Plantas alucinógenas vem sido usadas pelos homens por milhares de anos, provavelmente desde que eles começaram a caçar plantas para comer. Os alucinógenos continuaram recebendo a atenção das civilizações humanas durantes as eras. Recentemente, nós passamos por um período em que a sociedade ocidental sofisticada “descobriu” alucinógenos, e alguns setores da sociedade que assumiram, por uma razão ou outra, o uso de tais plantas. Isso tende a continuar.
Portanto é importante para nós aprender o quando nós possamos sobre plantas alucinógenas. Um grande grupo de literatura científica publicou sobre os seus usos e os seus efeitos, mas a informação é sempre trancada em jornais técnicos. O leigo interessado tem o direito à informação para basear suas opiniões. Esse texto foi escrito parcialmente para fornecer esse tipo de informação.
Não importa se acreditamos que o consumo de alucinógenos por homens nas sofisticadas ou primitivas sociedades constitui uso, falta de uso ou abuso, plantas alucinógenas tiveram uma participação extensa na cultura humana e provavelmente vão continuar tendo. Segue-se que um entendimento claro desse agentes potenciais físicos e sociais deve ser parte da educação geral dos homens.
(nota: o autor considera fungos e plantas como que pertencendo ao mesmo reino)
Plantas alucinógenas apareceram em diversos selos postais: (1, 6) Amanita muscaria, (2) fruto de um Peganum harmala, (3) Atropa belladonna, (4) Pancratium trianthum, (5) Rivea corymbosa, (7) Datura stramonium, (8) Datura candida, (9) Hyoscyamus niger.
O QUE SÃO PLANTAS ALUCINÓGENAS?
Na sua busca por comida, os primeiros humanos testaram todos os tipos de plantas. Algumas os nutriram, outras, que eles encontraram, os curaram, e outras os mataram. Algumas, para a surpresa deles, tinham estranhos efeitos em suas mentes e corpos, parecendo levá-los para outros mundos. Nós chamamos essas plantas de alucinógenas, porque elas distorcem os sentidos e comumente produzem alucinações – experiências que se afastam da realidade. Embora a maioria dos alucinógenos sejam visuais, eles também envolvem os sentidos de audição, toque, cheiro, ou gosto – e ocasionalmente diversos sentidos estão envolvidos.
A causa atual para as alucinações são substâncias químicas nas plantas. Essas substâncias não são narcóticos verdadeiros. Contrariarmente à opinião popular, nem todos os narcóticos são perigosos e viciantes. Estritamente e etimológicamente falando, um narcótico é uma substância que têm um efeito depressivo, leve ou alto, no sistema nervoso central.
Narcóticos que induzem alucinações são normalmente chamados de alucinógenos (geradores de alucinações), psicomiméticos (imitadores da psiquê), e psicodélicos (manifestadores da mente). Nenhum termo satisfaz totalmente os cientistas, mas “alucinógenos” chega perto. “Psicodélicos” é mais usado nos Estados Unidos, mas ele combina duas raízes gregas incorretamente, é biologicamente doentio, e adquiriu um significado popular além das drogas e seus efeitos.
Na história do gênero humano, alucinógenos têm sido talvez os mais importantes de todos os narcóticos. Os seus efeitos fantásticos fizeram-nos sagradospara os povos primitivos e até mesmo pode ter feito surgir nele a ideia de divindade.
O mais famoso dos alucinógenos com significância religiosa é o cacto peiote. Essa ilustração, chamada “Orador na manhã em uma cerimônia de peyote” é adaptada de uma pintura por Tsa Toke, um indiano Kiowa. Esses indianos são usuários rituais de peiote. O fogo central em forma crescente é ladeado por leques de penas de águias cerimoniais, as penas simbolizam a manhã, e os pássaros, as orações em ascenção.
ALUCINÓGENOS NAS SOCIEDADES PRIMITIVAS
Alucinógenos permeiam profundamente qualquer aspecto da vida nas sociedades primitivas. Eles ditam regras na saúde e na doença, paz e guerra, vida em casa e viajem, caça e agricultura; eles afetam as relações entre indivíduos, vilas, e tribos. Acredita-se que eles influenciam a vida antes e depois da morte.
O uso médico e religioso de plantas alucinógenas são particularmente importantes nas sociedades primitivas. Aborígenes atribuem a doença e a saúde ao trabalho das forças espirituais. Consequentemente, toda “medicina” que pode transportar os homens para o mundo espiritual é considerada por muitos aborígenes melhor do que qualquer efeito físico.
As forças psíquicas também vem sido atribuídas aos alucinógenos e têm sido uma parte integral nas religiões primitivas. Em todo o mundo plantas alucinógenas são usadas como mediadoras entre os homens e Deus. As profecias do Oráculo de Delphi, por exemplo, são ditas terem sido influenciadas por alucinógenos.
Outros usos aborígenes de alucinógenos variam de uma cultura primitiva para outra. Muitas plantas alucinógenas são básicas para a iniciação ritual de adolescentes. Os indianos Algonquin dão uma substância intoxicante para seus jovens, a “wysoccan”, e eles então ficam violentamente perturbados por vinte dias. Durante esse período, eles perdem toda a memória, iniciando a fase adulta se esquecendo de que eles já foram meninos. A raíz iboga no Gabão e o caapi na Amazônia são também utilizados nos rituais.
Estátua de Xochipilli, o “Príncipe das flores” Asteca, descoberto nas encostas do vulcão Popocatepetl e agora exposto no Museu Nacional na Cidade do México. As etiquetas indicam as possíveis interpretações botânicas das figuras.
Na América do Sul, muitas tribos tomam ayahuasca para prever o futuro, visualisar disputas, decifrar planos inimigos, produzir ou retirar feitiços, ou comprovar a fidelidade da esposa. Sensações de morte e separação do corpo e alma são algumas vezes experimentados durante um transe.
As propriedades alucinógenas da Datura têm sido muito exploradas, particularmente no Novo Mundo. No México e no Sul, a Datura é utilizada na divinação, profecia, e cura ritualística.
Os índios modernos mexicanos valorizam certos cogumelos como sacramentos e usam Morning glories e o cacto peiote para predizer o futuro, diagnosticar e curar doenças, e invocar bons e maus espíritos.
Os Mixtecs do México comem puffballs para escutar vozes do paraíso que respondem às suas perguntas. Os Waikás do Brasil e Venezuela aspiram a resina em pó de uma árvore da floresta para ritualizar a morte, induzir um estado de transe para diagnosticar doenças, e agradecer aos espíritos por uma vitória em uma guerra. Os Witotos da Colômbia comem a mesma resina poderosa para “falar com as pessoas pequenas”. Os médicos indígenas Peruvianos tomam cimora para fazer eles mesmos portadores de outras identidades. Índios do oeste do Brasil tomam jurema para têr visões gloriosas dos espíritos dos mundos antes de partir para batalhas com os seus inimigos.
USO NO MUNDO OCIDENTAL MODERNO
Nossa sociedade moderna adotou, recentemente, e algumas vezes ilegalmente, o uso de de alucinógenos em grande escala. Muitas pessoas acreditam que eles podem ativar experiências “místicas” ou “religiosas” alterando a química do corpo , raramente percebendo que eles estão simplesmente voltando para a era das velhas práticas primitivas. Se as aventuras induzidas por drogas podem ser idênticas com a visão metafísica reivindicada por alguns místicos, ou são meramente uma falsificação delas, é ainda uma controvérsia. O uso mundial e expansivo de alucinógenos em nossa sociedade pode ter pouco ou nenhum valor e pode algumas vezes até ser perigoso ou prejudicial. Em qualquer caso, é um traço cultural recentemente importado e sobreposto sem as raízes naturais da tradição ocidental.
Detalhe de uma pintura de uma visão primitiva de ayahuasca por Yando del Rios, artista peruviano contemporâneo.
COMPOSIÇÃO QUÍMICA
Alucinógenos são limitados a um pequeno número de componentes químicos. Todos os alucinógenos encontrados em plantas são componentes orgâncios – isto é, eles contém carbono como uma parte essencial de suas estruturas e são formados no processo de vida de organismos vejetais. Nenhum componente inorgânico de plantas, como minerais, são conhecidos por terem efeitos alucinógenos. Compostos alucinógenos devem ser divididos convenientemente em dois grandes grupos: os que contêm nitrogênio na sua estrutura e os que não contém. Os que contém nitrogênio são mais comuns. O mais importante dos componentes sem nitrogênio é o princípio ativo da marijuana, componentes terpenofenólicos classificados como dibenzoprianos e chamados canabinóides – em particular, tetrahidrocannabinóis. Os compostos alucinógenos com hidrogênio em sua estrutura são os alcalóides ou bases relacionadas.
ALCALÓIDES são um grupo diverso de mais de 5000 componentes com estruturas moleculares complexas. Eles contém nitrogênio, assim como carbono, oxigênio, e hidrogênio. Todos os alcalóides são são originados de plantas, porém alguns protoalcalóides ocorrem em animais. Todos são ligeiramente alcalinos, daí o seu nome. Eles são classificados em séries baseadas em suas estruturas. Muitos alcalóides alucinógenos são são indóis (veja abaixo) ou estão relacionadas com índoles, e a maioria foram ou provavelmente foram originados na planta partindo do aminoácido conhecido como triptofano. Muitas plantas medicinais e tóxicas, assim como as alucinógenas, devem sua atividade biológica à alcalóides. Exemplos de alcalóides mundialmente usados são a morfina, a quinina, a nicotina e a cafeína.
ÍNDOLES são alcalóides alucinógenos ou bases relacionadas, sendo que todos contém componentes nitrogenados. É mais impressionante que dos muitos milhares de compostos orgânicos que atuam em várias partes do corpo tão poucos são alucinógenos. O núcleo índole de alucinógenos geralmente aparece na forma de derivados de triptamina. Ele é composto por fenil e segmentos pyrrol (veja o diagrama a seguir). Triptaminas podem ser “simples” – isto é, sem substituições – ou elas podem ter vários grupos de “cadeias laterais” conhecidas como hidróxidos (OH), metóxitos (CH3), ou fósfogloxina (OPO3H) em seu anel fenólico. O anel índole (mostrado em vermelho no diagrama) é evidente não somente nas inúmeras triptaminas (dimetiltriptamina, etc.) mas também nos vários alcalóides ergóticos (ergina e outros), nos alcalóides ibogaínicos, e nos alcalóides Beta-carbonílicos (harmina, harmalina, etc.). A dietilamida do ácido lisérgico (LSD) tem um núcleo índole. Uma das razões para a significância dos alcalóides indólicos pode ser a semelhança estrutural com as serotoninas neuro-humorais (5-hidróxidimetiltriptamina), presentes no sistema nervoso de animais de sangue quente. A serotonina possui uma importância principal na bioquímica no sistema nervoso central. Um estudo do funcionamento das triptaminas alucinógenas pode experimentalmente ajudar a explicar a função da serotonina no corpo. Uma relação química similar à esses alucinógenos indólicos e à serotonina existe entre a mescalina, um alucinógeno presente no peiote, e o neuro-hormônio norepinefrina. Essas semelhanças químicas entre componentes alucinógenos e os neuro-hormônios que jogam na neurofisiologia podem ajudar a explicar a atividade alucinógena e até certos processos do sistema nervoso central. Outros alcalóides – as isoquinolinas, tropaminas, quinolizidinas, e isoxazolinas – são mais levemente alucinógenos e podem operar de forma diferente no corpo.
PSEUDO-ALUCINÓGENOS
Esses são compostos venenosos de plantas que causam o que pode ser chamado de alucinações secundárias ou pseudo-alucinações. Como não possuem agentes alucinógenos reais, eles bagunçam a função normal do corpo induzindo um estado de delírio acompanhado por aquilo que por todos os motivos práticos são alucinações. Alguns componentes dos óleos essenciais – os elementos aromáticos responsáveis pela característica odorífera das plantas – parecem agir nesse caso. Componentes da noz-moscada são um exemplo. Muitas plantas possuindo tais componentes são extremamente perigosas para se tomar, especialmente quando ingeridas em doses elevadas o suficiente para induzir alucinações. As pesquisas ainda não deram muita luz no tipo de psicoatividade produzido por essas substâncias.
COMO OS ALUCINÓGENOS SÃO CONSUMIDOS
Plantas alucinógenas são usadas de variadas formas, dependendo do tipo de planta, dos elementos químicos envolvidos, das práticas culturais, e outras considerações. O homem em sociedades primitivas em diversos locais, mostrou um grande talento e perspicácia em preparo de plantas alucinógenas para seus usos.
PLANTAS PODEM SER COMIDAS, frescas ou secas, como o peiote e o teonanacatl, ou o suco das folhas maceradas pode ser bebido, como a Salvia divinorum (no México). Ocasionalmente um derivado de vejetais pode ser comido, como o haxixe. Mais frequentemente, uma beberagem pode ser tomada: ayahuasca, caapi, ou yagé da casca de uma trepadeira; o cacto San Pedro; vinho de jurema, iboga; folhas de toloache, ou sementes amassadas das Morning glories mexicanas. Originalmente peculiar às culturas do Novo Mundo, onde era uma forma de usar tabaco, fumar agora é um método espalhado de usar cannabis. Outros narcóticos além do tabaco, como a tupa, podem ser vulcanizados.
ASPIRAR é um método preferido de usar diversos alucinógenos – yopo, epena, sébil, rapé dos índios. Assim como fumar, cheirar é um novo costume mundial. Alguns poucos indios do Novo Mundo costumam tomar alucinógenos de forma retal – como no caso da Anadenathera. Um método curioso de induzir os efeitos dos narcóticos é o método africano de fazer incisões no couro cabeludo e esfregar o suco da do bulbo de uma espécie de Pancratium através das incisões. Esse método é um tipo de contrapartida primitiva do método hipodérmico atual. Muitos métodos foram usados no caso de algumas plantas alucinógenas. Resina de Virola, por exemplo, é lambida inalterada, é geralmente preparada na forma de rapé, e é feita ocasionalmente em pequenos volumes a serem consumidos, e pode por vezes ser fumada.
ADITIVOS DE PLANTAS ou misturas para as principais espécies alucinógenos estão se tornando cada vez mais importantes na pesquisa. Plantas auxiliares são por vezes adicionadas à preparação para alterar, aumentar, ou prolongar os efeitos narcóticos dos ingredientes principais. Assim, para tornar o ayahuasca, caapi, yajé ou bebidas, preparadas basicamente a partir de Banisteriopsis caapi ou inebrians B., vários aditivos são frequentemente usados: folhas de Psychotria viridis ou rusbyana Banisteriopsis, que contenham triptaminas alucinógenas, ou Brunfelsia ou Datura, as quais são alucinógenas, por si próprias.
Fonte: Hallucinogenic Plants – A golden Guide, Golden Press. (Tradução do Original)
Nos anos de 1960 e início dos anos 70, pesquisadores como Timothy Leary, de Harvard, promoveram entusiasticamente o estudo dos tão conhecidos cogumelos “mágicos” (denominados formalmente como cogumelos psilocibínicos) e defenderam os benefícios em potencial dos mesmos para a psiquiatria. Por um breve momento, pareceu que experimentos controlados com cogumelos e outros psicodélicos entrariam para a corrente científica.
Poderia ser a experiência psicodélica um tratamento psiquiátrico?
Mas recentemente, através dos últimos anos, o pêndulo balançou de volta para a outra direção. E agora, novas pesquisas com a substância alteradora da mente, a psilocibina – o ingrediente “mágico” nos cogumelos – indicam que controladas com cuidado, baixas dosagens dela podem ser um meio efetivo de tratar pessoas com depressão clínica e ansiedade. Então, tudo mudou. A repercursão contra a cultura de drogas de 1960 – inclusive contra o próprio Leary – que foi preso por posse de drogas – tornaram a pesquisa quase impossível. O governo federal criminalizou os cogumelos, e a pesquisa parou por cerca de 30 anos.
O último estudo, publicado semana passada no Experimental Brain Research, mostrou que administrando a roedores uma dose purificada de psilocibina reduziu os sinais exteriores de medo dos mesmos. Os roedores no estudo foram condicionados a associar um som em particular com a sensação de serem submetidos a choques elétricos, e todos os ratos do experimentos paralisavam de medo quando o som era tocado, mesmo quando o aparato elétrico estava desligado. Ratos que ingeriram baixas dosagens da droga, entretanto, mantiveram-se calmos muito mais cedo, indicando que eles foram capazes de desassociar o estímulo e a experiência negativa da dor mais facilmente.
É difícil perguntar para um rato torturado porque exatamente ele sente menos medo (e possivelmente ainda mais difícil quando um rato está no meio de uma viagem de cogumelos). Mas diversos outros estudos demonstraram efeitos promissores da psilocibina em um grupo de indivíduos mais comunicativos: Humanos.
Em 2011, um estudo publicado no Archives of General Psychiatry por pesquisadores da UCLA e outros lugares encontrou que baixas doses de psilocibina melhoraram os humores e reduziram a ansiedade de 12 pacientes com câncer terminal por um longo período. Esses eram pacientes de 36 a 58 anos que sofreram com depressão e não responderam às medicações convencionais.
Foi dada a cada paciente uma dose pura de psilocibina ou um placebo, e eles foram questionados sobre os seus níveis de depressão e ansiedade diversas vezes nos meses seguintes. Os que foram administrados com psilocibina tiveram níveis de ansiedade reduzidos começando entre um e três meses, e níveis reduzidos de depressão começando entre duas semanas após o tratamento e continuando por seis meses seguidos, o período inteiro coberto pelo estudo. Adicionalmente, administrando cuidadosamente baixas dosagens e controlando o ambiente preveniu qualquer participante de ter uma experiência negativa sob a influência da psilocibina. (coloquialmente conhecida como “bad trip”.)
Cogumelos Psilocybe cubensis, uma das espécies que contém psilocibina mais conhecidas mundialmente.
Um grupo de pesquisadores de John Hopkins conduziu o estudo controlado dos efeitos da psilocibina mais longo, e as descobertas podem ser as mais promissoras de todas. Em 2006, eles deram a 36 usuários saudáveis (e que nunca tinham experimentado alucinógenos antes) uma dose da droga, e 60% reportaram “uma experiência mística completa”. 14 meses depois, a maioria reportou níveis maiores de bem-estar que antes, e classificaram tomar a psilocibina uma das cinco experiências mais significativas em suas vidas. Em 2011, a equipe conduziu um estudo com um grupo separado, e quando os membros desse grupo foram questionados um ano depois, os pesquisadores encontraram que de acordo com testes de personalidade, a abertura dos participantes para novas ideias e sentimentos aumentou significativamente – uma mudança muito rara em adultos.
Assim como muitas questões envolvendo o funcionamento da mente, cientistas estão ainda nos estágios iniciais de descobrir se e como a psilocibina desencadeia esses efeitos. Nós sabemos que logo após a ingestão da psilocibina (seja ela na forma pura ou através de cogumelos), ela é quebrada em psilocina, que estimula os receptores da serotonina, um neurotransmissor que acredita-se promover pensamentos positivos (também estimulados por anti-depressivos convencionais.)
“Psicodélicos são proibidos pois eles dissolvem as estruturas da opinião e dos modelos de comportamento culturalizados e até mesmo a forma como se processa informações.” -Terrence McKenna
O escaneamento do cérebro humano sob o efeito da psilocibina está somente nos estágios iniciais. Um estudo de 2012 em que voluntários foram administrados enquanto estavam em uma máquina de ressonância magnética de imagem funcional, que mede o fluxo de sangue para várias partes do cérebro, indicou que a droga diminuiu a atividade em um par de áreas de “hub” (o córtex pré-frontal médio e o córtex singulado posterior) que possuem densas concentrações de conexões com outras áreas do cérebro. “Esses “hubs” formam a experiência do mundo e a mantêm em ordem,” disse na épocaDavid Nutt, um autor e neurobiologista do Imperial College London. “Nós sabemos que desativando essas regiões somos levados a um estado em que a experiência do mundo ao nosso redor é estranha.” Não é claro como isso pode ajudar na ansiedade e na depressão, ou se é apenas uma consequência não relatada da droga que não tem nada a ver com os efeitos positivos.
Independentemente, o impulso para mais pesquisas nas aplicações potenciais de psilocibina e outros alucinógenos está claramente em andamento. A Wired recentemente citou os cerca de 1600 cientistas que participaram do Terceiro Encontro Anual da Ciência Psicodélica, muitos dos quais estão estudando a psilocibina – conjuntamente com outras drogas como o LSD (conhecido como ácido) e o MDMA (conhecido como ecstasy).
É claro, há um problema óbvio ao se usar cogumelos psilocibínicos como medicina – ou até mesmo pesquisá-los em um ambiente laboratorial. Atualmente, nos Estados Unidos, eles são listados como uma substância controlada, significando que é ilegal comprar, possuir, usar ou vender, e não podem ser prescrevidos por um doutor, porque eles não tem uso médico aceito. A pesquisa que ocorreu foi sob supervisão estrita do governo, e conseguir aprovação para novos estudos é visivelmente difícil.
O que você veria se pudesse olhar dentro de um cérebro em processo alucinatório? Apesar de décadas de investigação científica, nós ainda temos a falta de um entendimento claro de como drogas alucinógenas como o LSD (dietilamida do ácido lisérgico), mescalina e psilocibina (o principal ingrediente ativo em cogumelos mágicos) trabalham no cérebro. A ciência moderna demonstrou que alucinógenos ativam receptores da serotonina, um dos mensageiros químicos chave. Especificamente, dos 15 diferentes receptores de serotonina, o subtipo 2A (5-HT2A), parece ser o que produz alterações profundas do pensamento e da percepção. É incerto, entretanto, por que a ativação do receptor 5-HT2A pelos alucinógenos produz efeitos psicodélicos, mas muitos cientistas acreditam que os efeitos estão ligados a aumentos na atividade cerebral. Embora não seja conhecido porque essa ativação causaria profundas alterações da consciência, uma especulação é que um aumento espontâneo da atividade de algumas células do cérebro levariam a alterações sensoriais e perceptivas, ressurgimento incontrolado de memórias, e a projeção de “ruído” mental no olho da consciência.
O autor Inglês Aldous Huxley acreditava que o cérebro funciona como uma “válvula redutora”, que acabaria por restringir a consciência. Com mescalina e outros alucinógenos, é possível induzir efeitos psicodélicos inibindo esse mecanismo de filtragem. Huxley baseou essa explicação inteiramente em suas experiências pessoais com mescalina, que foi dada a ele por Humphrey Osmond, o psiquiatra que deu origem ao termo “psicodélico”. Apesar de Huxley ter proposto essa ideia em 1954,décadas antes do surgimento da ciência moderna do cérebro, ele pode estar correto. A maioria das opiniões é de que alucinógenos trabalham ativando o cérebro, ao invés de inibi-lo como Huxley disse. Os resultados de um estudo recente de imagens está desafiando essas explicações convencionais sobre a ativação da atividade cerebral.
O estudo em questão foi conduzido pelo Dr. Robin Carhart-Harris em conjunto com o professor David Nutt, um psiquiatra que era assessor científico do governo do Reino Unido na a política de drogas. O Doutor Carhart-Harris, Nutt, e colegas utilizaram ressonância magnética funcional para estudar os efeitos da psilocibina na atividade cerebral de 30 utilizadores experientes de psicodélicos. Nesse estudo, a administração intravenosa de 2mg de psilocibina induziu um estado psicodélico moderado que foi associado a reduções da atividade neural em regiões do cérebro, como o córtex pré-frontal medial e o córtex cingulado anterior.
Os dois córtex em questão estão extremamente inter-conectados com outras regiões do cérebro e acredita-se estarem envolvidos em funções como a regulação emocional, o processamento cognitivo, e a instrospecção. Baseado nas suas descobertas, os autores do estudo concluíram que alucinógenos reduzem atividades em regiões específicas do cérebro, diminuindo potencialmente a sua habilidade de coordenar o funcionamento de regiões cerebrais inferiores. De fato, a psilocibina aparenta inibir regiões do cérebro que são responsáveis por restringir a consciência dentro dos limites normais do estado desperto, uma interpretação que é notavelmente similar ao que Huxley propôs meio século atrás.
Os achados reportados pelo Dr. Carhart-Harris são notáveis porque eles vão de encontro aos resultados de estudos de imagens anteriores com alucinógenos. Geralmente, essas ressonâncias em humanos confirmaram o que estudos prévios em animais sugeriram: alucinógenos agem aumentando a atividade de certos tipos de células em diversas regiões do cérebro, ao invés de diminuir como indicado pelo estudo de ressonâncias do Dr. Nutt. Por exemplo, experimentos com tomografia por emissão de pósitrons conduzidos pelo Dr. Franz Vollenweider em Zurique (vide post: 10 Fatos Surpreendentes sobre Alucinógenos, Psicodélicos e Cogumelos Mágicos) demonstraram que a administração de psilocibina oralmente em humanos aumenta a atividade metabólica nos córtex descritos anteriormente, efeitos que acredita-se estarem correlacionados com a intensidade da resposta psicodélica. Estudos pré-clínicos, utilizando uma variedade de técnicas diferentes, mostraram que alucinógenos aumentam a atividade neural no córtex pré-frontal e em outras regiões corticais ativando neurônios excitatórios e inibitórios, levando a um aumento na liberação de neurotransmissores excitatórios e inibitórios.
Dado a esses achados anteriores, os dados colhidos pelas ressonâncias pelo Dr. Nutt são de certo modo supreendentes. Questões metodológicas (como rota de administração, dosagem, e o espectro e a extensão dos sintomas induzidos pela psilocibina) podem ser pelo menos parcialmente responsáveis por essas diferenças, devido ao processo não ser igualmente medido. É também importante considerar que o receptor 5HT2A não é o único receptor de serotonina que é ativado pela psilocibina. Os experimentos do Dr. Vollenweider confirmaram que o aumento da atividade metabólica detectada pelas tomografias é mediado pelo receptor 5HT2A (o receptor de serotonina responsável pelos efeitos psicodélicos da psilocibina). Como o grupo do Dr. Nutt não conduziu um teste similar para verificar que os efeitos que eles observaram foram mediados pelo receptor 5HT2A, esse com certeza é o próximo passo lógico.
Esperançosamente, estudos que se seguirão poderão providenciar uma explicação para esses achados discrepantes, e vão resolver o debate sobre se os alucinógenos funcionam reduzindo ou aumentando a atividade cerebral. Ensaios clínicos estão sendo conduzidos para investigar se os alucinógenos podem ser usados para aliviar o estresse e a ansiedade em pacientes com câncer terminal, para atenuar os sintomas do transtorno obsessivo-compulsivo, para reduzir a frequências de enxaquecas em salvas, entre outros (vide post), então é importante determinar o mecanismo para o efeito terapêutico dos alucinógenos. Além disso, parece haver alguma confusão entre os efeitos dos alucinógenos e os sintomas da psicose, então entendendo como os alucinógenos trabalham pode potencialmente providenciar insights sobre as causas da esquizofrenia e facilitar o desenvolvimento de tratamentos mais efetivos. Em qualquer evento, é importante notar que estudos identificaram que os córtex citados trabalham como peças-chaves na mediação dos efeitos dos alucinógenos. Na luz do que é conhecido sobre as funções base dessas regiões cerebrais, não é sem razão que eles poderiam estar envolvidos na mediação dos efeitos das drogas alucinógenas. Embora não esteja claro ainda se os alucinógenos trabalham na mente humana da maneira proposta por Huxley, parece que nós conseguimos identificar com sucesso algumas das regiões neurais chaves envolvidas nos efeitos desses agentes poderosos.
“UM ATALHO PARA DEUS Cogumelo alucinógeno evoca experiências místicas, causa bem-estar e melhora o humor, diz pesquisa
Por Rogério Tuma
Cientistas da Johns Hopkins University utilizam, pela primeira vez, métodos científicos rigorosos para avaliar alucinógenos e comprovam que o chamado “cogumelo sagrado” consegue evocar experiências místicas e espirituais idênticas àquelas espontâneas descritas por pessoas em transe religioso por séculos.
A psilocibina é um alcalóide encontrado no cogumelo psilocibe, existente no México e no Sudoeste americano, e é semelhante aos alcalóides encontrados em quase 200 plantas espalhadas pelo mundo. Esses alcalóides atuam nos receptores cerebrais do neurotransmissor serotonina (envolvido nos sonhos, no humor e em outras funções afetivas). Neles se encaixam o LSD, a mescalina e várias outras substâncias. Há milênios esse grupo de alucinógenos é utilizado em rituais religiosos. No Brasil, a seita mais conhecida que pratica esses rituais é o Santo Daime.
Durante o movimento hippie, nos anos 60, o cogumelo foi muitas vezes tomado de forma exagerada, o que inibiu seus estudos até recentemente. Agora, com as novas técnicas, o controle das pesquisas é maior e os resultados positivos e negativos são, portanto, mais confiáveis.
No estudo da Johns Hopkins, 36 voluntários foram divididos em três grupos e foram avisados de que poderiam receber um alucinógeno ou outras medicações que poderiam alterar a consciência. Um grupo de 15 voluntários recebeu oralmente a psilocibina na dose de 30 mg/70 kg. Um segundo grupo de 15 recebeu metilfenidato (estimulante cerebral utilizado para síndrome do déficit de atenção) como placebo positivo, isto é, uma medicação que simula os efeitos colaterais, mas que não provoca alucinações. E um terceiro grupo de seis voluntários recebeu metilfenidato duas vezes, sem saber, achando que receberam drogas diferentes nas duas ocasiões. Com isso os pesquisadores controlaram os efeitos da sugestão e da expectativa.
Para avaliar as possíveis alucinações e experiências foram aplicadas diversas escalas predefinidas que caracterizam estados de consciência, humor, misticismo, transcedência espiritual e várias outras alterações psíquicas.
Entre os indivíduos que receberam o alucinógeno, 60% descreveram sintomas que preencheram os critérios definidos para uma “experiência espiritual e mística completa” nas primeiras oito horas de avaliação, e um terço deles a descreveu como “a experiência espiritual mais importante de sua vida” e mais de dois terços descreveram a experiência como uma das cinco mais marcantes, comparável com a morte do pai ou o nascimento do primeiro filho.
Dois meses depois, 79% dos indivíduos ainda se referiam a uma grande ou moderada mudança positiva no seu bem-estar e na sua satisfação com a vida. A grande maioria também mencionou que seu humor, suas atitudes e comportamento melhoraram significativamente, e esse dado foi confirmado com parentes e colegas de trabalho.
O líder do estudo, publicado na revista americana Psychopharmacology de 11 de julho, dr. Roland Griffiths, afirma que a mensagem não é a de que se pode reproduzir experiências místicas artificialmente, mas que elas modificam positivamente a vida dos voluntários por pelo menos alguns meses, indicando um uso terapêutico valioso. Griffiths também alerta para os efeitos colaterais, pois mesmo nas condições bem controladas do estudo, um terço dos voluntários apresentou medo considerável e ansiedade. Alguns apresentaram sintomas passageiros de paranóia. A utilização sem controle da droga pode levar a sintomas negativos com freqüência ainda maior.
Apesar de no estudo em questão a droga não ter causado dependência ou sinais de intolerância, Griffiths alerta também que ela não é um instrumento de uso contínuo para melhorar a vida ou ser um caminho mais curto para Deus. “Há uma enorme diferença entre ter uma experiência espiritual e ter uma vida espiritual”, diz.
O estudo foi considerado um marco da ciência por Charles Schuster, diretor do Instituto Americano sobre Abuso de Drogas (Nida), pois reintegra à análise da consciência e percepção sensorial um grupo de substâncias de grande valor que foi abominado por quase 40 anos.
Os autores afirmam não existir interesse em explicar a religiosidade das pessoas. Segundo Lawrence Kraus, em artigo na revista New Scientist de julho, utilizar a ciência para negar a religião é um desserviço, pois coloca uma contra a outra e vice-versa. Também para o padre belga Georges Lemaitre, que foi o primeiro cientista a demonstrar que a Teoria da Relatividade de Einstein previa o Big-Bang: “É um erro utilizar a ciência para explicar a existência de Deus ou para torná-lo irrelevante, pois a tese serviria apenas ao propósito de satisfazer a convicção religiosa do postulante”. “
Os trechos a seguir são transcrições do capítulo 6 (“Os Parentes Mexicanos do LSD”) do livro “LSD: Minha Criança Problema“, de Albert Hofmann.
Mais tarde, em 1956, uma notícia no jornal despertou meu interesse. Entre alguns índios do México meridional, pesquisadores americanos tinham descoberto uns cogumelos que eram comidos em cerimônias religiosas e isso produzia uma condição inebriada acompanhada por alucinações.
Desde então, além do caso do cacto da mescalina também achado no México, até aquela ocasião, nenhuma outra droga era conhecida que produzissem alucinações como o LSD. Eu gostaria de estabelecer contato com estes pesquisadores para aprender os detalhes sobre estes cogumelos alucinógenos, mas não havia nenhum nome e nem endereços no artigo do pequeno jornal, de forma que foi impossível adquirir qualquer informação adicional. Não obstante, os cogumelos misteriosos cuja investigação química seria um problema tentador, não saíam dos meus pensamentos.
Como isto depois ficou demonstrado, o LSD foi a razão pela qual estes cogumelos acharam o caminho do meu laboratório, sem a minha ajuda, no início do ano seguinte.
Pela mediação do Dr. Yves Dunant, na ocasião diretor da filial de Paris da Sandoz, um pedido de informação chegou à administração da pesquisa farmacêutica na Basiléia, proveniente do Professor Roger Heim, diretor do Laboratório de Criptogamia do “Museum National d’Histoire Naturelle” de Paris, perguntando se nós estávamos interessados em executar uma investigação química sobre cogumelos alucinógenos mexicanos. Com grande alegria eu me declarei pronto para começar este trabalho em meu departamento, nos laboratórios de pesquisas de produtos naturais. Isso seria o meu vínculo às investigações excitantes dos cogumelos sagrados mexicanos que já estavam amplamente avançadas nos aspectos etno-micológico e botânico.
Por muito tempo a existência destes cogumelos mágicos tinha permanecido um enigma. A história do redescobrimento deles foi apresentada, pela primeira vez, em um magnífico trabalho de dois volumes de tratados de etno-micologia, Cogumelos, Rússia e História (Pantheon Books, Nova Iorque, 1957), pelos autores, os investigadores americanos Valentina Pavlovna Wasson e seu marido, R. Gordon Wasson, que representaram um decisivo papel neste redescobrimento. As seguintes descrições da fascinante história destes cogumelos foram tiradas do livro dos Wassons.
A primeira evidência escrita do uso de cogumelos inebriantes, por ocasiões de festival ou no curso de cerimônias religiosas e nas práticas curativas orientadas pela magia, foi achada entre os cronistas espanhóis e naturalistas do décimo sexto século que entraram no país logo em seguida da conquista do México por Hernan Cortez. O mais importante destes testemunhos é o do frade franciscano Bernardino Sahagun que menciona os cogumelos mágicos e descreve seus efeitos e seus usos em várias passagens do seu famoso trabalho histórico, “Historia General de las Cosas de Nueva Espana”, escrito entre os anos 1529 e 1590. Onde, por exemplo, ele descreve como os comerciantes celebravam o retorno para casa, depois de uma próspera viagem empresarial, com uma festa baseada em cogumelos:
Em primeiro lugar, na hora de festejar, eles comiam cogumelos quando, como eles diziam, era chegada a hora do soprar as flautas. Nesta hora eles não usavam comidas; só bebiam chocolate durante a noite e comiam cogumelos com mel. Quando os cogumelos já estavam entrando em ação, havia gente dançando e gente se lamentando… Alguns tinham visões de que morreriam na guerra, outros que seriam devorados por bestas selvagens… Alguns viam nas visões que ficariam ricos. Alguns viam que comprariam escravos, que se tornariam donos de escravos. Alguns tiveram visão de que cometeriam adultério e assim teriam suas cabeças despedaçadas, seriam apedrejados até a morte… Alguns tinham uma visão de que eles morreriam na água. Alguns viam numa visão que eles teriam tranqüilidade na morte. Alguns tinham visões de que eles cairiam do telhado e morreriam… Todas essas coisas eles viam… E quando os efeitos dos cogumelos cessavam, eles conversavam uns com os outros, o que eles tinham visto na visão.
Numa publicação do mesmo período, Diego Duran, um frade dominicano, informou que cogumelos inebriantes eram comidos durante a grande festividade por ocasião da ascensão de Montezuma II ao trono, o famoso imperador dos astecas, no ano 1502. Uma passagem na crônica do décimo sétimo século, de Don Jacinto de la Serna, refere-se ao uso destes cogumelos numa cerimônia religiosa:
E o que aconteceu lá tinha a ver com a vinda [para a aldeia] de um índio… e o nome dele era Juan Chichiton… e ele tinha trazido os cogumelos de cor vermelha que foram colhidos nos planaltos, e com eles ele tinha cometido uma grande idolatria… Na casa onde todo o mundo tinha se reunido por ocasião do banquete de um santo… o teponastli [um instrumento de percussão asteca], estava tocando e cantando durante toda a noite. Depois que a maior parte da noite tinha passado, Juan Chichiton, que era o sacerdote para aquele ritual solene para todos os presentes na “fiesta”, deu os cogumelos para comer e depois, à maneira de uma Comunhão, lhes deu pulque para beber… de forma que todos perderam suas cabeças, uma vergonha de se ver.
Em Nahuatl, o idioma dos astecas, estes cogumelos eram chamados como teonanacatl que pode ser traduzido como “cogumelo sagrado”.
Há indicações de que o uso cerimonial de tais cogumelos cresceu rapidamente em tempos précolombianos muito distantes. Foram achadas pedras em forma de cogumelo em El Salvador, Guatemala, e nos distritos montanhosos contíguos do México. Estas são esculturas de pedra no formato de cogumelo, em cujo talo são esculpidas a face ou a forma de um deus ou um demônio do tipo animal. A maioria é de aproximadamente 30 cm de altura. Os exemplos mais antigos, de acordo com arqueólogos, datam de antes de 500 A.C.
G. Wasson discute, de forma bem convincente, que há uma conexão entre estas pedras em forma de cogumelo e o teonanacatl. Se isto for verdadeiro, significa que o culto do cogumelo, o uso mágico-medicinal e religioso-cerimonial dos cogumelos mágicos, tem mais de dois mil anos de idade.
Para os missionários Cristãos, a inebriação, a visão e os efeitos alucinógenos produzidos por estes cogumelos, pareciam ser o trabalho do Diabo. Eles tentaram então, com todos os meios ao seu alcance, extirpar o uso deles. Mas eles só tiveram um parcial sucesso, porque os índios continuaram secretamente até nosso tempo, a utilizar o teonanacatl na forma de cogumelo, o que era sagrado para a eles.
Estranhamente, os relatórios nas crônicas antigas sobre o uso de cogumelos mágicos permaneceram desapercebidos durante os séculos seguintes, provavelmente porque eles foram considerados produtos da imaginação de uma época supersticiosa.
Todos os traços da existência de “cogumelos sagrados” estava em perigo de esquecimento de uma vez por todas quando, em 1915, um renomado botânico americano, Dr. W. E. Safford, em um relato anterior ao da Sociedade Botânica em Washington e numa publicação científica, lançou a tese de que nunca antes houvera nada semelhante aos cogumelos mágicos: os cronistas espanhóis tinham tomado o cacto da mescalina como um cogumelo! Não obstante isso fosse falso, esta proposição de Safford serviu para dirigir a atenção do mundo científico para o enigma dos cogumelos misteriosos
Foi o médico mexicano Dr. Blas Pablo Reko quem primeiro abertamente discordou com a interpretação de Safford e que achou evidência de que ainda são empregados em nosso tempo, cogumelos em cerimônias medicinais-religiosas, em distritos longínquos, nas montanhas meridionais do México. Mas não foi antes de 1938 que o antropólogo Robert J. Weitlaner e o Dr. Richard Evans Schultes, botânico de Universidade de Harvard, acharam, naquela região, estes tipos de cogumelos que estavam sendo usados lá para propósitos cerimoniais; e só em 1938 pôde um grupo de jovens antropólogos americanos, sob a direção de Jean Bassett Johnson, assistir pela primeira vez uma cerimônia noturna secreta de cogumelo. Isto se passou em Huautla de Jimenez, a capital do território Mazatec, no Estado de Oaxaca. Mas estes investigadores foram só espectadores, não lhes foi permitido participar dos cogumelos. Johnson fez a reportagem da experiência num diário sueco (Ethnotogical Studies 9, 1939).
Então a exploração dos cogumelos mágicos foi interrompida. A Segunda Guerra Mundial tinha começado. Schultes, a mando do governo americano, teve que se ocupar com a produção de borracha no território da Amazônia, e Johnson foi morto por ocasião de uma incursão Aliada na África Norte.
Os investigadores americanos eram: o casal Dra. Valentina Pavlovna Wasson e seu marido, R. Gordon Wasson, que novamente levantou o problema do aspecto etnográfico. R. G. Wasson era banqueiro, vice-presidente do J. P. Morgan Co. de Nova Iorque. Sua esposa, que morreu em 1958, era uma pediatra. Os Wassons começaram seu trabalho em 1953, no território Mazatec em Huautla de Jimenez onde quinze anos antes J. B. Johnson e outros tinham estabelecido a existência continuada do antigo culto indígena do cogumelo. Eles receberam informação especialmente valiosa de uma missionária americana que tinha estado trabalhando por lá durante muitos anos, Eunice V. Pike, participante da “Wycliffe Bible Translators”. Graças ao seu conhecimento do idioma nativo e da sua associação ministerial com os habitantes, Pike obteve a informação sobre o significado dos cogumelos mágicos que ninguém mais tinha. Durante várias estadas em Huautla e arredores, os Wassons puderam estudar em detalhes o presente uso dos cogumelos e comparar isto com as descrições das antigas crônicas. Isto mostrou que a convicção nos “cogumelos sagrados” ainda prevalecia naquela região. Porém os índios mantiveram suas convicções em segredo para os estranhos. Teve grande tato e habilidade para ganhar a confiança da população indígena e obter conhecimento neste domínio de segredo.
Na forma moderna do culto do cogumelo, as antigas idéias religiosas e costumes estão entrosadas com as idéias e terminologias Cristãs. Assim os cogumelos são chamados freqüentemente de “o sangue de Cristo”, porque eles só crescem onde uma gota do sangue do Cristo caiu na terra. De acordo com outra noção, brotam os cogumelos onde uma gota da saliva da boca do Cristo umedeceu o solo e é, todavia, o próprio Jesus Cristo que fala através dos cogumelos.
A cerimônia do cogumelo ocorre na forma de uma consulta. Alguém que pede conselho ou uma pessoa doente ou ele ou sua família questiona um “homem sábio” ou uma “mulher sábia”, também chamados curandeiro ou curandeira, em troca de um pagamento modesto. Curandeiro pode ser traduzido melhor para o inglês como “healing priest” (padre curador), porque sua função nisso é a de um médico e também a de um padre, ambos só são achados raramente nestas regiões distantes. No idioma Mazatec, o padre curador é chamado co-ta-ci-ne que significa “um que sabe”. Ele come o cogumelo durante a cerimônia que sempre ocorre à noite. As outras pessoas presentes à cerimônia às vezes também podem receber cogumelos, contudo, a maior dose sempre vai para o curandeiro. O desempenho é executado com o acompanhamento de orações e solicitações, enquanto os cogumelos são brevemente purificados numa bacia na qual o copal (uma resina parecida com incenso) é queimado. Numa completa escuridão, às vezes através da luz de uma vela, enquanto os outros ficam deitados quietamente nos seus tapetes de palha, o curandeiro, ajoelhando ou sentado, reza e canta ante um tipo de altar que contém um crucifixo, uma imagem de um santo ou algum outro objeto de adoração. Sob a influência dos cogumelos sagrados, o curandeiro aconselha em um estado visionário no qual até mesmo os observadores inativos mais ou menos participam. Na canção monótona do curandeiro, o teonanacatl em forma de cogumelo, dá suas respostas às perguntas colocadas. Diz se a pessoa doente viverá ou morrerá, quais ervas efetuarão a cura; revela o que ou quem matou uma dada pessoa, ou quem roubou o cavalo; ou torna conhecido como serão acontecimentos futuros, e assim sucessivamente.
A cerimônia do cogumelo não só tem apenas a função de uma consulta do tipo descrita, também tem para os índios, em muitos aspectos, um significado semelhante à Santa Comunhão do Cristianismo. De muitas expressões vocais dos nativos poderia ser deduzido que eles acreditam que Deus deu para os índios o cogumelo sagrado porque eles são pobres e não possuem nenhum doutor e medicamentos; e também porque, em particular, eles não podem ler a Bíblia, Deus pode falar então diretamente a eles através do cogumelo. A missionária Eunice V. Pike, mesmo aludindo às dificuldades que resultam de explicar a mensagem Cristã, a palavra escrita, para as pessoas que acreditam que elas possuem os meios – claro que os cogumelos sagrados – podem tornar a vontade de Deus conhecida para eles de uma maneira direta e clara: sim, os cogumelos lhes permitem ver o céu e estabelecer comunicação com o próprio Deus.
A reverência dos índios para os cogumelos sagrados também é evidente na convicção de que eles só podem ser comidos por uma “pessoa limpa”. “Limpa” aqui significa cerimoniamente limpa e esse termo inclui, entre outras coisas, pelo menos a abstinência sexual quatro dias antes e depois da ingestão dos cogumelos. Também devem ser observadas certas regras para juntar os cogumelos. Sem a observação destas ordens, os cogumelos podem tornar louca a pessoa que o come, ou pode até mesmo matar.
Os Wassons tinha empreendido sua primeira expedição para o território Mazatec em 1953, mas não foi antes de 1955 fez eles obtiveram sucesso em superar a timidez e a reserva dos amigos que eles tinham conseguido fazer em Mazatec, ao ponto de serem admitidos como participantes ativos em uma cerimônia de cogumelo. R. Gordon Wasson e seu companheiro, o fotógrafo Allan Richardson, estavam determinados a comerem cogumelos sagrados ao término de junho de 1955, por ocasião de uma cerimônia noturna de cogumelo. Eles se tornariam assim, com toda a probabilidade, os primeiros estranhos, os primeiros brancos a serem permitidos tomar teonanacatl.
No segundo volume de Cogumelos, Rússia e História, em palavras arrebatadas, Wasson descreve como o cogumelo tomou completamente posse dele, embora ele tivesse tentado lutar contra seus efeitos para poder permanecer como um observador objetivo. Primeiro ele viu padrões geométricos, coloridos que então assumiram características arquitetônicas. Visões logo seguidas de colunas esplêndidas, palácios de harmonia sobrenatural e magnificência embelezados com pedras preciosas, carros triunfais puxados por criaturas fabulosas como só são conhecidas na mitologia, e paisagens de brilho fabuloso. Separado do corpo, o espírito planou um tempo incontável por um reino de fantasia, entre imagens de uma realidade mais alta e de um significado mais profundo que o usual do mundo cotidiano. A essência da vida, o inafável, parecia estar à beira de ser destrancado, mas a última porta não se abriu.
Esta experiência foi a prova final para Wasson que os poderes mágicos atribuídos aos cogumelos de fato existiam e não eram somente superstição.
Para apresentar os cogumelos na pesquisa científica, Wasson tinha estabelecido anteriormente uma associação com o micologista Professor Roger Heim de Paris. Acompanhando o Wassons em expedições adicionais no território Mazatec, Heim conduziu a identificação botânica dos cogumelos sagrados. Ele mostrou que eles eram cogumelos pertencentes à família Strophariaceae, sobre uma dúzia de diferentes espécies ainda não descritas cientificamente, a maior parte pertencente ao gênero Psilocybe. O Professor Heim também teve sucesso cultivando algumas das espécies em laboratório. Os cogumelos mexicanos Psilocybe se mostraram serem especialmente satisfatórios para o cultivo artificial.
Investigações químicas correram em paralelo com estes estudos botânicos dos cogumelos mágicos, com a meta de extrair o princípio alucinógeno ativo do material do cogumelo e com isto preparar a forma quimicamente pura. Tais investigações foram executadas, a pedido do Professor Heim, no laboratório químico do Museu Nacional de História Natural de Paris, e grupos de trabalho também se ocuparam com este problema nos Estados Unidos, nos laboratórios de pesquisa de duas grandes companhias farmacêuticas: Merck and Smith, Kline and French. Os laboratórios americanos tinham obtido alguns dos cogumelos de R. G. Wasson e tinham juntado outros eles mesmo em Sierra Mazateca.
Como as investigações químicas em Paris e nos Estados Unidos se mostraram ineficazes, o Professor Heim enviou este assunto para a nossa firma, como mencionado no começo deste capítulo, porque ele sentia que a nossa experiência com o LSD, relacionada aos cogumelos mágicos por sua atividade semelhante, poderia ser usada nas tentativas de isolamento. Assim foi que o LSD mostrou ao teonanacatl o caminho do nosso laboratório.
Como diretor do departamento de produtos naturais do laboratório de pesquisa química-farmacêutica da Sandoz naquele momento, eu quis delegar a investigação dos cogumelos mágicos a um de meu colaboradores. Porém, ninguém mostrou muita ânsia para assumir este problema porque era conhecido que o LSD e tudo relacionado com isto era assuntos muito impopulares junto ao topo da administração. Porque o entusiasmo necessário para o sucesso dos objetivos não pode ser comandado e porque o entusiasmo já estava presente em mim e até onde abrangia este problema, eu mesmo decidi administrar a investigação.
Umas 100 g de cogumelos secos da espécie mexicana de Psilocybe, cultivados pelo Professor Heim no seu laboratório, estavam disponíveis para o começo das análises químicas. Meu assistente de laboratório, Hans Tscherter, um colaborador de longa década, tinha se desenvolvido como um ajudante muito capaz, completamente familiar com minha maneira de trabalho, ele me ajudou na extração e tentativas de isolamento. De vez que não havia nenhuma pista e nada relativo às propriedades químicas do princípio ativo que nós buscávamos, as tentativas de isolamento tiveram que ser administradas com base nos efeitos de frações do extrato. Mas nenhum dos vários extratos mostrou um efeito inequívoco em ratos ou cachorros que pudessem ter apontado a presença de princípios alucinógenos. Ficou duvidoso então se os cogumelos cultivados e secos de Paris ainda eram ativos. Isso só poderia ser determinado experimentando com este material de cogumelo em um ser humano. Como no caso de LSD, eu mesmo fiz este experimento fundamental, de vez que não é apropriado para investigadores solicitarem que um outro execute uma auto-experiência, porque eles já estão envolvidos com suas próprias investigações, especialmente se elas demandam, como neste caso, um certo risco.
Nesta experiência eu comi 32 espécimes secas de Psilocybe mexicano que junto pesaram 2,4 g. Esta quantia correspondia a uma dose comum, de acordo com os relatórios de Wasson e Heim, como era usado pelos curandeiros. Os cogumelos exibiram um efeito psíquico forte, como mostra o seguinte extrato do relatório daquela experiência:
Trinta minutos depois de minha ingestão dos cogumelos, o mundo exterior começou a sofrer uma transformação estranha. Tudo assumiu um caráter mexicano. Como eu estava perfeitamente ciente do meu conhecimento da origem mexicana do cogumelo isto me conduziu a imaginar só paisagens mexicanas, eu tentei deliberadamente olhar meu ambiente como eu o conhecia normalmente. Mas todos os esforços voluntários para olhar as coisas nas suas formas habituais e nas suas cores foram ineficazes. Se meus olhos estivessem fechados ou abertos, eu via só motivos mexicanos e cores. Quando o doutor que supervisionava a experiência se agachou para conferir minha pressão sanguínea, ele foi transformado num sacerdote asteca e eu não teria ficado surpreso se ele tivesse puxado uma faca de sacrifício. Apesar da seriedade da situação, me divertiu ver como a face germânica de meu colega tinha adquirido uma expressão puramente índia. Ao cume da intoxicação, aproximadamente uma hora e meia depois de ingestão dos cogumelos, a rapidez dos quadros interiores, motivos principalmente abstratos que mudavam rapidamente de forma e cor, alcançaram um tal grau alarmante que eu temi que seria rasgado neste redemoinho de água, de forma e cor e que eu me dissolveria. Depois de aproximadamente seis horas, o sonho veio a um fim. Subjetivamente, eu não tive nenhuma idéia de quanto tempo esta condição tinha durado. Eu sentia meu retorno para realidade cotidiana como sendo um retorno feliz de um estranho, fantástico mas bastante real mundo, para uma velha e familiar casa.
Esta auto-experiência mostrou uma vez mais que os seres humanos reagem muito mais sensivelmente que os animais para as substâncias psico-ativas. Nós já tínhamos chegado à mesma conclusão experimentando o LSD em animais, como descrito em um capítulo anterior deste livro. Não foi a inatividade do material do cogumelo, mas sim a capacidade de reação deficiente dos animais de pesquisa em vista do tipo de princípio ativo, que explicou porque nossos extratos tinham parecido inativos no rato e no cachorro.
Porque o ensaio em sujeitos humanos era o único teste à nossa disposição para a descoberta das frações ativas de extrato, nós não tivemos nenhuma outra escolha que a de executar a prova em nós mesmos se nós quiséssemos continuar o trabalho e chegar então a uma conclusão satisfatória. Na autoexperiência há pouco descrita, uma forte reação que durou várias horas foi produzida por 2,4 g de cogumelos secos. Então, em seqüência, nós usamos amostras que correspondiam só a um terço desta quantia, isto é 0,8 g de cogumelos secos. Se estas amostras contivessem o princípio ativo, eles provocariam só um efeito moderado que prejudicaria um pouco a habilidade para trabalhar por um curto intervalo de tempo, mas este efeito ainda seria tão distinto que as frações inativas e aquelas contendo o princípio ativo poderiam ser inequivocamente diferenciadas umas das outras. Vários colaboradores e colegas se ofereceram como “cobaias” para esta série de testes.
6.2. Psilocybin e Psilocin
Com ajuda deste teste fidedigno em objetos humanos poderia ser isolado o princípio ativo, poderia ser concentrado e poderia ser transformado em um estado quimicamente puro por meio dos métodos de separação mais recentes. Duas substâncias novas, que eu nomeei psilocybin e psilocin, foram obtidas assim na forma de cristais incolores.
Estes resultados foram publicados em março de 1958, no jornal Experientia, em colaboração com o Professor Heim e meus colegas Dr. A. Brack e Dr. H. Kobel que tinha provido as maiores quantidades de material de cogumelo para estas investigações depois que eles melhoraram o cultivo dos cogumelos essencialmente em laboratório.
Alguns de meus colaboradores na ocasião – Drs. A. J. Frey, H. Ott, T. Petrzilka e F. Troxler – então participaram dos próximos passos destas investigações, a determinação da estrutura química do psilocybin e do psilocin e a síntese subseqüente destas combinações, os resultados foram publicados em novembro 1958 pelo jornal Experientia. As estruturas químicas destes fatores do cogumelo merecem atenção especial em várias direções. Psilocybin e psilocin pertencem, como o LSD, às combinações de índole, à classe biologicamente importante de substâncias achadas nas plantas e no reino animal. Características químicas particulares comuns às substâncias do cogumelo e do LSD, mostraram que psilocybin e psilocin são relacionados de perto ao LSD, não só com respeito aos efeitos psíquicos, mas também quanto as suas estruturas químicas. Psilocybin é o ácido éster fosfórico do psilocin e, como tal, é o primeiro e até agora ácido fosfórico que contêm combinação de índole descobertos na natureza. O resíduo do ácido fosfórico não contribui para a atividade, porque o psilocin, livre do ácido fosfórico, é igualmente ativo como o psilocybin, mas torna a molécula mais estável. Enquanto psilocin é decomposto prontamente pelo oxigênio do ar, psilocybin é uma substância estável.
Psilocybin e psilocin possuem uma estrutura química bem parecida com o fator serotonina do cérebro. Como já foi mencionado no capítulo das experiências com animais em pesquisas biológicas, serotonina representa um importante papel na química das funções do cérebro. Os dois fatores do cogumelo, como o LSD, bloquearam os efeitos da serotonina em experiências farmacológicas em diferentes órgãos. Outras propriedades farmacológicas do psilocybin e psilocin também são semelhantes aqueles do LSD. A principal diferença consiste na atividade quantitativa, tanto em animal como também na experimentação humana. A dose ativa comum de psilocybin ou psilocin para seres humanos é de 10 mg (0,01 g); de acordo com isso, estas duas substâncias são aproximadamente 100 vezes menos ativas que o LSD, do qual 0,1 mg constitui uma dose forte. Além disso, os efeitos dos fatores do cogumelo duram só de quatro a seis horas, muito menos que os efeitos do LSD (de oito a doze horas).
A síntese total do psilocybin e psilocin sem a ajuda dos cogumelos poderia ser desenvolvida em um processo técnico que permitiria produzir estas substâncias em grande escala. A produção sintética é mais racional e mais barata que a extração dos cogumelos.
Assim, com o isolamento e a síntese dos princípios ativos, a desmistificação dos cogumelos mágicos foi realizada. As combinações, cujos efeitos maravilhosos conduziram os índios a acreditar durante milênios que um deus estava residindo nos cogumelos, teve suas estruturas químicas elucidadas e poderia ser produzido sinteticamente em frascos.
Neste caso, quanto de progresso em conhecimento científico foi obtido através da pesquisa de produtos naturais? Essencialmente, quando tudo é dito e feito, nós só podemos dizer que o mistério dos efeitos maravilhosos do teonanacatl foi reduzido ao mistério dos efeitos de duas substâncias cristalinas – desde que estes efeitos ou não podem ser explicados através de ciência, mas só podem ser descritos.
6.3. Uma Viagem no Universo da Alma com Psilocybin
A relação entre os efeitos psíquicos do psilocybin e aqueles do LSD, o caráter visionário e alucinógeno deles, fica evidente no seguinte relatório de Antaios, de uma experiência de psilocybin pelo Dr. Rudolf Gelpke. Ele caracterizou as experiências dele com o LSD e o psilocybin, como já mencionado no prévio capítulo, “Viagens ao Universo da Alma”.
6.4. Onde o Tempo Permanece Parado
(10 mg de psilocybin, 6 de abril de 1961, 10:20)
Depois de 20 minutos estão começando os efeitos: serenidade, mudez, sensação moderada de
tontura, mas agradável e uma “profunda respiração muito agradável”.
10:50 Forte vertigem, já não posso me concentrar.
10:55 Excitado, intensidade de cores: tudo de tom rosa para vermelho.
11:05 O mundo se concentra lá no centro da mesa. Cores muito intensas.
11:10 Um ser dividido, sem precedente – como eu posso descrever esta sensação de vida?
Ondas, diferentes personalidades, preciso me controlar.
Imediatamente depois desta nota eu fui para o ar livre e deixei a mesa do café da manhã onde eu tinha comido com o Dr. H. e sua esposa, e deitei no gramado. A inebriação chegou rapidamente a seu clímax. Embora eu tivesse resolvido firmemente tomar notas constantes, agora me parecia um completo desperdício de tempo, o movimento de escritura infinitamente lento, as impossibilidades de expressar, da expressão verbal vil – medida pela inundação da experiência interna que me invadiu e ameaçou me estourar. Parecia para mim que 100 anos não seriam suficientes para descrever a abundância da experiência de um único minuto. No princípio, impressões ópticas predominaram: Eu vi com delícia uma sucessão ilimitada de filas de árvores na floresta próxima. Então nuvens esfarrapadas no céu ensolarado rapidamente se acumulando em cima, com uma majestade silenciosa e empolgante, numa superposição de milhares de capas – céu no céu – e eu fiquei então esperando que, lá em cima, no próximo momento, algo completamente poderoso, desconhecido, não ainda existente, poderia aparecer ou acontecer – veria eu um deus? Mas só a expectativa permaneceu, o pressentimento, isto pairando, “no umbral do último sentimento”… Então eu me movi para mais para longe (a proximidade dos outros me perturbava) e me deitei num recanto do jardim, numa pilha de madeira esquentada pelo sol. Meus dedos acariciavam esta madeira com uma afeição sensual animal transbordante. Ao mesmo tempo eu submergi dentro de mim; foi um clímax absoluto: uma sensação de felicidade me penetrou, uma felicidade contente – eu próprio me encontrei atrás de meus olhos fechados numa cavidade cheia de ornamentos vermelho-tijolo, e ao mesmo tempo, no “centro do universo de calma consumada”. Eu soube que tudo era bom – a causa e origens de tudo eram boas. Mas no mesmo momento eu entendi também o sofrimento e a abominação, a depressão e o desentendimento da vida ordinária: lá onde uma pessoa nunca “é total”, mas ao invés, está dividida, cortada em pedaços e dividida em fragmentos minúsculos de segundos, minutos, horas, dias, semanas e anos: lá a pessoa está escrava do tempo de Moloch que devora as pessoas pedaço por pedaço; a pessoa está condenada a gaguejar, errar e retalhar; a pessoa tem que arrastar consigo mesmo a perfeição e o absoluto, a união de todas as coisas; o momento eterno da idade dourada, este original fundamento de ser – que realmente, não obstante, sempre suportou e sempre suportará – lá num dia da semana da existência humana, como um espinho atormentador enterrado profundamente na alma, como uma recordação de uma reivindicação nunca preenchida, como uma manhã fatal de um prometido paraíso perdido; por este “presente” sonho febril para um “passado” condenado em um “futuro” nublado. Eu entendi. Esta inebriação era um vôo espacial, não do exterior mas sim do homem interior e por um momento, eu experimentei a realidade de um local além da força da gravidade do tempo.
Como eu comecei a sentir novamente a força da gravidade, eu fui infantil o bastante para querer adiar este retorno tomando uma nova dose de 6 mg de psilocybin as 11:45, e uma vez mais 4 mg as 14:30. O efeito foi insignificante, e em todo caso não vale a pena ser mencionando.
Sra. Li Gelpke, uma artista, também participou desta série de investigações, fazendo três autoexperiências com LSD e psilocybin. A artista escreveu dos desenhos que ela fez durante a experiência:
Nada nesta página foi formado conscientemente. Enquanto eu trabalhei nisto, a memória (da experiência sob o psilocybin) era novamente realidade e me conduziu a cada pincelada. Por isso o quadro é como muitas camadas desta memória e a figura do lado direito mais em baixo, realmente é o que capturei dos sonhos… Quando livros sobre arte mexicana depois vieram até minhas mãos três semanas mais tarde, eu achei novamente lá os motivos de minhas visões onde com um começo súbito…
Maria Sabina e Gordon Wasson
Eu também mencionei a ocorrência de motivos mexicanos na inebriação de psilocybin durante minha primeira auto-experiência mexicana com Psilocybe seco, como foi descrito na seção na investigação química destes cogumelos. O mesmo fenômeno também ocorreu com R. Gordon Wasson. Procedendo de tais observações, ele adiantou a conjetura que a arte mexicana antiga poderia ter sido influenciada através de imagens visionárias, como eles aparecem na inebriação de cogumelo.
(…) Um dia depois, nós fizemos nossa visita formal a curandeira Maria Sabina, uma mulher tornada famosa pelas publicações dos Wassons. Foi na cabana dela que Gordon Wasson se tornou o primeiro homem branco a provar os cogumelos sagrados, no curso de uma cerimônia noturna, no verão de 1955. Gordon e Maria Sabina saudaram um ao outro como velhos amigos, cordialmente. A curandeira vivia fora do caminho, ao lado das montanhas de Huautla. A casa na qual a histórica sessão com Gordon Wasson tinha acontecido, tinha sido queimada, presumivelmente por residentes enfurecidos ou algum colega invejoso, porque ela tinha divulgado o segredo do teonanacatl para estranhos. Na nova cabana na qual nós estávamos, prevalecia uma desordem incrível, como provavelmente também devia ter prevalecido na antiga cabana na qual as crianças meio-desnudas, galinhas e porcos viviam em alvoroço. A velha curandeira tinha uma face inteligente, excepcionalmente mutável em expressão. Ela ficou impressionada obviamente quando foi explicado que nós tínhamos conseguido confinar o espírito dos cogumelos em pílulas, e ela prontamente se declarou pronta para “nos servir” com elas, quer dizer, nos conceder uma consulta. Ficou acordado que isto deveria acontecer na próxima noite na casa de Dona Herlinda.
6.8. Uma Cerimônia de cogumelo
Tão logo nós voltamos para a casa de Herlinda, ao entardecer, Maria Sabina já tinha chegado lá com uma grande comitiva, suas duas filhas adoráveis, Apolonia e Aurora (duas curandeiras videntes) e uma sobrinha, todos trouxeram também crianças. Sempre que a criança dela começava chorar, Apolônia ofereceria seu peito a ela. O velho curandeiro, Don Aurélio, também apareceu, um homem poderoso, caolho, vestindo um capote preto-e-branco. Foram servidos Cacao e massa doce na varanda. Fizeramme lembrar do relato de uma velha crônica que descrevia como o “chocolatl” era bebido antes da ingestão de teonanacatl.
Quando escureceu, todos nós fomos para o quarto no qual a cerimônia aconteceria. Ele então foi fechado, isto é, a porta foi obstruída com a única cama disponível. Só uma saída de emergência que dava para os fundos do jardim permaneceu aberta para uma necessidade absoluta. Era quase meianoite quando a cerimônia começou. Até aquele momento, todos os participantes da reunião tinham ficado dormindo na escuridão ou esperando os eventos da noite nas esteiras esparramadas pelo chão. Maria Sabina lançava de vez em quando um pedaço de copal nas brasas de um braseiro, pelo que o ar sufocante do quarto abarrotado ficava pouco suportável. Eu tinha explicado para a curandeira Herlinda, que estava novamente na reunião como intérprete, que aquela pílula continha o espírito de dois pares de cogumelos. (Cada pílula continha 5,0 mg de psilocybin sintético).
Quando tudo estava pronto, Maria Sabina distribuiu as pílulas em pares entre os adultos presentes. Depois de fumar solenemente, ela tomou dois pares (correspondendo a 20 mg de psilocybin). Ela deu a mesma dose para Don Aurélio e para sua filha Apolonia que também serviria como curandeira. Aurora recebeu um par, como também fez Gordon, enquanto minha esposa e Irmgard tomaram só uma pílula cada.
Uma das crianças, uma menina de cerca de dez anos, a pedido de Maria Sabina, tinha preparado para mim o suco de cinco pares de folhas frescas de hojas de la Pastora. Eu queria experimentar esta droga que eu tinha estado impossibilitado de tentar em San Jose Tenango. Foi dito que a poção era especialmente ativa quando preparada por uma menina virgem. A xícara com o suco exprimido foi igualmente purificada e conjurada por Maria Sabina e Don Aurélio, antes que me fosse entregue.
Todas estas preparações e muito da cerimônia seguinte progrediram do mesmo modo como a consulta com a curandeira Consuela Garcia em San Jose Tenango.
Depois que a droga foi consumida e a vela no “altar” foi apagada, nós esperamos os efeitos na escuridão.
Antes que uma meia hora tivesse decorrido, a curandeira murmuraram algo; sua filha e Don Aurélio também ficaram inquietos. Herlinda traduziu e nos explicou o que estava errado. Maria Sabina tinha dito que as pílulas não continham o espírito dos cogumelos. Eu discuti a situação com Gordon que se deitara ao meu lado. Para nós estava claro que a absorção do princípio ativo das pílulas, que precisava primeiro se dissolver no estômago, acontecia mais lentamente do que os cogumelos nos quais alguns dos princípios ativos já eram absorvidos pelas membranas mucosas durante o mastigar. Mas como nós poderíamos dar uma explicação científica sob tal condição? Em lugar de tentar explicar, nós decidimos agir. Nós distribuímos mais pílulas. As curandeiras e o curandeiro, cada um recebeu outro par. Cada um agora tinha tomado uma dose total de 30 mg de psilocybin.
Depois de aproximadamente outro quarto de hora, o espírito das pílulas começou a manifestar seus efeitos que duraram até o amanhecer. As filhas, e Don Aurélio com sua grave voz funda, fervorosamente respondiam às orações e canções da curandeira. Gemidos felizes, ansiosos de Apolonia e Aurora, entre cantar e rezar, deu a impressão que a experiência religiosa das jovens mulheres, na inebriação pela droga, foi combinada com sentimentos sensual-sexuais.
No meio da cerimônia, Maria Sabina perguntou pelo nosso pedido. Gordon perguntou novamente sobre a saúde da filha dele e de seu neto. Ele recebeu a mesma boa informação como a da curandeira Consuela. A mãe e criança de fato estavam bem quando ele voltou para sua casa em Nova Iorque. Porém obviamente isto ainda não representa nenhuma prova das habilidades proféticas de ambas curandeiras.
Evidentemente com o efeito do hojas, eu me achei durante algum tempo em um estado de sensibilidade mental e intensa experiência que, porém, não foi acompanhado de alucinações. Anita, Irmgard e Gordon experimentaram uma condição de euforia da inebriação que foi influenciada através da atmosfera estranha e mística. Minha esposa ficou impressionada pela visão de padrões distintos de linha muito estranhos.
Ela ficou surpresa e perplexa, algum tempo depois, ao descobrir as mesmas imagens justamente na rica ornamentação em cima do altar de uma velha igreja perto de Puebla. Isso aconteceu durante a viagem de retorno para a Cidade do México, quando nós visitamos igrejas de tempos coloniais. Estas igrejas admiráveis oferecem grande interesse cultural e histórico porque os artistas índios e trabalhadores que ajudaram na construção delas se basearam nos elementos do estilo índio. Klaus Thomas, em seu livro Die kunstlich gesteuerte Seele [A mente artificialmente guiada] (Ferdinand Enke Verlag, Stuttgart, 1970), escreve sobre a possível influência de visões da inebriação do psilocybin na arte indígena Meso-americana: “Seguramente uma comparação histórica-cultural das velhas e novas criações de arte índia… precisa convencer o espectador imparcial da harmonia com as imagens, formas e cores de uma inebriação de psilocybin”. O caráter mexicano das visões visto na minha primeira experiência com o Psilocybe seco mexicano e do desenho de Li Gelpke depois de uma inebriação de psilocybin também poderiam apontar para uma tal associação.
Quando nós íamos deixar Maria Sabina e sua clã, ao amanhecer, a curandeira disse que as pílulas tinham o mesmo poder que os cogumelos e que não havia nenhuma diferença. Esta era uma confirmação, por parte de uma autoridade bem competente, de que o psilocybin sintético é idêntico ao produto natural. Como um presente de despedida eu deixei, com Maria Sabina, um frasco de pílulas de psilocybin. Ela radiante explicou, ao nosso intérprete Herlinda, que agora ela poderia dar consultas também na estação quando nenhum cogumelo cresce.
Como nós deveríamos julgar a conduta de Maria Sabina, pelo fato que ela permitiu que estranhos, pessoas brancas, tivessem acesso à cerimônia secreta, e lhes tinha deixado provar do cogumelo sagrado?
Ao crédito dela pode ser dito que ela tinha aberto assim as portas à exploração do culto do cogumelo mexicano, na sua presente forma, para a investigação científica, botânica e química dos cogumelos sagrados. Valiosas substâncias ativas, tais como o psilocybin e o psilocin, resultaram daí. Sem esta ajuda, o conhecimento antigo e a experiência que estavam escondidas nestas práticas secretas iriam possivelmente, mesmo provavelmente, desaparecer sem deixar um rastro, sem frutificar, no avanço da civilização Ocidental.
De outro ponto de vista, a conduta desta curandeira pode ser considerada como uma profanação de um costume sagrado, até mesmo como uma traição. Alguns dos seus compatriotas eram desta opinião o que foi expresso em atos de vingança inclusive com a queima de sua casa.
A profanação do culto do cogumelo não parou com as investigações científicas. A publicação sobre os cogumelos mágicos motivou uma invasão de hippies e procuradores de droga no território Mazatec, muitos dos quais se comportaram mal, alguns mesmo criminalmente. Outra conseqüência indesejável foi o começo de verdadeiro turismo em Huautla de Jimenez, por meio do que a originalidade do lugar foi erradicada.
Tais declarações e considerações são na maior parte, a preocupação da pesquisa etnográfica. Onde quer que os investigadores e os cientistas localizem e elucidam os restos de antigos costumes, que estão ficando mais raros, o primitivismo deles fica perdido. Esta perda só é mais ou menos contrabalançada quando o resultado da pesquisa representa um lucro cultural duradouro.
A partir de Huautla de Jimenez nós fomos primeiro para Teotitlan, num passeio de caminhão escangalhado ao longo de uma estrada meio-pavimentada, e de lá voltamos numa viagem de carro confortável até a Cidade do México, que tinha sido o ponto de partida da nossa expedição. Eu tinha perdido vários quilogramas do peso de meu corpo, mas estava sobremaneira me sentindo compensado e encantando pelas experiências.
As amostras herbárias de hojas de la Pastora, que nós tínhamos trazido conosco, foram submetidas à identificação botânica por Carl Epling e Carlos D. Jativa no Instituto Botânico da Universidade de Harvard em Cambridge, Massachusetts. Eles acharam que esta planta era uma espécie de Salvia ainda não descrita e foi denominada Salvia divinorum por estes autores. A investigação química do suco da salvia mágica, no laboratório da Basiléia, foi um fracasso. O princípio psico-ativo desta droga parece ser uma substância bastante instável, de vez que o suco preparado e preservado com álcool no México provou em, auto-experiência, não ser mais nenhum pouco ativo. No que concerne à natureza química do princípio ativo, o problema da planta mágica ska Maria Pastora ainda espera uma solução.
Tão longamente neste livro eu descrevi meu trabalho científico e assuntos principalmente relativos à minha atividade profissional. Mas este trabalho, por muito de sua natureza, tiveram repercussões em minha própria vida e personalidade, não menos porque me colocou em contato com contemporâneos interessantes e importantes. Eu já mencionei alguns deles: Timothy Leary, Rudolf Gelpke, Gordon Wasson… Agora, nas páginas que seguem, eu gostaria de abdicar da reserva do cientista natural para retratar encontros que foram pessoalmente significantes para mim e que me ajudaram a resolver perguntas colocadas pelas substâncias que eu tinha descoberto.