o que é o Amor. Só descobrirá o que é o amor, se souber o que ele não é. Não, se o souber intelectualmente, porém, na vida real, afastando tudo o que o nega – o ciúme, a ambição, a avidez; as divisões que diariamente se verificam; eu e você, nós e eles, brancos e pretos. Infelizmente, as pessoas não o fazem, porque isso requer energia e a energia só vem ao observarmos a realidade, sem dela fugirmos. Vendo o que realmente é, então, observando-o, teremos a energia necessária para transcendê-lo. Não podemos transcendê-lo, se forcejamos para evitá-lo, para traduzi-lo ou superá-lo. Note simplesmente “o que é”, e descobrirá o que é amar. O amor não é prazer. E sabe o que significa descobri-lo realmente, você mesmo, em seu interior? Significa já não haver medo, nem apego, nem dependência, mas tão somente uma relação isenta de qualquer divisão.

INTERROGANTE: Pode-me dizer algo sobre a função do artista na sociedade? Desempenha ele algum papel além do que lhe é atribuído?

KRISHNAMURTI: Que é um artista? Aquele que pinta quadros, escreve poesias, aquele que busca expressar-se por meio da pintura ou escrevendo livros ou dramas? Porque separamos o artista de nós outros? Ou, porque diferenciamos o intelectual dos demais indivíduos? Colocamos o intelectual num certo nível, o artista noutro nível, talvez mais alto, e o cientista num nível mais elevado ainda. Depois, perguntamos: “Qual a função deles na sociedade?” Não se trata de saber qual é a função deles, mas qual é a sua junto à coletividade. Porque foi você que criou a desordem existente. Qual a sua função? Descubra-o. Isto é, trate de descobrir porque vive dentro deste mundo de sordidez, ódio e aflição; aparentemente, ele não o atinge.

Como vê, o senhor escutou estas palestras, participou em algumas das coisas ditas e compreendeu – nós o esperamos – muitas delas. Com isso pode tornar-se um “centro de relações corretas” e, portanto, compete-lhe transformar esta terrível, corrupta e destrutiva sociedade.

INTERROGANTE: Poderá falar sobre o tempo psicológico?

KRISHNAMURTI: O tempo é velhice, o tempo é sofrimento, o tempo não respeita ninguém. Há o tempo cronológico, medido pelo relógio. Este é indispensável; do contrário, não poderíamos ter condução, viajar, preparar uma refeição, etc. Mas, nós aceitamos outra espécie de tempo, ou seja “amanhã eu serei, amanhã mudarei, futuramente me tornarei isto ou aquilo”; psicologicamente, criamos este tempo – amanhã. Mas, existe esse dia imediato? Eis uma pergunta que tememos fazer a sério. Porque nós desejamos o amanhã: “amanhã terei o prazer de me encontrar com você, amanhã eu compreenderei, minha vida será diferente. Amanhã conhecerei a iluminação. E desse modo o futuro se torna a coisa mais importante de nossa vida. Ontem você se deleitou sexualmente, fruiu vários prazeres, e deseja repeti-los no dia seguinte, ou logo depois.

Faça a si próprio esta pergunta, e descubra a verdade respectiva: “Existe realmente um amanhã fora do pensamento” que projeta o amanhã? O futuro, com efeito, é uma invenção do pensamento. Se, psicologicamente, não houvesse um amanhã, que aconteceria, hoje, em sua vida? Uma tremenda revolução, não é? Sua ação se transformaria radicalmente, não é assim? Você seria, agora, um ente total e não um ente projetado do passado para o presente e daí para o futuro.

Tal equivale a viver e morrer todos os dias. Faça-o, e verá o que exprime viver completamente hoje. E isso não é amor? Ninguém diz “Amanhã amarei”. Ou amamos ou não amamos. O amor não reside no tempo; nele só está o amargor, porque o amargor, tal como o prazer, é pensamento. Devemos, pois, descobrir o que é o tempo, e descobrir se existe um “não amanhã” (no tomorrow). Isso é viver; há então aquela vida eterna – porque, na Eternidade, não existe tempo.

Krishnamurti

FONTE: http://www.cuidardoser.com.br/

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Meditação


Pensem na mente como um oceano, sendo suas ondulações os pensamentos. Tais ondulações são inseparáveis do oceano, assim como pensamentos são inseparáveis da natureza da mente. Em um oceano muito revolto poderá cair um caminhão, que não perceberemos os efeitos causados por este fato, enquanto em um oceano calmo, poderemos ver claramente as reações de qualquer mínimo estímulo, como uma pequena gota caindo na água.

Meditar, pra mim, não objetiva parar de pensar, mas acalmar o “oceano” com a intenção de clarear a consciência para a natureza dos pensamentos. “Parar de pensar” é consequência do meio utilizado, e conseguimos isso através da prática da concentração, seja na respiração, em mantras e sons ou simplesmente na observação da própria mente, testemunhando sua manifestação natural. Meditar é testemunhar, e a melhor testemunha de um fato é sempre aquela que apenas o observa , de forma alheia, sem envolvimento ou agregação de valores.

Os pensamentos surgem naturalmente em um fluxo, mas no estado de meditação nos tornamos os observadores, sem se apegar a emoções e pensamentos específicos. Assim passamos a conhecer melhor o oceano, não apenas as ondas em sua superfície. Muitas pessoas falam que para meditar devemos nos esforçar para “afastar todos os pensamentos”, porém pra mim isso não faz sentido, pois nunca poderemos calar a mente com um esforço mental incessante como este. Existe uma grande diferença entre “afastar pensamentos” e “se afastar dos pensamentos”, sendo esta segunda a única forma de meditação, na minha opinião. O erro está em pensar na meditação como uma luta contra os processos naturais da mente. Quando nos esforçamos para simplesmente afastar os pensamentos, sempre fazemos isso através de novos pensamentos e nunca entramos no silêncio. Porém se não nos preocuparmos com isso e praticarmos apenas a concentração, o silêncio virá naturalmente.

Os efeitos da prática podem ser observados pela diminuição natural do fluxo de pensamentos, que permite uma observação mais clara, e pela permanência no “espaço vazio” entre os pensamentos, que caracteriza o estado de meditação. A meditação proporciona auto-conhecimento, ao ponto que buscamos não interpretar a realidade com nossos conceitos contaminados de valores sociais, culturais ou o que quer que sejam. Nesse momento não se busca compreender nada, apenas sentir.

Amor…

esse texto sobre o Amor foi escrito por um dos moderadores do “plantasenteogenas.org”(Lupa). Segundo ele mesmo “sob a inspiração divina do cogumelo”

texto muito bom, principalmente pq às vezes não sabemos ao certo o q é o amor…….. é muito comum confundirmos amor com sentimentos egoístas que são gerados por expectativas criadas em cima da outra pessoa

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“Infelizmente a razão é incapaz de compreender as emoções, e para se entender o amor não adianta ficar horas e horas refletindo sobre ele, pois todas as reflexões não serão sobre o amor em si, serão sobre os desejos que estão relacionados à ele, pois o amor em si, puro, não cabe na mente..

a compreensão plena do amor é um insight espontâneo não codificado que poucas pessoas experimentam em suas vidas.. é quando um êxtase de sensações e sentimentos tomam o nosso corpo.. e sente-se uma compreensão tão grande pelas pessoas que chega a ser comovente, e se torna impossível segurar as lágrimas.. mas são lágrimas de felicidade e prazer de estar experienciando o amor puro..

Nesse momento não existe espaço para sentimentos “negativos” ou desejos egóicos.. só se deseja o bem à pessoa amada, independente de qualquer coisa, inclusive do desejo de posse.. uma bola de sensações emerge de nosso peito e desabrocha como um lótus bem em nossa frente, é possível sentir a energia da bola claramente.. tudo passa a fazer sentido, entende-se tudo sobre a outra pessoa..

Isso faz com que todos os “defeitos” da pessoa sejam imediatamente compreendidos e aceitos, e que sejam compreendidos todos os acontecimentos passados que te magoaram de alguma forma, tudo é perdoado.. não existe sentido em não perdoar, pois não perdoar é a falta de vontade de compreender o outro.. o orgulho desaparece..
entende-se que o amor puro é incapaz de gerar sofrimento, e que o sofrimento é gerado pelos desejos que estão relacionados ao amor.. isso é compreendido pois, nesse momento, é possível discernir claramente o amor dos desejos, e fazer com que os desejos sejam reduzidos à nada..
uma sensação de paz toma nosso corpo e lágrimas de prazer escorrem sobre nossos rostos..”

Pequeno Dicionário Psicodélico

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Dicionário rápido de termos e conceitos aplicados aos psicodélicos

 


 

AYAHUASCA:

ayahuasca-4Bebida Sacramental principalmente, fruto da infusão do cipó Banisteriopsis Caapi(iMAO) e a folha Psycotria Viridis(DMT). Outras espécies de cipó e folha também são utilizadas em algumas regiões. Também conhecida por Caapi, Nixi Honi Xuma,Oasca,Vegetal, Santo Daime, Kahi, Natema, Mihi, etc. Seu nome mais conhecido, AYAHUASCA é de origem quechua, que significa “Cipó dos Espíritos “. é chamada também de “O Vinho da Alma ” ou “Pequena Morte”. Utilizada por povos pré-colombianos, incas, e muito utilizada, por pelo menos, 72 tribos indígenas diferentes da Amazônia. É empregada extensamente no Peru, Equador, Colômbia, Bolívia, Brasil. Foi usada provavelmente na Amazônia por milênios, e está expandindo-se rapidamente na América sul e em outras partes do mundo com o crescimento de movimentos religiosos organizados tais como Santo Daime, União do Vegetal (UDV), Barquinha que a consagram como sacramento de seus rituais.

Ingerindo essa bebida mágica, os sentidos são expandidos, os processos mentais e as emoções tornam-se mais profundos. A jornada pode mover-se em muitas dimensões. A experiência pode em algum ponto revelar visões notáveis, insights, produzir catarses, produzindo experiências de renovação, de renascimento positivas. Efeito comum a outras substâncias como a psilocibina. A jornada com Ayahuasca, leva a exploração tanto deste mundo ordinário, como mundos paralelos, que estão além de nossa percepção corrente. Libera os limites normais de espaço-tempo.

Quimicamente, os efeitos da ayahuasca são consequência da ação da molécula DMT contida nas folhas, que se torna oralmente ativo em função dos inibidores de MAO contidos no cipó. Sem os iMAOs, o DMT ingerido oralmente seria metabolizado pelas enzimas, tornando-se inativo.


 

BUFOTENINA:

bufo_alvariusA bufotenina (N-dimetil-5-hidroxitriptamina) é um alcalóide com efeitos alucinogénos, derivado da serotonina, por dimetilação do seu grupo amina.
Pode ser encontrado na pele de determinados sapos do gênero Bufo, como oBufo marinus ou o Bufo Alvarius. Pode também ser encontrada em pelo menos duas espécies do gênero Anadenanthera, árvore que cresce no noroeste da Argentina, sul da Bolívia, Peru e provavelmente em outras regiões da América. É um potente enteógeno, que actua por via inalatória ou digestiva, sobre os receptores específicos do córtex cerebral.
A bufotenina, é uma substância controlada. Trata-se do mesmo produto que o veneno do sapo-cururu brasileiro contém.


 

CONSCIÊNCIA:

human-consciousness2É uma qualidade da mente considerando abranger qualificações tais como subjetividade, auto-consciência, sentiência, sapiência, e a capacidade de perceber a relação entre si e um ambiente. É um assunto muito pesquisado na filosofia da mente, na psicologia, neurologia, e ciência cognitiva. Consciência é uma qualidade psíquica, isto é, que pertence à esfera da psique, por isso diz-se também que ela é um atributo do espírito, da mente, ou do pensamento. Ser consciente não é exatamente a mesma coisa que perceber-se no mundo, mas ser no mundo e do mundo, para isso, a intuição, a dedução e a indução tomam parte. Joseph Campbell, ao ser indagado por Bill Moyers no documentário “O poder do mito”, invocou um significado mais abrangente e profundo a este termo, expandindo o conceito de consciência para toda a dinâmica exitente na natureza, ao dar a seguinte perspectiva. Rupert Sheldrake elabora  ainda mais sobre consciência e causalidade dando esta outra perspectiva.


 

DMT:

dmt_crystal2Conhecido quimicamente como N,N-dimethyltryptamine (C12H16N2), é talvez o mais poderoso enteógeno existente. Está presente naturalmente em diversas plantas e até em animais, inclusive em nós, humanos, onde é metabolizado pela enzima MAO. Entre as plantas fontes de DMT, temos: Acacia maidenii, phlebophylla. Anadenanthera peregrina, colubrina, excelsa, macrocarpa. Desmanthus illinoensis, Phalaris Grass , Psychotria viridis ,Mimosa hostilis (Jurema) ,Virola theiodora, calophylla, calophylloidea, surinamensis cuspidata, elongata, lorentensis, peruviana, rufula, sebifera (Epeña) , Arundo donax , Diplopterys cabrerana. Geralmente o DMT se encontra nas raízes e/ou folhas dessas plantas. Para o uso oral de DMT é necessário certa quantidade de iMAOs, ou seja, inibidores de monoamina oxidase. O DMT também pode ser fumado em forma de extrato, não necessitando de iMAOs, porém os relatos são de experiências diferentes e menos duradouras deste modo


 

ENTEÓGENO:

hqdefault2Ou enteogênico é um neologismo que vem do inglês: entheogen ou entheogenic, cunhado pela primeira vez por Gordon Wasson, foi proposto no ano de 1973 por investigadores como sendo o termo apropriado para descrever estados xamânicos ou de possessão extática induzidas pela ingestão de substâncias alteradoras da consciência. A palavra enteógeno significa literalmente: “manifestação interior do divino”, deriva de uma palavra grega obsoleta, que se refere à comunhão religiosa com drogas visionárias, ataques de profecia, e paixão erótica, e está relacionada com a palavra entusiasmo pela mesma raiz. Entretanto este termo foi proposto como uma forma elegante de resolver o problema de se encontrar um termo culturalmente apropriado e não pejorativo para descrever o uso destas substâncias.


 

EXPERIÊNCIA PSICODÉLICA:

Gnosis-Falkirk-2É caracterizada pela percepção de aspectos mentais originalmente desconhecidos por parte do indivíduo em questão. Os estados psicodélicos fazem parte do espectro de experiências induzidas por substâncias psicodélicas e tem origem na própria mente. Neste mesmo campo de estados, encontram-se a percepção sensorial, a sinestesia e estados alterados de consciência. Nem todos que experimentam substâncias psicodélicas (como o LSD e a Psilocibina) têm uma experiência psicodélica e muitos alcançam estados alterados de consciência através de outros meios, como pela meditação, yoga, privação sensorial, etc.

 


 

GNOSE:

spiritual_bodyO termo gnose deriva do termo grego “gnosis” que significa “conhecimento”. É um fenômeno de conhecimento espiritual vivenciado pelos gnósticos (cristãos primitivos sectários do gnosticismo). Para os gnósticos, gnose é um conhecimento que faz parte da essência humana. É um conhecimento intuitivo, diferente do conhecimento científico ou racional. Gnose é o caminho que pode guiar à iluminação mística através do conhecimento pessoal que conduz à salvação. A existência de um Deus transcendente não é questionada pelos gnósticos, pelo contrário, veem no conhecimento divino um caminho para atingir um conhecimento mais profundo da realidade do mundo.
O gnosticismo cristão designa um conjunto de crenças de natureza filosófica e religiosa cujo princípio básico assenta na ideia de que há em cada homem uma essência imortal que transcende o próprio homem.


 

iMAO’s (inibidores de monoamina oxidase):

esquemaOs inibidores da MAO inibem a enzima MAO, que degrada as monoaminas e aumentam assim a concentração sináptica de noradrenalina, dopamina e serotonina, neurotransmissores importantes no cérebro. Aumentam assim a excitação de determinados grupos de neurónios. Quando ingeridos combinados com o DMT, produzem o efeito de inibir a metabolização do mesmo, gerando a “trip”.

 


 

INTUIÇÃO:

Em filosofia, é o nome dado ao processo de apreensão racional não-discursiva de um fenômeno ou de uma relação. Se a razão discursiva se caracteriza por um processo paulatino que culmina numa conclusão, a intuição é compreensão direta, imediata de algo.

 


 

JUREMA PRETA:

2737a5_1Jurema-preta (Mimosa hostilis.) é uma árvore pertencente à família Fabaceae, da ordem das Fabales típica da caatinga, ocorrendo praticamente em quase todo nordeste brasileiro. Bem adaptada para um clima seco possui folhas pequenas alternas, compostas e bipinadas com vários pares de pinas opostas. Possui espinhos e apresenta bastante resistência às secas com grande capacidade de rebrota durante todo o ano. Usada pelos índios da etnia xucurus-cariris em conjunto com a Jurema Branca (Mimosa verrucosa). É utiliza tradicionalmente para fins medicinais e religiosos. Sua casca é usada para fins medicinais e a casca de sua raiz é a parte da planta usada nas cerimônias religiosas pois possui maior parte dos alcalóides psicoativos. Muitas vezes é utilizada em conjunto com iMao’s, como  um análogo a Ayahusca. Seu princípio ativo é a mesma triptamina presente no “vinho das almas”, o DMT, presente em toda a planta, mas em quantidade significativa apenas nas cascas das raízes.


 

KAMBÔ:

sapo1A rã (Phyllomedusa bicolor), é encontrada na Amazônia, estendendo-se desde norte da Bolívia, oeste e norte do Brasil, sudeste da Colombia, leste do Peru, sul e leste da Venezuela, e nas Guianas. Ocasionalmente é encontrada na vegetação ribeirinha do Cerrado.  A secreção produzida pela rã Kambo inclui dermorfina e deltorfina que atuam nos receptores neuronais sensíveis aos opiácios, podendo levar a uma alteração no nível de consciência. Possui uma longa tradição de uso medicinal por populações indígenas. Sintomas  mais graves porém, podem incluir forte diarréia, vômito, taquicardia, colapso sistêmico, podendo  em casos raros, levar ao óbito adultos saudáveis.

 


 

LSA:

argyreia_nervosa_seeds1Em português, Amina do Acido Lisérgico, é uma triptamina natural, presente nas sementes de algumas plantas, conhecidas como Hawaiian Baby Woodroose e Morning Glory. O uso das sementes  é feito oralmente e pruduz efeitos enteógenos similares aos do LSD 25. Todas as Morning Glory que contem LSA são da família Ipomea violacea, porém nem todas as espécies são psicoativas. Essas sementes foram muito utilizadas pelos Astecas, em rituais. As plantas conhecidas como Hawaiian Baby Woodroose são cientificamente identificadas como Argyreia nervosa. As sementes dessa planta possuem uma quantidade maior de LSA do que nas sementes de Morning Glory, prudizindo efeitos com uma dose menor. O LSA é um “parente” do LSD.


 

LSD:

lsd-kid1Dietilamida do ácido lisérgico, que é uma das mais potentes substâncias alucinógenas conhecidas. O LSD, ou mais precisamente LSD25, é um composto cristalino, que ocorre naturalmente como resultado das reações metabólicas do fungo Claviceps purpurea, relacionado especialmente com os alcalóides do ergot podendo ser produzido a partir do processamento das substâncias do esporão do centeio. Foi sintetizado pela primeira vez em 1938 e, em 1943, o químico suíço Albert Hofmann descobriu os seus efeitos de uma forma acidental. O LSD foi inicialmente utilizado como recurso psicoterapêutico e para tratamento de alcoolismo e disfunções sexuais. Com o movimento psicodélico na Inglaterra na década de 1960, passou a tomar conta das noites londrinas e do cenário musical inglês. O consumo do LSD difundiu-se nos meios universitários norte-americanos, hippies, grupos de música pop, ambientes literários, etc.


 

MENTE DE GAIA:

Alex Grey Gaia WTCNosso planeta possui um tipo de inteligência organizada. Ele é muito diferente de nós. Ele teve cinco ou seis milhões de anos para criar uma mente que funciona lentamente, que é feita de oceanos, rios, florestas e gelo. Ele está se tornando consciente de nós, a medida em que nos tornamos conscientes dele. E porque a vida de um depende da vida do outro, temos um sentimento sobre essa imensa, estranha, sagaz, velha, neutra, esquisita coisa, e tentamos descobrir por que seus sonhos estão tão atormentados, e por que tudo está tão desequilibrado. A Terra tem uma forma de inteligência capaz de abrir um canal de comunicação com os seres humanos individualmente. A experiência psicodélica é muito mais do que psicoterapia instantânea ou regressão, mais do que um simples tipo de superafrodisíaco, mais do que uma ajuda para formular idéias ou descobrir conceitos artísticos. A experiência psicodélica é, na verdade, o corredor que nos leva a um continente perdido da raça humana, um continente do qual não temos mais nenhuma conexão. E a natureza deste continente perdido da mente humana é o próprio intelecto de Gaia. Se confiamos nas evidências da experiência psicodélica descobrimos que não somos a única forma de vida inteligente neste planeta; descobrimos que compartilhamos com a Terra um tipo de consciência. A mente de Gaia é o que chamamos a experiência psicodélica. É uma experiência sobre o fato de que o intelecto do planeta está vivo, e que sem esta experiência nós vagamos num deserto de ideologias furadas. Com esta experiência o compasso do Eu Superior existente em cada ser humano pode ser acertado. (Terence Mckenna)


 

MESCALINA:

4ca99011017086edc8c01cd22e0b1a91A mescalina é uma substância alucinógeno extraída do cacto Peiote (Lophophora williamsii), é um pequeno cacto cuja região nativa estende-se do sudoeste dos Estados Unidos (incluindo os estados do Texas e Novo México) até o centro do México, e o cacto San Pedro (Trichocereus Panachoi) originário dos Andes. Ambos tem sido usado por séculos pelos efeitos psicodélicos experimentados quando ingeridos.. Sua formula química 3,4,5-trimetoxifeniletilamina. Era usada inicialmente em rituais de várias tribos pré-hispânicas. Ela foi isolada em 1896 e sintetizada em 1919. Seus efeitos alucinógenos na mente humana foram descritos em 1927. Por volta da década de 60 ela se torna popular, impulsionada pela obra de Carlos Castañeda. A obra “As portas da percepção” de Aldous Huxley também teve como base este alucinógeno.


 

PEIOTE:

Lophophora_williamsii3Desde os tempos mais antigos, o peiote foi usado por povos indígenas, tais como os huichol do norte do México e os Navajos no Sudoeste dos Estados Unidos, como uma parte dos rituais religiosos tradicionais. No século XIX, a tradição começou a se espalhar como forma de reviver a espiritualidade nativa, e utiliza-se para combater o alcoolismo e outros males sociais. A Igreja Americana Nativa é uma entre diversas organizações religiosas que usam o peiote como parte de sua prática religiosa.

O uso da mescalina popularizou-se nos anos 1970 entre clientes dos trabalhos avançados do escritor Carlos Castañeda. Don Juan Matus, o pseudônimo para o instrutor de Castañeda no uso do peiote, usou o nome “Mescalito” para se referir a uma entidade que possa ser detectada por aquelas que usam o peiote como forma de introspecção e de compreender como viver a própria vida.


 

PSICONAUTA:

Pill1Um psiconauta (do Grego ψυχοναύτης, significa literalmente um navegador da mente/alma) é uma pessoa que usa os estados alterados de consciência, intencionalmente induzidos, para investigar a própria mente e, possivelmente, encontrar respostas para questões espirituais através de experiências diretas. Psiconautas são pluralistas e buscam explorar tradições místicas de religiões variadas, meditação, sonho lúcido, tecnologias como brainwave entrainment e privação sensorial, e frequentemente drogas psicodélicas e enteógenas.

O objetivo de tais práticas pode ser responder questões sobre como a mente trabalha, melhorar um estado psicológico, responder questões existenciais ou espirituais, ou melhorar o desempenho cognitivo do dia a dia.


 

PSICODÉLICO:

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Composição das palavras gregas psiké (mente/alma) e deloun/delous (sensorial). Refere-se a uma manifestação da mente que produz efeitos profundos sobre a experiência consciente. Termo largamente utilizado na década de 1960 para descrever os efeitos de substancias enteógenas como o LSD, a mescalina (peiote), a psiclocibina (cogumelos mágicos), DMT, entre outros. Pode ser traduzida como “o que faz brilhar a alma” ou “o que manifesta a mente”

 

 


 

PSILOCIBINA:

78cbc1Está presente em cogumelos usados na medicina tradicional asteca-nahuatl da Meso-América. Os Astecas o chamavam genericamente de Teonanacatl ou “carne dos deuses”, os mazatecos o denominam ntsi-si-tho onde ntsi é um diminutivo carinhoso e o restante da palavra poderia ser traduzido como “aquele que brota”. A elevada freqüência de provas arqueológicas, na forma de estatuetas de cogumelos, encontrados na Guatemala evidenciam seu uso da cultura Maia. Os fungos superiores dos gêneros “Psilocybe”, “Panaeolus” e “Conocybe” perfazem uma série de mais de 180 espécies, são utilizados há pelo menos 3000 anos na cultura dos povos do México Asteca-Náhuatl possuindo características comuns à utilização xamânica, ainda mais antiga, do cogumelo Amanita muscaria nas populações siberianas.


 

SÁLVIA DIVINORUM:

salvia-d-divinorum1A Salvia divinorum, também chamada de “Ojos de la pastora” e “Herba de los dioses“, é a única entre milhares de espécies do gênero Salvia que apresenta efeitos psicoativos (embora suspeite-se que outras espécies possam conter essas propriedades). Originária do México na Sierra Mazateca, é considerada rara, o que torna difícil a sua obtenção. Dificilmente se reproduz por sementes, sendo multiplicada através de cortes enraizados (propagação vegetativa). Seu efeito é extremamente forte, principalmente quando usados extratos potencializados, que nada mais são do que folhas concentradas com a substância psicoativa. É extremamente recomendável que os futuros usuários venham a se informar sobre seus efeitos antes de se aventurarem. Não é uma erva a ser usada em festas, raves ou com multidões, pois exige uma certa discrição da parte do usuário para que ele se sinta à vontade. Não é uma droga recreativa e pode ser traumática quando usada nestas condições. Tem como pricípio ativo a Salvinorina A, que, no entanto, não se trata de alcalóide, mas de um diterpeno, com ação diferente da maioria das substâncias psicoativas. Pesquisas atuais sobre o efeito da salvinorina no organismo revelaram que esta, além de não ser uma substância que leva à dependência, apresenta propriedades antidepressiva, analgésica e ainda mostra-se promissora para o desenvolvimento de fármacos para o tratamento da esquizofrenia e dependencia química.


 

SAN PEDRO:

1182130.largeTambém conhecido como Wachuma (Trichocereus Panachoi) é o nome de uma planta originária dos Andes, da família dos cactus.  Wachuma significa, na língua Quechua “Ébrio e Consciente”. O nome São Pedro tem origem no catolicismo, quando fala-se de morte, em alusão à transcendência que a planta proporciona com o papel de São Pedro (do cristianismo).
O nome San Pedro, lhe é atribuído por dar ao iniciado a “chave” para entrar no Céu. Trata-se de um cacto que chega a atingir a mais de dois metros de altura, tendo a mescalina (assim como o Peiote) como princípio ativo. Tem sido utilizado há séculos pelos índios do Peru e do Equador. O uso atual do San Pedro concentra-se nas regiões costeiras do Peru e nos Andes do Peru e Bolívia, e tem recebido forte influência cristã. É aplicado para curar enfermidades, incluindo o alcoolismo e problemas mentais, para adivinhações, poções amorosas, para combater feitiçaria,purificação, etc. É conhecido também por huachuma, achuma, agua colla, cardo, huando hermoso, gigantón, San Pedrito, San Pedrillo.


 

SINCRONICIDADE:

imagev05É um conceito desenvolvido por Carl Gustav Jung para definir acontecimentos que se relacionam não por relação causal e sim por relação de significado. Desta forma, é necessário que consideremos os eventos sincronísticos não a relacionado com o princípio da causalidade, mas por terem um significado igual ou semelhante. A sincronicidade é também referida por Jung de “coincidência significativa”.
Em termos simples, sincronicidade é a experiência de ocorrerem dois (ou mais) eventos que coincidem de uma maneira que seja significativa para a pessoa (ou pessoas) que vivenciaram essa “coincidência significativa”, onde esse significado sugere um padrão subjacente.
Acredita-se que a sincronicidade é reveladora e necessita de uma compreensão, essa compreensão poderia surgir espontaneamente, sem nenhum raciocínio lógico. A esse tipo de compreensão instantânea Jung dava o nome de “insight”.


 

TEONANACATL:

Mushroom_stones_RichardRose_lgEm Nahuatl, o idioma dos astecas, teonanacatl pode ser traduzido como “carne dos deuses” ou “cogumelo sagrado”.
Há indicações de que o uso cerimonial de tais cogumelos cresceu rapidamente em tempos précolombianos muito distantes. Foram achadas pedras em forma de cogumelo em El Salvador, Guatemala, e nos distritos montanhosos contíguos do México. Estas são esculturas de pedra no formato de cogumelo, em cujo talo são esculpidas a face ou a forma de um deus ou um demônio do tipo animal. A maioria é de aproximadamente 30 cm de altura. Os exemplos mais antigos, de acordo com arqueólogos, datam de antes de 500 A.C.


 

TRIPTAMINAS:

2007_Xiao1As triptaminas são alcaloides indólicos estruturalmente relacionados ao aminoácido triptofano – constituem um grupo de compostos encontrados em plantas, fungos e animais. Algumas triptaminas, como a serotonina e a melatonina, atuam como neurotransmissores e participam da regulação fisiológica em animais. Outras, como a psilocibina, presente nos chamados “cogumelos mágicos” do gênero Psilocybe, possuem propriedades alucinógenas em humanos. A dimetiltriptamina (DMT), curiosamente, ao mesmo tempo em que atua como um neurotransmissor em animais apresenta propriedades alucinógenas quando administrada em grandes quantidades e em determinadas condições em humanos. A DMT está presente em todas as plantas, sendo mais abundante em gêneros comoAcacia, Mimosa, Anadenanthera, Chrysanthemum, Psy chotria, Desmanthus, Pilocarpus, Virola, Prestonia, Diplopterys, Arundo, Phalaris, dentre outros.


 

TROMBETA:

brugmansiawhiteÉ o nome popular dado no Brasil às plantas das espécies Brugmansia suaveolens e Datura stramonium. São também conhecidas como Canudo, Lírio, Zabumba, Saia-Branca e Trombeteira. É possível encontrá-la em várias regiões do país. Na medicina, são usadas como fitoterápicos, para combater distúrbios intestinais. A trombeta é uma planta anticolinérgica conhecida pela sua flor, que é utilizada para elaborar chás alucinógenos. Os efeitos mentais produzido pelo uso do chá são delírios e alucinações.  É considerado como droga de abuso, seu uso, é muito freqüente em baladas como “Boa noite, Cinderela”, pois a vítima após o uso, não se lembra do ocorrido no dia anterior. Entre os entusiastas da psicodelia há muita discussão sobre a trombeta ser ou não considerada um enteógeno, por causa de seus efeitos muito particulares e da ausência de lembrança da experiência. Há relatos também de prejuízos na visão durante alguns dias após o uso.


 

XAMÃ:

xama_lobo(pronuncia-se saman), ou shaman, é um termo proveniente do idioma tungue. Os tungues meridionais identificam no xamã os portadores de função religiosa que mantêm relação próxima com os espíritos e têm capacidade de entrar em êxtase (com enteógenos como ayahuasca e a psilocibina). A conceituação antropológica de xamã ainda não é consensual. Diz-se ser uma espécie de sacerdote, médico, curandeiro, conselheiro e advinho. Terence Mckenna falava que o Xamã é aquele que conhece o início e o fim de todas as coisas e consegue comunicar isso. É um líder espiritual com funções e poderes de natureza ritualística, que tem a capacidade de, por meio de êxtase provocado por substâncias enteógenas ou outras técnicas, entrar contato com o universo natural e com as forças da natureza.