Autonomia e Alienação (Atualizado, 06/04)

Autonomia e Alienação, por Cornelius Castoriadis, ” A Instituição Imaginária da Sociedade”, p.122-124.

Sentido da Autonomia.  – O Indivíduo

Se a autonomia está no âmago dos objetivos e dos caminhos do projeto revolucionário, é necessário precisar e elucidar esse termo. Tentaremos essa elucidação primeiro onde ela aparece mais fácil: a propósito do indivíduo, passando em seguida ao plano que mais interessa aqui, o plano coletivo. Tentaremos compreender o que é o indivíduo autônomo – e o que é uma sociedade autônoma ou não alienada.

Freud propunha como máxima da psicanálise “Onde era o Id, será o Ego” – “Seu objeto (dos esforços terapeuticos da psicanálise) é de reforçar o Ego (o eu consciente), de torná-lo mais independente do Superego, de ampliar seu campo de visão estendendo sua organização de tal maneira que ele possa apoderar-se de novas regiões do Id. Onde era Id será o Ego.” – Ego é aqui, numa primeira aproximação, o consciente em geral. O Id, propriamente falando, origem e lugar das pulsões (“instintos”), deve ser tomado nesse contexto como representando o inconsciente num sentido mais amplo. Ego, consciência e vontade, deve tomar o lugar da forças obscuras, que, “em mim”, dominam, agem por mim – “atuam-me” como dizia G. Groddeck. Essas forças não são simplesmente – não são tanto, voltaremos a isto mais adiante – as puras pulsões, libido ou pulsão de morte; são sua interminável, fantasiosa e fantastica alquimia, são também, e sobretudo, as forças de formação e de repressão inconscientes, o Superego e o Eu inconsciente. Uma interpretação da frase torna-se de imediato necessária. O Ego deve tomar o lugar do Id – isso não pode significar nem a supressão das pulsões, nem a eliminação ou a reabsorção do inconsciente. Trata-se de tomar de seu lugar na qualidade de instância de decisão. A autonomia seria o domínio do consciente sobre o inconsciente. Sem prejuízo da nova dimensão em profundidade revelada por Freud, este é o programa de reflexão filosófica sobre o indivíduo há vinte e cinco séculos, o pressuposto e ao mesmo tempo o resultado da ética tal como a viram Platão ou os estóicos, Spinoza ou Kant. (É em si uma imensa importância, porém não para esta discussão, que Freud proponha uma via eficaz para atingir o que permaneceu para os filósofos um “ideal” acessível em função de um saber abstrato). Se à autonomia, a legislação ou a regulação por si mesmo, opomos a heteronomia, legislação e regulação pelo outro, a autonomia é minha lei, oposta à regulação pelo inconsciente que é uma lei outra, a lei de outro que não eu.

Em que sentido podemos dizer que a regulação pelo inconsciente é a lei de um outro? De qual outro? De um outro literal, não de um “outro Eu” desconhecido, mas de um outro em mim. Como diz Jacques Lacan, “O inconsciente é o discurso do Outro”; é em grande parte, o depósito dos desígnos, dos desejos, dos investimentos, das exigências, das expectativas – significações de que o indivíduo foi o objeto, desde sua concepção, e mesmo antes, por parte dos que o engendraram e criaram. A autonomia torna-se então: meu discurso deve tomar o lugar do discurso do Outro, de um discurso estranho que está em mim e me domina: fala por mim. Esta elucidação indica de imediato a dimensão social do problema (pouco importa que o Outro de que se trata no início seja o outro “estreito”, parental; por uma série de articulações evidentes, o par parental remete, finalmente, à sociedade inteira e à sua história).

Mas qual é esse discurso do Outro não mais quanto a sua origem, mas quanto a sua qualidade? E até que ponto pode ser eliminado?

A característica essencial do discurso do Outro, do ponto de vista que aqui interessa, é sua relação com o imaginário. É que, dominado por esse discurso, o sujeito se toma por algo que não é  ( que, de qualquer maneira não é necessariamente para si próprio) e para ele os outros e o mundo inteiro sofrem uma deformação correspondente. O sujeiro não se diz, mas é dito por alguém, existe pois como parte do mundo de um outro (certamente, por sua vez, travestido). O sujeito é dominado por um imaginário vivido como mais real que o real, ainda que não sabido como tal, precisamente porque não sabido como tal. O essencial da heteronomia ou da alienação, no sentido mais amplo do termo – no nível individual, é o domínio por um imaginário autonomizado que se arrojou a função de definir para o sujeito tanto a realidade como o seu desejo. O Jogo Do Bicho é um jogo de loteria com uma história rica e um dos passatempos preferidos do Brasil. Neste jogo, os utilizadores têm a oportunidade de apostar numa variedade de animais, sendo cada animal associado a um grupo único de números. Review do caça-níquel Jogo Do Bicho https://jogodobichooficial.com .A jogabilidade foi pensada para os usuários poderem escolher até cinco animais diferentes em uma única aposta. Veja como o jogo se desenrola:

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Se quiserem depois eu posto a continuação do texto, que é bem grande.

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CONTINUAÇÃO

A “repressão das pulsões” como tal, o conflito entre o “princípio do prazer” e o “princípio da realidade”, não constituem a alienação individual que é, no fundo, o império quase ilimitado de um princípio de des – realidade. A esse respeito o conflito importante não é o que ocorre entre pulsões e realidade (se esse conflito bastasse como causa patogênica, jamais teria havido uma só resoluçõ mesmo aproximativamente normal do complexo de Édipo desde a origem dos tempos e jamais um homem e uma mulher teria andado sobre a terra). É o conflito entre pulsões e realidade, de um lado, e a elaboração imaginária no interior do sujeito, de outro lado.

O Id, nesta máxima de Freud, deve pois ser compreendido como significando essencialmente esta função do insconsciente que investe de realidade o imaginário, autonomiza-o conferindo-lhe poder de decisão – estando o conteúdo deste imaginário em relação com o discurso do Outro (“repetição”, mas também transformação amplificada desse discurso).

É pois lá onde estava essa função do inconsciente, e o discurso do Outro que fornece seu alimento, que o Ego deve advir. Isso significa que meu discurso deve tomar o lugar do discurso do Outro. Mas o que é o meu discurso? O que é um discurso que é meu?

Um discurso que é meu é um discurso que negou o discurso do outro; que o negou, não necessariamente em seu conteúdo, mas enquanto discurso do Outro; em outras palavras que, explicitando ao mesmo tempo a origem e o sentido desse discurso, negou-o ou afirmou-o com conhecimento de causa, relacionando seu sentido com o que se constitui como a verdade própria do sujeito – como minha própria verdade.

Se a máxima de Freud, nesta interpretação, fosse tomada em termos absolutos, ela proporia um objetivo inacessível. Nunca meu discurso será integralmente meu no sentido definido acima. É que evidentemente, eu não poderei jamais retomar tudo, ainda que simplesmente para ratificá-lo. É também  – e voltaremos a isto mais adiante – porque a noção de verdade prórpia do sujeito é em si mesma muito amis um problema do que uma solução.

Isso é também verdade no que se refere à relação com a função imaginária do inconsciente. Como pensar num sujeito que teria totalmente “reabsorvido” sua função imaginária, como poderíamos esgostar essa fonte no mais profundo de nós mesmos, de onde brotam ao mesmo tempo fantasias alienantes e criações livres, mas mais verdadeiras que a verdade, delírios irreais e poemas surreais, esse duplo fundo eternamente recomeçado de toda coisa, sem o qual nada teria fundo, como eliminar o que está na base de, ou pelo menos inextricavelmente ligado a, o que faz de nós homens – nossa função simbólica, que pressupõe nossa capacidade de ver e pensar em uma coisa algo que ela não é?

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Portanto, na medida em que não queremos fazer da máxima de Freud uma simples idéia reguladora definida em referência a um estado impossível – portanto uma nova mistificação – existe um outro sentido a dar-lhe. Ela deve ser compreendida como remetendo não a um estado concluído, mas a uma situação ativa; não a uma pessoa ideal que se tornaria Ego definitivamente, realizaria um discurso exclusivamente seu, jamais produziria fantasmas – mas a uma pessoa real, que não para seu movimento de retomada do que havia sido adquirido, do discurso do Outro, que é capaz de revelar seus fantasmas como fantasmas e não se deixe finalmente ser dominada por eles – a menos que assim o deseje. Não se trata aí de um simples “tender para”, é uma situação, ela é definível por características que traçam uma separação radical entre ela e o estado de heteronomia (ordem de fora, do outro, opressão). Essas características não consistem em uma “tomada de consciência” efetuada para sempre, mas sim uma outra relação entre consciente e inconsciente, entre lucidez e função imaginária, em uma outra atitude do sujeito relativamente a si mesmo, em uma modificação profunda da mistura atividade-passividade, do signo sob o qual esta se efetua, do respectivo lugar dos dois elementos que a compõem. O fato de que poderíamos completar a proposição de Freud pelo seu inverso: onde é o Ego o Id deverá surgir, mostra quão pouco se trata, em tudo isso, de uma tomada de poder pela consciência no sentido estrito. O desejo, as pulsões – quer se trate de Eros ou de Thanatos – sou eu também, e trata-se de levá-los não somente à consciência, mas à expressão e à existência. Um sujeito autônomo é aquele que sabe ter boas razões para concluir: isso é bem verdadeiro, e: isso é bem meu desejo.

A autonomia não é pois elucidação sem resíduo e eliminação total de discurso do Outro não reconhecido como tal. Ela é instauração de uma outra relação entre o discurso do Outro e o discurso do sujeito. A total eliminação do discurso do Outro não reconhecido como tal é um estado não-histórico. O peso do discurso de Outro, não reconhecido como tal, pode ser visto mesmo nos que tentaram mais radicalmente atingir o fundo da interrogação e da crítica dos pressupostos tácitos – quer seja Platão, Descartes, Kant, Marx ou o próprio Freud. Mas existem precisamente o que – como Platão ou Freud – jamais pararam nesse movimento; e existem os que pararam, e que às vezes, por isso, se alienaram em seu próprio discurso tornado outro. Existe a possibilidade permanente e permanentemente atualizável de olhar, objetivar, colocar a distância e finalmente transformar o discurso de Outro em discurso do sujeito.

Mas o que é esse sujeito? Este terceiro termo da frase de Freud que deve advir de lá onde estava o Id, certamente não é o Eu do “eu penso”. Não é o sujeito-atividade pura, sem entrave nem inércia, êste fogo-fátuo dos filósofos subjetivistas, esta flama independente de qualquer suporte, liame e alimento.

A pesquisa interdisciplinar da Ayahuasca e do DMT

por Marcelo Bolshaw Gomes

Nos últimos anos o fenômeno social e religioso do Ayahuasca, devido a sua enorme complexidade, vem atraindo vários pesquisadores de diferentes especialidades: antropólogos, juristas, psicólogos, biólogos, farmacêuticos, entre outros. Poucas pesquisas, no entanto, alcançam uma visão interdisciplinar de conjunto, se prendendo as particularidades de seu enfoque específico. Por exemplo, há hoje pesquisas de etno-música e de lingüística sobre a poética investigando os cantos do ayahuasca sem se preocupar com sua química ou com suas interações sociais dos cultos atuais. O presente texto pretende fazer uma introdução resumida destes estudos específicos, não só para orientação dos que se iniciam neste assunto multifacetado, mas, sobretudo, para tentar sistematizar de um modo mais abrangente, os resultados dessas diferentes investigações científicas em uma perspectiva interdisciplinar comum.

A PESQUISA NA ÁREA DA ANTROPOLOGIA
A bebida conhecida como Ayahuasca ou Iagé é preparada através da infusão do cipó do Jagube ou Mariri (Banisteriopsis caapi) e da folha da Rainha ou Chacrona (Psychotria viridis) – naturais da região amazônica. A bebida teria origem do Império Inca e seu uso teria se difundido entre várias tribos indígenas, das quais se tem razoável conhecimento antropológico. Ingerindo o chá, os índios absorvem o espírito da planta e, em transe, têm experiências psíquicas e vivenciam fenômenos paranormais, tais como a telepatia, a regressão a vidas passadas, contatos com os espíritos dos seus antepassados mortos, presciência e visão à distância. Há relatos de xamãs usavam a bebida para descobrir qual era a doença de seus pacientes e saber como tratá-la. Diversos antropólogos, inclusive, tomaram o chá e descreveram seus efeitos parapsíquicos.
Ainda hoje, várias tribos praticam rituais com o uso do Ayahuasca no Brasil, como as dos Kampas e dos Kaxinawás, localizadas perto da fronteira com o Peru. Desde o início do século, nos contatos culturais entre seringueiros e índios, a Ayahuasca passou a ser usada pelos migrantes nordestinos, que colonizaram a Amazônia ocidental. Destes contatos surgiram diversos grupos que associaram o uso da bebida a um contexto religioso cristão-espírita, dos quais a União do Vegetal, no estado de Rondônia, o Santo Daime e a Barquinha, no Acre, são os maiores expoentes.

Na Internet, é possível levantar bastante informação sobre o assunto em sites especializados(2). Também é possível ler alguns importantes trabalhos científicos em arquivos pdf. Dentre as diferentes opções, indicamos a tese de doutorado de Sandra Lucia Goulart, Contrastes e Continuidades em uma Tradição Amazônica: as religiões da ayahuasca, dá uma visão panorâmica dos cultos atuais. Especificamente sobre o culto da Barquinha, há o trabalho de Marcelo Simão Mercante, Ecletismo, Caridade e Cura na Barquinha da Madrinha Chica e Ensaio sobre a cura no contexto de um grupo da Barquinha , de Rafael Guimarães dos Santos.
Sobre a história da União do Vegetal (UDV), há poucos trabalhos acadêmicos, mas, na internet, existem pelo menos dois documentos relevantes: um com a versão oficial da entidade e outro com uma visão mais histórica.

Já sobre o Santo Daime, há muita coisa escrita e publicada, sugerimos o trabalho de Débora Carvalho Pereira Gabrich, O Trabalho oculto e exotérico de Raimundo Irineu Serra, sobre as origens do culto e de Armênio Celso de Araújo, Teodicéia Brasileira: Uma Breve História do Santo Daime sobre seu desenvolvimento. Há ainda alguns trabalhos antropológicos sobre aspectos específicos, que transversalmente alcançam patamares universais, como o de Leandro Okamoto da Silva Marachimbé veio foi para apurar. Estudo sobre o castigo simbólico, ou peia, no culto do Santo Daime(3) ou de Arneide Bandeira Cemin, O “Livro Sagrado” do Santo Daime .

Um dos trabalhos antropológicos mais significativos é o pioneiro Guiado pela Lua – Xamanismo e uso ritual da ayahuasca no culto do Santo Daime, de Edward MacRae (1992). Atualmente, há também os livros de Beatriz Caiuby Labate (4): O Uso Ritual da Ayahuasca (2002, em conjunto com Wladimyr Sena Araújo), A Reinvenção do Uso da Ayahuasca nos Centros Urbanos (2004) e O Uso Ritual das Plantas de Poder (2005, em conjunto com Sandra Goulart).

No âmbito internacional, destacamos o trabalho de pesquisa interdisciplinar desenvolvido por Ralph Metzner, Ayahuasca – Human Consciousness and the Spirit of Nature (Tradução Márcia Frazão: Gryphus, 2002). O livro é subdividido em quatro partes: a experiência da Ayahuasca (composta por 25 depoimentos pessoais de pesquisadores com ênfase em descobertas espirituais fora dos paradigmas religiosos tradicionais): Ayahuasca: uma história etnofarmacológica, de Denis Mckenna; A psicologia da Ayahuasca, de Charles S. Grob; e Fitoquímica e neurofarmocologia da Ayahuasca, de Jace C. Callaway. Além, da introdução e conclusão do próprio Metzner, sintetizando os resultados dos textos da coletânea, há também uma revisão histórica completa dentro de um contexto mais amplo da pesquisa da consciência e a espiritualidade.

A PESQUISA NA ÁREA DO DIREITO

Paralelamente ao crescimento dos cultos e à expansão do uso religioso da Ayahuasca, uma forte resistência dos setores conservadores da sociedade brasileira se formou, pressionando o governo para embargar o funcionamento destas instituições nos grandes centros metropolitanos. Porém, no dia dois de junho de l992, o conselho decidiu liberar definitivamente a utilização do chá para fins religiosos em todo o território nacional. Segundo a então presidente do Conselho Federal de Entorpecentes (Confen), Ester Kosovsky, “a investigação, desenvolvida desde l985, baseou-se numa abordagem interdisciplinar, levando em conta o lado antropológico, sociológico, cultural e psicológico, além de análises fitoquímicas”.

O relator do processo de investigação, Domingos Carneiro de Sá, explicou que o fato fundamental para a liberação da bebida foi o comportamento dos daimistas e a seriedade dos centros que utilizam o chá em seus rituais: “Não foram observadas atitudes anti-sociais dos participantes dos cultos, ao contrário, podemos constatar os efeitos integrados e reestruturantes do Daime com indivíduos que antes de participarem dos rituais apresentavam desajustes sociais ou psicológicos”. (SILVA SÁ, Domingos Bernardo Gialluisi. Ayahuasca, a consciência da expansão, in: Discursos sediciosos. Crime, Direito e Sociedade. Rio de Janeiro, Instituto Carioca de Criminologia, 1996, pp. 145-174).

DATA / DOCUMENTO
30/07/1985 RESOLUÇÃO Nº 4 DO CONFEN
04/02/1986 RESOLUÇÃO Nº 6 DO CONFEN
31/01/1986 PARECER DO CONFEN SUBMETIDO À PLENÁRIA
17/08/1998 PORTARIA Nº 117 DO IBAMA
24/11/1991 CARTA DE PRINCÍPIOS DAS ENTIDADES
02/06/1992 ATA DA 5ª REUNIÃO ORDINÁRIA – CONFEN
16/10/2001 PORTARIA Nº 4 DO IBAMA
04/11/2004 RESOLUÇÃO Nº 5 DO CONAD
17/08/2004 PARECER DO CATC
30/05/2006 COMPOSIÇÃO DO GMT-CONAD
e 06/11/2006 RELATÓRIO FINAL DO GMT-CONAD
Fonte: ayahuascabrasil

Com a expansão do Ayahuasca para outros países, surgiram questões jurídicas internacionais referentes a utilização e transporte da bebida. Dentre os vários processos de legalização, uma referência internacional importante é o texto Religious Freedom and United States Drug Laws: Notes on the UDV-USA Legal Case (MEYER, 2005). O site do Santo Daime na Itália também disponibiliza uma página com literatura jurídica internacional, com material sobre vários países.

A PESQUISA NA ÁREA DA BIOLOGIA

O Projeto Hoasca foi uma iniciativa organizada pela União do Vegetal (UDV) sobre a toxidade do Ayahuasca do ponto de vista clínico. Durante o verão de 1993, um grupo multinacional de pesquisadores biomédicos dos Estados Unidos, Finlândia e Brasil encontrou-se em Manaus para conduzir o mais completo exame dos efeitos bioquímicos e psicológicos da bebida. Participaram desta pesquisa interdisciplinar: Grob; McKenna; Callaway; Strassman, entre outros. Mas, além dos resultados atestando a baixa toxicidade do Ayahuasca para usuários de longo prazo, o Projeto Hoasca também deslocou o foco da pesquisa interdisciplinar da bebida para neuroquímica de seus principíos psicoativos, principalmente a DMT.

N,N-DMT ou N,N-dimetiltriptamina (C12H16N2) é um psicoativo que causa intensa emergência visual quando fumado, injetado ou ingerido oralmente. Na Ayahuasca, está presente na folha Psychotria viridis e em combinação com as enzimas MAOI (harmina e harmalina) existentes no cipó Banisteriopsis caapipermite um mais efeito prolongado e potencializado do que se utilizado sozinho em altas dosagens sem inibidores. N,N-DMT é muito chamou freqüentemente só “DMT”, embora este nome cause confusão algumas vezes com seu primo químico 5-MeO-DMT. A DMT é também um neurotransmissor químico presente naturalmente no corpo humano bem como em plantas muitas e em outros mamíferos. Não há registros que ele cause dependência física ou psicológica, mas há contra-indicações: os efeitos do N,N-DMT são dramaticamente aumentado se usados em altas dosagens (fumado, por exemplo) por indivíduos usando MAOIs. MAOIs são enzimas comumente encontradas nos anti-depressivos (phenelzine, tranylcypromine, isocarboxazid, l-deprenyl e moclobemide). Indivíduos propensos à esquizofrenia, com tendências à psicose depressiva ou ainda em estado emocional vulnerável devem ter cuidado com a DMT pois ela pode funcionar como um ‘gatilho’ para a manifestação desses desequilíbrios. Hoje, na internet, encontram-se alguns sites com informação detalhada sobre a substância (http://dmt.lycaeum.org/ ehttp://www.erowid.org/chemicals/dmt/dmt.shtml).

A DMT e as beta-carbolinas são similares em sua estrutura molecular a Serotonina, um neurotransmissor responsável por vários processos cognitivos. Isto levou a uma série de especulações sobre qual seriam os efeitos do Ayahuasca em nosso organismo?
Para Ralph Miller(5), por exemplo, em Ayahuasca – Universidade de Gaia:

A Pineal irá produzir DMT em grandes quantidades em pelo menos dois momentos das nossas vidas: no nascimento e na morte. Talvez ela prepare a chegada e a partida da alma. Pessoas que experimentam “situações de quase morte” – vendo luzes fortes, portais, ícones religiosos – relatam efeitos semelhantes aos das experiências com DMT. As moléculas de DMT são similares às moléculas da Serotonina e se encaixam nos mesmos receptores do cérebro. Isto é extraordinário porque, assim como a Serotonina, a DMT é uma chave específica que naturalmente se encaixa nesta “trava” do cérebro. Assim, você tem a DMT se encaixando aos receptores do cérebro, o que produz visões, enquanto as propriedades pró-Serotonina e pró-Dopamina do chá criam um estado de alerta e receptividade.

Do ponto de vista científico, há várias hipóteses sobre o papel da DMT no cérebro humano. Uma hipótese é de que esta substância estaria relacionada com a manifestação da esquizofrenia e dos distúrbios psicóticos. No entanto, ao se encontrar níveis semelhantes de DMT em sujeitos sadios e em esquizofrênicos, esta hipótese vem sendo abandonada. (FISCHMAN, 1983). Outra hipótese, postulada por Richard Strassman em seu livro, A Molécula do Espírito, diz que a DMT é produzida pela glândula Pineal e está relacionada com experiências de “pico” (nascimento, experiências de quase-morte, morte etc). Uma terceira hipótese feita por Callaway, que se relaciona com as duas primeiras, é que a DMT está relacionada com a regulação do sono, especificamente, na produção das imagens nos sonhos: o sono REM. Neste caso, se a DMT fosse produzida em excesso poderia ocasionar alucinações.

Atualmente, várias pesquisas investigam a utilização de medicamentos a base de DMT para tratamento químico de depressão, neuroses, fobias, síndromes neurológicas, bem como sua utilização como potencializador da consciência em processos terapêuticos psicológicos.

A PESQUISA NA ÁREA DA PSICOLOGIA

Enquanto os pesquisadores das áreas biológicas dão um enfoque enquadrado particularmente aos efeitos químicos da DMT no cérebro, os pesquisadores das áreas clínicas e psicológicas estudam a mudança nos estados de consciência e de percepção, distribuindo sua atenção em três fatores: a bebida, o ambiente (setting) e a intenção (set. A hipótese denominada em inglês de ‘set and setting’, formulada inicialmente por Timothy Leary com LSD nos anos 60, foi adotada pela maioria dos pesquisadores da área. A hipótese afirma que o conteúdo de uma experiência com substancia psicoativa é uma resultante da interação desses três fatores básicos.

Charles S. Grob, também participante do Projeto Hoasca, fez a mais ampla revisão bibliográfica sobre o Ayahuasca na área da psicologia clínica e neuro-psiquiatria (METZNER, 2002, p. 195) e considera a hiper-sugestionabilidade como um dos efeitos psico-químicos, detalhando o aspecto ambiental (setting) em vários fatores (o papel do líder, do grupo, do local). Ele é um dos pesquisadores que concluem que “o contexto, o roteiro e o propósito” são mais importantes do que os efeitos químicos de substância psicoativas (nos processos de “cura” e de autoconhecimento propiciados pela bebida).

Em relação às características dos estados de consciência quimicamente alterados pelo Ayahuasca, Grob aponta: a) Diminuição ou expansão da consciência reflexiva, com alterações de pensamento, mudanças subjetivas na concentração, na atenção, na memória e no julgamento podem ser induzidas voluntariamente em vários níveis de uma mesma experiência. b) Aumento da imaginação visual. Grob também identifica, dentre as experiências de milhares usuários entrevistados, várias recorrências psicológicas durante o transe: medo de perder o controle; resistência do ego (bad trip) e transcendência para estados místicos (entrega); aumento da expressão emocional – tristeza, alegria, desespero, fé; entre outras menos freqüentes.

Bastante significativa é a descrição do transe feita pelo Dr. Regis Barbier, no artigo Ayahuasca como opção espiritual (6)

A Ayahuasca revela que o conhecimento que temos do mundo, da existência, é um estado ou processo psicossomático. (…) A percepção, habitualmente embotada, permite apenas aprender e acessar uma fração distorcida de realidade; uma realidade revestida de projeções pessoais e pressuposições. (…) A Ayahuasca amplifica a capacidade psicossomática de responder a gradações mais sutis de estímulos além de muitas vezes integrar as diversas faculdades sensoriais em processos sinestésicos. Esse efeito de aumentar a capacidade de experienciar, de avaliar e apreciar por si mesmo, é central para a compreensão do seu significado. Esta amplificação, como uma lupa, permite uma (re)visitação intensiva e absorta dos conteúdos mentais – recordações, idéias, fantasias, pensamentos, emoções, medos, esperanças, sensações em gerais. Na dependência da ética e valores morais atuais do indivíduo, além de influir na intensidade e no foco das percepções, a experiência pode motivar a re-significação dos conteúdos sendo observados. Valores morais e atitudes são revistas. Aqui temos uma tecnologia que alterando a composição bioquímica do instrumento e dos meios de processamento da informação, permite a inativação temporária dos filtros culturais e psicodinâmicos que nos bastidores da mente agem determinando, formatando e hierarquizando, nossas experiências quotidianas. Pode se de fato aprender muito, crescer e liberar energia psíquica e vendo, transformando, eliminando, aceitando e se reconciliando com conteúdos incômodos. (…) O grande valor da Ayahuasca, trazidos à nossa atenção pelas sociedades indígenas, é que ela dissolve os limites da mente inconsciente; ela dá acessos aos conteúdos reprimidos e esquecidos. Ela possibilita o reconhecimento das configurações universais da psique, os arquétipos de humanidade, junto com um leque mais abrangente de conhecimentos e maneiras de conscientizar, até eventualmente a vivência dos diversos aspectos da união mística. Na medida em que o indivíduo consegue ver as coisas de uma maneira não distorcida, vendo claramente não apenas o seu passado mais também a presunção e cegueira da sua própria cultura e grupos de referencias, ele necessita, além de tolerar a decepção e o sofrimento, superar sentimentos de desamparo. Nem sempre é fácil ter de ver e aceitar que não somos assim tão vítimas, mas sim responsáveis pelas nossas vidas; aceitar ser capaz, reconhecer o seu potencial e a responsabilidade que isso requer implica coragem e determinação. Podemos até recusar crer que fazemos jus a muita beleza e alegria, bem estar profundo, sem nada ter de pagar além de ser o que já se é; apenas sendo o que já somos. O gerenciamento emocional produtivo dessa reavaliação, a reorganização psíquica, implica um grau suficiente de equilíbrio e bom senso para que se tomam atitudes judiciosas sem precipitações.

Outra grande contribuição ao estudo psicológico do Ayahuasca é o trabalho de Benny Shanon, O Conteúdo das Visões da Ayahuasca, em que além de trabalhar um levantamento das imagens das mirações e da hipótese de aceleração e desaceleração da percepção do tempo durante o transe, se discute também a pesquisa da mente através do ayahuasca (e não mais o efeito da ayahuasca na mente humana).

Shanon já havia escrito sobre o Ayahuasca como instrumento de investigação da mente (in LABATE, 2002; pág. 631), através dos parâmetros teóricos da psicologia cognitiva. Para ele, há questões fenomenológicas de primeira ordem (o que está sendo experimentado?) e de segundo ordem (Há uma ordem e um sentido no que está sendo experimentado?). Há também questões de dinâmica, de contexto e teóricas gerais a serem discutidas sobre o uso do Ayahuasca. Por exemplo, em relação às questões fenomenológicas de primeira ordem, Shanon distingue as questões de conteúdo das de domínio e de estrutura. Assim, felinos, pássaros e répteis são as imagens mais recorrentes nos transes, seguidos de perto pelos palácios, tronos e imagens arquitetônicas celestiais.

serpientes21A pesquisa destaca que as imagens são ‘universais da mente’ (semelhantes ao que Jung chamou de arquétipos), pois surgem em indivíduos sociais e culturalmente diferentes. Esses conteúdos podem surgir de diferentes formas ou domínios e o encadeamento dessas formas com estes conteúdos forma estruturas narrativas paralelas aos rituais. E Shanon entrevê, através deste sistema cognitivo de conteúdos/domínios, os parâmetros estruturais da consciência e destaca pelo menos quatro aspectos relevantes em relação ao efeito do Ayahuasca: a percepção do pensamento como uma cognição coletiva, a indistinção entre o interior e o exterior, e as experiências desindentificação pessoal e de tempo não-linear. Ou seja: quando tomam Ayahuasca as pessoas percebem que seus pensamentos não são individuais, mas sim ‘recebidos em rede’ (a mente como um rádio); que não existe a distinção entre o sensorial e o sensível; podem se transformar em animais (jaguares e águias são freqüentes) ou em outras pessoas; e finalmente percebem o transcorrer do tempo de forma desigual, em que alguns segundos demoram séculos e horas se sucedem rapidamente e em que alguns momentos se experimentam a simultaneidade (ou a sensação de eternidade) temporal. Quando baixamos arquivos no computador, pode-se perceber que alguns segundos demoram mais que outros, em função do peso do arquivo e da aceleração da conexão da internet. O que Shanon suspeita é que o mesmo acontece com o cérebro, mas só é perceptível sob o efeito do Ayahuasca.

Acredito que o desenvolvimento das pesquisas na área da psicologia se dará a partir do aprofundamento neurocientífico das teses de Shanon. Ou seja: não apenas estudar o efeito químico da substância no organismo, mas, sobretudo, compreender quais dimensões de consciência que este efeito propicia (telepatia, regressões mentais a traumas infantis, visualização de imagens do inconsciente profundo, mudanças na percepção do tempo e da realidade). Além de investigar o efeito da DMT no cérebro, observando o aspecto reverso, estudar a mente através da DMT – este será o propósito central das pesquisas psicológicas da ayahuasca.

ANTEPROJETO

Além, de pesquisas psicológicas, antropológicas, jurídicas e biológicas (incluindo aqui estudos neuroquímicos, farmacêuticos e clínicos), há também várias pesquisas sobre a música das cerimônias, a poesia dos cantos, as danças do ritual, a arquitetura dos templos, enfim, toda descrição semiótica e lingüística da arte dos cultos, bem como suas concepções doutrinárias. Nosso objetivo aqui, como dissemos no começo, é o de introduzir as diferentes investigações sobre a ayahuasca, buscando observar o que cada tem de essencial em relações às demais. Mais do que uma síntese entre essas pesquisas, o que se pretende é o de estabelecer uma atualização sistemática dessas investigações e observar as suas inter-relações. Teríamos, assim, nesta perspectiva, uma pesquisa interdisciplinar do Ayahuasca cinco linhas específicas de observação e acompanhamento: Antropologia, Direito internacional, Biologia (subdividido em várias áreas), Psicologia e Comunicação Social. Cada linha de pesquisa deve ser coordenada por doutor e, na prática, consistiria na investigação e na sistematização de um aspecto específico da pesquisa inter-disciplinar.

O projeto inter-disciplinar de pesquisa do Ayahuasca e da DMT prevê ainda: a) realização de encontros anuais em diferentes universidades e centros de estudos, em que os pesquisadores, organizados em Grupos de Trabalho segundo as linhas de pesquisa, apresentarão artigos e resenhas sobre a literatura internacional sobre o tema; e b) a criação de uma publicação acadêmica nacional, impressa e na internet, com a produção científica dos pesquisadores e informações sobre as pesquisas internacionais semelhantes

Notas:

(1) Marcelo Bolshaw Gomes < marcelobolshaw@ufrnet.br> é jornalista, professor de comunicação e doutor em ciências sociais pela UFRN, mas o presente texto é resultado da interação de vários pesquisadores através da lista:http://br.groups.yahoo.com/group/pesquisadores_da_ayahuasca/.

(2) V. principalmente www.santodaime.org; www.ayahuasca.com e http://yage.net/

(3) Há um capítulo especialmente interessante: A Peia de todos e a peia de cada um.

(4) Mestre e doutoranda em Antropologia Social pela Unicamp, pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos e coordenadora do instituto Alto das Estrelas .

(5) Tradução: Sergio Garcia Paim, originalmente publicado em

(6) Originalmente publicado no site: http://www.panhuasca.org.br

ADKINS E.M., BARKER E.L. & BLAKELY R.D.
2001 – Interactions of Tryptamine Derivatives with Serotonin Transporter Species Variants Implicate Transmembrane Domain I in Substrate Recognition . Molecular Pharmacology 59:514–523, 2001.

AGURELL, S.
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Evelyn Doering Silveira.   AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA DE ADOLESCENTES QUE CONSOMEM CHÁ DE AYAHUASCA EM CONTEXTO RITUAL RELIGIOSO – 01/12/2003
Laura Pérez Gil.   Pelos caminhos de Yuve: conhecimento cura e poder no xamanismo Yawanawa – 01/11/1999
Alberto Groisman.   “EU VENHO DA FLORESTA”: ECLETISMO E PRAXIS XAMANICA NO “CEU DO MAPIA”. – 01/01/1991
Antonio Henrique Fonseca Romero.   Autopoise e Educação no Movimento do Santo Daime – 01/10/2004
Beatriz Caiuby Labate.   “A reinvenção do uso da ayahuasca nos centros urbanos” – 01/04/2000
Eliseu Labigalini Júnior.   O USO DE AYAHUASCA EM UM CONTEXTO RELIGIOSO POR EX-DEPENDENTES DE ÁLCOOL – UM ESTUDO QUALITATIVO – 01/06/1998
Fernando de La Rocque Couto.   SANTOS E XAMAS: ESTUDOS DO USO RITUALIZADO DA AYAHUASCA POR CABOCLOS DA AMAZONIA E EM PARTICULAR NO QUE CONCERNE SUA UTILIZACAO SOCIO-TERAPEUTICA NA DOUTRINA DO SANTO DAIME – 01/06/1989
Leandro Okamoto da Silva.   Marachimbé Chegou Foi Para Apurar. Estudo Sobre o Castigo Simbólico, ou Peia, no Culto do Santo Daime. – 01/09/2004
Leonor Ramos Chaves.   A MULHER URBANA NO SANTO DAIME: Entre o modelo arcaico e o moderno de feminino – 01/11/2003
Maíra Teixeira Pereira.   ARQUITETURA COMO UM MICROCOSMO: RELIGIOSIDADE E REPRESENTAÇÃO DO ESPAÇO NA COMUNIDADE DO MATUTU-MG – 01/04/2003
Mara Rosane Coelho Teixeira.   EM RODA DOS MENINOS: UM ESTUDO DA VISÃO DE MUNDO CONSTRUÍDA PELAS CRIANÇAS NA COTIDIANIDADE DA DOUTRINA DO SANTO DAIME NA VILA CÉU MAPIÁ/AM -2003 – 01/06/2004
Maria Cristina Pelaez.   “NO MUNDO SE CURA TUDO: INTERPRETAÇÕES SOBRE A ‘CURA ESPIRITUAL’ NO SANTO DAIME” – 01/12/1994
Maria de Fátima Henrique de Almeida.   Santo Daime: a colônia cinco mil e a contracultura (1977-1983) – 01/08/2002
Paulo César Ribeiro Barbosa.   Psiquiatria cultural do uso ritualizado de um alucinógeno no contexto urbano: uma investigação dos estados de consciência induzidos em moradores de São Paulo pela iniciação ao consumo da Ayahuasca no Santo Daime e União Vegetal – 01/08/2001
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Rosana Martins de Oliveira.   DE FOLHA E CIPÓ É A CAPELINHA DE SÃO FRANCISCO: A RELIGIOSIDADE POPULAR NA CIDADE DE RIO BRANCO – ACRE (1945-1958) – 01/08/2002
Sandra Lúcia Goulart.   AS RAÍZES CULTURAIS DO SANTO DAIME – 01/05/1996

O Eu e o Inconsciente – C.G.Jung

Segue abaixo um trecho editado do capítulo “A persona como segmento da psique coletiva” extraído do livro “O Eu e o Incosciente” de C. G. Jung

Neste capítulo abordaremos um problema que, se negligenciado, causará a maior confusão. Mencionei antes que, na análise do inconsciente pessoal, a primeira coisa a ser acrescentada à consciência é constituída por conteúdos pessoais; sugeri que tais conteúdos reprimidos podem ser conscientizados, representando o que poderíamos chamar de inconsciente pessoal. Mostrarei também que, através da anexação das camadas mais profundas do inconsciente, para os quais propus o nome de inconsciente coletivo, se produz uma ampliação da personalidade, que pode levar à inflação. Tal estado ocorre mediante o mero prosseguimento do trabalho analítico, como no caso antes citado. Continuando a análise, acrescentamos à consciencia pessoal certas qualidades básicas e impessoais da humanidade, fato este que desencadeia a inflação descrita anteriormente e que pode ser encarada como uma das consequências desagradáveis da plena conscientização. (1) A consciência pessoal é mais ou menos um segmento arbitrário da psique coletiva.

1. Este fenômeno decorrente da expansão da consciência não é de forma alguma específico do tratamento analítico, mas ocorre sempre que os homens são subjulgados por um novo saber ou conhecimento. “O saber infla”, escreve S. Paulo na epístola aos coríntios, pois o novo conhecimento subira à cabeça de alguns, como sempre sucede. A inflação nada tem a ver com a espécie do conhecimento, mas sim com o modo pelo qual ele se apodera de uma cabeça fraca, quando o indivíduo torna-se incapaz de ver ou ouvir qualquer outra coisa. Fica como que hipnotizado e acredita ter descoberto a solução do enigma universal. Isto já significa presunção. Tal processo é uma forma de reação tão geral que já no livro do Gênesis 2,17 comer da árvore do conhecimento representa um pecado que conduz à morte. Não é fácil de compreender por que um acréscimo de consciência, acompanhado de presunção, é tão perigoso. O Gênesis representa o ato de consciência como uma infração do tabu, como se através do conhecimento se transpusesse criminosamente um limiar sacrossanto. Creio que o Gênesis está certo, na medida em que cada passo em direção a uma consciência mais ampla é uma espécie de culpa prometêica: mediante o conhecimento rouba-se, por assim dizer, o fogo dos deuses, isto é, o patrimônio dos poderes inconscientes é arrancado do contexto natural e subordinado à arbitrariedade da consciência. O homem que usurpou o novo conhecimento sofre uma transformação ou alargamento da consciência, mediante o nível humano de sua época (“sereis semelhantes a Deus”), mas isto o afasta dos homens. O tormento dessa solidão é a vingança dos deuses: tal homem não poderá voltar ao convívio humano. Como diz o mito, é agrilhoado à solitária rocha do Cáucaso, abandonado por deuses e homens.

Ela consiste numa soma de fatos psíquicos sentidos como algo de pessoal. O atributo “pessoal” significa: pertencente de modo exclusivo a uma dada pessoa. Uma consciência apenas pessoal acentua com certa ansiedade seus direitos de autor e de propriedade no que concerne aos seus conteúdos, procurando deste modo criar um todo. Mas todos os conteúdos que não se ajustam a esse todo são negligenciados, esquecidos, ou então reprimidos e negados. Isto constitui uma forma de auto-educação que não deixa de ser, porém, demasiado arbitrária e violenta. Em benefício de uma imagem ideal, à qual o indivíduo aspira moldar-se, sacrifica-se muito de sua humanidade. Indivíduos desse tipo, extremamente pessoais, costumam ser muito sensitivos, já que é tão fácil ocorrer-lhes algo que traz à consciência certos detalhes indesejáveis de seu verdadeiro caráter (“individual”).

A este segmento arbitrário da psique coletiva, elaborado às vezes com grande esforço, dei o nome de persona. A palavra persona é realmente uma expressão muito apropriada, porquanto designava originalmente a máscara usada pelo autor, significando o papel que ia desempenhar. Se tentarmos estabelecer uma distinção entre o material psíquico consciente e o inconsciente, logo nos encontraremos diante do maior dilema: no fundo teremos de admitir que a afirmação acerca do inconsciente coletivo, isto é, de que seus conteúdos são gerais, também é válida no que concerne aos conteúdos da persona. Sendo esta última um recorte mais ou menos arbitrário e acidental da psique coletiva, cometeríamos um erro se a considerássemos (à persona), in toto, como algo de “individual”. Como seu nome revela, ela é uma simples máscara da psique coletiva, uma máscara que aparenta uma individualidade, procurando convencer aos outros e a si mesma que é uma individualidade, quando, na realidade, não passa de um papel, no qual, no qual fala a psique coletiva.

Ao analisarmos a persona, dissolvemos a máscara e descobrimos que, aparentando ser individual, ela é no fundo coletiva: em outras palavras, a persona não passa de uma máscara da psique coletiva. No fundo, nada tem de real; ela representa um compromisso entre o indivíduo e a sociedade, acerca daquilo que “alguém parece ser: nome, título, ocupação, isto ou aquilo. De certo modo, tais dados são reais; mas em relação à individualidade essencial da pessoa, representam algo de secundário, uma vez que resultam de um compromisso no qual outros podem ter uma quota maior do que a do indivíduo em questão. A persona é uma aparência, uma realidade bidimensional, como se poderia designá-la ironicamente.

Seria incorreto, porém, encerrar o assunto, sem reconhecer que subjaz algo de individual na escolha e na definição da persona; embora a consciência do ego possa identificar-se com ela de modo exclusivo, o si-mesmo inconsciente, a verdadeira individualidade, não deixa de estar sempre presente, fazendo-se sentir de forma indireta. Assim, apesar da consciência do ego identificar-se inicialmente com a persona – essa figura de compromisso que representamos diante da coletividade, o si-mesmo inconsciente não pode ser reprimido a ponto de extinguir-se. Sua influência manifesta-se principalmente no caráter especial dos conteúdos contrastantes e compensadores do inconsciente. A atitude meramente pessoal da consciência produz reações da parte do inconsciente e estas, juntamente com as repressões pessoais, contêm as sementes do desenvolvimento individual, sob o invólucro de fantasias coletivas. Mediante a análise do inconsciente pessoal, a consciência abre-se e é alimentada pelo material coletivo, que traz consigo elementos da individualidade. Sei muito bem que isto é incompreensível para os que desconhecem meus pontos de vista e minha técnica e principalmente para os que encaram o inconsciente do ponto de vista freudiano. Mas se o leitor lembrar-se do exemplo já citado da estudante de filosofia, poderá ter uma idéia aproximada do que aqui estou tentando formular. No início do tratamento, a enferma era quase inconsciente da fixação que subjazia à sua relação com o pai. Ignorava de um modo quase total que buscava um homem semelhante ao pai, fato este com que seu intelecto logo se defrontou. Isto não constituiria propriamente um erro se seu intelecto não tivesse aquele caráter de protesto peculiar, infelizmente comum nas mulheres intelectuais. Esse tipo de intelecto se caracteriza pela tendência de apontar os erros alheios; é crítico em demasia, de tonalidade desagradavelmente pessoal, com a pretensão, no entanto, de ser objetivo. Isto geralmente irrita os homens, sobretudo se a crítica a eles endereçada (como acontece muitas vezes) tocar-lhes um ponto fraco; em benefício de uma discussão fecunda, seria justamente este o ponto a evitar. Longe disto, é uma peculiaridade infeliz de tal tipo de mulher procurar os pontos fracos do homem e fixá-los, exasperando o interlocutor. Em geral, sua intenção não é consciente; pelo contrário, seu propósito inconsciente é o de impelir o homem a uma posição superior, tornando-o deste modo um objeto de admiração. Mas em geral este não percebe que está sendo forçado a assumir o papel de herói; na realidade acha esses insultos tão odiosos que tratará de desviar-se o mais possível de tal mulher. Finalmente, o único homem que lhe restará só poderá ser o que desde o início se apequenou e que, portanto, nada tem de admirável.

(…) Depois desta digressão, voltemos ás reflexões iniciais. Uma vez abolidas as repressões de ordem pessoal, a individualidade e a psique coletiva começam a emergir, fundidas uma na outra, liberando as fantasias pessoais até então reprimidar. Aparecem sonhos e fantasias, que se revestem de um aspecto diferente. O “cósmico” parece ser um sinal inefável das imagens coletivas; as imagens de sonhos e fantasias são associadas ao eterno “cósmico”, tais como tempo e espaço infinitos, a enorme velocidade e a extensão dos movimentos, conexões “astrológicas”, analogias telúricas, lunares e solares, alterações nas proporções do corpo, etc. O aparecimento de motivos mitológicos e religiosos nos sonhos também indica a atividade do inconsciente coletivo. O elemento coletivo é anunciado muitas vezes por sintomas peculiares: (2) sonhos em que se voa através do espaço, a modo de um cometa, ou se tem a impressão de ser a terra, o sol ou uma estrela; ora se é extraordinariamente grande, ora pequeno como um anão; ou, como um morto, chega-se a um lugar estranho, num estado de alheamento, confusão, loucura, etc. Do mesmo modo, podem ocorrer sentimentos de desorientação, vertigem e outros semelhantes, juntamente com os sintomas de inflação

(2)Não será demais observar que os elementos coletivos dos sonhos não ocorrem apenas neste estádio do tratamento analítico. Há muitas espécies de situações psicológicas nas quais se manifesta a atividade do inconsciente coletivo. Mas não é este o lugar adequado para o exame dessas condições.

A riqueza de possibilidades da psique coletiva confunde e ofusca. Com a issolução da persona desencadeia-se a fantasia espontânea, a qual, aparentemente, não é mais do que a atividade específica da psique coletiva. Tal atividade traz à tona conteúdos, cuja existência era antes totalmente ignorada. Na medida em que aumenta a influência do inconsciente coletivo, a consciência perde seu poder de liderança. Imperceptivelmente, vai sendo dirigida, enquanto o processo inconsciente e impessoal toma o controle. Assi pois, sem que o perceba, a personalidade consciente, como se fora uma peça entre outras num tabuleiro de xadrez, é movida por um jogador invisível. É este quem decide o jogo do destino e não a consciência e suas intenções. No exemplo anteriormente citado, foi deste modo que se processou a liberação da transferncia, apesar de afigurar-se tão impossível à consciência.

Sempre que surja uma dificuldade aparentemente insuperável, é inevitável ter-se que mergulhar neste processo. Entretanto, nem sempre ocorre tal necessidade, uma vez que a maioria dos casos de neurose só pede a remoção de dificuldades temporárias de adaptação. Mas os casos graves não podem ser curados, sem uma profunda “mudança do caráter” ou da atitude. Na maioria dos casos, a adaptação à realidade exterior exige tanto trabalho, que a adaptação interior, voltada para o inconsciente coletivo, só pode ser considerada a longo prazo. No entantp, quando a adaptação interior se torna um problema, provém do inconsciente uma atração singular e irresistível, que exerce uma influência poderosa na direção do consciente da vida. A predominância das influências inconscientes, assim como a desintegração da persona e a redução da força condutora do consciente constituem um estado de desequilíbrio psíquico, induzido artificialmente no decorrer do tratamento analítico; é claro que a intenção desta terapia é a de resolver uma dificuldade inibidora que barra a via de um desenvolvimento ulterior. Naturalmente há inúmeros obstáculos que podem ser superados com um bom conselho e com um pouco de ajuda moral, ajudados pela boa vontade e compreensão por parte do paciente. Deste modo são obtidos excelentes resultados e até mesmo a cura. Não são raros os casos em que não há necessidade de dizer uma só palavra acerca do inconsciente. No entanto, há dificuldades frente as quais não se vislumbra qualquer solução satisfatória. Nessa eventualidade, se o transtorno do equilíbrio psíquico não ocorreu antes do tratamento, certamente aparecerá durante a análise, e ás vezes sem qualquer interferência do médico. É como se tais pacientes estivessem à espera de uma pessoa de confiança a fim de entregar-se e sucumbir. Essa perda de equilíbrio é, em princípio, semelhante a um distúrbio psicótico; isto é, difere dos estádios iniciais da doença mental pelo fato de conduzir finalmente a uma saúde mais plena, enquanto que nas psicoses há uma destruição crescente. No primeiro caso, a pessoa entra em pânico e como que se abandona diante de complicações aparentemente desesperadas. Em geral, tudo começa por um esforço pertinaz de dominar a situação problemática pela força de vontade; ocorre então o colapso e essa vontade diretora é completamente aniquilada. A energia assim liberada desaparece do consciente e cai no inconsciente. É então que costumam sobrevir os primeiros sinais da atividade inconsciente. (assinalo aqui o exemplo do jovem que sucumbiu à psicose.) Evidentemente, nesse caso, a energia que desapareceu da consciência ativou o inconsciente. O resultado imediato foi a brusca alteração dos sentidos. Podemos imaginar que se o jovem mencionado tivesse uma mente mais forte, tomaria a visão das estrelas como uma imagem salvadora, conseguindo então encarar o sofrimento humano sub specie aeternitatis, e neste caso seu equilíbrio seria restaurado. (3)

Deste modo, um obstáculo aparentemente invencível seria superado. Assim, pois, encaro a perda de equilíbrio como algo adequado, pois substitui uma consciência falha, pela atividade automática e instintiva do inconsciente, que sempre visa a criação de um novo equilíbrio; tal meta será alcançada sempre que a consciência for capaz de assimilar os conteúdos produzidos pelo inconsciente, isto é, quando puder compreendê-los e digerí-los. Se o inconsciente dominar a consciência, desenvolver-se-á um estado psicótico. No caso de não prevalecer nem processar-se uma compreensão adequada, o resultado será um conflito que paralisará todo o progresso ulterior. O problema da compreensão do inconsciente coletivo coloca-nos diante de uma considerável dificuldade, que será o tema do próximo capítulo.