O Eu e o Inconsciente – C.G.Jung

Segue abaixo um trecho editado do capítulo “A persona como segmento da psique coletiva” extraído do livro “O Eu e o Incosciente” de C. G. Jung

Neste capítulo abordaremos um problema que, se negligenciado, causará a maior confusão. Mencionei antes que, na análise do inconsciente pessoal, a primeira coisa a ser acrescentada à consciência é constituída por conteúdos pessoais; sugeri que tais conteúdos reprimidos podem ser conscientizados, representando o que poderíamos chamar de inconsciente pessoal. Mostrarei também que, através da anexação das camadas mais profundas do inconsciente, para os quais propus o nome de inconsciente coletivo, se produz uma ampliação da personalidade, que pode levar à inflação. Tal estado ocorre mediante o mero prosseguimento do trabalho analítico, como no caso antes citado. Continuando a análise, acrescentamos à consciencia pessoal certas qualidades básicas e impessoais da humanidade, fato este que desencadeia a inflação descrita anteriormente e que pode ser encarada como uma das consequências desagradáveis da plena conscientização. (1) A consciência pessoal é mais ou menos um segmento arbitrário da psique coletiva.

1. Este fenômeno decorrente da expansão da consciência não é de forma alguma específico do tratamento analítico, mas ocorre sempre que os homens são subjulgados por um novo saber ou conhecimento. “O saber infla”, escreve S. Paulo na epístola aos coríntios, pois o novo conhecimento subira à cabeça de alguns, como sempre sucede. A inflação nada tem a ver com a espécie do conhecimento, mas sim com o modo pelo qual ele se apodera de uma cabeça fraca, quando o indivíduo torna-se incapaz de ver ou ouvir qualquer outra coisa. Fica como que hipnotizado e acredita ter descoberto a solução do enigma universal. Isto já significa presunção. Tal processo é uma forma de reação tão geral que já no livro do Gênesis 2,17 comer da árvore do conhecimento representa um pecado que conduz à morte. Não é fácil de compreender por que um acréscimo de consciência, acompanhado de presunção, é tão perigoso. O Gênesis representa o ato de consciência como uma infração do tabu, como se através do conhecimento se transpusesse criminosamente um limiar sacrossanto. Creio que o Gênesis está certo, na medida em que cada passo em direção a uma consciência mais ampla é uma espécie de culpa prometêica: mediante o conhecimento rouba-se, por assim dizer, o fogo dos deuses, isto é, o patrimônio dos poderes inconscientes é arrancado do contexto natural e subordinado à arbitrariedade da consciência. O homem que usurpou o novo conhecimento sofre uma transformação ou alargamento da consciência, mediante o nível humano de sua época (“sereis semelhantes a Deus”), mas isto o afasta dos homens. O tormento dessa solidão é a vingança dos deuses: tal homem não poderá voltar ao convívio humano. Como diz o mito, é agrilhoado à solitária rocha do Cáucaso, abandonado por deuses e homens.

Ela consiste numa soma de fatos psíquicos sentidos como algo de pessoal. O atributo “pessoal” significa: pertencente de modo exclusivo a uma dada pessoa. Uma consciência apenas pessoal acentua com certa ansiedade seus direitos de autor e de propriedade no que concerne aos seus conteúdos, procurando deste modo criar um todo. Mas todos os conteúdos que não se ajustam a esse todo são negligenciados, esquecidos, ou então reprimidos e negados. Isto constitui uma forma de auto-educação que não deixa de ser, porém, demasiado arbitrária e violenta. Em benefício de uma imagem ideal, à qual o indivíduo aspira moldar-se, sacrifica-se muito de sua humanidade. Indivíduos desse tipo, extremamente pessoais, costumam ser muito sensitivos, já que é tão fácil ocorrer-lhes algo que traz à consciência certos detalhes indesejáveis de seu verdadeiro caráter (“individual”).

A este segmento arbitrário da psique coletiva, elaborado às vezes com grande esforço, dei o nome de persona. A palavra persona é realmente uma expressão muito apropriada, porquanto designava originalmente a máscara usada pelo autor, significando o papel que ia desempenhar. Se tentarmos estabelecer uma distinção entre o material psíquico consciente e o inconsciente, logo nos encontraremos diante do maior dilema: no fundo teremos de admitir que a afirmação acerca do inconsciente coletivo, isto é, de que seus conteúdos são gerais, também é válida no que concerne aos conteúdos da persona. Sendo esta última um recorte mais ou menos arbitrário e acidental da psique coletiva, cometeríamos um erro se a considerássemos (à persona), in toto, como algo de “individual”. Como seu nome revela, ela é uma simples máscara da psique coletiva, uma máscara que aparenta uma individualidade, procurando convencer aos outros e a si mesma que é uma individualidade, quando, na realidade, não passa de um papel, no qual, no qual fala a psique coletiva.

Ao analisarmos a persona, dissolvemos a máscara e descobrimos que, aparentando ser individual, ela é no fundo coletiva: em outras palavras, a persona não passa de uma máscara da psique coletiva. No fundo, nada tem de real; ela representa um compromisso entre o indivíduo e a sociedade, acerca daquilo que “alguém parece ser: nome, título, ocupação, isto ou aquilo. De certo modo, tais dados são reais; mas em relação à individualidade essencial da pessoa, representam algo de secundário, uma vez que resultam de um compromisso no qual outros podem ter uma quota maior do que a do indivíduo em questão. A persona é uma aparência, uma realidade bidimensional, como se poderia designá-la ironicamente.

Seria incorreto, porém, encerrar o assunto, sem reconhecer que subjaz algo de individual na escolha e na definição da persona; embora a consciência do ego possa identificar-se com ela de modo exclusivo, o si-mesmo inconsciente, a verdadeira individualidade, não deixa de estar sempre presente, fazendo-se sentir de forma indireta. Assim, apesar da consciência do ego identificar-se inicialmente com a persona – essa figura de compromisso que representamos diante da coletividade, o si-mesmo inconsciente não pode ser reprimido a ponto de extinguir-se. Sua influência manifesta-se principalmente no caráter especial dos conteúdos contrastantes e compensadores do inconsciente. A atitude meramente pessoal da consciência produz reações da parte do inconsciente e estas, juntamente com as repressões pessoais, contêm as sementes do desenvolvimento individual, sob o invólucro de fantasias coletivas. Mediante a análise do inconsciente pessoal, a consciência abre-se e é alimentada pelo material coletivo, que traz consigo elementos da individualidade. Sei muito bem que isto é incompreensível para os que desconhecem meus pontos de vista e minha técnica e principalmente para os que encaram o inconsciente do ponto de vista freudiano. Mas se o leitor lembrar-se do exemplo já citado da estudante de filosofia, poderá ter uma idéia aproximada do que aqui estou tentando formular. No início do tratamento, a enferma era quase inconsciente da fixação que subjazia à sua relação com o pai. Ignorava de um modo quase total que buscava um homem semelhante ao pai, fato este com que seu intelecto logo se defrontou. Isto não constituiria propriamente um erro se seu intelecto não tivesse aquele caráter de protesto peculiar, infelizmente comum nas mulheres intelectuais. Esse tipo de intelecto se caracteriza pela tendência de apontar os erros alheios; é crítico em demasia, de tonalidade desagradavelmente pessoal, com a pretensão, no entanto, de ser objetivo. Isto geralmente irrita os homens, sobretudo se a crítica a eles endereçada (como acontece muitas vezes) tocar-lhes um ponto fraco; em benefício de uma discussão fecunda, seria justamente este o ponto a evitar. Longe disto, é uma peculiaridade infeliz de tal tipo de mulher procurar os pontos fracos do homem e fixá-los, exasperando o interlocutor. Em geral, sua intenção não é consciente; pelo contrário, seu propósito inconsciente é o de impelir o homem a uma posição superior, tornando-o deste modo um objeto de admiração. Mas em geral este não percebe que está sendo forçado a assumir o papel de herói; na realidade acha esses insultos tão odiosos que tratará de desviar-se o mais possível de tal mulher. Finalmente, o único homem que lhe restará só poderá ser o que desde o início se apequenou e que, portanto, nada tem de admirável.

(…) Depois desta digressão, voltemos ás reflexões iniciais. Uma vez abolidas as repressões de ordem pessoal, a individualidade e a psique coletiva começam a emergir, fundidas uma na outra, liberando as fantasias pessoais até então reprimidar. Aparecem sonhos e fantasias, que se revestem de um aspecto diferente. O “cósmico” parece ser um sinal inefável das imagens coletivas; as imagens de sonhos e fantasias são associadas ao eterno “cósmico”, tais como tempo e espaço infinitos, a enorme velocidade e a extensão dos movimentos, conexões “astrológicas”, analogias telúricas, lunares e solares, alterações nas proporções do corpo, etc. O aparecimento de motivos mitológicos e religiosos nos sonhos também indica a atividade do inconsciente coletivo. O elemento coletivo é anunciado muitas vezes por sintomas peculiares: (2) sonhos em que se voa através do espaço, a modo de um cometa, ou se tem a impressão de ser a terra, o sol ou uma estrela; ora se é extraordinariamente grande, ora pequeno como um anão; ou, como um morto, chega-se a um lugar estranho, num estado de alheamento, confusão, loucura, etc. Do mesmo modo, podem ocorrer sentimentos de desorientação, vertigem e outros semelhantes, juntamente com os sintomas de inflação

(2)Não será demais observar que os elementos coletivos dos sonhos não ocorrem apenas neste estádio do tratamento analítico. Há muitas espécies de situações psicológicas nas quais se manifesta a atividade do inconsciente coletivo. Mas não é este o lugar adequado para o exame dessas condições.

A riqueza de possibilidades da psique coletiva confunde e ofusca. Com a issolução da persona desencadeia-se a fantasia espontânea, a qual, aparentemente, não é mais do que a atividade específica da psique coletiva. Tal atividade traz à tona conteúdos, cuja existência era antes totalmente ignorada. Na medida em que aumenta a influência do inconsciente coletivo, a consciência perde seu poder de liderança. Imperceptivelmente, vai sendo dirigida, enquanto o processo inconsciente e impessoal toma o controle. Assi pois, sem que o perceba, a personalidade consciente, como se fora uma peça entre outras num tabuleiro de xadrez, é movida por um jogador invisível. É este quem decide o jogo do destino e não a consciência e suas intenções. No exemplo anteriormente citado, foi deste modo que se processou a liberação da transferncia, apesar de afigurar-se tão impossível à consciência.

Sempre que surja uma dificuldade aparentemente insuperável, é inevitável ter-se que mergulhar neste processo. Entretanto, nem sempre ocorre tal necessidade, uma vez que a maioria dos casos de neurose só pede a remoção de dificuldades temporárias de adaptação. Mas os casos graves não podem ser curados, sem uma profunda “mudança do caráter” ou da atitude. Na maioria dos casos, a adaptação à realidade exterior exige tanto trabalho, que a adaptação interior, voltada para o inconsciente coletivo, só pode ser considerada a longo prazo. No entantp, quando a adaptação interior se torna um problema, provém do inconsciente uma atração singular e irresistível, que exerce uma influência poderosa na direção do consciente da vida. A predominância das influências inconscientes, assim como a desintegração da persona e a redução da força condutora do consciente constituem um estado de desequilíbrio psíquico, induzido artificialmente no decorrer do tratamento analítico; é claro que a intenção desta terapia é a de resolver uma dificuldade inibidora que barra a via de um desenvolvimento ulterior. Naturalmente há inúmeros obstáculos que podem ser superados com um bom conselho e com um pouco de ajuda moral, ajudados pela boa vontade e compreensão por parte do paciente. Deste modo são obtidos excelentes resultados e até mesmo a cura. Não são raros os casos em que não há necessidade de dizer uma só palavra acerca do inconsciente. No entanto, há dificuldades frente as quais não se vislumbra qualquer solução satisfatória. Nessa eventualidade, se o transtorno do equilíbrio psíquico não ocorreu antes do tratamento, certamente aparecerá durante a análise, e ás vezes sem qualquer interferência do médico. É como se tais pacientes estivessem à espera de uma pessoa de confiança a fim de entregar-se e sucumbir. Essa perda de equilíbrio é, em princípio, semelhante a um distúrbio psicótico; isto é, difere dos estádios iniciais da doença mental pelo fato de conduzir finalmente a uma saúde mais plena, enquanto que nas psicoses há uma destruição crescente. No primeiro caso, a pessoa entra em pânico e como que se abandona diante de complicações aparentemente desesperadas. Em geral, tudo começa por um esforço pertinaz de dominar a situação problemática pela força de vontade; ocorre então o colapso e essa vontade diretora é completamente aniquilada. A energia assim liberada desaparece do consciente e cai no inconsciente. É então que costumam sobrevir os primeiros sinais da atividade inconsciente. (assinalo aqui o exemplo do jovem que sucumbiu à psicose.) Evidentemente, nesse caso, a energia que desapareceu da consciência ativou o inconsciente. O resultado imediato foi a brusca alteração dos sentidos. Podemos imaginar que se o jovem mencionado tivesse uma mente mais forte, tomaria a visão das estrelas como uma imagem salvadora, conseguindo então encarar o sofrimento humano sub specie aeternitatis, e neste caso seu equilíbrio seria restaurado. (3)

Deste modo, um obstáculo aparentemente invencível seria superado. Assim, pois, encaro a perda de equilíbrio como algo adequado, pois substitui uma consciência falha, pela atividade automática e instintiva do inconsciente, que sempre visa a criação de um novo equilíbrio; tal meta será alcançada sempre que a consciência for capaz de assimilar os conteúdos produzidos pelo inconsciente, isto é, quando puder compreendê-los e digerí-los. Se o inconsciente dominar a consciência, desenvolver-se-á um estado psicótico. No caso de não prevalecer nem processar-se uma compreensão adequada, o resultado será um conflito que paralisará todo o progresso ulterior. O problema da compreensão do inconsciente coletivo coloca-nos diante de uma considerável dificuldade, que será o tema do próximo capítulo.

Entrevista Terence Mckenna – O Fim da Divindade Mecânica

Segue abaixo um capítulo do livro FIM DA DIVINDADE MECÂNICA, compilado por John David Ebert, editado no Brasil pela Editora Teosófica.
São entrevistas com grandes pensadores como Terence, Stanislav Grof, Ralph Abraham, etc.

Colocamos aqui o capítulo 05 – Etnobotânica, que é uma excelente entrevista com Terence McKenna.

Vale a pena dá uma lida neste livro, segue a descrição :

“Essa série de conversas com alguns dos principais pensadores do mundo atual descreve e revela a mudança radical que tem alterado a nossa maneira de olhar o mundo. Trata-se de uma transformação cultural revolucionária. No entanto, até agora ela tem ocorrido em grande parte inconscientemente, como se as suas partes não formassem um todo. Essa obra devolve ao leitor a capacidade de enxergar o todo. A visão científica e a visão religiosa, antes separadas, se reencontram. E como resultado disso nós percebemos de outra maneira, nova e abrangente, qual é o nosso lugar no universo. O Fim do Deus Previsível abre um diálogo para que pensadores das mais diferentes áreas expressem suas visões sobre a vida e o mundo, usando suas próprias palavras, e compartilhando o hábito de pensar de modo criativo, multidimensional, inovador e não-dogmático. Deepak Chopra: a ioga do desejo. Ruper Sheldrake: o envelhecimento das células e a física dos anjos. Stanislav Grof: o nascimento, a morte e o que está além. Lynn Margulis: a evolução de Gaia. Ralph Abraham: os alicerces do Caos. Brian Swimme: Deus e o vácuo quântico. Terence McKenna: a etnobotânica. William Irwin Thompson: a imaginação da cultura. São oito conversas profundas, descontraídas. Elas revelam aspectos centrais da civilização humana que surge no século 21″

Terence McKenna e o Jardim dasDelícias Psicodélicas

No que vem a ser um tipo de piada psicodélica interna, os auto­res William Gibson e Bruce Sterling ressuscitam T.H. Huxley, avô do famoso Aldous, para uma cena no romance que escreveram, The Diffe­rence Engine (A Máquina da Diferença). Um paleontólogo que havia acabado de retomar à América dá a Huxley alguns botões de peiote que recebera de um xamã nativo norte-americano. Huxley, recebendo o presente, diz, “Certas toxinas vegetais têm a propriedade de produzir visões.” Depois ele guarda os botões numa gaveta da escrivaninha e diz, “…cuidarei para que sejam devidamente catalogadas depois”. 1

A piada, claro, é que Huxley não fará absolutamente nada com relação aos botões de peiote, até que, com as experiências de seu neto Aldous com mescalina, em meados do século vinte, o valor do peiote seja descoberto. Pois foi em 1955 que Aldoux Huxley ingeriu quatro décimos de grama de mescalina – o princípio psicoativo do peiote – e descobriu que, nas palavras de James Joyce, “qualquer objeto, intensa­mente considerado, pode tomar-se um portal para o incorruptível eon dos deuses.” O livro de Aldous Huxley As Portas da Percepção, no qual ele relata esta experiência, mais tarde cairia nas mãos do menino de 14 anos Terence McKenna, para quem o livro iria prover o ímpeto de toda uma vida de exploração nas profundezas insondáveis da consciên­cia humana.

A atitude de T.H. Huxley, porém – como Gibson e Sterling ima­ginaram – tipifica a atitude do estudioso com relação a esses assuntos: conhecimento bom para as páginas amareladas de volumes desgastados nas estantes das bibliotecas, mas que não tem relação com o mundo da experiência vivida. É extremamente irônico o fato de que o método científico concebido por homens como Leonardo da Vinci e Francis Bacon enfatiza precisamente a validade da experiência individual. A civilização ocidental, aliás, foi moldada pela mitologia da experiência individual, em oposição à ultrapassada noção oriental da confiança na autoridade de outros, e deve seu êxito atual àqueles grandes pioneiros que tiveram a coragem de visitar terras que se pensava estarem apinha­das de estranhas criaturas boschianas que lhes guardavam os portões. É esta mitologia ocidental da experiência pessoal que, por exemplo, im­peliu Vesalius a rejeitar a autoridade de Galeno e a abrir corpos huma­nos, para verificar de uma vez por todas a estrutura da anatomia huma­na; ou a coragem prometeica de Galileu em desafiar aquela encarnação renascentista de Zeus – a própria Igreja Católica – e olhar através do telescópio para o que ninguém jamais ousara olhar antes com tanta in­tensidade; ou as migrações transatlânticas de Colombo (de “columba”, pomba) com o intuito de descobrir por si mesmo se as Índias podiam ser alcançadas navegando-se para além do-pôr-do-sol. Até os vôos espaci­ais da Apollo e nossa atual exploração de Marte, nos dias atuais, o mito permaneceu essencialmente sem mudanças.

Aquele “território transcendental da mente”, porém, que Aldous Huxley descreveu – os labirintos obscuros e desconhecidos da consci­ência humana – ainda permanece, na maior parte, inexplorado pelos ocidentais. A investigação da mente inconsciente só começou com Freud e seus predecessores românticos alemães do século dezenove.

Terence McKenna é um dos tais Magalhães da consciência, e a sua jornada começou com uma viagem à Ásia em 1967 para estudar a iconografia pré-budista dos thangkas tibetanos. Ele descobriu, em vez disso, que as raízes do Budismo tibetano estão no Xamanismo nativo de Bon-Po, no qual alguns praticantes usam haxixe e a figueira-do-inferno, alucinógena, para catalisar suas viagens xamânicas.

Em 1971, Terence e seu irmão Dennis fizeram uma viagem à bacia amazônica em busca de um experiência xamânica autêntica, e no processo encontraram uma espécie de cogumelo que continha psilocybin (Stropharia cubensis) que, diz McKenna, só fica atrás do DMT (dimetiltriptamina) em seu poder de induzir a uma viagem alu­cinógena ao reino dos Ancestrais. E normalmente é este reino que os xamãs contatam para obter conhecimento e informação valiosa capaz de curar as aflições de suas comunidades, ou as desordens de uma pessoa específica. Tais cosmonautas interiores podem, nas palavras de Aldous Huxley, “tornar-se condutores através dos quais alguma influência be­néfica possa fluir daquele outro campo para um mundo de eus obscure­cidos, cronicamente morrendo por falta dessa influência.” As experiên­cias dos irmãos McKenna com a telepatia, a sincronicidade e encontros com OVNIs são descritas com vívidos detalhes no livro de McKenna True Hallucinations (Alucinações Verdadeiras), de 1993.

A maior tarefa que tiveram ao retomarem do submundo xamâ­nico da Amazônia foi, nas palavras de Joseph Campbell, saber “como expressar numa linguagem compreensível para o mundo da luz os pro­nunciamentos do mundo da escuridão que desafiavam a própria capaci­dade de falar”. Desafio a que responderam com um livro intitulado The Invisible Landscape (A Paisagem Invisível), de 1975. Nesta obra estra­nha e poética os autores tentam compreender completamente, através de uma síntese de ciência, filosofia e história, as implicações de suas expe­riências na Amazônia. Na teoria geral da ressonância da natureza que eles expandiram como alguma hélice exótica do DNA cultural, o mi­crocosmo da viagem xamânica aos interiores das consciências humana e cósmica está mapeado no macrocosmo do tempo e espaço através de uma filosofia da história que McKenna chama “A Onda do Tempo.” Nesta teoria, os eventos da história são descritos como uma onda fraci­onada não-linear na qual as épocas distantes influenciam épocas sepa­radas pelo tempo e pelo espaço através de ressonâncias em sua similari­dade estrutural.

Em 1976, os autores deram prosseguimento a esse trabalho com Psilocybin: the Magic Mushroom Grower’s Guide (Psilocybin: Guia do Plantador do Cogumelo Mágico), e em 1991, McKenna juntou uma década e meia de ensaios e entrevistas em The Archaic Revival (O Re­nascimento Arcaico).

Em 1992, apareceu o livro de Terence McKenna Food of the Gods (O Alimento dos Deuses), no qual ele afirma que a sua história das origens da consciência humana foi precipitada pela ingestão de cogumelos psicoativos. Também o livro faz a crônica do longo declínio do uso do cogumelo e sua história insatisfatória de substitutos como o ópio, açúcar, café, e heroína ao longo da evolução humana.

Naquele mesmo ano, o longo intercâmbio de McKenna com o biólogo Rupert Sheldrake e com o teórico do caos Ralph Abraham culminou com o aparecimento do livro deles Trialogues at the Edge of the West (Triálogos nos Limites do Ocidente), ao qual se juntou uma se­qüência, The Evolutionary Mind: Trialogues at the Edge of the Un­thinkable (A Mente Evolucionária: Triálogos nos Limites do Impensá­vel), em 1998.

No momento dessa entrevista, McKenna estava escrevendo um livro em co-autoria com Philippe DeVosjoli, que iria chamar-se Casting Nets into the Sea of Mind (Lançando Redes no Mar da Mente). McKen­na promete uma futura explicitação completa de suas teorias da evolu­ção da consciência humana e sua relação com a linguagem e a tecnolo­gia.

JE: No seu primeiro livro, The Invisible Landscape (A Paisagem Invisível), você e seu irmão Dennis desenvolvem o que parece ser um tipo de teoria geral da ressonância da natureza que inclui a experiência visionária do xamanismo como também as épocas mais elásticas do tempo histórico. Gostaria de discutir como essa teoria surgiu de suas reflexões sobre a natureza do tempo após sua viagem à Amazônia em 1971.

TERENCE MCKENNA: Bem, penso que provavelmente a percepção central em tudo aquilo foi a idéia de que o tempo é realmente, quando você o ana­lisa, metabolismo, que é a única qualidade que se associa com a vida orgânica, por meio do qual a vida cria um sistema aberto longe do equi­líbrio e por aquele meio sustenta-se no tempo e através do tempo. As­sim a estrutura da vida orgânica, especificamente a estrutura do DNA, é, penso eu, uma resposta evolucionária única a este impulso termodi­nâmico em direção ao desequilíbrio que parece caracterizar a biologia. Estudando o metabolismo – o que, em termos práticos, significa olhar para o interior de nossas células – podemos realmente não apenas en­tender o que é o tempo, mas fazer generalizações sobre o tempo que podemos efetivamente estender a outros domínios do universo.

JE: É interessante o modo como você conecta o micro­cosmo com o macrocosmo em True Hallucinations (Alucinações Verdadeiras). Por exemplo, você fala de como construiu toda essa teoria da ressonância em torno do número 64. que você diz ser significativo tanto para o DNA – no qual há 64 seqüências possí­veis de codons – quanto para o I Ching, no qual há 64 hexagra­mas. 2 Você poderia falar um pouco sobre como chegou a essa conclusão meditando sobre esse número?

TERENCE MCKENNA: Sessenta e quatro é um número interessante. São dois para seis e surge a partir do quatro, o que, de acordo com Jung e outros, é uma divisão primária do espaço, do tempo e da realidade. Nós vivemos num universo em quatro dimensões. A minha noção sobre o I Ching era de que se o levássemos a sério – e certamente o levamos – (e por levar a sério quero dizer se o reconhecemos como tendo uma estranha habili­dade para funcionar como anunciado), então parece razoável perguntar, como ele faz isso? Eu creio que o modo como ele deve fazê-lo é sendo, como você mencionou, de algum modo um microcosmo do macrocos­mo maior. E a conclusão de que era diretamente análogo à estrutura do DNA, parecia ser a prova. O I Ching é uma visão primária na estrutura não apenas do universo em que vivemos, mas da Mente na qual estamos incluídos e que observa o universo.

JE: A sua teoria da ressonância do tempo sugere que eventos distantes na história possam ter um efeito ou uma influ­ência sobre eventos presentes através de um tipo de ressonância de suas similaridades estruturais. Por exemplo, você compara o fim do Império Romano com os eventos de hoje em dia. Você pode discutir como ocorre essa ressonância?

TERENCE MCKENNA: Claro. Antes de mais nada relembremos o que pressupõe a teoria histórica convencional: que o momento mais importante em ter­mos de moldar este momento é aquele que imediatamente o precedeu. Eu assumi um ponto de vista diferente, e senti que um determinado momento histórico no tempo é um tipo de onda permanente de padrões de interferência criado por outros momentos no tempo que podem ou não tê-lo precedido imediatamente. Assim, por exemplo, A Idade de Ouro Grega, embora esteja agora situada a 2500 anos de distância no passado, ainda assim continua a moldar nossas idéias a respeito da lei e da sociedade. E em qualquer situação dada há muitas destas influências agindo, algumas delas trivialmente, para dar-nos banheiras com pernas em formas de garras e coisas assim; e algumas muito profundamente, nos querendo passar a durabilidade da democracia ou coisa semelhante.

JE: Você acha que o fato de seu modelo terminar no mesmo ano que o calendário Maia – 2012 d.e – sugere algum tipo de ressonância entre a nossa cultura e a dos Maias? 3

TERENCE MCKENNA: Não tenho certeza do que isso significa. Eu creio que todas as culturas que olhem profundamente no tempo, se chegarem a conclu­sões corretas, terão modelos de algum modo congruentes. Mesmo se olharmos para a civilização ocidental e seus calendários, atravessamos o final de um milênio apenas doze anos antes do fim do calendário Maia. Numa escala de mil anos, esta é uma diferença de ponto doze por cento.
Assim, de modo bastante estranho, a vida inconsciente das cul­turas parece sincronizar-se com estes ritmos cósmicos muito extensos, quer a cultura reconheça estes ritmos ou não. É apenas a canção da pai­sagem temporal, se você quiser.

JE: No lado microcósmico, no seu livro The lnvisible Landscape, você e seu irmão desenvolvem uma teoria de que as experiências visionárias do xamanismo são ativadas quando o psilocybin se liga quimicamente com o DNA neural. Você gosta­ria de discutir esta teoria?

TERENCE MCKENNA: Bem, no metabolismo comum, o psilocybin é um antago­nista, significando um competidor, em relação à serotonina, que é um simples transmissor cerebral na sinapse. Porém, uma percentagem muito pequena de psilocybin chega até o núcleo da célula. Há afinida­des estruturais muito surpreendentes entre o DNA e muitas dessas mo­léculas psicodélicas que aparecem naturalmente. Como você sabe, o DNA pode ser visualizado como uma estrutura tipo escada, enquanto muitas dessas drogas moleculares são chamadas planares, o que signifi­ca apenas achatadas, e são do tamanho e geometria apropriados para permitirem-se encaixar dentro e fora dos espaços entre os nucIeotídeos do DNA. Este processo é chamado intercalação. É bem estudado, mas ninguém sabe qual pode ser o propósito ou as conseqüências deste ajuste perfeito entre as estruturas do DNA e estas drogas moleculares. 4

JE: Karl Pribram fala sobre o paradigma holográfico do armazenamento da memória, mas ele parece estar preocupado com isso do ponto de vista individual, enquanto que você e o seu irmão expandiram a visão sugerindo que algo como a alma do mundo ou o inconsciente coletivo está também de algum modo acessível na experiência psicodélica?

TERENCE MCKENNA: Sim, se aceitarmos o modelo junguiano de um inconsciente coletivo – um conjunto compartilhado de imagens arquetípicas que não são concedidas culturalmente – então nós temos a considerar, como você mencionou, não apenas o problema da memória individual, mas o problema maior dessas memórias raciais ou arquetípicas. Acho que tomamos as coisas difíceis demais para nós nesta área colocando tanta fobia e estresse ao fazermos a pesquisa psicodélica. O nosso medo pre­coniza que qualquer pessoa que escolha se concentrar nas áreas de far­macologia ou biologia molecular está escolhendo uma vida de pura marginalização. É muito difícil obter financiamento, e há muito pouco apoio institucional.

JE: Eu estou curioso acerca do que você pensa sobre o trabalho de Stanislav Grof com o LSD e a teoria dele de que rea­tiva o trauma do nascimento.

TERENCE MCKENNA: Bem, o Stan é meu amigo pessoal, e ele fez um trabalho muito corajoso com o LSD. Quando o LSD tornou-se ilegal, ele desen­volveu um modelo de técnicas respiratórias para levar as pessoas para a mesma área. Tendo dito isso, a minha própria exploração pessoal da psique não tendeu a apoiar a teoria dele sobre as várias matrizes peri­natais. Eu chamaria isso de uma teoria neo-freudiana. Tenho a mente aberta acerca disso, mas não creio que a maioria das pessoas que não ouviram falar da teoria de Grof fariam experiências que realmente pu­dessem ser mapeadas por aquele sistema.

JE: Você poderia discutir, então, o que são, em sua expe­riência, as diferenças nos conteúdos visionários do LSD versus a experiência com psilocybin?

TERENCE MCKENNA: Bem, sim, de certo modo. Cada uma destas coisas, sendo quimicamente única, é como uma lente feita de vidro com coloração ligeiramente diferente. O LSD vai diretamente à estrutura da personali­dade, às estruturas que surgiram através das experiências na vida do indivíduo, de modo que é muito bom para trabalhar através daquilo que eu penso ser assuntos psicoanalíticos normais. É, de modo relutante, um alucinógeno. Em outras palavras, transforma a qualidade dos pensa­mentos, mas não transforma o input no córtex visual tão dramatica­mente quanto o fazem algumas destas outras coisas.

Os compostos que são derivados de plantas, por outro lado ­psilocybin ou DMT – parecem estar cheios de sua própria informação a qual desejam passar adiante. De modo que muitas vezes não se sai com um profundo insight com relação aos próprios relacionamentos ou situ­ação de paternidade, mas em vez disso com um sentido muito mais profundo de conexão com a dinâmica da natureza ou, quase se pode dizer, com o mundo da energia do espírito ou energia mágica. Agora, por que esta diferença deve ser obtida entre o psilocybin e o LSD … A causa pode ser estrutural ou pode haver algo mais profundo.

Por exemplo, a causa pode envolver algo como a noção dos campos morfogenéticos de Sheldrake. O LSD, afinal de contas, foi in­ventado no século vinte, ao final dos anos trinta, e está inteiramente caracterizado pelos europeus e americanos do século vinte. Os com­postos como o psilocybin, por outro lado, usado por milênios pelos po­vos tribais das montanhas do México, teriam, certamente, um tipo de campo morfogenético completamente diferente.

JE: Você mencionou que o psilocybin facilita o contato com o que parece ser uma Mente estranha ou inteligência de al­gum tipo. Você tem uma teoria sobre OVNI’s que sugere que eles poderiam de algum modo ser sugestões desta inteligência fora da psique. Você poderia discutir isso?

TERENCE MCKENNA: A psique, ou consciência, é um conceito muito escorrega­dio. Um pesquisador, Julian Jaynes, sugeriu que a consciência humana mudou sua natureza mesmo nos tempos históricos. Jaynes fala que nos tempos homéricos, o ego como o conhecemos não existia, exceto sob extremo estresse. E então se apresentava quase como uma intrusão exte­rior na consciência, como a voz de um deus. 5 Eu acho que a maior dife­rença entre a consciência materialista moderna e a consciência xamâni­ca arcaica é que esta última interpreta muito de suas percepções como vindas de um Outro inteligente e organizado. E eu, após haver passado pela interpretação extraterrestre durante vários anos, cheguei à opinião de que este Outro que contatamos através destas coisas é nada mais nada menos que um tipo de inteligência integrada que permeia o planeta inteiro. Por falta de uma melhor descrição, vamos simplesmente chamá-la de Supermente de Gaia.

Eu acho que durante muito tempo ao longo da história, as pes­soas estavam totalmente conscientes, totalmente à vontade com a lin­guagem e o teatro e os rituais e a magia, mas estavam no berço, diga­mos assim, ou embutidos num diálogo quase contínuo com o resto da realidade, experienciada como uma consciência contínua a que chama­vam o Grande Espírito, ou os Ancestrais, ou simplesmente Deus. A herança cultural e lingüística do Ocidente tem sido em larga escala uma construção de defesas contra este Outro e uma substituição Dele pelo ego de massa da humanidade, politicamente expresso.

Assim, quando entramos na selva, ingerimos plantas psicodéli­cas e executamos antigos rituais paradigmáticos, se conseguirmos dis­solver o condicionamento e as expectativas de modernidade e materia­lismo. descobrimos que este mistério ainda está lá, ainda vivo, ainda capaz de dialogar conosco. E isso deixa as pessoas absolutamente con­fusas. Elas reagem a isso com o êxtase ou com o medo, ou com histórias de conversão religiosa ou abdução alienígena. Depende inteiramente de como a coisa reage sobre você. Neste caso, a revelação de um homem é o pesadelo de outro. Mas a coisa que jaz por trás de tudo isto é algum tipo de mente natural, viva e inteligente, que é simplesmente uma ex­tensão da biosfera, de Gaia.

JE: Em seu livro Food of the Gods (Alimento dos Deu­ses), você lida com algumas das dimensões históricas do uso dos alucinógenos. Você visualiza a história da cultura como um constante declínio no uso de alucinógenos derivados de plantas e a substituição gradual destes por substitutos insatisfatórios como o álcool, o ópio, o fumo, a cocaína, etc. É possível que se as pes­soas usassem alucinógenos de um modo mais rituailizado e con­trolado, tal como, digamos, duas vezes ao mês, que isso poderia reduzir significativamente o uso abusivo de algumas destas ou­tras drogas?

TERENCE MCKENNA: Deus meu, duas vezes ao mês! Isso seria uma revolução, não seria? Eu acredito que as pessoas sem essa mãozinha da inteligên­cia de Gaia sobre a qual estávamos falando estão simplesmente num mato sem cachorro. Elas têm o marxismo, e a moderna publicidade, e quaisquer que sejam os valores culturais nos quais nasceram para guiá­-los, mas inevitavelmente, como destacou Freud no livro O Mal-estar na Civilização, estas coisas levam à neurose.

Penso que a chave para entender a experiência psicodélica, quer você a ame ou a deteste, é que ela dissolve as fronteiras. Dissolve a programação cultural e a substitui por um tipo de programação muito mais básica que está no animal humano. Todas as culturas nos desviam desta fonte original de autenticação pessoal. E nesse sentido, Freud es­tava certo; toda cultura é neurótica. Assim, no livro que você mencio­nou, e também num outro livro meu chamado The Archaic Revival (O Renascimento Arcaico), eu simplesmente assinalo que quando as civili­zações tornam-se massivamente neuróticas, parecem ter um reflexo instintivo de voltar no tempo em busca de um modelo. 6 Por isso a Re­nascença criou o Classicismo como resposta à falha da igreja medieval. É por isso que no século vinte presenciamos surtos de fenômenos que vão do cubismo e surrealismo ao rock and roll. Estes são impulsos em direção a um estado mental arcaico. No centro deste impulso em dire­ção ao estado mental arcaico está a dissolução da fronteira dos valores culturais que ocorre sob o efeito de psicodélicos. Certamente que se pudéssemos encontrar algum meio de trazer isso às pessoas – e eu acho que duas vezes ao mês soa muito mais freqüente do que o necessário ­na razão de uma vez ao ano e de um modo poderoso, seria suficiente para manter as pessoas operando à luz do conhecimento correto de que há valores estruturais maiores que o conhecimento que lhes está sendo passado através da mídia de massa e das convenções culturais.

As pessoas estão ficando absolutamente famintas por autentici­dade, e nesse meio tempo lhes é oferecida uma seleção interminável de carros alemães, produtos para os cabelos, novos sabores de sorvetes e divertimentos sem graça, e nada disso satisfaz, porque aquilo que as pessoas realmente necessitam é um sentido autêntico de seu próprio ser e de sua própria importância no esquema natural das coisas. A cultura não pode responder a isso a não ser que abra espaço para a transcendên­cia de si mesma.

JE: Em Food of the Gods você sugere que a consciência humana pode ter-se desenvolvido da consciência dos seus ances­trais hominídeos como resultado de os hominídeos haverem in­corporado cogumelos alucinógenos em sua dieta. Qual é a evi­dência primária que temos do uso de cogumelos na história hu­mana?

TERENCE MCKENNA: Eu acho que a mais antiga evidência que eu consideraria como tendo algum peso é um grupo de imagens escavadas na rocha no platô Tassili, ao sul da Argélia. Eles continuam dando idades cada vez mais antigas para essas coisas, mas creio que agora chegaram a cerca de 12.000 anos. Aí vemos xamãs com cogumelos brotando de seus corpos e as mãos cheias de cogumelos. 7 Este tipo de evidência, porém, jamais foi buscado, e nas áreas onde eu acho ser mais provável de se encontrar, nenhuma escavação jamais foi feita – especificamente, no sul da Argé­lia. Poder-se-ia fazer estudos polinológicos em busca de esporos de cogumelos. Poder-se-ia tentar encontrar rochas ainda mais remotas e representações de arte em rocha ainda mais antigas, destes xamãs, con­sumidores de cogumelos. o grande embaraço da teoria comum da evolução, você sabe, é a explosão muito dramática no tamanho do cérebro humano num período muito curto de tempo evolucionário. Um biólogo evolucionário, Lurnholz, o chama de a mais dramática transformação de um órgão importante de um animal superior em todo registro fóssil. Bem, é um grande embaraço para a evolução, porque se pode notar que o cérebro é o órgão que criou a teoria da evolução. Assim, se não podemos dar conta de sua origem subimos por uma escada que não tem degrau para descanso.

Algo extraordinário estava acontecendo com a situação hominí­dea, digamos entre 125.000 e 25.000 anos atrás. Todas as outras teorias falharam. Eu me concentrei no psilocybin mas realmente quando con­verso com os meus pares neste campo, o que estou dizendo é que aquilo para o que precisamos olhar é a dieta. A dieta é um dos principais fato­res que afetam as taxas de mutação em qualquer espécie. A razão por que a maioria das espécies animais têm dietas muito definidas e especi­alizadas é que a dieta é uma estratégia evolucionária conservadora para limitar a exposição a compostos mutagênicos, e daí à mutação. Quando uma espécie está sob pressão nutricional e começa a experimentar ali­mento anteriormente considerado marginal ou inaceitável, ora, isso na­turalmente quer dizer que o genoma vai ficar exposto a nova tensão química através da cadeia alimentar, e que se vai adquirir mais defor­midades no nascimento, cegueira, baixo QI, baixa taxa de natalidade. Mas também se vai adquirir a muito rara e positiva mutação, e a taxa dessas mutações positivas será também concomitantemente elevada um pouco.

Assim, penso que o lugar onde procurar a explicação da ruptura na evolução humana é o período em que deixamos de ser uma criatura que vivia ao relento, sob o céu. A mudança subseqüente na dieta e as comoções pela exposição a vários agentes químicos causaram muitas mudanças nos seres humanos. O psilocybin é simplesmente uma das mais dramáticas. Podemos construir um cenário com o psilocybin que considero muito atrativo para os biólogos evolucionários, porque mostra como o psilocybin, contribuindo crescentemente com pequenas vanta­gens, poderia ter provocado uma importante influência química na evolução da arquitetura do cérebro e da consciência.

JE: Em Food of the Gods você traça um arco de difusão histórica de uma sociedade inspirada por uma deusa, original­mente comedora de cogumelos – o povo Tassili no paleolítico no norte da África – e o segue através da Ásia Menor à medida que viaja para o interior do Catal Huyuk anatoliano, de onde migra para a Creta de Mino. Finalmente. os gregos adotam essa cultura da Deusa na forma muito reduzida dos mistérios eleusianos, nos quais a ferrugem alucinógena das gramíneas pode ter sido usada, do mesmo modo que os cretenses usavam o ópio. A minha per­gunta, então, é, você tem alguma idéia de exatamente onde foi, ao longo deste caminho, e por que motivo foi que o consumo do co­gumelo desapareceu?

TERENCE MCKENNA: Sim, eu o associo inteiramente a lentas mudanças no clima. Em outras palavras, provavelmente de 100.000 a 125.000 anos atrás ocorreu o período mais propício em termos de tamanho e extensão das chuvas, e a sobreposição mais propícia, também, de ecossistemas de cogumelos e de habitats humanos. Toda a África do Norte era um vasto pasto com animais ungulados evoluindo e muitas correntes de água descendo das terras altas. E aquelas pastagens tinham surgido de uma mudança climática. Antes disso, em um tempo ainda anterior, houvera florestas. Mas à medida que as pastagens deram lugar ao deserto ao longo dos milênios, os cogumelos – o seu alcance, a disponibilidade, e a potência – todos sofreram retração ou diminuição. À medida que o pro­cesso continuou, a população humana ou passou sem, ou começou a procurar substitutos. E nenhum substituto tem realmente o mesmo efeito que o original, e assim se tem os cultos da cerveja, a fermentação de sucos de frutas em vinho, experiências com cânhamo e ópio. Mas foi simplesmente uma série de desastres climatológicos, e o que liquidou a coisa toda – que também foi uma resposta a esta mudança climatológica – foi a invenção da agricultura. Eu acredito que Frazer em The Golden Bough (O Ramo Dourado) diz alguma coisa sobre o fato de que, quando os deuses se tornaram alimento, as grandes orgias e celebrações ficaram marginalizadas, porque os valores culturais que se tornaram importantes naquele tempo foram a habilidade de levantar-se de manhã bem cedo, pegar a enxada e ir trabalhar.

JE: Alguns estudiosos têm dito que o consumo de alu­cinógenos é um substituto pobre para a longa e difícil estrada da disciplina espiritual que é necessária, dizem eles, para se tomar verdadeiramente iluminado. Como você responde a este ponto de vista ? 8

TERENCE MCKENNA: Bem, eu não sei, acredito que eles estejam verdadeiramente iluminados. Esse é um assunto difícil de se tocar. Este é um ar­gumento corrente e interminável em todos os níveis da antropo­logia. O grande proponente deste ponto de vista de que eu tenho conhecimento é Mircea Eliade, que assumiu a posição de que o que ele chamava “xamanismo narcótico” era de algum modo de­cadente, e que o verdadeiro xamanismo era passar por provações e perder-se na selva e coisas desse tipo. Eu não acredito que os povos aborígines gostavam mais de desconforto e desprazeres do que nós. Frente a um sem-número de métodos para chegar ao mesmo fim, a maioria de nós escolheria o método mais eficaz e não-destrutivo. Eu realmente acredito que quando o acesso direto ao mistério ou ao espírito se torna problemático por qualquer ra­zão, é então que se tem a codificação do dogma, a nomeação de classes especiais de pessoas para interpretar para o restante de nós as vontades do mundo invisível. E então se tem listas morais do que se deve fazer e não fazer. E tudo se torna religião organi­zada. A fobia que a maioria destas religiões organizadas mostra em relação à experiência psicodélica é simplesmente que elas sentem aí um competidor muito poderoso para seus clientes.

JE: Você mencionou que viajou por um tempo pela Ásia experimentando estas várias técnicas de Ioga e que não fizeram efeito em você?

TERENCE MCKENNA: Bem, não é que não funcionem; elas não produzem a expe­riência psicodélica. Produzem experiências muito interessantes e úteis, e certamente ensinam autodisciplina e tudo o mais. Mas eu acho que com a religião organizada há uma tensão interna porque a religião está no momento e procura responder às aspirações do homem além deste mundo, e ainda inevitavelmente a religião volta-se para os seus esque­mas de investimento, seu próprio auto-engrandecimento, seu desejo de atrair mais pessoas e mais território para sua área de influência. Assim eu sempre senti que a autêntica viagem religiosa era algo que ia aconte­cer entre um simples ser humano e os Espíritos. Eu penso que é uma pena que a religião tenha tanto medo da experiência direta que acabe colocando inevitavelmente um tipo de elite entre o homem comum e o mistério.

JE: Você já tomou psilocybin em conjunção com um tan­que de isolamento?

TERENCE MCKENNA: Na realidade jamais fiz isso num tanque. Não creio que se tenha de ir tão longe, mas o melhor meio para estas coisas é o que eu chamo de confortável escuridão silenciosa. Algumas pessoas querem ouvir música e isso certamente causa arrebatamento. Mas nada pode­mos fazer com a notícia de que Bach é Deus; já sabemos disso. Eu acho que quando as pessoas têm que ter música ou livros de arte empilhados à sua volta, elas já estão se deixando influenciar. As riquezas interiores da silenciosa mente humana estão além de qualquer coisa que já tenha­mos criado em qualquer situação elegante ou em qualquer sociedade esplendorosa que já tenhamos tido neste planeta. E essa notícia em ter­mos existenciais é realmente bastante fortalecedora. Toda a sociedade de consumo de que fazemos parte é na realidade um sistema para causar maravilhas. Brinquedos, roupas, jogos e divertimentos: tudo isso é para deixá-lo atônito e para arrebatá-lo. Bem, se você estivesse cultivando cogumelos no esterco de vaca no seu quintal, você rapidamente desen­volveria um relacionamento completamente diferente com tais maravi­lhas. Você certamente chegaria à conclusão de que há uma infinitude de tais maravilhas, e que a maioria delas está dentro de você.

Assim, novamente eu vejo a cultura oferecendo substitutos ba­ratos da experiência autêntica. A cultura quer que você rejeite o passa­do, antecipe o futuro, e mal perceba a presença sentida da experiência imediata. Do meu ponto de vista, esse é o valor mais tóxico que tolera­mos; a desvalorização de nossos sentimentos à medida que eles ocorrem no ato de viver no momento, num lugar determinado no espaço e no tempo. Isso é o que nós somos, isso é tudo o que sempre seremos, e um mundo feito de esperança e arrependimento é um substituto muito páli­do para aquele sentimento de estar vitalmente conectado e presente no mundo vivo.

JE: As suas idéias sobre a ressonância através do tempo têm muito em comum com a ressonância mórfica de Rupert Shel­drake e com as pesquisas sobre vibrações de Ralph Abraham. Fora os Trialogues (Triálogos), você acha que vocês três seriam capazes de trabalhar juntos num livro?

TERENCE MCKENNA: Estamos muito próximos, e aliás fizemos todo um segundo conjunto de Trialogues. Tudo o que precisamos é de um editor sufici­entemente louco para publicá-los, embora eu não ache que o primeiro livro tenha ido bem em inglês, mas foi muito bem recebido na Alema­nha. Mas sim, me sinto muito próximo a esses caras. Eu acho que anologia à medida que nos movemos em direção a ambientes de comuni­cação assistidos por drogas quase-telepáticas e por máquinas.

JE: Você acredita que a tecnologia de realidade virtual terá influência preponderante em tudo isso, ou apenas vai se tor­nar uma novidade?

TERENCE MCKENNA: Acredito que tem um potencial tremendo porque é real­mente uma tecnologia que nos permitirá mostrar uns aos outros o interi­or de nossas cabeças. Isso é algo que jamais fomos capazes de fazer. Você e eu estamos tendo esta conversa e educadamente pressupondo que temos abertos diante de nós dicionários idênticos, e portanto você entende o que eu quero dizer. Mas nada é mais capaz de trazer a con­versa para uma situação estridente do que alguém dizer para outrem, “você poderia me explicar o que eu acabei de dizer?” E você sabe, em face a esse desafio, a suposição da comunicação é algo bastante rare­feito. 9

Se nós realmente pudéssemos mostrar uns aos outros o que que­remos dizer construindo meios esculturais da nossa intencionalidade em 3-D, seríamos capazes de eliminar a enlouquecedora ambigüidade que acompanha o ruidoso estilo de conversação bucal de baixa freqüência. É surpreendente para mim que tenhamos uma civilização global baseada em ruidosa comunicação bucal, visto que há 500 línguas e ninguém tem o mesmo dicionário, ninguém teve a mesma educação, e todos têm conjuntos diferentes de experiências. Assim, acredito que fizemos um trabalho incrível com o instrumento grosseiro que nos foi dado, mas o futuro da comunicação é o futuro da evolução da alma humana, e à me­dida que nos comunicarmos com maior facilidade, as fronteiras e a ilu­são da diferença simplesmente irão tornar-se indefinidas e desaparece­rão.

NOTAS:

1 Gibson e Sterling (1992), p.II?
2 Veja, por exemplo, The Mayan Factor. de José Arguelles (1987), p.86.
3 De acordo com o software de McKenna, Timewave Zero, a história é composta de uma série de ondas de novidades, na qual novas invenções surgem ao final de um ci­clo. Já que o I Ching é composto de 64 haxagramas, as datas na história podem ser divididas por esse número para produzir pontos de Novidades. Por exemplo, 1.3 bi­lhões de anos atrás marca a invenção da reprodução sexual pelos organismos eucari­óticos. Divida esse número por 64 para produzir um ciclo começando há 18 milhões de anos no período Mioceno no apogeu do período dos mamíferos ( e talvez não co­incidentemente, 15 milhões de anos atrás, uma grande catástrofe teve início pelo im­pacto de algum planetóide). Divida isso por 64 para produzir um número por volta de 200.000, uma data associada com o advento das populações Neanderthal. Nova­mente divida por 64 e chegue a um número por volta de 4.300, que é o começo das invasões Kurgan das civilizações da deusa da Europa antiga, o prólogo do nasci­mento de uma alta civilização após cerca de mil anos ou coisa assim. O último destes ciclos de Novidades começa em 5 de agosto de 1945 – um dia antes do bombardeio de Hiroshima – e termina em 21 de dezembro de 2012 d.e. Veja trabalho publicado, Temporal Resonance em McKenna (1991) pp.104-113. Veja também Arguelles, ibid., embora McKenna diga que ele apresentou a idéia de 2012 a Arguelles.
4 Para observar uma ilustração deste processo de intercalação veja figo 9, p.76 em McKenna, Terence e McKenna, Dennis (1993).
5 Jaynes (1976).
6 A propósito dessa questão, o Mahaa Koot Hoomi, um raja iogue dos Himalaias,
escreveu em 1880 em uma carta ao jornalista inglês Alfred Sinnett: “Temos a ten­dência a crer em ciclos que voltam sempre periodicamente e esperamos poder acele­rar a ressurreição do que já passou e já se foi. Nós não poderíamos impedi-Io ainda que quiséssemos. A ‘nova civilização’ será apenas filha da antiga, e nos basta deixar que a lei eterna siga o seu próprio curso para que os nossos mortos saiam dos seus sepulcros; mas estamos certamente ansiosos por acelerar o desejado acontecimento.” Veja Cartas dos MahaTerence McKennaas, Ed. Teosófica, Brasília, volume I, Carta li, pp. 81-82. No entanto, a filosofia esotérica e a literatura teosófica propõem a expansão da inte­ligência espiritual sem o uso de quaisquer drogas ou substância intoxicantes, que constituem atos de violência contra o corpo e a consciência do indivíduo. ( N. ed. bras. )
7 Veja ilustrações dessas figuras alucinógenas em McKenna ( 992). pp. 72-73. Veja também a ilustração em Campbell (1988a), p. 83, figo 146. Sobre a importância da arte do plateau Tassili, Campbell cita o trabalho do erudito Henri Lhote: “Parece”, diz Lhote ao discutir essas descobertas, “que estamos diante das primeiras obras de arte negra – de fato, somos tentados a dizer isso, em relação à sua origem”.
8 Por exemplo, William Irwin Thompson escreve: “Infelizmente, o modo de vida do hippie californiano ‘” deve-se tomar o consumidor típico americano e pensa que o caminho para a iluminação é através do consumo de cogumelos e curtição da ilumi­nação sem necessidade de todo o trabalho árduo da sadhalla iogue. Veja Thompson (1996), p.189. Sobre o comentário de Ken Wilber veja também nota de fim de página número 6, da entrevista de Grof (Em outro capítulo)
9 Contraste com Thompson: “Eu acho que o problema principal com a realidade virtualé que ela é uma tecnologia tóxica, é uma violação dos seus lobos frontais. Eu acho que vai causar efeitos sobre a saúde das pessoas como faz o mal de Alzheimer no seu início. Quando eu era menino, costumava entrar em sapatarias e colocar os pés nas máquinas de raios-X. O que parecia ser progressista e rotineiro estava na realidade causando câncer nas pessoas.” Veja Brown e McClen (1995), p.297 .

O Alimento dos Deuses – Terence McKenna (pt 3)

Seguem os principais trechos dos capítulos 2 e 3

 

Capítulo 2 – A magia nos alimentos

 

O modo como os seres humanos usam plantas, alimentos e drogas faz mudar os valores dos indivíduos e, em última instância, de sociedades inteiras. Comer alguns alimentos nos deixa felizes, comer outros nos deixa sonolentos e ainda outros nos deixam em alerta. Somos joviais, inquietos, excitados ou deprimidos, dependendo do que comemos. A sociedade encoraja tacitamente certos comportamentos que correspondem a sentimentos internos, encorajando assim o uso de substãncias que produzem comportamentos aceitáveis.

A supressão ou a expressão da sexualidade, a fertibilidade e a potência sexual, o grau de acuidade visual, a sensibilidade aos sons, a velocidade de resposta motora, a taxa de maturação e o tempo de vida são apenas algumas das características dos animais que podem ser influenciadas por plantas alimentícias com químicas exóticas. A formação simbólica do homem, sua facilidade lingüística e sensibilidade a valores comunitários também podem se alterar sob a influência de metabólitos psicoativos e fisioativos. Uma noite de observação num bar de solteiros basta como trabalho de campo para confirmar essa observação. De fato, a atividade de encontrar um parceiro sempre deu grande importância à capacidade lingüística, como atesta a atenção perene aos estilos dos bate-papos e das cantadas.

Ao pensar em drogas tendemos a nos concentrar em episódios de intoxicação, mas muitas drogas são usadas normalmente em doses de aperitivo ou de manutenção; o café e o tabaco são exemplos óbvios em nossa cultura. O resultado disso é uma espécie de “ambiência da intoxicação”. Como peixes dentro d’água, as pessoas dentro de uma cultura nadam no meio virtualmente invisível dos estados mentais culturalmente sancionados, ainda que artificiais.

As linguagens parecem invisíveis para quem as fala, e mesmo assim criam o tecido da realidade para seus usuários. O problema de confundir a linguagem com a realidade é bem conhecido no mundo cotidiano. O uso das plantas é um exemplo de uma linguagem complexa de interações químicas e sociais. Ainda assim, a maioria de nós não tem consciência dos efeitos das plantas sobre nós mesmos e sobre nossa realidade, em parte porque esquecemos que as plantas sempre mediaram o relacionamento cultural dos homens com o mundo.

Uma história de primatas

 

No Parque Nacional de Gombe Stream, na Tanzânia, primatologistas descobriram que folhas de uma determinada espécie apareciam sempre não digeridas nas fezes de chimpanzés. Eles descobriram que, a intevalos de alguns dias, os chimpanzés, em vez de comer frutas silvestres como sempre, caminhavam durante vinte minutos ou mais até um lugar onde crescia uma espécie de Aspilia. Os chimpanzés colocavam repetidamente os lábios numa folha de Aspilia e prendiam-na na boca. Pegavam uma folha, colocavam na boca, reviravam-na durante alguns instantes e em seguida engoliam-na inteira. Desse modo podiam ser comidas até trinta folhas pequenas.

O bioquímico Eloy Rodriguez, da Universidade da Califórnia em Irvine, isolou o princípio ativo da Aspilia – um óleo avermelhado agora chamado de thiarubrina-A. Neil Towers, da Universidade da Colúmbia Britânica, descobriu que esse composto pode matar bactérias comuns em concentrações de menos de uma parte por milhão. Registros de herbários estudados por Rodriguez e Towers mostraram que os povos africanos usavam folhas de Aspilia para tratar de feridas e dores de estômago. Das quatro espécies nativas da África, os povos nativos usavam apenas três, as mesmas três utilizadas pelos chimpanzés.

Rodriguez e Towers continuaram observando as interações entre chimpanzés e plantas e agora podem identificar cerca de doze plantas – uma verdadeira matéria médica – usadas entre as populações de chimpanzés.

Você é o que você come

 

A história que propomos para o surgimento do homem à luz da auto-reflexão é uma história de você-é-o-que-você-come. Grandes mudanças climáticas e uma dieta recém-ampliada, e portanto mutagênica, proporcionaram muitas oportunidades para que a seleção natural afetasse a evolução das principais características humanas. Cada contato com um novo alimento, uma nova droga, ou um condimento estava carregado de risco e consequências imprevisíveis. E isso é ainda mais verdadeiro hoje em dia, quando nossa comida contém centenas de preservativos e aditivos mal estudados.

Como exemplo de plantas com impacto potencial sobre uma população humana, considere a batata-doce do gênero Dioscorea. Em boa parte do mundo tropical as batatas-doces proporcionam uma fonte de alimento confiável e nutritiva. Não obstante, várias espécies muito próximas contêm compostos que interferem na ovulação. (Estas se tornaram a fonte de matéria-prima para as modernas pílulas anticoncepcionais.) Algo próximo do caos genético cairia sobre uma população de primatas que passasse a se alimentar dessas espécies de Dioscorea. Muitas situações assim, ainda que de magnitude menos espetacular, devem ter ocorrido enquanto os primeiros hominídeos experimentavam novos alimentos ao mesmo tempo em que expandiam seus hábitos de dieta onívora.

Comer uma planta ou um animal é um modo de invocar o seu poder, um modo de assimilar sua mágica. Na mente dos povos anteriores à escrita raramente são claras as linhas divisórias entre drogas, alimentos e condimentos. O xamã que se empanzina de pimenta para aumentar o calor interno dificilmente estará num estado menos alterado do que o entusiasta de óxido nitroso após uma longa inalação. Em nossa percepção do sabor e em nossa busca de variedade na sensação de comer, somos marcadamente diferentes até mesmo de nossos parentes primatas. Em algum ponto do caminho, nossos novos hábitos onívoros e nosso cérebro em evolução, com sua capacidade de processar dados sensórios, uniram-se na feliz idéia de que a comida pode ser uma experiência. Nasceu a gastronomia – para juntar-se à farmacologia, que certamente a precedeu, já que a manutenção da saúde através da dieta é vista entre muitos mamíferos.

A estratégia dos primeiros hominídeos era comer tudo que parecesse comestível e vomitar o que não era palatável. Plantas, insetos e pequenos animais vistos como comestíveis através desse método eram introduzidos na dieta. Uma dieta em mudança ou uma dieta onívora significa exposição a um equilíbrio químico sempre em alteração. Um organismo pode regular esse insumo químico através de processos internos, mas, em última instância, as influências mutagênicas crescerão e um número maior do que o usual de indivíduos será ofertado ao processo de seleção natural. O resultado dessa seleção natural são mudanças aceleradas na organização neural, nos estados de consciência e no comportamento. Nenhuma mudança é permanente, cada uma dá caminho a outra. Tudo flui.

Simbiose

 

À medida que influenciavam o desenvolvimento dos seres humanos e de outros animais, também as plantas eram afetadas. Essa co-evolução atrai a idéia de simbiose. “Simbiose” tem vários significados; uso o termo para falar de um relacionamento entre duas espécies conferindo benefícios mútuos a seus membros. O sucesso biológico e evolucionário de cada espécie está ligado ao – e é estimulado pelo – sucesso da outra. Esta situação é o oposto do parasitismo, ainda que feliz seja o parasita que evolui para se tornar um simbionte. Os relacionamentos simbióticos, onde cada membro precisa do outro, podem ter uma ligação genética muito forte ou podem ser mais abertos. Apesar das interações entre os homens e as plantas serem simbióticos em seu padrão de ganhos e vantagens mútuas, esses relacionamentos não são geneticamente programados. Em vez disso são vistos claramente como hábitos profundos, quando comparados com exemplos de verdadeira simbiose no mundo da natureza.

Um exemplo de um relacionamento ligado geneticamente, e portanto realmente simbiótico, envolve o pequeno peixe-palhaço, Amphiprion ocellaris, que passa a vida perto de certa espécie de anêmona -do-mar. Esse peixe é protegido dos grandes predadores pelas anêmonas, e o suprimento de comida das anêmonas é aumentado pelo peixe-palhaço, que atrai peixes maiores para a área onde as anêmonas estão se alimentando. Quando um arranjo mutuamente agradável como esse acontece por muito tempo, ele termina por eventualmente se “institucionalizar”, turvando cada vez mais a distinção genética entre os simbiontes. Em última instância, um organismo pode tornar-se parte do outro, como aconteceu com as mitocôndrias, as usinas de força das células animais, ao se juntarem com outras estruturas para formar a célula. As mitocôndrias têm um componente genético separado, cuja origem pode remontar às bactérias eucarióticas que, há centenas de milhões de anos, eram organismos independentes.

Outro exemplo instrutivo de simbiose, e que pode ter profundas implicações para nossa situação, é o relacionamento que se desenvolveu entre as formigas-cortadeiras e uma espécie de basilomiceto, um cogumelo. E. O. Wilson aborda esse relacionamento:

No fim da trilha as carregadoras descem apressadas pelo buraco do formigueiro, em meio a multidões de companheiras e ao longo de canais tortuosos que terminam perto do lençol freático cinco metros abaixo ou mais. As formigas largam pedaços de folhas no chão de uma câmara, para serem apanhados por trabalhadoras de um tamanho ligeiramente menor, que partem-nas em fragmentos de cerca de um milímetro. Dentro de minutos, formigas ainda menores assumem o trabalho, amassando e moldando os fragmentos em bolotas úmidas e cuidadosamente inserem-nas numa massa de material semelhante. Essa massa varia entre o tamanho de um punho fechado e uma cabeça humana, é cheia de canais e parece uma esponja cinza. É a horta das formigas: em sua superfície crescem fungos simbiontes que, junto com a seiva das folhas, formam o único alimento das formigas. O fungo se espalha como uma geada branca, penetrando suas hifas na pasta de folhas para digerir a celulose abundante e as proteínas que estão ali numa solução parcial.

O ciclo da horticultura prossegue. Formigas trabalhadoras ainda menores do que as descritas acima arrancam tiras soltas do fungo de lugares de crescimento denso e plantam-nas nas superfícies recém-construídas. Finalmente, as trabalhadoras menores de todas – e mais abundantes – patrulham as plantações de fungos sondando-os com suas antenas, lambendo as superfícies e arrancando os esporos e as hifas de espécies diferentes. Essas anãs da colônia conseguem andar através dos canais mais estreitos dentro das massas da horta. De tempos em tempos arrancam tufos de fungos e levam-nos para suas companheiras maiores.

Nenhum outro animal desenvolveu a capacidade de produzir cogumelos a partir de vegetação fresca. Esse evento evolucionário aconteceu apenas uma vez, há milhões de anos, em algum lugar da América do Sul. Isso deu enorme vantagem às formigas: agora elas podiam mandar trabalhadoras especializadas colher a vegetação, ao mesmo tempo em que mantinham o grosso da população em segurança nos abrigos subterrâneos. Em resultado disso, os diferentes tipos de formigas-cortadeiras juntos, o que compreende quatorze espécies do gênero Atta e vinte e três do Acromyrmex, dominam grande parte dos trópicos americanos. Elas consomem mais vegetação do que qualquer outro grupo de anim,ais, inclusive as formas mais abundantes de lagartas, gafanhotos, pássaros e mamíferos.

 

Podemos perdoar E. O. Wilson, o maior expoente na sociobiologia, por achar que apenas uma vez na história da terra um animal e um cogumelo formaram um relacionamento mutuamente benéfico. Sua descrição das formigas-cortadeiras e de seu relacionamento com a agricultura dos fungos antecipa e introduz considerações fundamentais em meu esforço de revisão do nosso complexo relacionamento com as plantas. Já que, como veremos, um subproduto do estilo de vida dos pastores nômades foi a disponibilidade cada vez maior e o uso dos fungos psicoativos. Como a atividade agrícola das formigas, os padrões de comportamento das sociedades humanas nômades serviu como um modo eficaz para a expansão do alcance de alguns cogumelos.

Uma nova visão da evolução humana

 

Os primeiros contatos entre os hominídeos e os cogumelos contendo psilocibina podem ter precedido em um milhão de anos ou mais a domesticação do gado na África. E durante esse período de um milhão de anos os cogumelos não foram somente colhidos e comidos, mas provavelmente também alcançaram o status de um culto. Mas a domesticação do gado selvagem, um grande passo na evolução cultural humana, ao trazer os homens para mais perto do gado, também permitiu um contato maior com os cogumelos, porque esses cogumelos crescem apenas nas fezes do gado. Em resultado disso, a interdependência entre os homens e o cogumelo foi aumentada e aprofundada. Foi nessa época que os rituais religiosos, a criação dos calendários e a magia natural começaram a existir.

Pouco depois dos homens encontrarem os fungos visionários das pradarias africanas, e como as formigas-cortadeiras, nós também nos tornamos a espécie dominante em nossa área, e também aprendemos como “manter o grosso de nossa população segura em refúgios subterrâneos”. Em nosso caso esses refúgios foram as cidades muradas.

Ao ponderar sobre o curso da evolução humana alguns observadores sérios questionaram o cenário apresentado pelos antropólogos físicos. A evolução dos animais superiores demora um tempo maior para acontecer, operando em períodos de tempo raramente menores do que um milhão de anos e mais comumente em dezenas de milhões de anos. Mas o surgimento dos humanos modernos a partir dos primatas superiores – com as enormes mudanças em tamanho de cérebro e comportamento – aconteceu em menos de três milhões de anos. Fisicamente, nos últimos cem mil anos mudamos aparentemente muito pouco. Mas a espantosa proliferação de culturas, instituições sociais e sistemas linguísticos aconteceu tão depressa que os modernos biólogos evolucionários praticamente não a podem explicar. A maioria nem mesmo tenta.

De fato, a ausência de um modelo teórico não é surpreendente; há muita coisa que não sabemos sobre a situação complexa dos hominídeos no período imediatamente anterior ao surgimento do homem e durante o tempo em que os modernos seres humanos começavam a entrar em cena. As evidências fósseis e biológicas indicam claramente que o homem descende de ancestrais que não são radicalmente diferentes de espécies primatas que ainda existem. E mesmo assim, o Homo sapiens pertence obviamente a uma classe separada dos outros membros da ordem.

Pensar sobre a evolução humana significa em última instância pensar sobre a evolução da consciência humana. Nesse caso, quais são as origens da mente humana ? Em suas explicações, alguns investigadores adotaram uma ênfase principalmente cultural. Eles apontam para nossas capacidades linguísticas e simbólicas especiais, nosso uso de ferramentas e nossa capacidade de guardar informações epigeneticamente – como em canções, artes plásticas, livros, computadores -, e com isso criando não somente cultura mas também história. Outros, assumindo uma abordagem um pouco mais biológica, enfatizaram nossas peculiaridades fisiológicas e neurológicas, inclusive o tamanho excepcional e a complexidade do neocórtex, grande parte do qual é dedicada a processos linguísticos complexos, ao armazenamento e à recuperação de informações, além de estar associada aos sistemas motores que controlam atividades como a fala e a escrita. Mais recentemente reconheceu-se que as interações de feedback entre influência cultural e ontogenia biológica estão envolvidas em certas estranhezas desenvolvimentais, como infância e adolescência prolongadas, o atraso da maturidade sexual e a persistência de muitas características essencialmente neonatais através da vida adulta. Infelizmente a união desses pontos de vista ainda não levou ao reconhecimento do poder dos constituintes psicoativos e fisioativos da dieta na modelação de genomas.

Há três milhões de anos, e através de uma combinação dos processos discutidos acima, existiam pelo menos três espécies claramente reconhecidas de proto-hominídeos no leste da África. Eram o Homo africanus, o Homo boisei e o Homo robustus. E também nessa época o onívoro Homo habilis, o primeiro hominídeo verdadeiro, surgira claramente a partir da uma divisão da espécie que também deu surgmento a dois homens-macacos vegetarianos.

As pradarias se expandiam devagar; os primeiros hominídeos moviam-se através de um mosaico de pradarias e florestas. Essas criaturas, com cérebros proporcionalmente apenas um pouco maiores do que os dos chimpanzés, já andavam eretas e provavelmente carregavam comida e ferramentas entre trechos de florestas que elas continuavam a procurar em busca de tubérculos e insetos. Seus braços eram proporcionalmente maiores que os nossos e possuíam mão mais forte para agarrar. A evolução para a postura ereta e a expansão inicial para um ambiente de pradarias ocorreram antes, entre nove e cinco milhões de anos atrás. Infelizmente não temos evidências fósseis dessa transição anterior.

Os hominídeos provavelmente expandiram sua dieta original de frutas e pequenos animais incluindo raízes, tubérculos e bulbos. Uma simples vara para cavar daria acesso a essa fonte de alimentos anteriormente indisponível. Os modernos babuínos das savanas subsistem principalmente de bulbos de capim durante certas estações. Os chimpanzés acrescentam quantidades substanciais de feijões à sua dieta quando se aventuram na savana. Tanto os babuínos quanto os chimpanzés caçam cooperativamente e atacam pequenos animais. Mas geralmente não usam ferramentas na caçada, e não há evidência de que os primeiros hominídeos tampouco as usassem. Entre os chimpanzés, os babuínos e os hominídeos a caçada parece ser uma atividade masculina. Os primeiros hominídeos caçavam tanto cooperativamente quanto sozinhos.

Com o Homo sapiens começou uma expansão súbita e misteriosa do tamanho do cérebro. O cérebro do Homo habilis pesava em média 770 gramas, comparada às 530 gramas dos outros hominídeos. O período seguinte de 2.250.000 anos trouxe uma evolução surpreendentemente rápida no tamanho e na complexidade do cérebro. Entre 750.000 e 1.100.000 anos atrás, um novo tipo de hominídeo, o Homo erectus, estava amplamente disseminado. O cérebro desse novo hominídeo pesava entre 900 e 1.100 gramas. Há boas evidências de que o Homo erectus usava ferramentas e possuía algum tipo de cultura rudimentar. Na Caverna de Choukoutien, na África do Sul, há evidências do uso de fogo junto a ossos queimados, sugerindo o cozimento de carne. Esses eram atributos do Homo erectus, que foi o primeiro hominídeo a deixar a África há cerca de um milhão de anos.

Teorias mais antigas sugerem que os homens modernos evoluíram do Homo erectus em diversos lugares. Porém, cada vez mais, os primatologistas evolucionários da atualidade aceitam a noção de que o moderno Homo sapiens também surgiu na África, há cerca de 100.000 anos, e fez uma segunda grande migração para povoar todo o planeta. Na Caverna Border e na Caverna da foz do Rio Klasies, na África do Sul, há evidências dos primeiros Homo sapiens modernos vivendo num ambiente misto de floresta e pradarias. Numa das muitas tentativas para compreender essa transição importantíssima, Charles J. Lumsden e Edward O. Wilson escreveram:

Os ecologistas comportamentais desenvolveram gradualmente uma teoria para explicar por que foi feito o avanço para uma postura ereta, uma teoria que responde por muitas das características biológicas específicas do homem moderno. Os primeiros homens-macacos saíram das florestas tropicais para habitats mais abertos, sazonais, onde passaram a uma existência exclusivamente terrestre. Construíram acampamentos-base e tornaram-se dependentes da divisão de trabalho, através da qual alguns indivíduos, provavelmente as fêmeas, andavam menos e dedicavam mais tempo ao cuidado dos jovens; outros, principalmente ou exclusivamente os machos, se dispersavam amplamente em busca de caça. O bipedalismo conferia grande vantagem na locomoção em espaços abertos. Também deixava livre os braços, permitindo que os homens-macacos ancestrais usassem ferramentas e carregassem animais mortos e outros alimentos de volta ao acampamento. A divisão da comida e formas relacionadas de reciprocidade seguiram-se automaticamente como processos centrais da vida social dos homens-macacos. O mesmo aconteceu com a ligação sexual íntima e de longo prazo e o aumento da sexualidade, que foram postos a serviço da criação dos jovens. Muitas das formas mais distintas de comportamento social humano são produto desse complexo adaptativo profundamente entrelaçado.

 

A um tipo avançado de hominídeo seguiu-se outro, no laboratório evolucionário da África. E, começando com o Homo erectus, representantes de cada tipo se irradiaram através da massa eurasiana nos períodos interglaciais. Durante cada glaciação, a migração para fora da África era bloqueada; novos hominídeos eram “preparados” no ambiente africano de forças intensificadas de mutação através de dietas exóticas e seleção natural climaticamente induzida.

No final desses notáveis três milhões de anos na evolução da espécie humana, o cérebro humano havia triplicado! Lumsden e Wilson chamam isso de “talvez o avanço mais rápido registrado para qualquer órgão complexo em toda a história da vida”. Uma taxa tão notável de mudança evolucionária no principal órgão de uma espécie implica a presença de pressões seletivas extraordinárias.

Como os cientistas não puderam explicar essa triplicação do tamanho do cérebro humano em período evolucionário tão pequeno, alguns dos primeiros paleontólogos estudiosos de primatas e teóricos evolucionários previram e buscaram evidências de esqueletos de transição. Hoje em dia a idéia de um “elo perdido” foi praticamente abandonada. O bipedalismo, a visão binocular, o polegar em oposição e o braço capaz de fazer lançamentos – tudo isso já foi colocado como ingrediente-chave na mistura que fez com que os humanos auto-reflexivos se cristalizassem fora do caldeirão de tipos e estratégias dos hominídeos em competição. No entanto, tudo que realmente sabemos é que a mudança no tamanho do cérebro foi acompanhada por mudanças notáveis na organização social dos hominídeos. Eles se tornaram usuários de ferramentas, de fogo e da linguagem. Iniciaram o processo como animais superiores e saíram dele, há cerca de 100.00 anos, como indivíduos conscientes e com percepção de si próprios.

O verdadeiro elo perdido

 

Meu ponto de vista é que os componentes químicos mutagênicos e psicoativos existentes na dieta dos primeiros humanos influenciou diretamente a rápida reorganização das capacidades de o cérebro processar informações. Os alcalóides contidos nas plantas, especificamente os compostos alucinógenos como a psilocibina, a dimetiltriptamina (DMT) e a harmalina podem ter sido os fatores químicos da dieta que catalisaram o surgimento da auto-reflexão humana. A ação dos alucinógenos presentes em muitas plantas comuns aumentou nossa atividade de processamento de informações e nossa sensibilidade ambiental, com isso contribuíndo para a súbita expansão do tamanho do cérebro. Como aconteceu num estágio posterior desse mesmo processo, os alucinógenos atuaram como catalisadores no desenvolvimento da imaginação, alimentando a criação de estratagemas internos e esperanças que podem ter sinergizado o surgimento da linguagem e da religião.

Em pesquisas realizadas no final dos anos 60. Roland Fisher deu pequenas quantidades de psilocibina a estudantes de pós-graduação e em seguida mediu sua capacidade de detectar o momento em que linhas anteriormente paralelas se desviavam. Ele descobriu que a capacidade de desempenhar essa tarefa específica era aumentada depois de pequenas doses de psilocibina.

Quando discuti essas descobertas com Fisher, ele sorriu, depois de explicar suas conclusões, e em seguida resumiu: “Você vê, o que se provou conclusivamente aqui é que, sob certas circunstâncias, somos mais bem-informados sobre o mundo real se tomamos uma droga do que se não tomamos.” Sua resposta jacosa ficou em minha mente, primeiro como uma anedota acadêmica, depois como um esforço de sua parte para comunicar uma coisa profunda. Quais seriam as consequências, para a teoria da evolução, de admitir que alguns hábitos químicos conferem vantagem adaptativa e, portanto, tornam-se profundamente gravados no comportamento e até mesmo no genoma de alguns indivíduos?

Três grandes passos para a raça humana

 

Ao tentar responder essa pergunta construí um cenário – algumas pessoas podem chamá-lo de fantasia; é o mundo observado de um ponto de vista para o qual os milênios são apenas estações, uma visão para a qual fui levado por anos pensando nesses temas. Imaginemos, por um instante, que estamos fora da agitação genética que é a história biológica, e que podemos ver as consequências entrelaçadas de mudanças na dieta e no clima, que certamente devem ter sido muito lentas para serem percebidas por nossos ancestrais. O cenário que se desdobra envolve os efeitos interconectados e mutuamente reforçados da psilocibina tomada em três níveis. Por ser especial em suas propriedades, creio que a psilocibina é a única substância que poderia produzir esse cenário.

No primeiro nível de uso, o mais baixo, há o efeito que Fisher observou: pequenas quantidades de psilocibina, consumida sem consciência de sua psicoatividade, e talvez mais tarde consumida conscientemente, provocam um aumento notável na acuidade visual, especialmente na detecção periférica. Como a acuidade visual é valorizada entre os caçadores-coletores, a descoberta de um equivalente de “binóculos químicos” não poderia deixar de ter um impacto sobre o sucesso da caçada e da coleta por parte dos indivíduos que dispunham dessa vantagem, Devido ao aumento de comida disponível, os descendentes desses grupos terão uma probabilidade maior de chegar à idade reprodutiva. Numa situação assim, a não-proliferação (ou o declínio) dos grupos não-usuários de psilocibina seria uma consequência natural.

Como a psilocibina é um estimulante do sistema nervoso central, quando tomado em doses ligeiramente maiores ela tende a provocar a inquietação e a excitação sexual. Assim, nesse segundo nível de uso, ao aumentar a ocorrência da copulação os cogumelos favorecem diretamente a reprodução humana. A tendência de regular e programar a atividade sexual dentro do grupo, ligando-a a um ciclo lunar de disponibilidade dos cogumelos, pode ter sido importante como um primeiro passo em direção ao ritual e à religião. Sem dúvida, no terceiro e mais alto nível de uso, as preocupações religiosas estariam no primeiro plano da consciência da tribo, simplesmente por causa do poder e da estranheza da experiência em si.

Esse terceiro nível, então, é o nível do êxtase xamânico totalmente desabrochado. A intoxicação por psilocibina é um êxtase cujo sopro e profundidade são o desespero da prosa. É totalmente Outro, e não menos misterioso para nós do que era para nosso ancestrais que mastigavam cogumelos. A capacidade de dissolução de fronteiras do êxtase xamânico predispõe os grupos tribais usuários de alucinógenos aos laços comunitários e a atividades sexuais grupais, o que promove a mistura de genes, taxas maiores de nascimento e um senso comunitário de responsabilidade pela prole do grupo.

Em qualquer dose que o cogumelo fosse usado, ele possuía a propriedade mágica de conferir vantagens adaptativas sobre os usuários arcaicos e seus grupos. O aumento da acuidade visual, a excitação sexual e o acesso ao Outro transcendente levaram ao sucesso na obtenção de comida, à capacidade e ao vigor sexual, à prole abundante e ao acesso a esferas de poder sobrenatural. Todas essas vantagens podem ser facilmente auto-reguladas através da manipulação das doses e da frequência de ingestão. O capítulo 4 detalhará a notável propriedade da psilocibina, estimulando a capacidade do cérebro de formar linguagem. Seu poder é tão extraordinário que a psilocibina pode ser considerada a catalisadora do desenvolvimento da linguagem entre os homens.

Afastando-se de Lamarck

 

Uma objeção a essas idéias surge inevitavelmente e deve ser enfrentada. Esse cenário de surgimento do homem pode ter cheiro de lamarckismo, que teoriza que as características adquiridas por um indivíduo durante seu tempo de vida podem ser passadas à sua prole. O exemplo clássico é a afirmação de que a girafa tem pescoço comprido porque o estica para alcançar ramos mais altos. Essa idéia fácil de compreender e que faz bastante sentido é um completo anátema entre os neo-darwinistas, que atualmente estão na vanguarda da teoria evolucionária. A posição deles é que as mutações são totalmente aleatórias, e que somente depois das mutações serem expressas como características dos organismos a seleção natural cumpre inconsciente e desapaixonadamente sua função de preservar os indivíduos que receberam vantagem adaptativa.

A objeção deles pode ser colocada da seguinte forma: ainda que os cogumelos possam ter-nos dado melhor visão, sexo e linguagem quando comidos, como esses desenvolvimentos entraram no genoma humano e se tornaram inatamente humanos? Os desenvolvimentos não-genéticos do funcionamento de um organismo feitos através de agentes externos retardam os reservatórios genéticos correspondentes a essas facilidades, tornando-os supérfluos. Em outras palavras, se um metabólito necessário é comum na comida disponível, não haverá pressão para desenvolver uma característica para a expressão endógena desse metabólito. Assim, o uso dos cogumelos criariam individuos com menos acuidade visual, menos facilidade de linguagem e menos consciência. A natureza não proporcionaria esses desenvolvimentos através da evolução orgânica porque o investimento metabólico necessário à sua sustentação não valeria a pena, comparado ao minúsculo investimento metabólico necessário para comer cogumelos. E mesmo assim todos temos hoje em dia esses desenvolvimentos, sem ingerir cogumelos. Então, como as modificações proporcianadas pelos cogumelos entraram no genoma?

A resposta curta a essa pergunta, uma resopsta que não exige defender as idéias de Lamarck, é que a presença da psilocibina na dieta dos hominídeos mudou os parãmetros do processo de seleção natural ao mudar os padrões comportamentais sobre os quais essa seleção vinha operando. A experimentação com muitos tipos de alimentos estava causando um aumento geral no número de mutações aleatórias oferecidas ao processo de seleção natural, ao passo que o aumento da acuidade visual, do uso de linguagem e da atividade ritual através do uso de psilocibina representavam novos comportamentos. Um desses novos comportamentos, o uso da linguagem – que era anteriormente uma característica de importância apenas marginal – subitamente tornou-se muito útil no contexto dos novos estilos de vida caçadora e coletora. Nesse caso a inclusão de psilocibina na dieta mudou os parâmetros do comportamento humano em favor dos padrões que promoviam o maior uso da linguagem; a aquisição da linguagem levou a um maior vocabulário e à expansão da capacidade de memória. Os indivíduos usuários de psilocibina desenvolveram regras epigenéticas ou formas culturais que lhes permitiram sobreviver e se reproduzir melhor do que outros indivíduos. Finalmente, os estilos epigenéticos de comportamento mais bem-sucedidos se espalharam entre as populações junto com os genes que os reforçam. Desse modo, a população evoluiria genética e culturalmente.

E quanto à acuidade visual, talvez a ampla necessidade de lentes corretivas entre os homens modernos seja um legado do longo período de aumento “artificial” da visão através do uso de psilocibina. Afinal de contas, a atrofia das capacidades olfativas dos seres humanos é vista por uma escola como o resultado da necessidade de os famintos onívoros tolerarem cheiros e gostos fortes, talvez até de carniça. Permutas desse tipo são comuns na evolução. A supressão da agudeza no olfato e no paladar permitiria a inclusão, na dieta, de alimentos que seriam deixados de lado como “fortes demais”. Ou isso pode indicar alguma coisa mais profunda em nosso relacionamento evolucionário com a dieta. Meu irmão Dennis escreveu:

A aparente atrofia do sistema olfativo humano pode representar uma mudança funcional num conjunto de receptores químicos primitivos externamente dirigidos, levando-os a uma função reguladora interna. Essa função pode estar relacionada com o controle do sistema feromonal humano que, em grande parte, está sob controle da glândula pineal, e que media, num nível subliminar, uma quantidade de interações psicossociais e psicosexuais entre os indivíduos. A pineal tende, entre outras funções, a suprimir o desenvolvimento gronadal e o surgimento da puberdade, e esse mecanismo pode representar um papel na persistência das características neonatais na espécie humana. O atraso na maturação e a infãncia e adolescência prolongadas representam um papel crítico no desenvolvimento neurológico e psicológico do indivíduo, já que proporcionam as circunstãncias que permitem o desenvolvimento pós-natal do cérebro nos primeiros anos de infância, os anos formativos. Os estímulos simbólicos, cognitivos e linguísticos que o cérebro experimenta durante esse período são essenciais para seu desenvolvimento, e são os fatores que nos tornam os seres únicos, conscientes, manipuladores de símbolos e usuários da linguagem que somos, As aminas neuroativas e os alcalóides presentes na dieta dos antigos primatas podem ter representado um papel na ativação bioquímica da glândula pineal e nas adaptações resultantes disso.

 

Gostos adquiridos

 

Os seres humanos sentem-se ao mesmo tempo atraídos e repelidos por substâncias cujo sabor esteja no limite da aceitabilidade. Comidas muito temperadas, amargas ou aromáticas provocam fortes reações em nós. Dizemos que é preciso “adquirir o gosto” por esses tipos de comida. Isso é verdade para alimentos como queijos macios ou ovos em conserva, mas também acontece, e é mais verdadeiro, com relação às drogas. Lembrar o primeiro cigarro ou a primeira dose de conhaque é lembrar-se de um organismo rejeitando violentamente a aquisição de um gosto em particular. A repetição do contato parece ser a chave para se adquirir um gosto, o que sugere que o processo é complexo e envolve adaptações comportamentais e bioquímicas.

Isso que estamos falando começa a se parecer estranhamente com o processo do vício em drogas. Uma coisa estranha ao corpo é repetidamente introduzida nele através da decisão consciente. O corpo se ajusta ao novo regime químico como sendo correto e adequado e dá sinais de alarme quando esse regime é ameaçado. Esses sinais podem ser psicológicos e fisiológicos e serão sentidos sempre que o novo ambiente químico dentro do corpo correr algum tipo de perigo, inclusive a decisão consciente de interromper o uso da substância química em questão. Dentre o vasto número de substâncias químicas que constituem o armazém molecular da natureza, temos discutido um número relativamente pequeno de componentes que interagem com os sentidos e o processo neurológico de processar dados. Esses compostos incluem todas as aminas psicoativas, os alcalóides, os fermônios e os alucinógenos – na verdade, são todos componentes que podem interagir com quaisquer dos sentidos, do paladar e do olfato até a visão e audição e combinação de todos eles. A aquisição de um gosto por esses compostos, a aquisição de um hábito reforçado comportamental e fisiologicamente, é o que defende a síndrome básica do vício químico.

Esses compostos têm a capacidade notavel de, ao mesmo tempo, lembrar-nos de nossa fragilidade e de nossa capacidade para as coisas magníficas. As drogas, como a realidade, parecem destinadas a confundir quem procura fronteiras nítidas e uma divisão fácil do mundo em termos de preto e branco. O modo como iremos enfrentar o desafio de definir nossos relacionamentos futuros com esses componentes, e com as dimensões de risco e oportunidade que eles oferecem, pode dar a palavra final sobre nosso potencial para a sobrevivência e para a evolução como espécie consciente.

Capítulo 3 – A Busca da Árvore Primal do Conhecimento

 

Os aluconógenos como o verdadeiro elo perdido

 

A noção que estamos explorando neste livro é que uma família particular de compostos químicos ativos, os alucinógenos indóis, representaram um papel decisivo no surgimento de nossa humanidade essencial, da característica humana de auto-reflexão. Por isso é importante saber exatamente o que são esses compostos e que papel eles desempenham na natureza. As características definidoras desses alucinógenos são estruturais: todos têm um grupo pentexil, de cinco lados, em associação com o anel benzeno, mais conhecido (ver Figura 28). Esses anéis moleculares tornam os indóis altamente reativos quimicamente e, portanto, moléculas ideais para a atividade metabólica no mundo de alta energia da vida orgânica.

Os alucinógenos podem ser psicoativos e/ou fisiologicamente ativos e podem ter como alvo muitos sistemas dentro do corpo. Alguns indóis são endógenos ao corpo humano – um bom exemplo é a serotonina. Muitos outros são exógenos, encontrados na natureza e nas plantas que podemos comer. Alguns se comportam como hormônios e regulam o crescimento ou a taxa de maturação sexual. Outros influenciam o humor e o estado de alerta. São quatro as famílias dos compostos indóis que são fortes alucinógenos visionários e que também ocorrem em plantas:

1. Os compostos do tipo LSD. Encontrados em três gêneros relacionados de ipoméias e fungos de cereais, os LSDs são raros na natureza. O fato de serem os alucinógenos mais conhecidos deve-se indubitavelmente a milhares de doses de LSD terem sido fabricadas e vendidas durante os anos 60. O LSD é um psicodélico, mas são necessárias doses relativamente grandes para provocar o paradis artificiel de alucinações vívidas e absolutamente transmundanas que é produzido pela DMT e pela psilocibina em doses bastante tradicionais. Não obstante, muitos pesquisadores enfatizaram a importância dos efeitos não-alucinógenos do LSD e de outros psicodélicos. Dentre esses efeitos pode-se citar um sentimento de expansão mental e aumento na velocidade do pensamento; a capacidade de compreender e de se relacionar com questões complexas de pensamento, com a estruturação da vida e com redes complexas e decisórias de ligação conectiva.

O LSD continua a ser fabricado e vendido em quantidades maiores do que qualquer outro alucinógeno. Foi visto como auxiliar na psicoterapia e no tratamento do alcoolismo crônico: “Sempre que foi experimentado, em todo o mundo, mostrou-se um interessante tratamento para uma doença muito antiga. Nenhuma outra droga até hoje pôde igualar-se a ele em salvar as vidas atormentadas dos alcoólatras inverterados – diretamente, como tratamento, ou indiretamente, como meio de produzir informações valiosas.” Mas, em consequência da histeria da mídia, pode ser que seu potencial jamais venha a ser conhecido.

2. Os alucinógenos triptamínicos, especialmente a DMT, a psilocina e a psilocibina. Os alucinógenos triptamínicos são encontrados em todas as famílias de plantas superiores – por exemplo, nos legumes – e a psilocina e a psilocibina ocorrem nos cogumelos. A DMT também ocorre endogenamente no cérebro humano. Por esse motivo, talvez não se deva pensar na DMT como uma droga, mas a intoxicação por DMT é o mais profundo e visualmente espetacular dos alucinógenos, notável por sua breviedade, intensidade e atoxidade.

3. As betacarbolinas. As betacarbolinas, como a harmina e a harmalina, podem ser alucinógenos perto do nível tóxico. São importantes para o xamanismo visionário porque podem inibir sistemas enzimáticos do corpo que, caso isso não acontecesse, despotencializariam os alucinógenos do tipo DMT. Portanto as betacarbolinas podem ser usadas em conjunção com a DMT para prolongar e intensificar as alucinações visuais. Essa combinação é a base da infusão alucinógena ayahuasca ou yagé, usada na Amazônia. As betacarbolinas são drogas legais, e até muito recentemente eram virtualmente desconhecidas do público geral.

4. A família de substâncias ibogana. Essas substâncias ocorrem em dois gêneros aparentados de árvores africanas e sul-americanas, a Tabernanthe e a Tabernamntana. A Tabernathe iboga é um pequeno arbusto de flores amarelas aparentado com o café e tem uma história de utilização como alucinógeno na África ocidental tropical. Seus componentes ativos têm uma relação estrutural com as betacarbolinas. A ibogana é mais conhecida como poderoso afrodisíaco do que como alucinógeno. Não obstante, em doses suficientes ela é capaz de induzir uma podrosa experiência visionária e emocional.

Esses poucos parágrafos numerados podem conter as informações mais importantes e excitantes, relativas ao mundo vegetal, que os seres humanos coletaram desde o esquecido nascimento da ciência. Mais precioso do que as notícias sobre o antineutrino, mais cheio de esperança para a humanidade do que a detecção de novos quasares é o conhecimento de que certas plantas, certos compostos, destrancam portas esquecidas levando a mundos de experiência imediata que confundem nossa ciência e, de fato, nos confundem. Adequadamente entendida e aplicada, essa informação pode se tornar uma bússola que nos guie de volta ao jardim perdido de nossas origens.

Em busca da árvore do conhecimento

 

Na tentativa de compreender quais alucinógenos indóis e quais plantas podem ter tido implicação causal no surgimento da consciência, vários pontos importantes devem ser observados:

A planta que estamos procurando deve ser africana, já que há enormes evidências de que o gênero humano surgiu na África. Mais especificamente, a planta africana deveria ser nativa das pradarias, já que foi aí que os nosso ancestrais recém-onívoros aprenderam a se adaptar, a coordenar seu bipedalismo e a refinar os métodos de sinalização existentes.

A planta não deve exigir qualquer preparação; deve ser ativa em seu estado natural. Supor algo diferente é forçar a credulidade – misturas, drogas compostas, extratos e concentrações pertencem a estágios posteriores de cultura, quando a consciência humana e o uso da linguagem já estavam bem estabelecidos.

A planta deve estar continuamente disponível para uma população nômade, facilmente perceptível e em grande quantidade.

A planta deve conferir benefícios imediatos e tangíveis para os indivíduos que a estão comendo . Somente assim ela se estabeleceria e se manteria como parte da dieta dos hominídeos.

Essas exigências reduzem dramaticamente o número de concorrentes. A África tem poucas plantas alucinógenas. Essa escassez e a contrastante superabundância desse tipo de planta nos trópicos do Novo Mundo nunca foram satisfatoriamente explicadas. Será mera coincidência que, quanto maior o tempo pelo qual um ambiente foi exposto aos seres humanos, menor o número de alucinógenos nativos e menor o número de espécies de plantas em que eles ocorrem naturalmente? A África atual praticamente não tem plantas nativas que sejam bons candidatos para a catálise da consciência entre os hominídeos em evolução.

As pradarias têm muito menos espécies vegetais do que as florestas. Devido a essa escacez, é muito provável que um hominídeo testasse qualquer planta que encontrasse nas pradarias em busca de seu potencial alimentício. O eminente geógrafo Carl Saur achava que não existem pradarias naturais. Ele sugeriu que todas as pradarias eram artefatos humanos, resultantes do impacto cumulativo das queimadas sazonais. Baseou esse argumento no fato de que todas as espécies das pradarias podem ser encontradas na base das florestas que as margeiam, ao passo que uma grande percentagem das espécies encontradas nas florestas estão ausentes nas pradarias. Saur concluiu que as pradarias são tão recentes que podem ser vistas como concomitantes às populações humanas usuárias de fogo.

Eliminando os candidatos

 

Hoje em dia, apenas a religião do Bwiti, dos fang do Gabão e do Zaire, pode ser chamada de um verdadeiro culto africano baseado numa planta alucinógena. É concebível que a planta utilizada, a Tabernanthe iboga, possa ter tido alguma influência sobre os povos pré-históricos do século XIX. Em nenhuma época, por exemplo, ela foi mencionada pelos portugueses, que tiveram uma longa história de comércio e exploração na África Ocidental. Essa falta de evidências é difícil de se explicar, caso se acredite que o uso da planta seja muito antigo.

Analisando sociologicamente, o Bwiti é uma força não somente de coesão grupal como de manutenção de casamentos. Historicamente, o divórcio é uma fonte crônica de ansiedade grupal entre os fang. Isso deve-se ao fato de que o divórcio é facilmente obtido, mas logo depois ele deve ser acompanhado de negociações complicadas, longas e potencialmente caras com a famíla do cônjuge, relativas à devolução de parte do dote. Talvez a iboga, além de ser um alucinógeno, ative um feromônio que promova a união do casal. Sua reputação como afrodisíaco poderia estar parcialmente relacionada a essa promoção do laço entre o casal.

A planta em si é um arbusto de tamanho médio, não é nativa das pradarias, e sim das florestas tropicais. Raramente é encontrada fora da área de cultivo.

Como resultado dos contatos dos europeus com a África tropical, a iboga tornou-se o primeiro indol a entrar em voga na Europa. Tônicos baseados no extrato da planta tornaram-se extremamente populares na França e na Bélgica depois da iboga ser apresentada ao público na Exposição de 1867 em Paris. Esse extrato simples era vendido na Europa com o nome de Lambarene, como cura para tudo, da neurastenia à sífilis e, acima de tudo, um afrodisíaco.

Somente em 1901 o alcalóide foi isolado. A onda inicial de pesquisas que se seguiu parecia promissora. Antecipou-se ansiosamente a cura para a impotência masculina. No entanto, a ibogaína, depois de caracterizada quimicamente, foi logo esquecida. Ainda que não surgisse qualquer evidência de que fosse perigoso ou viciante, o composto foi colocado, nos Estados Unidos, na Lista I, a categoria mais restritiva e controlada, tornando extremamente improváveis outras pesquisas. Até hoje a ibogaína continua praticamente sem ser estudada nos seres humanos.

O que sabemos sobre o culto da iboga aprendemos com o trabalho de campo dos antropólogos. Raspas das raízes da planta são tomadas em quantidades prodigosas. Os fang acreditam que esse hábito foi adquirido durante uma migração que durou séculos, na qual eles estiveram algum tempo próximos ao povo pigmeu, que lhes ensinou o poder espiritual contido no Bwiti. A casca da raiz da Thabernathe iboga contém a parte psicoativa da planta. De acordo com os fang, devem ser comidos muitos gramas desse material da raiz para “abrir a cabeça”. A partir daí, quantidades menores tornam-se eficazes pelo resto da vida da pessoa.

Apesar do culto da iboga ser muito interessante, não creio que essa planta tenha sido o catalisador da consciência nos humanos em evolução. Como já foi mencionado antes, não foi demonstrada uma longa história de sua utilização, e ela não é uma planta de pradarias. Além disso, em pequenas doses ela diminui a visão comum ao facilitar a persistência de imagens, halos e “listras” visuais.

Não é conhecido o uso de qualquer planta contendo LSD na África. Tampouco existe qualquer exemplo marcante de plantas ricas nesses compostos.

A Peganum Harmala, a gigantesca arruda da Síria, é rica na harmina betacarbolina e atualmente ocorre em estado selvagem em todas as partes áridas da África do Norte junto ao Mediterrâneo. Mas não há qualquer registro de seu uso na África como alucinógeno, e , de qualquer modo, ela deve ser concentrada e/ou combinada com DMT para ativar seu potencial visionário.

A planta de UR

 

Então ficamos, por um processo de eliminação, com os alucinógenos do tipo triptamina – a psilocibina, a psilocina e a DMT. Num ambiente de pradarias pode-se esperar que esses compostos ocorram num cogumelo coprófilo (que nasce sobre esterco) contendo psilocibina ou numa erva contendo DMT. Mas, a não ser que a DMT fosse extraída e concentrada, algo além do alcance técnico dos primeiros seres humanos, essas ervas jamais poderiam suprir quantidades suficientes de DMT para proporcionar um alucinógeno eficaz. Por um processo de eliminação, somos levados a suspeitar de um cogumelo que pudesse estar envolvido no processo.

Quando nossos ancestrais remotos afastaram-se das árvores e passaram a ocupar as pradarias, cada vez mais encontraram gado selvagem que comia vegetação. Esses animais tornaram-se uma grande fonte de sustento potencial. Nossos ancestrais também encontraram o esterco desse gado selvagem e os cogumelos que cresciam sobre ele.

Vários desses cogumelos das pradarias contêm psilocibina: os da espécie Panaeolus e o Stropharia cubensis, também chamado de Psilocybe cubensis (ver a Figura 1). Este último é o conhecido “cogumelo mágico”, atualmente cultivado por entusiastas em todo o mundo.

Dessas espécies de cogumelo, apenas o Stropharia cubensis contém psilocibina em quantidades concentradas e está livre de compostos que produzam náusea. Só ele é pandêmico – ocorre em todas as regiões tropicais, pelo menos em todos os lugares onde exista gado do tipo zebu (Bos indicus). Isso levanta várias questões. Será que o Stropharia cubensis ocorre exclusivamente no esterco de zebu ou pode ocorrer também o esterco de outro tipo de gado? Há quanto tempo ele chegou aos seus vários habitats? O primeiro espécime de Psilocybe cubensis foi coletado pelo botânico americano Earle em Cuba, em 1906, mas o atual pensamento botânico coloca o ponto de origem da espécie no sudeste da Ásia. Numa escavação arqueológica na Tailândia, num local chamado Non Nak Thadatado em quinze mil anos – , foram encontrados ossos de gado zebu junto com túmulos humanos. Atualmente o Stropharia cubensis é comum na área de Non Nak Tha. O sítio de Non Nak Tha sugere que o uso dos cogumelos foi uma característica que surgiu sempre que populações de homens e gado evoluíram juntos.

Amplas evidências apóiam a noção de que o Stropharia cubensis é a superplanta ou o umbigo da mente feminina do planeta, que, quando seu culto estava intacto – o culto paleolítico da Grande Deusa de Chifres – , transmitia o conhecimento de que somos capazes de viver num equilíbrio dinâmico com a natureza, com os outros e com nós mesmos. O uso de cogumelos alucinógenos evoluiu como uma espécie de hábito natural com consequências comportamentais e evolucionárias. Esse relacionamento entre seres humanos e cogumelos teria de incluir também o gado, os criadores da única fonte dos cogumelos.

Esse relacionamento provavelmente não tem mais de um milhão de anos, já que data dessa época a era dos caçadores nômades. Os últimos cem mil anos são provavelmente uma quantidade de tempo mais do que generosa para permitir a evolução do pastoralismo a partr de seu primeiro vislumbre. Como todo o relacionamento não passa de um milhão de anos, não estamos discutindo uma simbiose biológica que pode levar muitos milhões de anos para se desenvolver. Em vez disso falamos de um costume profundamente arraigado, um hábito cultural extremamente poderoso.

Independentemente de como a chamamos, a interação dos homens com o cogumelo Stropharia cubensis não foi um relacionamento estático,e sim dinâmico, através do qual fomos levados, por méritos próprios, a níveis culturais cada vez mais altos e a níveis de autoconsciência individual. Acredito que o uso dos cogumelos alucinógenos nas pradarias da África nos deu o modelo para o surgimento de todas as religiões. E quando, após longos séculos de lento esquecimento, de migrações e mudanças climáticas, o conhecimento do mistério finalmente se perdeu, em nossa angústia trocamos a parceria pelo domínio, a harmonia com a natureza pelo estupro da natureza, a poesia pelo sofisma da ciência. Resumindo, trocamos nosso direito inato de parceiros no drama da mente viva do planeta pelos cacos da história, pela guerra, pela neurose e – se não acordarmos rapidamente para a nossa situação difícil – pela catástrofe planetária.

O que são os alucinógenos vegetais?

 

À luz da sua importância, conforme sugeri, para a evolução humana, é natural investigar o que os mutagenes e outros subprodutos secundários estão fazendo pelas plantas em que eles ocorrem. Esse é um mistério botânico que permanece controvertido entre os biólogos evolucionários da atualidade. Foi sugerido que os compostos tóxicos e bioativos são produzidos nas plantas para torná-las não-palatáveis e portanto indesejáveis como alimento. Também sugeriu-se, por outro lado, que esses compostos foram desenvolvidos para atrair insetos ou pássaros que polinizam ou distribuem sementes.

Uma explicação mais provável para a presença de compostos secundários baseia-se no reconhecimento de que, na verdade, eles não são secundários ou periféricos. A evidência disso é que os alcalóides, geralmente vistos como secundários, são formados na maior quantidade em tecidos que são mais ativos no metabolismo geral. Os alcalóides, inclusive todos os alucinógenos mencionados aqui, não são produtos inertes nas plantas onde ocorrem, mas estão num estado dinâmico, flutuando em concentração e na taxa de declínio metabólico. O papel desses alcalóides na química do metabolismo deixa claro que eles são essenciais à vida e à estratégia de sobrevivência do organismo, mas agem de maneiras que ainda não compreendemos.

Uma possibilidade é que alguns desses compostos possam ser exoferomônios. Os exoferomônios são mensageiros químicos que não atuam entre os membros de uma única espécie, mas sim entre as espécies, de modo que um indivíduo influencia membros de uma espécie diferente. Alguns exoferomônios agem de modo a permitir que um pequeno grupo de indivíduos afete uma comunidade ou todo um nicho biológico.

A noção de natureza como um todo organísmico e planetario que medeia e controla seu próprio desenvolvimento através da liberação de mensagens químicas pode ser um tanto radical. Nossa herança do século XIX é que a natureza não passa de “dentes e garras”, onde uma ordem natural impiedosa e irracional promove a sobrevivência dos que são capazes de garantir sua própria existência continuada à custa dos concorrentes. Concorrentes, nessa teoria, significa todo o resto da natureza. Entretanto, a maioria dos biólogos evolucionários há muito considera incompleta essa visão darwinista clássica da natureza. Hoje em dia há uma compreensão geral de que a natureza, longe de ser uma guerra infinita entre as espécies, é uma infinita dança de diplomacia. E a diplomacia é em grande parte questão de linguagem.

A natureza parece maximizar a cooperação mútua e a coordenação mútua de objetivos. Ser indispensável aos organismos com os quais compartilhamos um ambiente é a estratégia que garante a reprodução bem-sucedida e a sobrevivência contínua. É uma estratégia onde a comunicação e a sensibilidade ao processamento de sinais são de importância vital. Essas são habilidades de linguagem.

Só agora começa a ser estudada com atenção a idéia de que a natureza pode ser um organismo cujos componentes interconectados agem uns sobre os outros e se comunicam mutuamente através da liberação de sinais químicos no ambiente. Mas a natureza tende a agir com uma certa economia; uma vez desenvolvida, uma determinada resposta evolucionária a um problema será aplicada repetidamente em situações onde seja adequada.

O Outro Transcendente

 

Se os alucinógenos funcionam como mensageiros químicos entre espécies, então a dinâmica da relação íntima entre primata e planta alucinógena é uma dinâmica de transferência de informações entre uma espécie e outra. Onde não existem alucinógenos vegetais, essas transferncias de informação acontecem muito mais devagar, mas na presença dos alucinógenos uma cultura é rapidamente apresentada a informações cada vez mais novas, a dados sensórios e a comportamentos, e assim é elevada a estágios cada vez mais altos de auto-reflexão. Chamo isso de contato com o Outro Transcendente, mas este é apenas um rótulo, e não uma explicação.

De certo ponto de vista, o Outro Transcendente é a natureza percebida como coisa viva e inteligente. De outro, ele é a união espantosamente estranha de todos os sentidos com a memória do passado e a antecipação do futuro. O Outro Trascendente é o que encontramos nos alucinógenos poderosos. É o ponto crucial do Mistério de existirmos, tanto como espécie quanto como indivíduos. O Outro Transcendente é a Natureza sem sua máscara alegremente confortadora de espaço comum, tempo comum e causalidade comum.

Claro que não é fácil imaginar esses elevados estágios de auto-reflexão. Porque quando procuramos fazer isso estamos agindo como se esperássemos que a linguagem, de algum modo, abarcasse algo que, no presente, está além da linguagem, algo translinguístico. A psilocibina, o alucinógenos que só ocorre nos cogumelos, é um instrumento eficaz nessa situação. O principal efeito sinergístico da psilocibina parece estar, em última instância, no âmbito da linguagem. Ela exercita a verbalização; dá força à articulação; transmuta a linguagem em algo visível. Ela poderia ter provocado um impacto sobre o aparecimento súbito da consciência e da linguagem usada pelos primeiros homens. Nós podemos, literalmente, ter comido o caminho para a consciência mais elevada. Nesse contexto é importante observar que os mais poderoso mutagenes que existem no ambiente natural ocorrem nos bolores e nos fungos. Os cogumelos e os grãos de cereal infectados por bolores podem ter tido grande influência sobre as espécies animais, inclusive os primatas, evoluindo nas pastagens

O Alimento dos Deuses – Terence Mckenna (pt 2)

Trechos do primeiro capítulo: Xamanismo: Arrumando o Palco

Um mundo feito de linguagem

As evidências reunidas em milênios de experiência xamânica dizem que, de certo modo, o mundo é na verdade feito de linguagem. Ainda que contrariando as expectativas da ciência moderna, essa proposição radical concorda com boa parte do atual pensamento linguístico. “A revolução linguística do século XX”, segundo a antropóloga Misia Landau, da Boston University, “é o reconhecimento de que a linguagem não é apenas um instrumento para a comunicação de idéias sobre o novo mundo, mas, em primeiro lugar, uma ferramenta para dar vida ao mundo. A realidade não é simplesmente “experimentada” ou “refletida” na linguagem; em vez disso é, de fato, produzida pela linguagem.”

Segundo o ponto de vista do xamã psicodélico, o mundo parece existir mais na natureza de uma expressão vocal ou de uma narrativa do que relacionado de qualquer modo aos léptons e bárions ou carga e spin dos quais falam nossos sumos sacerdotes, os físicos. Para o xamã, o cosmo é uma narrativa que se torna real enquanto é contada e enquanto conta a si própria. Essa perspectiva implica que a imaginação humana pode controlar o leme de estar no mundo. A libertdade, a responsabilidade pessoal e uma consciência humilde do verdadeiro tamanho e da inteligência do mundo combinam-se neste ponto de vista para torná-lo uma base adequada a uma verdadeira vida neo-arcaica. Uma reverência pelos poderes da linguagem e da comunicação e uma imersão neles são as bases do caminho xamânico.

É por isso que o xamã é o ancestral remoto do poeta e do artista. Nossa necessidade de fazer parte do mundo parece exigir que nos expressemos através da atividade criativa. As fontes definitivas dessa criatividade estão ocultas no mistério da linguagem. O êxtase xamânico é um ato de rendição que autentica o Eu individual e aquilo a que ele se rende, o mistério do ser. Como nossos mapas da realidade são determinados pelas circunstâncias atuais, tendemos a perder a consciência dos padrões mais amplos de tempo e espaço. Somente através do acesso ao Outro Transcendente podem ser vislumbrados esses padrões de tempo e espaço e nosso papel dentro deles. O xamanismo procura esse ponto de vista mais alto, que é alcançado através de um feito de perícia linguística. Um xamã é alguém que conseguiu uma visão dos princípios e dos fins de todas as coisas, e que consegue comunicar essa visão. Para o pensador racional isso é inconcebível, mas as técnicas do xamanismo são dirigidas para esse objetivo, e essa é a fonte do seu poder. Dentre as técnicas do xamã, a mais importante é o uso de alucinógenos vegetais, repositórios da gnose vegetal vive que se encontra – agora praticamente esquecida – em nosso passado.

Uma realidade dimensional mais elevada

Ao entrar no domínio da inteligência vegetal o xamã ganha, de certo modo, acesso privilegiado a uma perspectiva dimensional mais elevada sobre a experiência. O bom senso presume que, apesar da linguagem estar sempre evoluindo, a matéria-prima daquilo que a linguagem expressa é relativamente constante e comum a todos os seres humanos. Além disso, também sabemos que a língua hopi não tem tempos ou conceitos de passado ou futuro. Como, então, o mundo hopi pode ser igual ao nosso? E os inuítes não tem o pronome pessoal da primeira pessoa. Como, então, o mundo deles pode ser igual ao nosso?

As gramáticas das línguas – suas regras internas – têm sido cuidadosamente estudadas. Ainda assim, muito pouca atenção foi dedicada a examinar o modo como a linguagem cria e define os limites da realidade. Talvez a linguagem seja mais adequadamente compreendida quando pensadas em termos de magia, já que a postura básica da magia é de que o mundo é feito de linguagem.

Se a linguagem é aceita como primeiro elemento do conhecimento, então nós, do ocidente, fomos tristemente enganados. Somente as abordagens xamânicas poderão nos dar as respostas que achamos mais interessantes: quem somos, de onde viemos e para que destino estamos nos dirigindo? Essas perguntas nunca foram mais importantes do que hoje em dia, quando as evidências do fracasso da ciência em nutrir a alma da humanidade estão ao nosso redor. O nosso tédio não é somente um tédio temporal do espírito; se não tivermos cuidado, nossa condição será uma condição temporal do corpo e do espírito coletivos.

O preconceito racional, mecanicista e antiespiritual de nossa cultura tornou impossível apreciarmos a estrutura mental do xamã. Somos cultural e linguisticamente cegos ao mundo das forças e interconexões que permanecem claramente visíveis aos que mantiveram o relacionamento arcaico com a natureza.

É claro que quando cheguei à Amazônia, vinte anos atrás, não sabia de nada disso. Como a maioria dos ocidentais, acreditava que a magia era um fenômeno dos ingênuos e primitivos, que a ciência poderia dar uma explicação para o funcionamento do mundo. Nessa posição de ingenuidade intelectual, encontrei pela primeira vez cogumelos contendo psilocibina em San Augustine, no alto Magdalena, ao sul da Colômbia. Mais tarde, e não muito distante dali, em Florencia, também encontrei e usei infusões visionárias feitas com cipós banisteriopsis, o yagé ou ayahuasca das lendas underground dos anos 60.

As experiências que tive durante essas viagens foram pessoalmente transformadoras e, mais importante, me apresentaram a uma classe de experiências vitais para a restauração do equilíbrio entre nossos mundos social e ambiental.

Compartilhei da mente grupal gerada nas sessões de visões dos ayahuasqueros. Vi os dardos mágicos de luz vermelha que um xamã pode mandar contra outro. Porém, mais reveladores do que os feitos paranormais dos magos e dos curandeiros espirituais foram as riquezas interiores que descobri em minha mente no auge dessas experiências. Ofereço meu relato como uma espécie de testemunho, um Homem Comum; se essas experiências aconteceram comigo, elas podem fazer parte da experiência geral dos homens e das mulheres em todo o mundo.

Um memento xamânico

Minha educação xamânica não foi especial. Milhares de pessoas de um modo ou de outro, concluíram que as plantas psicodélicas e as instituições xamânicas implicadas por seu uso são instrumentos profundos para a exploração das profundezas internas da psique humana. Agora os xamãs psicodélicos constituem uma subcultura mundial e crescente de exploradores hiperdimensionais, muitos dos quais são cientificamente sofisticados. Uma paisagem começa a entrar em foco, uma região ainda pouco vislumbrada, mas que vem surgindo, chamando a atenção do discurso racional – e possivelmente ameaçando confundi-lo. Anida podemos nos lembrar de como devemos nos comportar, de como assumir o lugar correto no padrão de conexão, na teia contínua de todas as coisas.

A compreensão de como alcançar esse equilíbrio depende das culturas esquecidas e maltratadas que vivem nas florestas úmidas e nos desertos do Terceiro Mundo e nas reservas para onde as culturas dominadoras forçam os povos aborígenes. A gnose xamânica pode estar morrendo; certamente está mudando. Mas os alucinógenos vegetais que são sua origem, origem da mais antiga religião humana, continuam como uma fonte que jorra, refrescante como sempre. O xamanismo é vital e real devido ao encontro do indivíduo com o desafio e o espanto, o êxtase e a exaltação induzidos pelas plantas alucinógenas.

Meus contatos com o xamanismo e os alucinógenos na Amazônia me convenceram de sua importância salvadora. Depois de me convencer, decidi filtrar as várias formas de ruído linguístico, cultural, farmacológico e pessoal que obscureciam o Mistério. Tive a esperança de destilar a essência do xamanismo, de descobrir o esconderijo da Epifania. Quis ver além dos véus de sua dança sinuosa. Como um voyeur cósmico, sonhei confrontar a beleza nua.

Um cínico do tipo dominador poderia se contentar em rejeitar isso como ilusão da juventude romântica. Ironicamente, já fui este cínico. Sentia a loucura da busca. Sabia das dificuldades. “O Outro? A beleza platônica nua? Você deve estar brincando!”

E devo admitir que houve muitas desventuras loucas pelo caminho. “Devemos nos tornar os loucos de Deus”, falou uma vez um entusiasmado amigo zen, querendo dizer: “Vai fundo.” Buscar e encontrar era um método que funcionara para mim no passado. Eu sabia que na Amazônia ainda sobreviviam práticas xamânicas baseadas no uso de plantas alucinógenas e estava determinado a confirmar minha intuição de que por trás desse fato havia um grande segredo não descoberto.

A realidade superou a apreensão. O rosto manchado da velha leprosa ficou ainda mais horroroso quando as chamas da fogueira saltaram subitamente no momento em que ela colocou mais lenha. Na semi-escuridão por trás da mulher pude ver o guia que me trouxera a esse lugar sem nome no rio Cumala. Antes, no bar da cidade junto ao rio, este encontro casual com o barqueiro disposto a me levar para ver a milagrosa feiticeira do ayahuasca, lendária do local, pareceu uma grande ocasião para uma história. Agora, após três dias de viagem pelo rio e de meio dia lutando por trilhas tão enlameadas a ponto de ameaçar arrancar as botas a cada passo, eu não tinha tanta certeza.

Neste ponto, o objetivo original de minha busca – o autêntico ayahuasca da floresta, que diziam ser muito diferente da lavagem oferecida pelos charlatães do mercado – praticamente não tinha mais interesse para mim.

– Tomé, caballero! – cacarejou a velha enquanto me passava um copo cheio do líquido negro e espesso. Sua superfície tinha o brilho de óleo de motor.

Ela deve ter crescido representando esse papel, pensei enquanto bebia. O líquido era quente e salgado, áspero e agridoce. Tinha o gosto do sangue de uma coisa velha, muito velha. Tentei não pensar no quanto estava à mercê daquelas pessoas estranhas. Mas na verdade minha coragem estava fraquejando. Os olhos zombeteiros de Doña Catalina e do guia tinham ficado frios e parecidos com olhos de louva-deus. Uma onda de sons de insetos passando rio acima pareceu respingar a escuridão com cacos de luz amolada. Senti os lábios ficando dormentes.

Tentando não parecer tão pesado quanto estava, fui até minha rede e deitei de costas. Por trás de meus olhos fechados havia um rio de luz magenta. Ocorreu-me, numa espécie de pirueta mental, que devia haver um helicóptero pousando sobre a cabana, e esta foi a minha impressão.

Quando recuperei a consciência, parecia estar surfando no tubo de uma onda de informações transparentes e iluminadas, com dezenas de metros de altura. A empolgação deu lugar ao terror quando percebi que minha onda acelerava em direção a um litoral rochoso. Tudo desapareceu no caos trovejante de onda informacional indo de encontro à terra virtual. Mais tempo perdido e em seguida a impressão de ser um marinheiro naufragado, lançado a uma praia tropical. Sentia que estava apertando o rosto contra a areia quente. Tenho sorte de estar vivo! Ou será que estou vivo para ter sorte? Comecei a rir.

Nesse ponto a velha começou a cantar. Não uma canção comum, e sim um icaro, uma canção mágica de cura, que em nosso estado intoxicado e extático mais parece um peixe de recife tropical ou uma encharpe de seda com muitas cores do que um desempenho vocal. A canção é uma manifestação visível de poder, envolvendo-nos e deixando-nos seguros.

O xamanismo e mundo arcaico perdido

O xamanismo foi maravilhosamente definido por Mircea Eliade como “as técnicas arcaicas do êxtase”. O uso que Eliade faz do termo “arcaico” é importante aqui porque nos alerta para o papel que o xamanismo deve representar em qualquer renascimento autêntico das formas arcaicas vitais de ser, viver e compreender. O xamã consegue entrar num mundo que está oculto para quem vive na realidade comum. Nesta outra dimensão se escondem tanto poderes úteis como malévolos. Suas regras não são as regras de nosso mundo; parecem mais as regras que atuam nos mitos e nos sonhos.

Os curandeiros xamânicos insistem na existência de um Outro inteligente em alguma dimensão próxima. A existência de uma ecologia de almas ou uma inteligência não encarnada não é uma coisa com a qual a ciência possa se atracar e em seguida imergir com suas premissas intactas. Particularmente se esse Outro tem feito parte da cultura terrestre há muito tempo, presente porém invisível, compartilhando um segredo global.

Os textos de Carlos Castaneda e de seus imitadores resultaram numa coqueluche de “consciência xamânica” que, mesmo confusa, transformou o xamã de uma figura periférica na literatura da antropologia cultural, no modelo colocado pela mídia para a entrada na sociedade neo-arcaica. A despeito da atração que o xamanismo provoca sobre a imaginação popular, os fenômenos paranormais que ele presume serem reais e verdadeiros nunca foram levados a sério pela ciência moderna, ainda que os cientistas, num caso raro de deferência, tenham chamado psicólogos e entropólogos para analisar o xamanismo. Essa cegueira em relação ao mundo paranormal criou um ponto cego intelectual em nossa visão normal de mundo. Somos completamente inconscientes do mundo mágico do xamã. Ele é simplesmente mais estranho do que podemos supor.

Considere um xamã que use plantas para conversar com um mundo invisível habitado por inteligências não-humanas. Pareceria perfeito para manchete de um tablóide sensacionalista. Entretanto, os antropólogos registram essas coisas o tempo todo e ninguém ergue uma sobrancelha. Isso porque tendemos a presumir que o xamã interpreta sua experiência da intoxicação como comunicação com espíritos ou ancestrais. A implicação é que você ou eu interpretaríamos essa mesma experiência de modo diferente, e que portanto não é de se espantar que um campesino pobre e desinformado ache que estava falando com um anjo.

Por mais xenofóbica que seja essa atitude, ela sugere um bom procedimento operacional, já que o que se diz é: “Mostre as técnicas de seu êxtase e julgarei por mim mesmo a sua eficácia.” Eu fiz isso. Essa é a minha credencial para as teorias e opiniões que ofereço. A princípio fiquei aterrorizado pelo que descobri: o mundo do xamanismo, dos aliados, dos alteradores de forma e do ataque mágico é muito mais real do que as construções da ciência jamais poderão ser, porque esses espíritos ancestrais e seu mundo podem ser vistos e sentidos, podem ser conhecidos, na realidade não-habitual.

Uma coisa profunda, inesperada, quase inimaginável nos espera se levarmos nossas atenções investigativas para o fenômeno dos alucinógenos vegetais xamânicos. Os povos que estão fora da história ocidental, que continuam na época do sonho da pré-escrita, mantiveram acesa a chama de um mistério tremendo. Seria humildade admitir isso e aprender com eles, mas tudo isso faz parte do renascimento arcaico.

Daí não se deve deduzir que devemos ficar de queixo caído diante das realizações dos “primitivos” numa outra versão da Dança do Selvagem Nobre. Todo mundo que já fez trabalho de campo sabe dos choques frequentes entre nossas explicações sobre como o “verdadeiro povo das florestas úmidas” deve se comportar e as realidades da vida tribal cotidiana. Ninguém compreende ainda a misteriosa inteligência que há nas plantas ou as implicações da idéia de que a natureza se comunica numa linguagem química básica, inconsciente porém profunda. Ainda não compreendemos como os alucinógenos transformam a mensagem inconsciente em revelações contempladas pela mente consciente. Enquanto afiavam suas intuições e seus sentidos, usando as plantas que estivessem à mão para aumentar sua vantagem adaptativa, os povos arcaicos tinham pouco tempo para a filosofia. Até hoje ainda não se manifestaram totalmente as implicações da existência dessa mente descoberta pelos povos xamânicos dentro da natureza.

Enquanto isso, silenciosamente e fora da história, o xamanismo prosseguia seu diálogo com o mundo invisível. O legado do xamanismo pode atuar como uma força estabilizadora destinada a redirecionar nossa consciência para o destino coletivo da biosfera. A fé xamânica é de que a humanidade tem aliados. Existem forças favoráveis à nossa luta para nascermos como espécie inteligente. Mas são forças silenciosas e tímidas; devem ser procuradas não na chegada de frotas alienígenas no céu da terra, e sim aqui perto, na solidão dos locais ermos, junto às cachoeiras; e, sim, nas pastagens agora tão raras sob nossos pés.

O Alimento dos Deuses – Terence Mckenna (pt 1)

Pretendo estar postando uma seqüência de alguns trechos que estou digitalizando do livro “O Alimento dos Deuses” do Terence McKenna, lançado em 1992. Considero um livro extremamente importante para qualquer um que se interesse pelos assuntos ligados a enteógenos, drogas e evolução humana. É uma verdadeira obra de arte. Vou começar pela própria Introdução do livro.

 

Introdução: Manifesto para um novo pensamento sobre drogas

Há um espectro assombrando a cultura planetária: o espectro das drogas. A definição de dignidade humana, criada pela Renascença e elaborada nos valores democráticos da moderna civilização ocidental, parece a ponto de se dissolver. A grande mídia nos informa a todo volume que a capacidade humana para o comportamento obsessivo e o vício realizou um casamento satânico com a farmacologia moderna, com o marketing, com o transporte a grandes velocidades. Formas anteriormente obscuras de utilização de substâncias químicas agora competem livremente num mercado global bastante desregulamentado. Governos e nações do terceiro Mundo são mantidos escravos de entidades legais e ilegais que promovem o comportamento obsessivo.

Esta situação não é nova, mas está ficando cada vez pior. Até recentemente os cartéis internacionais das drogas eram criações obedientes de governos e serviços secretos que buscavam fontes de dinheiro “invisível” com o qual financiar seu próprio tipo de comportamento obsessivo institucionalizado. Atualmente esses cartéis das drogas evoluíram, através do crescimento sem precedentes da demanda por cocaína, transformando-se em elefantes desgarrados diante de cujos poderes até mesmo seus criadores se sentem inquietos.

Somos assediados pelo triste espetáculo das “guerras das drogas” promovidas por instituições governamentais que geralmente são paralisadas pela letargia e ineficiência ou estão em evidente conluio com os cartéis internacionais das drogas – que essas instituições prometem publicamente destruir.

Nenhuma luz poderá ser lançada sobre essa situação de uso e abuso pandêmico das drogas se não fizermos uma dura reavaliação de nossa situação atual e um exame de alguns padrões antigos, praticamente esquecidos, de experiência e comportamento relacionados às drogas. A importância dessa tarefa não pode ser subestimada. Sem a menor dúvida a auto-administração de substâncias psicoativas, tanto legais quanto ilegais, cada vez mais fará parte do desdobramento futuro de uma cultura global.

Uma reavaliação dolorosa

Qualquer reavaliação do uso que fazemos das substâncias deve começar com a noção do hábito, “uma tendência ou prática estabelecida”. Familiares, repetitivos e geralmente não examinados, os hábitos são simplesmente as coisas que fazemos. Segundo um velho ditado, “as pessoas são criaturas de hábito”. A cultura é em grande parte questão de hábito, aprendido com os pais e as pessoas ao nosso redor, e depois lentamente modificados pelas mudanças nas condições e por inovações inspiradas.

Mas, por mais lentas que sejam essas modificações culturais, a cultura apresenta um espetáculo de novidade violenta e contínua quando comparada com a modificação lentíssima das espécies e dos ecossistemas. Se a natureza representa um princípio de economia, a cultura certamente deve exemplificar o princípio de inovação através do excesso.

Quando os hábitos nos consomem, quando nossa devoção a eles excede as normas culturalmente definidas, nós os chamamos de obsessões. Nesses casos sentimos que a dimensão unicamente humana do livre-arbítrio foi violada de algum modo. Podemos ficar obcecados com quase tudo: com um padrão de comportamento como o de ler jornal matutino ou com objetivos materiais (o colecionador), com terras e propriedades (o construtor de impérios) ou com o poder sobre outras pessoas (o político).

Enquanto muitos de nós podem ser colecionadores, poucos têm a oportunidade de se entregar às obsessões a ponto de se tornarem construtores de impérios ou políticos. A obsessões das pessoas comuns tendem a se concentrar no aqui e agora, no âmbito da gratificação imediata através do sexo, da comida e das drogas. Uma obsessão com os constituintes dos alimentos e das drogas (também chamados de metabólitos) é rotulada de vício.

Os vícios e as obsessões são exclusivos dos seres humanos. Sim, existem amplas evidências relatadas sobre as preferências por estados intoxicados entre elefantes, chimpanzés e algumas borboletas. Mas, assim como acontece quando comparamos as capacidades lingüísticas de chimpanzés e golfinhos com a fala humana, vemos que os comportamentos desses animais são enormemente diferentes dos comportamentos humanos.

Hábito. Obsessão. Vício. Essas palavras são marcos de sinalização em um caminho de livre arbítrio decrescente. A negação do poder do livre-arbítrio está implícita na noção de vício, e em nossa cultura os vícios são levados à sério – especialmente os vícios exóticos ou não-familiares. No século XIX o vício do ópio era o “demônio de ópio”, uma descrição que trazia de volta a idéia de uma possessão demoníaca levada a cabo por uma força externa. No século XX a idéia do viciado como uma pessoa possuída foi trocada pela noção do vício como doença. E com a noção do vício como doença o papel do livre-arbítrio finalmente é reduzido até desaparecer. Afinal de contas, não somos responsáveis pelas doenças que podemos herdar ou desenvolver.

Mas hoje em da a dependência humana às substâncias químicas representa um papel mais consciente na formação e manutenção dos valores culturais do que em qualquer época anterior.

Desde meados do século XIX, e com velocidade e eficiência cada vez maiores, a química orgânica vem colocando nas mãos de pesquisadores, médicos e – em última instância – qualquer pessoa uma cornucópia infinita de drogas sintéticas. Essas drogas são mais poderosas, mais eficazes, de maior duração e, em alguns casos, muitas vezes mais viciantes do que seus parentes naturais. (Uma exceção é a cocaína, que, apesar de natural, quando refinada, concentrada e injetada torna-se particularmente destrutiva)

O surgimento de uma cultura global levou à ubiqüidade de informações sobre as plantas recreacionais, afrodisíacas, estimulantes, sedativas e psicodélicas que foram descobertas por seres humanos inquisitivos vivendo em partes remotas e anteriormente desconhecidas do planeta. Ao mesmo tempo em que esta torrente de informações botânicas e etnográficas chegava à sociedade ocidental, enxertando hábitos de outras culturas dentro da nossa e proporcionando-nos mais escolhas do que nunca, foram dados grandes passos na síntese de moléculas orgânicas complexas e na compreensão da mecânica molecular dos genes e da hereditariedade. Essas novas idéias e tecnologias estão contribuindo para um conhecimento muito diferente sobre a engenharia psicofarmacológica. Drogas projetadas em laboratório como o MDMA, o u Ecstasy, e os esteróides anabólicos usados por atletas e adolescentes para estimular o desenvolvimento dos músculos são arautos de uma era de intervenção farmacológica cada vez mais freqüente e eficaz sobre a nossa aparência, nosso desempenho e nosso sentimentos.

A idéia de regulamentar num nível planetário primeiro centenas, e depois milhares de substâncias sintéticas facilmente produzidas, intensamente procuradas, porém ilegais, é estarrecedora para qualquer pessoa que tenha esperança de um futuro mais aberto e menos regimentado.

Um renascimento arcaico

Este livro irá explorar a possibilidade de um renascimento do arcaico – ou da atitude pré-industrial e pré-alfabetizada com relação à comunidade, ao uso de substâncias e à natureza; uma atitude que serviu bem e por muito tempo aos nossos ancestrais nômades pré-históricos, antes do surgimento do estilo de cultura que chamamos de “ocidental”. O termo arcaico refere-se ao paleolítico superior, um período entre sete e dez mil anos atrás, precedendo à intervenção e à disseminação da agricultura. O arcaico foi um tempo de pastoreio nômade e de igualitarismo, de uma cultura baseada na criação de gado, no xamanismo e no culto à Deusa.

Organizei a discussão numa ordem mais ou menos cronológica, com as últimas seções, mais orientadas para o futuro, retomando e revendo os temas arcaicos dos primeiros capítulos. A argumentação segue de acordo com as linhas de progresso de uma peregrinação farmacológica. Assim chamei as quatro sessões do livro de “Paraíso”, “Paraíso Perdido”, “Inferno” e, espero que sem ser exageradamente otimista, “Paraíso Reconquistado”. Um glossário de termos especiais é dado no final do livro.

Obviamente, não podemos continuar pensando como antigamente sobre o uso de drogas. Sendo uma sociedade global, devemos encontrar uma nova imagem orientadora para nossa cultura, uma imagem que unifique as aspirações da humanidade com as necessidades do planeta e do indivíduo. Uma análise da imperfeição existencial que nos leva a formar relacionamentos de dependência e vício com plantas e drogas mostrará que, no início da história, perdemos alguma coisa preciosa, cuja ausência nos tornou doentes de narcisismo. Somente uma recuperação do relacionamento que des

envolvemos com a natureza através do uso de plantas psicoativas antes da queda na história pode nos oferecer a esperança de um futuro humano e aberto.

Antes de nos comprometermos irrevogavelmente com a quimera de uma cultura livre de drogas, comparada ao preço de um abandono completo dos ideais de uma sociedade planetária livre e democrática, devemos nos fazer perguntas duras: por que, como espécie, somos tão fascinados por estados alterados de consciência? Qual tem sido o impacto deles sobre nossas aspirações estéticas e espirituais? O que perdemos ao negar a legitimidade do impulso de cada indivíduo para o uso de substâncias visando experimentar pessoalmente o transcedental e o sagrado? Minha esperança é de que a resposta a essas perguntas vai nos forçar a enfrentar as conseqüências de negar a dimensão espiritual da natureza, de ver a natureza como nada mais que um “recurso” a ser dominado e esgotado. A discussão bem-informada sobre esses temas não dará conforto a quem é obcecado pelo controle, não dará conforto ao fundamentalismo religioso ignorante, a qualquer forma de fascismo.

A pergunta de como, enquanto sociedade e indivíduos, nos relacionamos com as plantas psicoativas no final do século XX, levanta uma questão mais ampla: como, com o passar do tempo, fomos moldados pelas alianças mutáveis que formamos e rompemos com vários membros do mundo vegetal enquanto caminhávamos pelo labirinto da história? Esta é uma questão que irá nos ocupar detalhadamente nos próximos capítulos.

O grande mito de nossa cultura se inicia no Jardim do Éden, quando foi comido o fruto da Árvore do Conhecimento. Se não aprendermos com o passado, essa história pode terminar com um planeta intoxicado, suas florestas sendo apenas uma lembrança, sua coesão biológica despedaçada, nosso legado um deserto de ervas daninhas. Se deixamos de perceber alguma coisa em nossas tentativas anteriores de compreender nossas origens e nosso lugar na natureza, será que agora estamos em condições de olhar para trás e compreender não somente o passado, mas também o futuro, de um modo inteiramente novo? Se pudermos recuperar o sentimento perdido da natureza como um mistério vivo poderemos ter confiança em novas perspectivas na aventura cultural que certamente nos espera adiante. Temos a oportunidade de nos afastar do triste niilismo histórico que caracteriza o reino de nossa cultura profundamente patriarcal e dominadora. Estamos em posição de recuperar a avaliação arcaica de nossa relação praticamente simbiótica com as plantas psicoativas como uma fonte de idéias e coordenação fluindo do mundo vegetal para o mundo humano.

O mistério de nossa consciência e de nosso poderes de auto-reflexão está de algum modo ligado a este canal de comunicação com a mente invisível que os xamãs afirmam ser o mundo vivo da natureza. Para os xamãs e as culturas xamânicas a exploração desse mistério sempre foi uma alternativa crível à vida numa cultura materialista confinadora. Nós, que pertencemos às democracias industriais, podemos escolher explorar agora essas dimensões estranhas ou podemos esperar até que a destruição cada vez maior do planeta vivo torne irrelevante qualquer outra exploração.

Um novo manifesto

Portanto chegou o tempo, no grande discurso natural que é a história das idéias, de repensar totalmente nosso fascínio pelo uso habitual das plantas psicoativas e fisioativas. Temos de aprender com os excessos do passado, especialmente da década de 1960, mas não podemos simplesmente advogar o “Diga não”, do mesmo modo que não podemos advogar o “Experimente, você vai gostar”. Nem podemos apoiar uma visão que deseje dividir a sociedade entre usuários e não-usuários. Precisamos de uma abordagem ampla a essas questões, uma abordagem que envolva as implicações evolucionárias e históricas mais profundas.

A influência da dieta em induzir mutações nos primeiros humanos e o efeito de metabólitos exóticos na evolução de sua neuroquímica e sua cultura ainda é um território não estudado. A adoção de uma dieta onívora por parte dos primeiros hominídeos e a descoberta do poder de certas plantas foram fatores decisivos para afastá-los da corrente da evolução animal, levando-os para a maré acelerada da linguagem e da cultura. Nossos ancestrais remotos descobriram que certas plantas, quando auto-administradas, suprimem o apetite, diminuem a dor, proporcionam jorros de energia súbita, conferem imunidade contra patogenes e sinergizam atividades cognitivas. Essas descobertas levaram-nos à longa jornada para a auto-reflexão. Assim que nos tornamos onívoros usuários de ferramentas, a própria evolução de um processo de modificação vagarosa para uma rápida definição de formas culturais através da elaboração de rituais, linguagens, escrita, capacidades mnemônicas e tecnologia.

Essas mudanças imensas ocorreram em grande parte como resultado das sinergias entre os seres humanos e as várias plantas com as quais eles interagiram e co-evoluíram. Uma avaliação honesta do impacto das plantas sobre as bases das instituições humanas descobriria que elas são absolutamente fundamentais. No futuro, a aplicação de soluções estáveis botanicamente inspiradas, como o crescimento zero de população, a extração do hidrogênio da água do mar e os programas maciços de reciclagem podem ajudar a reorganizar nossas sociedades e nosso planeta em termos mais holísticos, conscientes do meio ambiente, neo-arcaicos.

A supressão do natural fascínio humano com relação aos estados alterados de consciência e a atual situação de perigo por que passa toda a vida na terra estão íntima e causalmente conectadas. Quando suprimos o acesso ao êxtase xamânico represamos as águas refrescantes da emoção que flui de um relacionamento profundamente ligado, quase simbiótico, com a terra. Em conseqüência disso se desenvolvem e se mantêm os estilos sociais mal-adaptados que encorajam a superpopulação, o mau uso dos recursos e a intoxicação ambiental. Nenhuma cultura na terra é tão profundamente narcotizada, em termos de se acostumar às conseqüências do comportamento mal-adaptado, quanto o ocidente industrializado. Buscamos uma atitude tranqüila numa atmosfera surreal de crise cada vez maior e contradições irreconciliáveis.

Como espécie, precisamos reconhecer a profundidade de nosso dilema histórico. Continuaremos a jogar com um baralho pela metade enquanto continuarmos a tolerar os cardeais do governo e da ciência que pretendem ditar onde a curiosidade humana pode se concentrar e onde não pode. Essas restrições à imaginação humana são aviltantes e absurdas. O governo não somente restringe a pesquisa sobre substâncias psicodélicas que poderiam talvez produzir valiosas idéias psicológicas e médicas; ele pretende impedir também seu uso religioso e espiritual. O uso religioso das plantas psicodélicas é uma questão de direitos civis; sua restrição é a repressão de uma legítima sensibilidade religiosa. De fato, não é uma sensibilidade religiosa que está sendo reprimida, mas a sensibilidade religiosa, uma experiência da religio baseada no relacionamento entre plantas e seres humanos que existe desde muito antes do advento da história.

Não mais podemos adiar uma reavaliação honesta dos verdadeiros custos e benefícios do uso habitual das plantas e das drogas versus os verdadeiros custos e benefícios da supressão de seu uso. Nossa cultura global corre o risco de sucumbir a um esforço orwelliano de acabar com o problema através do terrorismo militar e policial contra os consumidores de drogas em nossa população e os produtores de drogas no Terceiro Mundo. Essa resposta repressiva é alimentada em grande parte por um medo não examinado que é produto de desinformação e ignorância histórica.

Preconceitos culturais profundamente arraigados explicam porque a mente ocidental torna-se subitamente ansiosa e repressiva com relação às drogas. As mudanças de consciência induzidas por substâncias revelam dramaticamente que nossa vida mental tem fundamentos físicos. Assim, as drogas psicoativas desafiam a suposição cristã da da inviolabilidade e do status ontológico especial da alma. De modo semelhante, elas desafiam a idéia moderna do ego, de sua inviolabilidade e de suas estruturas de controle. Resumindo, os contatos com as plantas psicodélicas questionam toda a visão de mundo da cultura dominadora.

Abordaremos frequentemente esse tema do ego e da cultura dominadora nesse reexame da história. De fato, o terror que o ego sente ao contemplar a dissolução de fronteiras entre o Eu e o mundo não está somente por trás da supressão dos estados alterados da consciência, mas, de modo mais geral, explica a supressão do feminino, do estrangeiro e exótico e das experiências transcedentais. Nos tempos pré-históricos, porém pós-arcaicos, de cerca de 5000 a 3000 a.C., a supressão da sociedade igualitária pelos invasores patriarcais arrumaram o cenário para a supressão da investigação experimental e aberta da natureza, feita pelos xamãs. Em sociedades altamente organizadas essa tradição arcaica foi substituída por uma tradição do dogma, da politicagem clerical, das guerras e, finalmente, dos valores “racionais e científicos” ou dominadores.

Até aqui usei sem explicação os termos “igualitários” e “dominadores” para falar de estilos de cultura. Devo essas expressões úteis a Riane Eisler e sua importante revisão da história no livro The Chalice and the Blade. Eisler desenvolveu a noção de que os modelos de sociedade “igualitária” precederam e mais tarde competiram e foram oprimidos pelas formas de organização social “dominadora”. As culturas dominadoras são hierárquicas,, paternalistas, materialistas e de domínio masculino. Eisler acredita que a tensão entre as organizações igualitárias e dominadoras e a superexpressão do modelo dominador são responsáveis pelo nosso afastamento da natureza, de nós mesmos e ins dos outros.

Eisler escreveu uma brilhante síntese do surgimento da cultura no antigo Oriente Próximo e do desdobramento do debate político relativo à feminização da cultura e à necessidade de superar padrões de domínio masculino para a criação para a criação de um futuro viável. Sua análise política dos sexos eleva o nível do debate para além dos que saudaram estridentemente um ou outro “matriarcado” ou “patriarcado” antigo. The Chalice and the Blade introduz a noção de “sociedades igualitárias” e “sociedades dominadoras” e usa os registros arqueológicos para argumentar que, sobre vastas áreas e durante muitos séculos, as sociedades igualitárias do Oriente Médio antigo não tinham guerras nem levantes. A guerra e o patriarcado chegaram com o aparecimento de valores dominadores.

A herança dominadora

Nossa cultura, auto-intoxicada pelos subprodutos venenosos da tecnologia e pela ideologia egocêntrica, é a infeliz herdeira da atitude dominadora que diz que a alteração da consciência através do uso de plantas ou de substâncias é errada, onanística e perversamente anti-social. Irei argumentar que a supressão da gnose xamânica, com sua confiança e insistência na dissolução extática do ego, roubou-nos o significado da vida e tornou-nos inimigos do planeta, de nós mesmos e de nossos netos. Estamos matando o planeta para manter intactas as suposições equivocadas do estilo cultural dominador do ego.

É tempo de mudança.

Comunicação programada durande experiências com DMT

Psychedelic Review No. 8, 1966

por Timothy Leary

Timothy Leary


Durante os primeiros dois anos do Harvard Psychedelic Research Project (Projeto de Pesquisa Psicodélica de Harvard) circularam rumores sobre um “poderoso” agente psicodélico chamado dimetiltriptamina: ou DMT. O efeito dessa substância deveria durar menos que uma hora e produzir efeitos estilhaçantes e aterrorizadores. Dizia-se que era a bomba atômica da família psicodélica.

O farmacologista húngaro Stephen Szara foi quem primeiro reportou, em 1957, que as substâncias N,N-Dimetiltriptamina (DMT) e N,N-Dietiltriptamina (DET) produziam efeitos no homem similares ao LSD e mescalina. A única diferença era na duração: enquanto LSD e mescalina tipicamente duravam de 8 a 10 horas, o DMT durava de 40 minutos a uma hora, e o DET de duas a três horas. Também foi relatado que os homólogos dipropiltriptamina e dibutiltriptamina eram ativos, mas menos potentes. A substância-mãe, triptamina, por si só não tem efeito. Quimicamente, o DMT está intimamente relacionado com a psilocibina e a psilocina (4-hidroxi-N-dimetiltriptamina), assim como à bufotenina (5-hidroxi-N-dimetiltriptamina). O mecanismo de ação do DMT e componentes relacionados ainda é um mistério científico. Como LSD e psilocibina, o DMT tem a propriedade de aumentar o modificação metabólica da serotonina no corpo. Uma enzima capaz de converter triptamina natural do corpo em DMT foi recentemente descoberta em alguns tecidos de mamíferos. Isso sugere que pode haver mecanismos para o corpo converter substâncias internas naturais em componentes psicodélicos. (1,2,3,4,5).

O DMT foi identificado como um dos componentes da semente Mimosa hostilis, de onde os índios Pancaru do Pernambuco, Brasil, preparam uma bebida alucinógena que eles chamam de Vinho da Jurema. Também é, junto com a bufotenina, um dos componentes das sementes da Piptadenia peregrina, de onde os índios do Orinoco Basin e Trinidad preparam um pó alucinógeno que eles chamam de yopo (6).

William Burroughs experimentou a substância em Londres e relatou-a nos termos mais negativos. Burroughs estava trabalhando na época em uma teoria da geografia neurológica — algumas áreas corticais seriam celestiais; outras, diabólicas. Como exploradores chegando a um novo continente, seria importante mapear as áreas amistosas e as hostis. Na cartografia farmacológica de Burroughs, o DMT lançava o viajante em um território estranho e decididamente não amigável.

Burroughs contou uma história interessante sobre um psiquiatra em Londres que experimentou DMT com um amigo. Após alguns minutos, o assustado amigo começou a pedir ajuda. O psiquiatra, ele mesmo já rodopiando em um universo de pigmentos móveis e vibratórios, alcançou sua agulha hipodérmica (que já tinha se fragmentado em um composto trêmulo de mosaicos ondulares) e se inclinou para aplicar o antídoto. Para seu desgosto, seu amigo — se contorcendo de pânico — foi subitamente transformado em um réptil serpenteante, encrustado de jóias e faiscante. O dilema do doutor: onde aplicar uma injeção intravenal em uma cobra marciana-oriental se debatendo?

Alan Watts tinha uma história de DMT a contar. Ele experimentou a droga como parte de uma pesquisa na Califórnia e tinha planejado provar que poderia manter controle racional e fluência verbal durante a experiência. O equivalente mais próximo disso seria tentar uma descrição momento-a-momento das reações de alguém que foi atirado de um canhão atômico de neon bizantino. O Dr. Watts deu uma descrição assombrada sobre fusão perceptiva.

No outono de 1962, durante uma série de três dias de palestras na Southern California Society of Clinical Psychologists, me encontrei em uma discussão com um psiquiatra que estava coletando dados sobre o DMT. Ele havia ministrado a droga para mais de 100 cobaias e apenas 4 tiveram experiências prazeirosas. Isso era um desafio para a hipótese de “ambiente-condição” (set-setting). Conforme nossas evidências — e alinhado com nossa teoria — encontramos poucas diferenças entre drogas psicodélicas. Estávamos ceticamente convencidos que as elaboradas variações clínicas alegadamente encontradas em reações a diferentes drogas eram puro folclore psicodélico. Estávamos firmes em nossa hipótese de que drogas não têm efeitos específicos na consciência, com exceção daqueles da expectativa, preparação, clima emocional e relações com o “fornecedor” da droga — fatores responsáveis por todos os diferentes tipos de reação.

Estávamos ansiosos para ver se a lendária “droga do terror”, o DMT, se enquadraria na teoria do “ambiente-condição”.

Uma sessão foi arranjada. Fui para a casa do pesquisador, acompanhado de um psicólogo, um monge Vedanta e duas amigas. Após uma longa e amigável discussão com o médico, o psicólogo deitou em um sofá. A cabeça de sua amiga repousava em seu peito. Me sentei na extremidade do sofá, sorrindo reconfortantemente. Uma dose intramuscular de 60 mg de DMT foi aplicada.

Em dois minutos, o rosto do psicólogo já estava brilhando de alegria serena. Pelos próximos 25 minutos ele respirou profundamente e murmurou de prazer, mantendo um relato divertido e de êxtase sobre suas visões.

“Os rostos na sala se tornaram mosaicos de bilhões de faces em tons ricos e vibrantes. As características faciais de cada um dos observadores em volta da cama eram a chave para suas heranças genéticas. Dr. X (o psiquiatra) era um índio americano bronzeado com pintura cerimonial completa no corpo; o monge hindu era um profundo e espiritual habitante do oriente médio com olhos que, de uma só vez, refletiam perspicácia animal e a tristeza de séculos; Leary era um irlandês malandro, um capitão com pele encouraçada e rugas nos cantos de olhos, que já haviam olhado longa e duramente o inescrutável, um comandante aventureiro ansioso por mapear novas águas, explorar o próximo continente, exsudando a confiança que vem com a bem-humorada consciência cósmica de sua missão — genética e imediata. Próximo a mim, ou melhor, sobre mim, ou melhor, dentro de mim, ou melhor, além de mim: Billy. A pele dela estava vibrando em uma harmonia com a minha. Cada estalar de músculo, o exato curso do sangue em suas veias… era um assunto de intimidade absoluta… Mensagens do corpo de uma suavidade e sutileza tanto estranhamente eróticas quanto deliciosamente familiares. Profundamente dentro, um ponto de calor em minha virilha lentamente — mas poderosa e inevitavelmente — irradiou por todo meu corpo até que cada célula se tornou um sol emanando seu próprio fogo originador da vida. Meu corpo era um campo de energia, um conjunto de vibrações com cada célula pulsando em fase com todas as outras. E Billy, cujas células agora dançavam a mesma dança, não era mais um entidade discreta, mas uma parte ressonante do conjunto único de vibrações. A energia era amor”.

Exatamente 25 minutos após a administração, o psicólogo sorriu, suspirou, sentou jogando as pernas no lado do sofá e disse: “Durou por um milhão de anos e uma fração de segundo. Mas acabou e agora é a sua vez”.

Com esse precedente assegurador, tomei posição no sofá. Margaret sentou no chão segurando minha mão. O psicólogo sentou ao pé do sofá, irradiando benevolência. A droga foi administrada.

Minha primeira experiência com DMT

“Minha experiência com DMT ocorreu na mais favorável condição. Tínhamos acabado de presenciar a experiência extática de meu colega e a radiância de sua reação forneceu uma estrutura otimista e segura. Minhas expectativas eram extremamente positivas.”

“Cinco minutos após a injeção, deitado confortavelmente na cama, senti os sintomas típicos da aproximação psicodélica — uma soltura somática prazeirosa, um afinamento sensitivo a sensações físicas.”

“Olhos fechados… visões típicas de LSD, a beleza rara do maquinário retinal e físico, transcendência da atividade mental, desapego sereno. Consciência reconfortante da mão de Margaret e a presença de amigos.”

“De repente, abri meus olhos e sentei… a sala era celestial, brilhando com iluminação radiante… luz, luz, luz… as pessoas presentes estavam transfiguradas… criaturas que pareciam deuses… estávamos todos unidos em um organismo. Abaixo da superfície radiante pude ver o delicado e fantástico maquinário de cada pessoa, a rede de músculos, veias e ossos — excelentemente lindo e unido, tudo parte do mesmo processo.”

“Nosso grupo estava comungando uma experiência paradisíaca — cada um no seu turno estava recebendo a chave da eternidade — agora era a minha vez, eu estava experimentando esse êxtase pelo grupo. Mais tarde, outros iriam embarcar. Éramos membros de uma coletividade transcendente.”

“O Dr. X me auxiliou delicadamente… me deu um espelho onde vi meu rosto como um retrato em vidro manchado.”

“O rosto de Margaret era como o de todas as mulheres — esperta, bela, eterna. Seus olhos eram completamente femininos. Ela murmurou exatamente a mensagem certa: ‘Pode ser sempre desse jeito’.”

“A incrível unidade complexa do processo evolutivo — incrível, infinita em sua variedade — por quê? Para onde está indo? etc… etc. As velhas perguntas e então a gargalhada de aceitação divertida, extática. Demais! Muito! Esqueça! Não pode ser deduzida. Ame-a em gratidão e aceite! Iria me inclinar para buscar significado na face tingida e chinesa de Margaret, mas caí de volta no travesseiro em reverência. Gargalhada estupefata.”

“Gradualmente, a iluminação brilhante foi recuando para o mundo tridimensional e me sentei. Renascido. Renovado. Radiante com afeição e reverência.”

“Essa experiência me levou ao ponto mais alto da iluminação com um enteógeno — um satori -pedra-preciosa. Foi menos interno e mais visual e social que minhas experiências usuais com LSD. Não houve um segundo de medo ou emoção negativa. Só alguns momentos de paranóia benigna (agente do grupo divino etc).”

“Fui deixado com a convição de que o DMT oferece muito potencial como um gatilho transcendental. A brevidade da reação tem muitas vantagens — fornece segurança com a certeza de que acabará em meia hora e pode possibilitar a exploração precisa de áreas transcendentais específicas.”

Ambiente-condição na experiência programada

Imediatamente depois de minha primeira viagem com DMT, a droga foi administrada ao monge hindu. Esse dedicado homem esteve 14 anos em meditação e renúncia. Era um sannyasin, ordenado para vestir o manto sagrado laranja. Ele havia participado de diversas sessões com drogas psicodélicas, com resultados extremamente positivos, e estava convencido de que a estrada bioquímica para o samadhi era não apenas válida mas talvez o método mais natural para pessoas vivendo em uma civilização tecnológica.

Sua reação ao DMT foi, contudo, confusa e desconfortável. Catapultado na súbita perda do ego, ele lutou para racionalizar sua experiência em termos de técnicas hindús clássicas. Se manteve olhando indefeso e perdido para o grupo. Prontamente, em 25 minutos ele se sentou, riu e disse: “Que viagem foi essa?! Realmente terminei preso em alucinações cármicas!”.

A lição era clara. O DMT, como outras chaves psicodélicas, podia abrir uma infinidade de possibilidades. Mas ambiente, condição, sugestionabilidade e estrutura da personalidade estavam sempre lá como filtros, através dos quais a experiência extática podia ser distorcida.

Na volta a Cambridge, arranjos foram feitos com uma empresa farmacêutica e com nosso consultor médico para conduzirmos uma pesquisa sistemática com a nova substância. Durante os próximos meses fizemos mais de 100 sessões — no início, exercícios de treino para pesquisadores experientes e, depois, testes com pessoas completamente inexperientes em assuntos psicodélicos.

A porcentagem de sessões de sucesso, extáticas, foi alta — acima de 90%. A hipótese ambiente-condição claramente contou a favor do DMT, em relação a experiências positivas. Mas havia certas características definidas da experiência que eram notavelmente diferentes de psicodélicos clássicos — LSD, psilocibina e mescalina. Primeiro de tudo, a duração. A transformação de 8 horas do LSD foi reduzida para 30 minutos. A intensidade também era maior. Isso significa que o estilhaçamento da percepção “aprendida” das formas, o colapso da estrutura adquirida, era muito mais pronunciado. “Olhos fechados” produziam uma suave, silenciosa, na velocidade da luz, dança redemoinhante de formas celulares incríveis — acre sobre acre, milha sobre milha de formas orgânicas em giro suave. Uma volta de foguete convolutiva, acrobática e suave através da fábrica de tecidos. A variedade e irrealidade dos precisos, fantásticos e delicados mecanismos da maquinaria orgânica. Muitos que experimentam LSD reportam odisséias sem fim através da rede de túneis circulatórios. Não com DMT. No lugar disso, uma volta na nuvem sub-celular em um mundo de beleza móvel e ordenada que desafia a busca por metáforas.

“Olhos abertos” produziam um colapso similar da estrutura adquirida — mas desta vez dos objetos externos. Rostos e coisas não mais tinham forma, mas eram vistos como um fluxo tremeluzente de vibrações (que é que elas são). A percepção de estruturas sólidas era vista como uma função de redes visuais, mosaicos, teias de energia luminosa.

A transcendência do ego-espaço-tempo foi o relato mais frequente. As pessoas frequentemente reclamavam que se tornavam tão perdidas no amoroso fluxo de existências infinitas que a experiência terminava muito rápido, e era tão suave que faltavam pontos de referência para tornar as memórias mais detalhadas. As costumeiras referências de percepção e memória estavam faltando! Não podia haver memória da sequência de visões porque não havia tempo — e nenhuma memória de estrutura porque o espaço foi convertido em um processo fluído.

Para lidar com esse problema, instituímos sessões programadas. Seria solicitado que a pessoa respondesse a cada dois minutos, ou ela seria apresentada a um estímulo para resposta a cada dois minutos. Os pontos de referência seriam, assim, fornecidos pelo pesquisador — a sequência temporal poderia ser quebrada em estágios e o fluxo de visões seria dividido em tópicos.

Como exemplo de uma sessão programada usando DMT, vamos considerar o relatório que se segue. O plano para essa sessão envolveu a “máquina de escrever experimental”. Esse dispositivo, descrito em uma artigo anterior (7), é projetado para permitir comunicação não-verbal durante sessões psicodélicas. Há dois teclados com dez botões para cada mão. As 20 teclas são conectadadas com um polígrafo de 20 canetas que registra uma marca em um rolo de papel em movimento cada vez que uma tecla é pressionada.

A pessoa precisa aprender os códigos de classificação da experiência antes da sessão e é treinada para responder automaticamente, indicando a área de sua consciência.

Nesse estudo foi combinado que eu seria questionado a cada dois minutos, para indicar o conteúdo de minha consciência.

A sessão aconteceu em uma sala especial, de 8 por 20, completamente coberta: teto, paredes e piso, por telas indianas alegres e coloridas. A sessão seguiu o modelo de “revezamento de guia”: outro pesquisador, uma psicofarmacologista, iria agir como interrogador para minha sessão. O farmacologista então repetiria a sessão, com Leary como interrogador.

Às 20h10, recebi 60 mg de DMT

Deitado no travesseiro, arrumando almofadas… relaxado e aguardando… de certa forma entretido por nossa tentativa de impor referências ao conteúdo temporal no fluxo do processo… ruído, suor, zunindo… olhos fechados… de repente, como se alguém tivesse apertado um botão, a escuridão estática da retina é iluminada… fábrica gigante de relógios preciosos de brinquedo, a fábrica de Papai Noel… não impessoal ou arquitetada, mas alegre, cômica, leve. A dança evolucionária, zunindo de energia, bilhões de formas derivadas girando, estalando através de seus turnos determinados no suave balé…

2º MINUTO. TIM: ONDE ESTÁ VOCÊ AGORA? A voz de Ralph, declarativa, gentil… o quê? onde? você? olhos abertos… ali espalhados perto de mim estão dois insetos magníficos… pele polida, com metal brilhante, com jóias incrustadas… ricamente adornados, eles olham para mim docemente… queridos grilos venusianos radiantes… um tem um bloco em seu colo e está segurando uma caixa encrustada de jóias com brilhantes seções ondulantes trapezóides… olhar interrogativo… incrível… e perto dele o Sr. Grilo Diamante entra suavemente em vibrações… o Dr. Grilo Rubi-Esmeralda sorri… TIM ONDE ESTÁ VOCÊ AGORA?… move a caixa na minha direção… ah sim… tente dizer a eles… onde…

DMT TRIP-5

Aos dois minutos, o paciente está sorrindo de olhos fechados. Ao ser questionado ele abriu os olhos, olhou para os observadores curiosamente, sorriu. Quando a pergunta sobre orientação foi repetida ele deu de ombros, moveu seu dedo procurando a máquina de escrever e (com um olhar de tolerância entretida) golpeou a tecla de “atividade cognitiva”. Ele então caiu de volta com um suspiro e fechou seus olhos.

Use a mente… explique… olhe para baixo nas caixas ondulantes… lutando para focar… use a mente… sim COGNITIVA… ali…

Olhos fechados… de volta ao workshop dançante… alegria… beleza incrível… a maravilha, maravilha, maravilha… obrigado… obrigado pela chance de ver a dança… tudo se encaixa junto… tudo se adequa ao padrão úmido, pulsante… um gigantesco penhasco acinzentado-branco, se movendo, cravado de pequenas cavernas e, em cada caverna, uma tira de antena de radar, insetos-elfos alegremente trabalhando, cada caverna a mesma, a parede cinza-branca infinitamente adornada por… infinitude de formas de vida… redes de energia alegres e eróticas…

4º MINUTO. TEMPO, ONDE ESTÁ VOCÊ AGORA? Rodando pela tapeçaria do espaço, vem um voz lá de baixo… voz terrestre bondosa e querida… base na Terra chamando… onde está você?… que piada… como responder… estou no tubo de ensaio borbulhante do alquimista cósmico… não, agora o pó de estrela cadente suave me explode gentilmente… rostos estilhaçados em mosaico de vidro manchado… Dr. Lagosta da Tiffany segura o cesto de seções trapezóides… olha para chave brilhante… onde está a chave venusiana do êxtase?… onde está a chave para a explosão estelar do ano 3000?… IMAGENS DE PROCESSOS EXTERNOS… sim… pegou a chave…

Aos quatro minutos, o paciente ainda estava sorrindo de olhos fechados. Ao ser contatado para reportar, abriu seus olhos e riu. Olhou para os observadores com olhos brilhantes, examinou o teclado da máquina de escrever experimental e apertou a tecla de IMAGEM DE PROCESSO EXTERNO. Então caiu de volta e fechou seus olhos.

Que bom… eles estão aqui embaixo… esperando… sem palavras aqui para descrever… eles têm palavras lá embaixo… ondas de formas coloridas girando… repicando alegremente… de onde eles vêm… Quem é o arquiteto… impiedoso… cada fábrica dançante e ondulante devorando a outra… me devorando… padrão cruel… o que fazer… terror… ah deixa vir… me devorem… me engolfem no oceano de bocas de flocos de neve… tudo bem… como tudo se encaixa… piloto-automático… está tudo pensado… tudo no piloto-automático… de repente meu corpo estala e começa a desintegrar… fluindo para o rio de energia… tchau… fui… o que eu era está agora absorvido em um flash de elétrons… dirigido através do espaço sideral em pulsos orgásmicos de movimentos de partículas… libertação… emitindo luz, luz, luz…

6º MINUTO. TIM, ONDE ESTÁ VOCÊ AGORA? Voz terrestre chamando… você aí em órbita nuclear… incorporação… agarre a partícula com feixe de energia… devagar… pare na estrutura do corpo… volte… com o abrir dos olhos a dança nuclear subitamente congela em forma fixa… vendo dois blocos de elétrons tremeluzindo… a galáxia Ralph chamando… a galáxia Sr. Ralph sorrindo… a dança de energia capturada momentaneamente na forma de robô amigável… olá… perto dele uma vela brilha… o centro da teia de um milhão de fechos de luz… a sala é capturada em uma rede de energia-luz… tremeluzindo… toda visão é luz… nada a enxergar a não ser ondas de luz… fótons refletidos do sorriso enigmático de Ralph… espera a resposta… fótons quicando das teclas da vibrante máquina de escrever… como é fácil transmitir uma mensagem… o dedo aperta IMAGENS DE PROCESSOS EXTERNOS…

Aos seis minutos, o paciente terminou de fazer caretas que pareciam ser de algum medo ou problema passageiro. Ao ser contatado para reportar, espiou pela sala e sem hesitar pressionou a tecla PROCESSOS EXTERNOS. Então fechou os olhos.

Olhos fechados… mas pós-imagens da chama da vela persistem… globos oculares presos em órbita em torno de um centro de luz interno… radiância celestial no centro de luz… luz do sol… toda luz é sol… luz é vida… vida, lux, luce, vida… tudo é uma dança de luz-vida… toda vida é o fio… carregando luz… toda luz é o frágil filamento de luz… som solar silencioso… transmitido das chamas do sol… luz-vida…

8º MINUTO. TIM, ONDE ESTÁ VOCÊ AGORA? No coração da explosão de hidrogênio do sol… nosso globo é um globo de luz… abrir os olhos joga cortina sobre o clarão do sol… olhos abertos trazem cegueira… trancam a radiância interna… vendo Deus em contraste-escuro segurando uma caixa de sombra… onde é a vida?… pressione a TECLA DA LUZ BRANCA. Aos oito minutos, o paciente, que estava deitado imóvel sobre as almofadas, abriu seus olhos. Sua expresão era de confusão, surpresa. Sem expressão, pressionou a tecla LUZ BRANCA.

Mantendo olhos fechados… parado… capturado… hipnotizado… toda a sala, paredes floridas, almofadas, vela, formas humanas todas vibrando… todas as ondas não tendo nenhuma forma… imobilidade terrível… apenas fluxo de energia silencioso… se você se mover, vai destroçar o padrão… todas as memórias de formas, significados, identidades… sem significado… foi… tudo é uma emanação impiedosa de ondas físicas… fenômenos são pulsos televisivos estalando através de um programa interestelar… nosso sol é um ponto em uma tela de TV astrofísica… nossa galáxia é um minúsculo agregado de pontos em um canto de uma tela de TV… cada vez que uma supernova explode é apenas aquele ponto na tela mudando… o ciclo de dez milhões de anos do universo é um flash de milissegundo de luz na tela cósmica que flui infinita e rapidamente com imagens… sentado imóvel… não desejando movimento ou impor movimento no padrão… ausência de movimento em movimento na velocidade da luz…

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10º MINUTO. TIM, ONDE ESTÁ VOCÊ AGORA? Torre de controle transmitindo mensagem de averiguação… inundação de amor fantástico por podermos nos contatar… permanecemos em contato… onde estava aquele agregado mesmo… alucinando… metáforas de ficção científica… onde está a chave… ali… ALUCINAÇÕES EXTERNAS…

Dos oito aos dez minutos o paciente sentou-se imóvel, olhos abertos em um estado de transe. Não houve tentativa de comunicação. Contatado, ele se moveu devagar mas determinado e pressionou a TECLA DE ALUCINAÇÕES EXTERNAS.

Trechos do Questionário de Pesquisa preenchido depois da sessão: perda do espaço-tempo… fusão com fluxo de energia… vendo todas as formas de vida como ondas físicas… perda do corpo… existência como energia… consciência de que nossos corpos são blocos momentâneos de energia e de que somos capazes de nos afinar com padrões não-orgânicos… certeza de que processos vitais estão no “piloto-automático”… nada a temer ou se preocupar… a complexidade e infinitude do processo vital… entendimento repentino do significado de termos da filosofia indiana como “maya”, “maha-maya”, “lila”… insight dentro da natureza e diversos estados transcendentais… a vazia-luz-branca-do-não-conteúdo, êxtase da estruturação temporária da forma-meta-vida-inorgância da estrutura do código genético musical e o…

12º MINUTO. TIM, ONDE VOCÊ ESTÁ AGORA? Olhos abertos… risada… pego pela torre de controle vigilante ao orbitar em torno de uma área da mente terrena e descobridora… onde é a tecla para pensamentos terrenos?… alucinações… não, o jogo do pensamento… pressione TECLA COGNITIVA…

Do 10º ao 12º minuto, o paciente sentou olhando sem expressão e sem movimento para a parede da sala. Ao ser contatado, sorriu e pressionou a tecla COGNITIVA.

Acima da cabeça está a lâmpada coberta com enfeites de escurecimento para luz azul… circulando a sombra brilhante estão faixas ondulares… silenciosas… acenando… convidando… junte-se a dança… deixe seu robô… um universo inteiro de coreografias aéreas prazeirosas aguarda… sim, juntar-se a eles… de repente, como fumaça subindo de um cigarro, a consciência subiu… indo em caminhos de gaivota até a fonte da luz e, silenciosamente, para outra dimensão…

Do questionário de pesquisa: uma descrição do nível atingido é uma yoga em prosa além da realização atual… havia bilhões de cartas de arquivo, em hélice, que num passar de olhos me confortava com uma biblioteca sem fim de eventos, formas, percepções visuais — não abstratas, mas empíricas… um bilhão de anos de experiências codificadas, classificadas, preservadas em claridade brilhante, pulsante e fria, que fazia a realidade ordinária parecer um show barato, fora de foco, esfarrapado, desengonçado, indeciso, gasto e de mau gosto… qualquer pensamento, uma vez pensado, instantaneamente se tornava vivo e piscava através do diafragma da consciência… mas ao mesmo tempo não havia ninguém para observar… eu… ele… aquele que está consciente… todos vibrando em uma visão eletrônica em technicolor, VEJA!, para aquele que tem estado cego por séculos…

14º MINUTO. TIM, ONDE VOCÊ ESTÁ AGORA? Oh, onde estamos agora?… oh, escute, aqui está onde estamos… uma vez havia um ponto elétrico brilhante… piscar repentino em lama pré-crambriana… o ponto se balança e se agita em uma contorção tremida com traços de alegria, cantoria, soluçar e calafrios… para cima… uma serpente começa a se torcer em direção à suave e quente fenda… minúsculo, do tamanho de um vírus… crescendo… o comprimento enorme de um bacilo microscópico… fluindo exultante, sempre cantando a melodia da flauta hindu… sempre explodindo, se esfoliando… agora do tamanho de uma raiz de musgo, zunindo através de espamos úmidos… crescendo… crescendo… sempre desfolhando sua própria visão… sempre cego, exceto pelo ponto frontal da luz-olho… agora correias de pele de cobra, sacudindo mosaicos de jóias ritmicamente, adiante como cobra… agora do tamanho de um tronco de árvore, sensual com o graxa espérmica correndo dentro… agora inchando em uma enchente de esticamento de tecido… rosa, corrente lamaçal de fogo melodioso… agora circulando o globo, apertando oceanos salgados verdes e montanhas marrom-argila entalhadas em um abraço constritor… serpente fluindo cegamente, agora uma torcida cobra de vértebras elétricas de um bilhão de milhas sem fim cantando a melodia hindu da flauta… cabeça de pênis palpitando… mergulhada em todos os odores, toda a tapeçaria colorida de tecido… contorcimento cego, serpente intumescida circular cega, cega, cega, exceto pelo único olho de jóia que, por um fragmento de piscar, a cada célula no desfile progressivo é permitido aquele momento cara-a-cara de insight de chama solar no futuro-passado.

TIM, TIM, ONDE VOCÊ ESTÁ AGORA? A torre de La Guardia repete solicitações de contato com um navio perdido além do abrangência do radar… onde?… sou o olho da grande cobra… uma dobra na pele da serpente, dando mergulhos trapezóides… registrando conteúdos da consciência… onde está você?… aqui… ALUCINAÇÕES INTERNAS.

Do 12º ao 14º minutos, o paciente sentou silenciosamente com olhos fechados. Ao ser contatado, falhou em responder e, após 30 segundos, foi contatado novamente. Então pressionou a tecla ALUCINAÇÃO EXTERNA.

A sessão continuou com interrupções de dois minutos até o 20º minuto no mesmo padrão: vôos atemporais pelos alucinantes campos de vibração de energia pura com repentinas contrações em direção à realidade para responder às questões do observador.O relatório da sessão preenchido no dia seguinte continha os seguintes comentários sobre esse método de sessão programada:Essa sessão sugeriu algumas soluções para o problema da comunicação durante experiências psicodélicas. A pessoa “lá em cima” está passando por experiências que rodopiam tão rápido e contêm conteúdo estrutural tão diferente de nossas formas macroscópicas familiares que ela, possivelmente, não consegue descrever onde está ou o que está experimentando. Considere a analogia do piloto de avião que perdeu a orientação e que fala com a torre de controle. O piloto está experimentando muitos eventos — pode descrever as formações de nuvens, flashes de luz, a cristalização de gelo na asa visível da janela — mas nada disso faz qualquer sentido para os técnicos da torre que tentam traçar o curso na linguagem tridimensional de navegação. A pessoa “lá em cima” não pode fornecer coordenadas. A equipe de controle no chão deve transmitir: “Cessna 64 Bravo, nosso radar mostra que você está a 15 milhas a sudoeste do Aeroporto Internacional. O brilho vermelho que você vê é o reflexo de Manhattan. Para entrar na rota para Boston você precisa mudar o curso em 57 graus e manter uma altitutde de 5500″.

Mas a linguagem da psicologia não é sofisticada o suficiente para fornecer tais parâmetros. Nem há compassos empíricos para determinar a direção.

O que podemos fazer, nesse ponto, é configurar “planos de vôos”. O paciente pode trabalhar, antes da sessão, as áreas de experiência com que quer interagir; e ele pode planejar a sequência temporal de sua viagem visionária. Ele não será capaz, durante o vôo, de dizer aos “controladores” onde está, mas eles podem contatá-lo e dizer como ele deve proceder. Assim, durante essa sessão, quando Ralph perguntou, ONDE VOCÊ ESTÁ AGORA?, não pude responder. Tive que descer, diminuir o fluxo da experiência e então contar a ele onde acabei chegando.

Quando fizeram a pergunta de contato, eu poderia estar esbarrando em outras galáxias. Para poder responder, tive que parar minha jornada livre e errante, chegar perto da terra e dizer: “Estou sobre New Haven”.

Essa sessão foi um contínuo e serial venha-para-baixo. Repetidamente, tive que parar o fluxo para poder responder. Meu cortex estava recebendo centenas de impulsos por segundo, mas para responder às perguntas da torre de controle tive que reduzir a nave para uma marcha lenta: “Estou aqui”.

Essa sessão sugere que um modo mais eficiente de mapear experiências psicodélicas seria:

1 – Memorizar o teclado da máquina de escrever experimental, para que a comunicação com o controle de solo seja automática.
2 – Planejar a sessão de modo que os controladores não perguntem coisas irrespondíveis — “Onde realmente estou?” — mas digam ao paciente onde ir. Então a tarefa de comunicação do viajante seria indicar se ele está no curso, isto é, se ele está ou não seguindo as instruções de vôo transmitidas pelos controladores.

O controle de solo deveria enviar estímulos. A sugestionabilidade está totalmente aberta. A torre La Guardia direciona o vôo.

VOCÊ APRENDEU ALGO DE VALOR COM ESSA SESSÃO? SE SIM, POR FAVOR ESPECIFIQUE: “A sessão foi de grande valor. Estou forte e claramente motivado a desenvolver métodos de controle de solo e vôos planejados”.

APROXIMADAMENTE QUANTO DA SESSÃO (EM %) FOI GASTO EM CADA UM DESSES ASPECTOS?

1 – JOGOS INTERPESSOAIS (afeição pelos observadores) – 10%
2 – EXPLORAÇÃO OU DESCOBERTA DE SI, OU JOGOS DO EGO – 0%
3 – OUTROS JOGOS (SOCIAIS, INTELECTUAIS, RELIGIOSOS) – 70% (intelectuais, lutando com o problema da comunicação)
4 – TRANSCENDÊNCIA ALÉM DOS JOGOS – 20% (continuamente)

Referências

1 – Szara, S: Hallucinogenic effects and metablism of tryptamine derivatives in man. Fed. Proc. 20: 858-888, 1961.
2 – Szara, S: Correlation between metabolism and behavioral action os psychotropic tryptamine derivatives. Biochem. Pharmacol., 8: 32, 1961.
3 – Szara, S: Behavioral correlates of 6-hydroxylation and the effect of psychotropic tryptamine derivatives on brain serotonin levels. Comparative Neurochemistry, ed. D. Richter, pp. 432-452. Pergamon Press, Oxford, 1964.
4 – Szara, S. & Axelrod, J.: Hydroxylation and N-demethylation N,N-dimethyltryptamine. Experientia, 153: 216-220, 1959.
5 – Szara, S., Hearst E. & Putney F.: Metabolism and behavioral action of psychotropic tryptamine homologues. Int. J. Neuropharmacol., 1: 111-117, 1962.
6 – Schultes, R.E. Botanical Sources of the New World Narcotics. In Weil, G.M., Metzner, R. & Leary, T. (eds). The Psychedelic Reader, University Books, New Hyde Park, 1965.
7 – Leary, T. The Experiential Typewriter. Psychedelic Review, No. 7. 1965.

* Texto gentilmente retirado do blog http://avisospsicodelicos.blogspot.com/

Gaia – Fritjoff Capra

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Texto retirado do livro “O Ponto de Mutação” (1982) de Fritjof Capra.

“Os sistemas estratificados evoluíram a par dessas formas superiores de vida, renovando-se em todos os níveis e assim mantendo os ciclos contínuos de nascimento e morte para todos os organismos, de uma extremidade a outra da estrutura da árvore. E esse desenvolvimento leva-nos a indagações sobre o lugar dos seres humanos no mundo vivo. Como nós também nascemos e estamos destinados a morrer, isso significa que somos partes integrantes de sistemas maiores que continuamente se renovam? Com efeito, parece ser esse o caso. À semelhança de todas as outras criaturas vivas, pertencemos a ecossistemas e também formamos nossos próprios sistemas sociais. Finalmente, em nível ainda maior, há a biosfera, o ecossistema do planeta inteiro, do qual nossa sobrevivência é profundamente dependente. Não consideramos usualmente esses sistemas mais extensos organismos individuais – à semelhança de plantas, animais ou pessoas -, mas uma nova hipótese científica faz profundamente isso no mais amplo nível acessível. Estudos detalhados do modo como a biosfera parece regular a composição química do ar, a temperatura da superfície da terra e muitos outros aspectos do ambiente planetário levaram o químico James Loverlock e a microbióloga Lynn Margulis a sugerir que tais fenômenos só podem ser entendidos se o planeta, como um todo, for considerado um único organismo vivo. Reconhecendo que sua hipótese representa o renascimento de um poderoso mito antigo, os dois cientistas chamaram-lhe a hipótese de Gaia, do nome da deusa grega na Terra.

A percepção consciente da Terra como algo vivo, que desempenhou um papel importante no nosso passado cultural, foi dramaticamente revivida quando os astronautas puderam, pela primeira vez na história humana, ver nosso planeta a partir do espaço exterior. A visão que eles tiveram do planeta em toda sua refulgente beleza – um globo azul e branco flutuando na profunda escuridão do espaço – impressionou-os e comoveu-os profundamente; como muitos deles têm declarado desde então, foi uma imensa experiência espiritual que mudou para sempre suas relações com a Terra. As magníficas fotos da “Terra inteira” que esses astronautas trouxeram ao voltar tornaram-se um novo e poderoso símbolo para o movimento ecológico e podem muito bem ser o resultado mais significativo de todo o programa espacial.

O que os astronautas e inúmeros homens e mulheres na Terra antes deles perceberam intuitivamente está sendo confirmado por investigações científicas, conforme é descrito em detalhes no livro de Loverlock. O planeta está não só palpitante de vida, mas parece ser ele próprio um ser vivo e independente, toda a matéria viva da Terra, juntamente com a atmosfera, os oceanos e o solo, forma um sistema complexo com todas as características de auto-organização. Permanece num estado notável de não-equilíbrio químico e termodinâmico, e é capaz, através de uma gigantesca variedade de processos, de regular o ambiente planetário a fim de que sejam mantidas condições ótimas para a evolução da vida.

Por exemplo, o clima da Terra nunca foi totalmente desfavorável à vida desde que apareceram as primeiras formas de vida, há cerca de 4 bilhões de anos. Durante esse longo período de tempo, a radiação proveniente do sol aumentou, pelo menos, 30 por cento. Se a Terra fosse simplesmente um objeto sólido inanimado, a temperatura de sua superfície acompanharia a produção de energia solar, o que significa que a Terra inteira seria uma esfera gelada durante mais de 1 bilhão de anos. Sabemos, pelas informações geológicas, que essas condições adversas nunca existiram. O planeta manteve uma temperatura razoavelmente constante em sua superfície durante toda a evolução da vida, tal como um organismo humano mantém constante a temperatura do corpo, apesar de condições ambientais variáveis.

Exemplos semelhantes de auto-regulação podem ser observados com relação a outras propriedades ambientas, como a composição química da atmosfera, o conteúdo salino dos oceanos e a distribuição de vestígios de elementos entre plantas e animais. Tudo isso é regulado por intrincadas redes cooperativas que exibem as propriedades dos sistemas auto-organizadores. A Terra é, pois, um sistema vivo; ela funciona não apenas como um organismo, mas, na realidade parece ser um organismo Gaia, um ser planetário vivo. Suas propriedades e atividades não podem ser previstas com base na soma de suas partes; cada um de seus tecidos está ligado aos demais, todos eles interdependentes; suas muitas vias de comunicação são altamente complexas e não-lineares; sua forma evoluiu durante bilhões de anos e continua evoluindo. Essas observações foram feitas num contexto científico, porém trancendem largamente o âmbito da ciência. À semelhança de muitos outros aspectos do novo paradigma, elas refletem uma profunda consciência ecológica, que é, em última instância, espiritual.”

Sociedade Psicodélica – Terence Mckenna

por Terence McKenna

Baseado em uma fala dada em um encontro da ARUPA
no Instituto Esalen em junho de 1984.

mckenna1Eu quero falar esta noite a respeito da noção de uma sociedade psicodélica. Quando eu falei em Santa Bárbara em uma conferência sobre psicodélicos em maio de 1983 minhas lentes de contato falharam em um ponto crítico na minha leitura e eu simplesmente tive que improvisar. Mais tarde quando eu ouvi a fita da gravação eu ouvi a frase “sociedade psicodélica.” Eu nunca usei este termo conscientemente em uma conversa. Mas porque eu havia dito, e porque havia acontecido uma ressonância através das pessoas que estavam lá, eu comecei a pensar sobre isso e esta noite irei especular sobre o que isto pode significar para nós.

Quando eu penso em sociedade psicodélica, esta noção implica em criar uma sociedade que vive à luz do Mistério da Existência. Em outras palavras, problemas e soluções deveríam ser retiradas de seu papel central nas organizações sociais, e Mistérios – Mistérios irredutíveis – deveriam estar em seu lugar. Nos anos 20 o entomologista britânico J.B.S. Haldane disse em um ensaio, “O universo pode não ser apenas mais estranho como supomos; ele pode ser mais estranho do que nós podemos supor.”

Eu sugiro que assim como nós olhamos para trás em cada ápice da civilização na história humana – seja ela Maia, ou Greco-Romana, ou a Dinastia Sung – temos acreditado que isso aconteceu graças à posse de uma descrição apurada do cosmos e da relação do homem com ele. Isto parece ir junto com o completo florescimento de uma civilização. Mas, a partir deste ponto de vista da nossa presente civilização, nós consideramos todas estas concepções como se fossem piores, de segunda mão. Nós nos orgulhamos que nossa civilização tem a última e real descrição sobre o que está acontecendo.

Eu considero isto um erro, e que atualmente nos cega, ou torna nosso progresso histórico muito difícil, é nossa falta de atenção que nossas crenças se tornaram obsoletas e deveríam ser colocadas de lado. Uma sociedade psicodélica abandonaria os sistemas de crenças pela experiência direta. É o que eu penso a respeito a do problema do dilema moderno: a experiência direta foi descontada, e no seu lugar todos os tipos de sistemas de crença foram criados.

Eu preferiria um tipo de anarquia intelectual onde não importa o quê fosse pragmaticamente aplicável e fosse trazido de qualquer situação; onde crença fosse entendida como uma função auto-limitante. Porque, veja, se você acredita em alguma coisa você é automaticamente impedido a acreditar em seu oposto; que significa que um grau da liberdade humana foi coisificada no ato de se submeter à esta crença.

Eu insisto que é supérfluo ter crenças, porque o universo é realmente mais estranho do que nós supomos, precisamos retornar para o que no século XVI era chamado de método Baconiano; que não significa a elaboração fantástica de construções de pensamentos que explicam a natureza, mas somente uma catalogação dos fenômenos que nós experimentamos. Redes de computadores e drogas psicodélicas e a crescente disponibilidade de informação no mundo têm tornado possível a evolução de novos estados de informação que nunca existiram anteriormente. Estamos processando estas novas oportunidades em uma razão muito devagar porque estamos sendo impedidos pela ideologia.

Os modelos Freudianos e Junguianos enxergam a experiência psicodélica como um desmantelamento da resistência em revelar emoções, motivos e sistemas de crenças escondidas e complexas. Esta noção, há cinco ou dez anos, foi substituída pelo modelo de experiência alucinógena xamânica. Este modelo sustenta que pessoas arcaicas têm delegado membros especiais de uma sociedade para provar informações de domínio secreto usando drogas psicodélicas. A informação extraída destes domínios são então usadas para guiar e direcionar a sociedade.

Eu estou interessado neste segundo modelo. Tenho gastado algum tempo na Amazônia e estou familiarizado com os mecanismos operacionais do xamanismo e personalidades xamânicas. Acredito que a experiência psicodélica vai além da instituição do xamanismo. Estamos diante de uma oportunidade única de arremessar de lado a crise da cultura mundial.

Nossa habilidade de destruir a nós mesmos é a imagem espelhada da capacidade de nos salvarmos. O que está faltando é uma visão clara do quê deveria ser feito. O que deveria ser feito certamente não é a acumulação cada vez maior de arsenal termonuclear ou a promoção de todo o tipo espetáculos de primatas – que Tim Leary tem muito bem denunciado. O que precisa ser feito é que nossas concepções ontológicas fundamentais de realidade precisam ser refeitas. Precisamos de uma nova linguagem, de modo que para ter uma nova linguagem precisamos de uma nova realidade. É um tipo de equação urobórica, ou uma situação de desvencilhamento. Uma nova realidade gerará uma nova linguagem. Uma nova linguagem fará uma nova realidade se legitimar e ser uma parte desta realidade.

As substâncias psicodélicas podem ser imaginadas como pontos de uma grade de informações. Elas provêm novas perspectivas na realidade, e quando você reconecta todos os pontos de vista que você coletou considerando realidade, então um modelo aplicável de realidade e que faça sentido começa a surgir.

Eu penso que esta realidade aplicável e que faça sentido – o que Wittgenstein nomeou algo como “suficientemente verdadeiro” – é o que estamos procurando. O “suficientemente verdadeiro” mapeando por cima da teoria é o que estanos procurando, mas a experiência deve ser feita primeiro. A linguagem do Eu deve ser feita primeiro.

O que eu estou defendendo é que cada um de nós tome responsabilidade pela transformação cultural, que não é algo que seria disseminado de cima para baixo. É algo que cada um de nós podemos contribuir nos esforçando a viver tão para dentro do futuro quanto possível. Devemos nos livrar das concepções de anos 40, 50, 60, 70, 80, 90. Devemos transcender o momento histórico e tornarmos exemplares de humanidade no Fim do Tempo.

Alguns de vocês que acompanham minha leitura esta tarde se preocupam em saber que eu acredito que liberação – ou vamos dizer “decência” – como uma qualidade humana e antecipação deste estado perfeito da humanidade futura. Podemos ter vontade de aperfeiçoar o futuro nos tornando um microcosmo do futuro perfeito, não mais distribuir culpa para instituições ou hierarquias de responsabilidade ou controle, mas dar-nos conta que a oportunidade está aqui, a responsabilidade está aqui, e os dois nunca se tornem congruentes denovo. A salvação para o nosso espírito imortal depende do quê você faz com as oportunidades que a vida lhe dá.

Então, o que faremos com a oportunidade? O quê significa dizer, em termos operacionais, “Viva tão longe ao futuro quanto puder?” Significa tomar uma posição vís à vis da emergente realidade hiper-dimensional. Isto não significa necessariamente tornar-se um usuário de drogas psicodélicas; mas significa admitir esta possibilidade. Se você sente um potencial heróico dentro de você para ser um dos experimentadores – um dos pioneiros – então você sabe o que fazer. Se por outro lado você se sente perdido no abismo – se você se sente como William Blake chamou de “caindo para a eterna morte,” caindo do espiral da existência que conecta uma encarnação à outra – então oriente-se para a experiência psicodélica como uma fonte de informação.

Uma imagem espelhada da experiência psicodélica emergiu com o hardware e software integrados às redes de computadores. A internet e a www são, paradoxalmente suficientes, uma profunda influência feminilizante na sociedade. Isto está no desenvolvimento de hardware/software que inconscientemente está se tornando consciente. Esse é um pensamento que tomamos do bon mot platônico – “Se Deus não existisse, o homem deveria inventá-lo” – e disse, “se a inconsciência não existe, a humanidade a inventará na forma de vastas redes que serão capazes de transferir e transformar informação.”

Isto é, de fato, onde estamos presos: a transformação de informação. Nós não mudamos fisicamente nos últimos quarenta mil anos. O tipo humano está bem estabilizado antes do fim da última glaciação. Mudanças que foram feitas antigamente no âmbito biológico está acontecendo agora no âmbito cultural. Estamos abrigando presunções culturais e nos preocupando com nossa visão do mistério unitário em uma razão cada vez mais rápida, enquanto tentamos nos acomodar ao desdobrameno daquele mistério que se deita diante de nós no tempo. Este é o processo que está fundindo a vasta sombra de destruição por cima de toda a experiência da história humana.

Anterior à nossa própria era, a única palavra que poderia ser aplicada para esta força que faz as pessoas se unirem, causando nascimento e morte, levantando e derrubando civilizações, era Deus; e isso era imaginado como uma forma auto-consciente que estava aprendendo a respeito do mundo como um gato aprende a respeito do aquário e fazendo as coisas acontecerem. Agora temos uma noção diferente – a noção de um sistema vetor que força uma grande área que está sendo empurrada para um espaço muito pequeno, e este pequeno micro-setor de tempo/espaço é a história. É um ímpeto que os budistas chamam de “o reino densamente empacotado,” um reino onde os opostos estão unificados.

A história é este reino onde o corpo é finalmente interiorizado e a mente exteriorizada. Penso a mente como um órgão da quarta dimensão no nosso corpo. Você não pode vê-lo porque ele está na quarta dimensão, mas você experimenta uma baixa dimensão seccionando-a no fenômeno da consciência. Mas isto é somente uma secção parcial. assim como uma elipse é um desenho parcial de um cone.

O crescimento dos sistemas de informação é somente um reflexo do hardware masculino do que já existe na natureza como um fato. Agora nos resta afiar nossas intuições e nos tornarmos atentos a este sistema preexistente e ligá-lo para que possamos estar um passo a frente dos dualismos que nos separam dos outros e do mundo. Precisamos nos dar conta que há um enxame de genes – e não um grupo de espécies – no planeta; que metade do tempo você está pensando no que está escutando; que idéias são criaturas notavelmente escorregadias que são difíceis de traçar sua origem; e que estamos realmente no mano-a-mano e todos juntos em uma dimensão que não é tão acessível e sólida como você desejaria que fosse (como Joyce comenta em Finnegan’s Wake).

Os psicodélicos são o red-hot, a edição social/ética porque eles são agente descondicionadores. Eles levantarão dúvidas se você é um rabino ortodoxo, um antropólogo marxista, ou um homem de altar porque o seu negócio é dissolver sistemas de crenças. Eles fazem isso muito bem, e depois eles deixam você com uma ferida na experiência, o que William James chamou – tomando uma experiência infantil – “uma confusão florida, barulhenta.”

Fora isso você reconstrói o mundo e precisa entender que esta reconstrução é um diálogo onde suas decisões – a projeção de sua gramática no espaço intelectual em sua frente – irá formar um gel sobre o ser. Nós todos criamos nosso próprio universo porque estamos todos operando com a nossa própria linguagem privada que são somente traduzíveis através da linguagem de outra pessoa. Há ainda um análogo físico a isto que irá promover um reforço desta noção de separação e nossa singularidade.

A imagem do mundo que se forma em seus olhos é feita de fótons. Fótons são minúsculos pacotes de luz tão próximas que podem ser pensadas como partículas. Isto significa que cada fóton que toca o fundo dos seus olhos é diferente dos fótons que tocam o fundo dos olhos de qualquer outra pessoa. Isto significa que eu me baseio em uma seção do mundo 100% diferente da imagem que qualquer um de vocês estão se baseando. E ainda estamos sentados aqui com uma suposição ingênua de que nossas imagens do mundo diferem somente pela nossa perspectiva dentro do espaço desta sala.

Temos inúmeras suposições ingênuas como esta construção do nosso pensamento. Nosso mecanismo explanatório mais venerado – tal como “ciência” – surge também como nosso mecanismo explanatório mais velho. Portanto, eles têm se construídos como a mais ingênua e não-examinada suposição. “Ciência”, por exemplo, podemos demolir em trinta segundos. A “ciência” diz a você um grupo de condições que criará um efeito dado, e a cada momento que o grupo de condições estiver em seu lugar o efeito será obtido. O único lugar que isto acontece é dentro de um laboratório. Nossa experiência não é assim. O contato com uma pessoa é sempre diferente. A experiência de fazer sexo, comer uma refeição, tomar um ônibus – isto penetra no ser – e torna suportável de todo jeito. A “ciência” ainda deseja dizer a você que somente o valor das coisas descritas em um fenômeno podem ser disparadamente repeditas. Isto se dá porque estes são somente os fenômenos que a ciência pode descrever, e é o nome do jogo com o qual ela se preocupa.

Mas nós temos que reivindicar nossa liberdade – tomar vantagem do abismo minúsculo entre o imenso abismo do desconhecimento; seja talvez a morte, ou reencarnação, ou transições para outras formas de vida. Estas coisas nós não sabemos ou entendemos, mas no momento que somos humanos temos a rara oportunidade de descobri-las. E eu tenho fé de que isto é possível – em algum lugar ou em algum momento. Talvez nenhum progresso seria feito até a nona hora em que a realidade pudesse ser literalmente fragmentada em pedaços, para além do ponto de reconstrução.

Existe, definitivamente, uma tendência anti humanista em todos os sistemas, Ludwig von Bertalanfe, que foi o inventor da teoria dos sistemas gerais, disse, “pessoas não são máquinas, mas em toda situação que elas tiverem a oportunidade, elas irão agir como uma.” Estamos todos caindo em padrões. Nós seguramos estes padrôes cada vez mais forte. Eles não podem ser violados; e isto acontece no nível das idéias.

Estamos agora no crista da onda da história, em tipo de aperto que nos devolve ao passado. Espero que tenhamos chegado ao fim desta fase. Queira você comprar minha visão apocaliptica transformadora envolvendo 2012, ou queira você dizer que somente por olhar ao seu redor você tem certeza que, logo, logo, a merda vai ser atirada ao ventilador, eu acho que nós concordamos que estamos diante de um impasse. O que está para acontecer será ou um grande deslocamento da biosfera, causando uma invalidação da inteligência como uma adptação biológica e nossa extinção; ou iremos nos tornar – como James Joyce sonhou – “o homem auto governável;” em outras palavras, a exteriorização do espírito e a interiorização do corpo.

Neste processo, tudo terá de ser desafiado. Toda a noção de humanidade será desafiada. Estamos à beira da manipulação do DNA, ou de tomar controle da forma humana, de sermos capazes de extender a noção de arte para dentro do corpo humano. Somos clássicos? Deveríamos ser Adonis e Perséfone? Ou o que somos nós? Somos surrealistas? Deveria eu ser uma batata ou uma girafa em chamas? Estas são questões que terão de ser enfrentadas. Eu sorrio enquanto falo isto, mas estas questões são importantes.

E a noção de ganho vertical que vemos nas metáforas feitas em relação à experiência psicodélica: expansão da consciência, ficar chapado (getting high – a tradução seria “elevar-se”), viagem psicodélica, vôo xamânico. É como se os alucinógenos fossem o feminino, o software, o formador, o cabo condutor do que está ocorrendo. Seguindo por trás vem o hardware, a mentalidade construtora masculina.

Isto irá continuar até que o cabo condutor das longas distâncias da engenharia contrutora se rompa. Esta é a crença xamânica: que nós podemos encontrar uma maneira de usar químicos em nossos corpos, usar nossas vozes, nossos pensamentos e nossas mãos por sobre nós e sobre os outros; para transformar nós mesmos sem nenhuma tecnologia; para nos movermos no reino da imaginação com uma tecnologia psicofarmacológica interiorizada que nos liberte dentro da nossa imaginação.

Ao mesmo tempo isto está acontecendo com a mentalidade construtora masculina, que irá colocar sociedades humanas na órbita da terra/lua e em planetas próximos. Mas há um porém para a mentalidade construtora, que é um vácuo que envolve os planetas e exemplifica este abismo e o elemento feminino. É o mistério da Mama matrix de Finnegan’s Wake. A misteriosa Mama matrix é o universo, e não há como escapar deste fato. Mas eu penso que a mentalidade construtora, que irá tentar transformar o homem em suas máquinas será desestabilizado pelos psicodélicos, pelo pensamento voltado ao planeta, pelo lado voltado à imaginação de nossa consciência, que irá criar as bases para o casamento espiritual que será a incubação química de um novo formato da humanidade; e isto não está longe.

Não pode estar longe. Esta é uma responsabilidade inerente a todos nós que nos faz criá-la. Há uma obrigação definida para examinar as possibilidades de ação, e para pensar claramente sobre si e sobre o outro, sobre a linguagem e o mundo, sobre o passado e o presente. Por muito tempo nós vivemos em um mundo definido pela geografia. Se você nasceu na Índia, você achará que o cosmos é de uma maneira. Se você nasceu no Brooklyn, você achará de outra. Precisamos transcender estas grades do destino biológico, que nos torna aquilo que nós não queremos ser. Nós podemos clamar por este nível mais alto de liberdade através do simples ato de prestar atenção à existência.

Precisamos começar a exprimir nossas visões ideológicas antes que sejamos consumidores das próprias. Precisamos desligar a nossa TV interna que nos puxa para as suposições culturais ditadas pelo Pentágono, Madison Avenue, e pelo estado corporativo. Precisamos, ao invés disso, ligar nossos modems e começar a interagir como pessoas dotadas de mentalidade pelo mundo afora e estabelecer esta nova ordem intelectual que será a salvação da biosfera, eu acredito firmemente nisto. A internet finalmente concretiza nossa coletividade permitindo que pessoas sintam a interrelação de seus destinos; sentem a interrelação como uma coisa que transcende divisões nacionais, divisões ideológicas. A net permite que cada um de nós recupere a experiência de ser parte de uma família humana.

Nenhuma reconstrução de sociedade pode ser feita sem psicodélicos porquê nós perambulamos durante muito tempo sem eles. Certamente somos produtos de uma sociedade que foi longe demais sem psicodélicos como nenhuma outra cultura no mundo. Isto foi há dois mil anos desde que o Mistério foi real em Eleusis e nestes dois mil anos perambulamos longe na disfunção e na confusão. Mas nós somos filhos pródigos. Podemos reparar a idéia de xamanismo a partir do estase social pré-tecnológico e projetá-lo, aperfeiçoá-lo e viajar com ela para além das estrelas.

E se não fizermos, tudo estará perdido. Há somente riscos e comprometimentos nestas aspirações milenares e nestas metas culturais, metas que têm o potencial de restaurar o significado e a direção para nossa civilização. Se isto não for feito iremos fragmentar nossa oportunidade e deixar o horror e a destruição do típico cenário futuro.

 


Anarquicamente copiado de:
FORTE, Robert. Entheogens And The Future Of Religion. San Francisco, CSP, 1997.

Humildemente traduzido por:
Waver

http://www.cogumelosmagicos.org
http://www.plantasenteogenas.org
Versão copyleft – idéias não têm dono. Espalhe a palavra.

O novo salto quântico da consciência

To postando esse texto escrito pelo Ricardo Kelmer, um excelente escritor que mantém o site http://www.ricardokelmer.net …. confiram para mais textos

Foi uma Crônica que ele fez sobre o livro “The White Hole in Time” (Peter Russel), que tem um filme de mesmo nome que mostra as raízes da crise humana… na verdade uma crise de consciência
Texto muito bom, que ganha aqui mais um canal pra que a informação chegue a mais pessoas

“A cada dia mais e mais pesquisadores ligados ao estudo da consciência, antropologia, psicologia e botânica se debruçam sobre uma possibilidade no mínimo intrigante e polêmica. É provável que as plantas psicoativas (que induzem a mente a funcionar em estados especiais) possam ter contribuído significativamente para o surgimento da autoconsciência, fator decisivo que proporcionou aos nossos ancestrais, num determinado ponto da evolução, as condições para sobreviver e gerar a incrível espécie a qual pertencemos: o Homo sapiens.

Admitir tal hipótese é mexer num vespeiro. Muita gente se indagará: “Quer dizer que nós humanos só existimos porque um bando de macacos comeram umas plantinhas e ficaram doidões?” Imagino os mais religiosos: “Era só o que faltava! Deixa só Deus escutar isso!” Pois infelizmente para muita gente, e até para alguns deuses, essa hipótese vem sendo estudada com seriedade e encontra ressonância positiva no meio científico.

Quem já passou por uma experiência com as tais “plantas sagradas”, como a Ayahuasca, o Peiote e a Jurema, sabe perfeitamente do imenso poder que elas guardam. E sabe também que elas não se prestam a um consumo recreativo, exatamente porque costumam tocar muito fundo em nosso interior, abalando nossa compreensão da realidade e de nós mesmos e nos fazendo emergir da experiência profundamente transformados. Xamãs e pajés do mundo inteiro as utilizam há milhares de anos em contextos religiosos e terapêuticos. Atualmente médicos e pesquisadores de vários países estão unindo medicina acadêmica com antiquíssimas práticas xamânicas que envolvem o uso de plantas psicoativas e, com essa curiosa união, vêm obtendo resultados animadores na cura de muitas doenças como a dependência química.

Atualmente no Brasil proliferam-se seitas e dissidências de seitas que em seus rituais utilizam chás à base dessas plantas, chamando a atenção de estudiosos para o emergente fenômeno. Toma-se o chá para entrar num estado de consciência não ordinário, onde é possível viver experiências sensoriais e cognitivas as mais diversas. Há quem encontre pessoas vivas ou mortas, santos, entidades animais ou espíritos de plantas. Há os que experimentam capacidades psíquicas incomuns ou vivenciam uma intensa sensação de união com a Natureza e tudo que existe. Há quem passe por profundas experiências de auto-investigação psicológica como também de autocura ou seja tocado por revelações importantes que podem mudar toda uma vida. Pode não acontecer nada mas também pode ser prazeroso ou doloroso. Pode ser infernal ou divino mas será sempre construtivo. Depende de cada um e de seu momento. Os religiosos radicais, sempre obcecados, diriam que é coisa do demônio. Alguns psicólogos talvez usassem o termo “terapia de choque”. Talvez nada mais seja que um providencial reencontro consigo mesmo e com sua verdade mais íntima.

Por que a crescente procura atual pelas plantas de poder dos xamãs? Por qual razão tantas pessoas ousam se submeter a uma experiência incerta, largando a segurança de sua mente cotidiana e desafiando o desconhecido de si mesmo? Minha impressão é que isso tudo talvez signifique, em última instância, uma forma de religação à Natureza. Religação sim, porque, na verdade, nós também fazemos parte da Natureza. O que houve é que, infelizmente, passamos a nos ver separados dela e com isso nos distanciamos demais da sabedoria natural do planeta e agora, perdidos num mundo cada vez mais caótico e insano, buscamos com avidez crenças e experiências que nos reconectem ao sentido maior da vida e às nossas verdades mais profundas. Entendo isso como um anseio natural e legítimo de uma espécie adoecida: o anseio de cura, liberdade, totalidade e harmonia com a Mãe Terra.

o que liberta também escraviza

Por minha própria experiência, sei que plantas psicoativas podem ser bastante úteis porque nos fazem olhar para dentro, nos reconectam às leis naturais e ao sagrado de nossas vidas, nos lembram de nosso potencial para a autocura e ajudam a nos libertarmos de medos, culpas e bloqueios. Não há como não se transformar após um profundo encontro consigo mesmo. É por isso que quem passa por tais experiências xamânicas engrossa a legião dos que entendem o mais importante: somente a profunda mudança interior de cada um é que fará finalmente com que o mundo mude para melhor.

Este talvez seja o convite que as plantas sagradas fazem neste momento à nossa espécie: quanto mais pessoas se religarem à sua verdade mais íntima, mais próxima a humanidade estará de seu ponto de equilíbrio. Por outro lado, sei também que a espécie humana está doente e que, na busca angustiada pela cura, é capaz de exagerar no remédio. Por isso, nessa urgente busca por valores espirituais, é preciso, acima de tudo, priorizar a liberdade e atentar para o risco sempre presente de cairmos escravos exatamente daquilo que um dia elegemos como libertador. As plantas sagradas não ficam de fora desse perigo. Tenho amigos que fazem parte de seitas que utilizam tais plantas e certamente discordarão. Respeito o que eles pensam e admiro sua busca pessoal. Porém, como tudo o mais que existe, as plantas sagradas também possuem dois lados. Se um lado liberta, o outro está lá prontinho para escravizar caso você não se mantenha atento, equilibrado e sem apegos excessivos.

Religiões, seitas e gurus funcionam muito bem para os que necessitam de regras ou se sentem mais seguros pertencendo a um certo grupo. Eles estão em seu caminho e isso deve ser respeitado. Mas há pessoas que conseguem beber em todos os ensinamentos e usufruir do melhor que eles lhes oferecem sem ter de se enquadrar em nenhum específico. É um caminho mais solitário, evidente, e exige um contínuo “estar aberto” – mas que exatamente por isso recompensa quem o trilha com a liberdade que nenhum outro caminho pode oferecer. As regras da seita ou as palavras do guru podem até iluminar durante um tempo, sim, mas até mesmo essa luz pode cegar para os horizontes seguintes da jornada. O principal ensinamento das plantas de poder (assim como deveria ser o de todo guru) é este: devemos abandonar todas as muletas e aprender a caminhar por nós mesmos.

O atual processo coletivo de reconectar-se aos valores da Natureza através das plantas psicoativas não significa uma espécie de retrocesso evolutivo e que devemos voltar a saltar pelas árvores. Nada disso. Uma vez ultrapassados, os marcos da evolução da consciência sempre nos impulsionam para o novo, jamais para trás. Acontece que a verdadeira evolução avança em forma de espiral e é por isso que quando o caminho parece retornar a um determinado ponto, na verdade ele está sim passando novamente por lá – porém num novo nível, mais acima, numa nova dimensão.

Talvez essas poderosas plantas, que acompanham nossa espécie desde seu nascimento numa impressionante relação simbiótica, estejam agora nos oferecendo a preciosa oportunidade de mais um salto quântico da consciência, uma intensa transformação da mente e de sua interpretação da realidade – como fizeram nossos peludos antepassados em algum ponto de sua jornada. Agora, porém, diferente deles, possuímos razão e discernimento. Possuímos milênios e milênios de experiência sedimentados no inconsciente comum da espécie e temos nossos próprios erros para nos guiar.

Retornaremos à Mãe Terra e ao sagrado, sim, porque não há outro caminho se quisermos de fato sobreviver como espécie. Mas o faremos num novo nível porque agora estamos mais capacitados para enfrentar o grande mistério da vida, esse mistério que nos maravilha e assombra cada vez que olhamos para o sem-fim do mundo lá fora ou para o infinito interior de nós mesmos.


Ricardo Kelmer é escritor, letrista e roteirista e mora em São Paulo, Terra, 3a. pedra do Sol

Na Teia da Sálvia


Minha Experiência com Sálvia Divinorum

Vou relatar aqui minha experiência com a Salvinorina…. Apesar de curta, foi uma das minhas mais intensas experiências dentre todas, no sentido de ter me provocado mais reações posteriores….. 5 minutos que valeram uma vida!
Mas antes de correr pra arrumar Sálvia, leia o relato e veja que em nenhum momento foi divertido!

Acordei 9:00 na manhã de sol e minha casa estava vazia pois tínhamos combinado de almoçar fora…. Comecei a assistir um filme que logo me encheu o saco. Sabia que precisava fazer alguma coisa diferente…. foi aí que lembrei que minha encomenda, que eu havia feito com o Rafael, já tinha chegado e senti que era hora de experimentar… Tinha ainda 2 horas antes de encontrar a minha família pro almoço.

Fui para o meu quarto, acendi um incenso e coloquei uma música leve. Separei uma dose do extrato de Sálvia e enchi o meu pipe…. já sentado na cama e encostado no travesseiro.
Mandei pra dentro em dois tapas e aguardei….
Esperava passar por uma viagem tranqüila…. mas tudo foi muito sinistro

Senti minha visão se alterando levemente e me senti indo em direção a algum lugar….
De repente, em um instante meu quarto se transformara numa grande “Teia” em espiral, formada por plantas… e senti uma presença muito forte de uma entidade… como se fosse a grande “Aranha-Mãe” da Teia… uma entidade um pouco sádica e não muito bondosa comigo…. (fui racionalizando os sentimentos e dando a minha interpretação à eles: digo isso, pois pra quem experimentar certamente será diferente.)

A “Planta-Rainha” era muito poderosa, mandava naquele lugar. E seu poder era compartilhado por outras entidades que estavam fora da “teia”, mas era possível sentir a suas presenças… o tempo todo elas se comunicando com a “Rainha”….. e ela foi tentando tomar o controle da minha cabeça através do medo.. Senti ela como sendo meu sentimento interior de medo.. e o tempo todo era como se as entidades rissem de mim e me dissessem:
– “ Olha só quem veio brincar com a gente”
– “ Veio Brincar onde não devia?! Agora agüenta!
– “ Agora você tá preso aqui, mané… Não tem pra onde correr ”

e eu sentia claramente isso….

Percebi que de fato era uma brincadeira idiota… ou talvez o idiota fosse eu por querer brincar com uma coisa que se mostrou muito séria!
O sentimento de medo era intenso como eu nunca havia sentido antes…. era forte, pouco confortável e parecia não ter fim…. meu corpo não existia mais, só o sentimento e as zombarias das “entidades-plantas” cada vez rindo mais e querendo me aprisionar naquela “teia”

A “planta-rainha” ficava a minha esquerda e estava sendo responsável pela construção daquele caminho.. as outras entidades se comunicavam com ela, mas eu não as via… O tempo todo parecia que elas queriam me castigar por ter ido brincar onde não devia…. brincar no mundo delas…
Me senti como uma criança no meio de pessoas más que queriam me fazer mal…. Queria chorar, mas lembrava que aquilo ia passar!
Mesmo nunca tendo passado por aquilo, senti que aquela situação não era novidade… como se estranhamente eu já tivesse presenciado aquilo ….

Com o medo tomando conta, minha reação foi me afastar da planta….. agindo por instinto, joguei o pipe com as cinzas na lixeira do meu quarto…. em vão.
As entidades mais uma vez zombaram de mim como se dizendo:
– “Ha Ha Ha ..Garoto idiota!! Você acha que isso vai adiantar??? Isso está acontecendo muito além desse pequeno plano … Você não está no seu quarto e o problema não é a planta!!!”

Quando percebi o óbvio, vi que somente naquele plano eu conseguiria resolver a situação… foi quando alguma coisa interior começou a “argumentar” com a “Planta-Rainha”, dizendo a ela que eu iria agüentar!!! Que não ia mais me sujeitar ao medo… Supostamente havia entendido a origem do medo onde estava se manifestando o mal…

A Planta-Rainha não queria desistir, e junto com as outras entidades começou a “falar” que eu não ia conseguir… mas me mantive forte….
Foi engraçado, porque quando a Rainha percebeu de fato que eu não ia mais ceder, ela simplesmente virou as costas e foi embora junto com as outras presenças me libertando da Teia…

Foi engraçado sentir que as entidades conversavam zombando de mim, como dizendo “pegamos ele” “agora eu quero ver aguentar” e coisas do tipo. Foi como ficar sob o poder delas, no mundo delas! E não existia saída sem encarar a situação de frente…..

No geral, apesar de ter sido meio aterrorizante, me fez um bem enorme…. Saí da trip completamente mudado…
Qualquer coisa que antes me assustava ou me impedia de estar tranqüilo, perderam o peso….  nenhum medo até hoje na minha vida superou o encontro com a “Planta-Rainha”

Infelizmente as palavras são limitadas e não conseguem explicar o que de fato aconteceu.. só dar uma pequena idéia. Foi intenso.

medos são sentimentos… eles não tem causa… eles existem ou não existem… se existem, nós mesmos criamos suas “causas” que na real são só as razões pra nós mesmos assumirmos que ele existe

Forte abraço amigos
Fiquem em Paz.

Dany3l

– Acrescentando informação ao post (em 15/07/2009)

Em virtude da atual popularização da Sálvia Divinorum, acho importante acrescentar que não se trata de uma planta recreativa. A experiência espiritual que advém do seu consumo transcende a realidade ordinária e tradicionalmente é utilizada por nativos mexicanos que a chamam de “los ojos de la pastora”…
Constitui um meio de auto conhecimento cuja experiência surpreende pela peculiaridade e intensidade… Os mais diversos tipos de experiência são relatados, os mais diversos níveis de consciência são atingidos
Sálvia Divinorum é um enteógeno. Deve  ser respeitada como é a Ayahuasca, o Psilocybe Cubensis e tantas outras ferramentas…. portanto, antes da experiência, pesquise sempre mais, busque informação, não limite seu conhecimento, e identifique sempre qual o seu propósito para o uso.

– Informações técnicas importantes (atualizado em 21/03/2010)

Retirado da Comunidade “enteógenos sem dogmas

A Salvia divinorum é a única entre milhares de espécies do gênero Salvia que apresenta efeitos psicoativos (embora suspeite-se que outras espécies possam conter essas propriedades). Originária do México na Sierra Mazateca, é considerada rara, o que torna difícil a sua obtenção. Difícilmente se reproduz por sementes, sendo multiplicada através de cortes enraizados (clones, as famosas mudas).

Seu efeito é extremamente forte, principalmente quando usados extratos potencializados, que nada mais são do que folhas concentradas com a substância psicoativa. É extremamente recomendável que os futuros usuários venham a se informar sobre seus efeitos antes de se aventurarem. Não é uma erva a ser usada em festas, raves ou com multidões, pois exige uma certa discrição da parte do usuário para que o mesmo se sinta a vontade. Não é uma droga recreativa e pode ser traumático quando usada nessas condições.

Até hoje, não existe confirmação de que seu uso é prejudicial a saúde, não acarreta vício e seu uso tende a não ser freqüente. Contudo, bons estudos estão sendo feitos in vivo e in vitro e o uso tradicional está garantido por um conhecimento e histórico de uso centenários.

É considerada LEGAL na maioria dos países, sendo que a Itália, 2 estados dos EUA e a Austrália já proibiram o uso da planta sem antes fazer um estudo sobre a periculosidade da mesma. Tal medida mostra a falta de critério científico por parte dos legisladores quanto aos requesitos usados para se proibir uma substância. Acredita-se que essa medida foi tomada devido a algumas notícias de incidentes nos EUA, sendo que nenhum deles foi comprovado ter sido causado pelo consumo da planta. A única alegação neste sentido teria sido da parte da mãe de um usuário que cometeu suicídio inalando gas de cozinha dentro de uma barraca. Apesar de ele não estar sob o efeito de salvia no momento do suicídio, ela afirmou: “Só pode ter sido culpa dessa planta”.

Tem como pricípio ativo a Salvinorina A, que, no entanto, não se trata de alcalóide, mas de um diterpeno, com ação diferente da maioria das substâncias psicoativas. Pesquisas atuais sobre o efeito da salvinorina no organismo revelaram que esta, além de não ser uma substância que leva à dependência, apresenta propriedades antidepressiva, analgésica e ainda mostra-se promissora para o desenvolvimento de fármacos para o tratamento da esquizofrenia e dependencia química.

É chamada por alguns como o alucinógeno natural mais potente já descoberto, só perdendo para o LSD, o qual não é encontrado na natureza (é um semi-sintético). Por isso, pode conduzir a estados alterados de percepção onde não se recomenda interação com máquinas ou eventos sociais. Daí o uso espiritual étnico entre os Mazatecas e bruxos ancestrais.

Curiosidade

Devido à dificuldade de se obter sementes férteis, sua propagação tem sido feita através de cortes de seus galhos que são enraizados em água, isso vem ocorrendo nas últimas décadas. Suspeita-se que os clones espalhados pelo mundo inteiro têm origem em apenas 3 espécimes, ou seja, os clones espalhados pelo mundo todo são geneticamente idênticos.Uma das mudas mais difundidas foi originada pela muda coletada no Mexico por Albert Hoffman, o mesmo doutor que sintetizou o LSD

Uso Tradicional

Os “curanderos” mexicanos a usam mascando suas folhas, uma pessoa necessita de cerca de 50 a 100 folhas para obter uma experiência visionária. Tal método é ineficiênte, a absorção da Salvinorina ocorre na realidade pelo tecido sublingual durante a mastigação e não pelo estomago, mas ao contrário do uso moderno, em que se fumam as folhas e se obtem um efeito rápido, ao mascar as folhas o usuário obtém efeitos mais prolongados, podendo chegar a até 2 horas após a ingestão.

Uso Moderno

Há, normalmente, 4 métodos que são utilizados para consumir as folhas da Salvia Divinorum: aromatizando os ambientes, mascando as folhas, fumando as folhas e usando tinturas ou essências sublinguais.O uso de várias plantas em rituais sempre foi prática xamânica tradicional. Elas são, geralmente, queimadas na preparação do ambiente em que são celebrados os rituais xamânicos. É dito que a fumaça das folhas inspira o xamã e o ambiente circundante, propiciando o contato com outros mundos e entidades auxiliadoras.É sabido que mascar as folhas de Salvia Divinorum tem sido o método tradicional utilizado pelos xamãs mazatecas (chotachine). Segundo informações colhidas, os xamãs utilizam entre 10 e 60 folhas, aos pares, enroladas umas nas outras (“quid”), formando uma massa compacta, sendo então mascada, sem engolir o sumo das folhas. Para alcoólatras, o xamã chega a utilizar cerca de 100 folhas, o que sugere que o álcool bloqueie os efeitos da salvinorina. Masca-se por cerca de 30 minutos ou até atingir o estado de consciência almejado. Os xamãs afirmam ser essencial manter o sumo das folhas na boca o máximo possível, podendo-se engoli-lo após o uso ou, ir engolindo o sumo bem lentamente, à medida que se for mascando. Em geral, afirma-se que a pessoa precisa de doses maiores nas primeiras vezes, pois, segundo a tradição xamã, ela tem que “soltar as amarras e aprender o caminho”. Caso sejam folhas secas, tem-se recomendado deixá-las de molho na água fria, pouco antes da mascagem, para que amoleçam e possam ser enroladas uma na outra.

Supondo uma pessoa com nível mediano de sensibilidade, tem se afirmado que 12 a 24 folhas frescas de Salvia Divinorum, mascadas por 30 minutos, são suficientes para obter um estado meditativo profundo. Neste método, o elemento psicoativo é assimilado pela língua, gengivas e demais tecidos bucais. Por isso não se deve engolir o sumo imediatamente, mas mantê-lo na boca pelo maior período de tempo possível. Relata-se que, neste método, os efeitos psicoativos iniciais começam após 15-20 minutos, aumentando pelos próximos 30min, quando então, gradualmente, vão se amenizando até terminar uma ou, no máximo, duas horas depois, quando a pessoa estará se sentindo totalmente normal.

No mercado, existem as “folhas fortificadas”, também denominadas extratos. São folhas comuns de Salvia Divinorum banhadas em solução de salvinorina na proporção de 5 vezes mais do que uma folha normal (5X), ou 10 vezes mais forte do que o normal (10X). Tem-se dito que elas são feitas para certas pessoas, denominadas “cabeças duras”, que têm pouca sensibilidade à folha natural da Salvia. Portanto, é importante verificar a sensibilidade de cada um, antes de utilizar as folhas fortificadas para incenso já que, muitas vezes, não seriam necessárias.Há também as tinturas ou essências de Salvia Divinorum, que são um composto alcoólico, assim como são certas gotas homeopáticas, com a diferença de que possuem uma maior concentração de álcool.

O que é um extrato de Salvia?

Extrato de Salvia é quando o princípio ativo, a salvinorina-A, é extraído da planta com o propósito de aumentar a concentração do mesmo. Por exemplo: Você pega 9 gramas de folhas de Salvia divinorume extrái a salvinorina que é depositada de volta em outro 1 grama de folhas. Então, esse outro 1 grama de folhas terá a potência aumentada em 10 vezes (9+1), daí o nome 10X. Resumindo, você terá colocado a quantia de salvinorina que existe em 10g de folhas em apenas 1g de folhas.Geralmente, esses extratos são divididos em Standardized Extracts(extratos padronizados) e Non-Standardized ou Crude Extracts (extratos não padronizados).Standardized Extracts (Extratos padronizados) : É aquele onde o princípio ativo – no caso a Salvinorina-A – é extraído da planta e isolado, pesado e então recolocado nas folhas secas em uma quantia específica. No caso de extratos de Salvia divinorum, 2.4mg é considerada a quantia padrão (standardized) para cada grama de folha seca. Por essa razão, se vc quiser elevar sua folha para 10x, você precisa colocar 24mg de extrato por grama de folha. Entretanto, essa quantidade pode variar de 0,8 a 3,6mg de Salvinorina-A por grama de folhas.

Partindo dessas informações, concluímos a quantidade de Salvinorina-A presente em cada grama de extrato STANTARDIZED (padrão – 2.4mg):

1g de Extrato 5X – 12mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 6X – 15mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 10X – 24mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 15X – 36mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 20X – 48mg de Salvinorina-A
Obs.: 1g de Extrato significa 1g de folhas secas picotadas onde foram adicionados de salvinorina.

Obs.: Foram usados os valores 5X, 6X, 10x, 15X e 20x, pois são os mais comumente encontrados. E também por serem os extratos mais seguros para uso, sendo que os mais fortes são perigosos.
Entretanto, como dito acima, a quantidade de Salvinorina-A em cada grama de folhas pode variar de 0,8 a 3,6mg. A maioria dos fabricantes de extratos trabalham com extratos de 3,6mg. Dessa maneira, confira a outra tabela baixo:Quantidade de Salvinorina-A presente em cada grama de extrato 3,6mg:1g de Extrato 5X – 18mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 6X – 21mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 10X – 36mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 15X – 54mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 20X – 72mg de Salvinorina-ANON-Standardized Extracts ou Crude Extracts (extratos não-padronizados): É feito socando-se as folhas em uma variedade de solventes para retirar/extrair a Salvinorina-A, e então a mistura é adicionada à outras folhas. Os problemas desse método são: uma boa parte da Salvinorina-A é perdida junto com os solventes; concentra uma grande parte de alcatrão e de outras substâncias nocivas; não queima tão bem quanto um Standardized; e não se tem noção da quantia exata do alcalóide por grama de folha, pois como dito acima varia de folha à folha.Quantidades usadas quando fumada:

Folhas normais de Salvia: de 1/2 a 1 grama.
Folhas de alto nível (High grade leaves): de 1/4 a 1/2 de grama.
Extrato de Salvia 5x: de 1/10 a 1/3 de grama.
Extrato de Salvia 6x: de 1/10 a 1/4 de grama.
Extrato de Salvia 10x: 1/10 de grama.
Extrato de Salvia 15x: 1/20 de grama.
Extrato de Salvia 20x: de 1/25 a 1/20 de grama..

—-> Segue alguns links com mais informações importantes sobre a “divina pastora”


Importante.

A Internet libertou as pessoas da informação tendenciosa e manipulativa que algumas redes de imprensa gostam de impor.
Através de suas revistas e programas de TV, clichês direcionados à parcela da população que busca conforto na ignorância, trata assuntos  recentes e importantes como a Sálvia Divinorum de forma superficial e longe da realidade. Dessa forma constroem “pseudo-verdades” psicológicas que são cuidadosamente inseridas no senso comum sob a máscara de “reportagens informativas”. Enquanto na verdade o que ocorre é o caminho inverso, pois não levam em consideração os fatos e registros de experiências, afastando o espectador da verdade, fazendo um trabalho de desinformação. São matérias arquitetadas com interesses específicos, que se aproveitam do medo que essas pessoas tem daquilo que não conhecem, não compreendem ou querem fingir que não existe.

Portanto, estejam sempre atentos ao que lhes é oferecido.
Pesquise sempre, se informe sempre, não aceite uma só informação, busque sempre mais informação. Questione! Questione até o que você acha que tem certeza. ….. busque sempre a experiência direta.