Seria o Brasil o novo epicentro da Ciência Psicodélica no mundo?

por Bia Labate

Eu sou parte do comitê científico da Segunda Conferência Mundial sobre Ayahuasca, a qual acontecerá em Rio Branco, na Amazônia Brasileira, em Outubro de 2016. Eu gostaria de compartilhar algumas incríveis informações científicas envolvendo a ayahuasca.

A conferência combina um palco principal, e um palco paralelo composto por pesquisadores que responderam ao “chamado para artigos”, um festival de cinema e uma série de eventos culturais. O palco principal terá representantes das religiões brasileiras que consagram ayahuasca, cerca de 100 indígenas e 11 mesas redondas. Estes incluem: xamanismo amazônico, cultura e patrimônio cultural, pesquisa científica, usos contemporâneos, intervenções clínicas, desafios da globalização, política e leis, meio ambiente e sustentabilidade, plantas da Amazônia, questões de gênero e riscos.

Na primeira edição da conferência em Ibiza, em 2014, foram enviadas cem propostas de apresentação. Agora, dois anos depois, esse número dobrou. A ciência da Ayahuasca parece espalhar-se pelo mundo vigorosa e dinamicamente assim como a própria ayahuasca. O  número de profissionais está crescendo, estão cada vez mais inspirados para estudar esta substância intrigante através das lentes de diferentes disciplinas.

Das 200 apresentações recebidas, 120 foram para a área acadêmica, e 80 para o palco comunitário, que consiste de praticantes com conhecimento empírico. Os artigos vêm de um total incrível de 28 países! Metade das propostas são da área de ciências sociais, e a outra metade dos campos de biomedicina, psicologia e saúde pública combinados. Embora ainda haja uma predominância de pesquisadores e profissionais do sexo masculino, um número crescente de mulheres estão participando sobre estas questões.

Os tópicos são variados como: ayahuasca para moradores de rua, tratamento para usuários problemáticos de drogas ou álcool, uso por veteranos de guerra e prisioneiros, terapias para lidar com a morte e no parto, e o papel da ayahuasca nos distúrbios de saúde mental e no bem-estar psicológico . Eles também abordam a prática ritual, o conhecimento xamânico, as relações inter-étnicas, o hibridismo cultural, a transnacionalização religiosa, a política de cura e a mercantilização. Além disso, a relação com terapias alternativas e espiritualidade da Nova Era será contemplada. Algumas apresentações também se concentram nos tópicos de legalidade, riscos à saúde e abuso sexual. Finalmente, artes e música, ao lado de ecologia e conservação, estão no menu da conferência.

Quase metade das propostas enviadas vieram do Brasil. Embora isso seja compreensível, a conferência revelou, para nossa surpresa, a notável emergência de novos grupos de pesquisa em todo o país. Esses incluem:

Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes(PROAD)

São Paulo

Dr. Dartiu Xavier da Silveira

Um grupo de 21 anos de pesquisa sobre ayahuasca que se materializou fora da organização PROAD, que vem conduzindo pesquisas com drogas desde 1991. Atualmente, cerca de 20 professores, pós-doutores e estudantes de graduação e pós-graduação pesquisam os potenciais terapêuticos e Uso ritualístico da ayahuasca, incluindo estudos epidemiológicos, ensaios clínicos, estudos de comorbidade, neurociências e redução de danos.

 

Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos (NEIP)

São Paulo e outras cidades
Dra. Bia Labate

Uma rede de ciências sociais de 15 anos com 70 professores e pesquisadores de nível pós-graduado. Os membros do grupo organizaram várias conferências, publicaram dois livros e um grande número de dissertações de mestrado e doutorado, predominantemente em antropologia, sobre as religiões ayahuasca brasileiras (Santo Daime, Barquinha e União do Vegetal), novos usos urbanos de ayahuasca e indígenas.

 

Universidade de São Paulo (USP)

Ribeirão Preto

Dr. Jaime Hallak, Dr. José Alexandre Crippa, Dra. Flávia Osório e Dr. Antônio Zuardi
Um grupo de pesquisa com mais de 20 professores, pós-doutores e estudantes de pós-graduação, envolvido há mais de uma década na investigação de novos medicamentos para o tratamento de transtornos neuropsiquiátricos como depressão, ansiedade, esquizofrenia e doença de Parkinson. O grupo é uma das equipes científicas brasileiras mais produtivas no campo biomédico. Eles realizam ensaios clínicos com voluntários saudáveis ​​e pacientes, investigando o potencial do uso terapêutico de vários fármacos, incluindo ayahuasca, canabidiol, nitroprussiato de sódio e ocitocina, entre outros.

 

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Natal
Dr. Draulio de Araujo
Este é um grupo interdisciplinar de sete anos de idade de 30 pesquisadores, incluindo professores, pós-doutores e estudantes de graduação. Seus interesses de pesquisa incluem os efeitos antidepressivos agudos e duradouros da ayahuasca. Diferentes marcadores biológicos e comportamentais são investigados nos campos da bioquímica, neuropsicologia e neuropsiquiatria, usando métodos como MRIs e EEGs.

 

Universidade de Brasília (UNB)

Brasília
Dra. Regina Célia de Oliveira

Este trabalho é de um grupo de dois anos de idade, composto por seis pesquisadores botânicos e um toxicologista, incluindo professores e estudantes de graduação. O foco da pesquisa é descobrir quais espécies do cipó Banisteriopsis spp são usadas pelas religiões brasileiras da ayahuasca e entender seu conhecimento etnobotânico dessas espécies. O foco inclui morfologia externa, análise citogenética, seqüenciamento de DNA, caracterização química, fitoquímica, anatomia, diversidade genética, conservação, análise filogenética, composição química e componentes bioativos da ayahuasca.

 

Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)

Campinas

Dr. Luis Fernando Tófoli

Trata-se de um grupo interdisciplinar de um ano de idade, composto por 20 professores, pesquisadores e alunos. Seus interesses de pesquisa incluem o manejo agrícola de Banisteriopsis caapi e Psychotria viridis, análises químicas das próprias espécies de ayahuasca, fisiologia da ayahuasca, estabilidade de amostras de ayahuasca, liofilização, metabolômica, potenciais terapêuticos e estudos neurocientíficos.

Segundo os pesquisadores, os principais desafios são:

– encontrar financiamento;

– obter acesso ao DMT;

– a ortodoxia de alguns grupos de ayahuasca e o acesso a eles;

– encontrar voluntários para as experiências (devido a critérios de recrutamento);

– prejuízo dos profissionais de saúde;

– acesso à videira e à folha, ambos crescendo na natureza e cultivados;

– os desafios analíticos da caracterização da química das plantas coletadas.

 

Por outro lado, como potenciais benefícios, essas pesquisas podem:

– reconhecer e registrar uma grande variedade de práticas culturais ricas;

– ampliar a compreensão dos diversos contextos de uso e seus significados;

– dissipar o estigma e a criminalização;

– dar mais legitimidade aos grupos da ayahuasca;

– propor alternativas aos desafios da expansão;

– informar sobre os riscos e benefícios;

– aprender sobre os processos de saúde mental em indivíduos saudáveis;

– encontrar tratamento alternativo para doenças mentais ou perturbações, incluindo novas formas de tratamento para depressão e ansiedade;

– desenvolver terapias psicodélicas;

– compreender a origem e a idade das espécies;

– compreender a diversidade cultural e genética das plantas.

Apesar dos enormes desafios no atual cenário político e científico brasileiro, a ciência psicodélica parece estar crescendo naturalmente. Se você está interessado nesses tópicos, esta conferência é “como mel para abelhas”, como dizemos no Brasil. Venha participar neste diálogo único entre o conhecimento tradicional e a ciência!

Bia Labate é uma antropóloga brasileira que vive no México. Pesquisa substâncias psicoativas, politica de drogas, xamanismo, rituais e religião. Tem 17 livros publicados.

Para mais informações
www.twitter.com/LabateBia
www.bialabate.net

FONTE huffingtonpost.com

Alucinógenos que podem curar

Matéria publicada em Janeiro pela ” Scientific American Brasil“, nos foi direcionada por Vinícius Costa.

Em horas, substâncias psicoativas são capazes de induzir realinhamentos psicológicos profundos que exigiriam décadas para serem alcançados no divã.
por Roland R. Griffiths e Charles S. Grob

SANDY LUNDAHL, EDUCADORA EM SAÚDE DE 50 ANOS DE IDADE, chegou ao centro de estudos biológicos comportamentais na Johns Hopkins University School of Medicine em uma manhã de primavera de 2004. Ela se ofereceu para participar de um dos primeiros estudos com drogas alucinógenas nos Estados Unidos em mais de três décadas. Preencheu questionários, conversou com os dois monitores que estariam com ela pelas próximas oito horas e se ajeitou no confortável espaço parecido com uma sala de estar em que a sessão aconteceria. Então, engoliu duas cápsulas azuis e reclinou-se em um sofá. Para ajudá-la a relaxar e focar seu interior, ela usava tapa-olhos e fones de ouvido, que transmitiam música clássica especialmente selecionada.

As cápsulas continham um a alta dose de psilocibina, principal componente dos cogumelos “mágicos”, que, como o LSD e a mescalina, produzem alterações de humor e percepção, mas muito raramente alucinações. Ao final da sessão, quando os efeitos haviam se dissipado, Sandy, que nunca havia tomado um alucinógeno antes, preencheu mais questionários. Suas respostas indicavam que, durante o tempo em que ficou na sala, havia passado por uma profunda
experiência mística.

Em uma visita de acompanhamento mais de um ano depois, ela disse que continuava a pensar na experiência diariamente e – o mais notável – que ela a considerava o evento mais pessoal e espiritualmente significativo de sua vida. Ela sentia que aquilo trouxera mudanças positivas em seu humor, atitudes, comportamento e uma perceptível melhora em sua satisfação com a vida como um todo. “Parece que a experiência levou a uma aceleração do meu desdobramento ou desenvolvimento espiritual”, descreveu. “Lampejos de introspecção ainda ocorrem… Sou muito mais amorosa – compensando as feridas que causei no passado… Sou cada vez mais capaz de perceber as pessoas como tendo a luz do divino fluindo por elas.”

Sandy foi uma de 36 participantes de um estudo conduzido por um de nós de (Griffiths) na Johns Hopkins que começou em 2001 e foi publicado em 2006, seguido por um relatório que saiu dois anos depois. Quando o primeiro trabalho apareceu no periódico Psychopharmacology, muitos membros da comunidade científica saudaram a ressurreição de uma área de pesquisas que estava dormente havia um bom tempo. Os estudos com a psilocibina na universidade continuam por dois caminhos: um explora os efeitos psicoespirituais da droga em voluntários saudáveis. O outro estuda se os estados de consciência alterada induzidos por alucinógenos – e, em particular, experiências místicas – poderiam mitigar os efeitos de vários problemas psiquiátricos e comportamentais, incluindo alguns para os quais as terapias atuais não chegam a ser efetivas. A principal droga usada nesses estudos é a psilocibina, que integra os chamados alucinógenos clássicos. Assim como as outras drogas dessa classe – psilocina, mescalina, DMT e LSD –, a psilocibina age nos receptores de serotonina das células cerebrais. Confusamente, substâncias de outras classes que exercem efeitos farmacológicos diferentes desses dos alucinógenos clássicos também são rotuladas como alucinógenos” pela mídia e por relatórios epidemiológicos. Esses compostos, alguns dos quais também podem oferecer potencial terapêutico, incluem a quetamina, o MDMA (popularizado como “ecstasy”), salviorina A e ibogaína, entre outros.

SUPERANDO LEARY

A PESQUISA TERAPÊUTICA com os alucinógenos se vale de evidências promissoras observadas em estudos iniciados nos anos 50 que, coletivamente, envolveram milhares de participantes. Alguns desses estudos sugeriam que os alucinógenos poderiam ajudar a tratar a dependência química e a aliviar o sofrimento psicológico das doenças terminais. Essa pesquisa parou no início dos anos 70, quando o uso recreativo dos alucinógenos, principalmente o LSD, cresceu e atraiu uma cobertura sensacionalista da mídia. Esse campo de investigação também foi afetado pela demissão amplamente divulgada de Timothy Leary e Richard Alpert da Harvard University em 1963, em resposta à preocupação sobre métodos heterodoxos de pesquisa usando alucinógenos, incluindo, no caso de Alpert, oferecer psilocibina a um estudante fora do campus.

O crescente uso sem supervisão de substâncias pouco compreendidas, em parte resultado do apoio dado a elas pelo carismático Leary, ganhou repercussão. O Ato de Substâncias Controladas, de 1970, pôs os alucinógenos comuns na Lista 1, a categoria mais restritiva. Novas limitações foram impostas à pesquisa com humanos, a subvenção estatal foi suspensa e os pesquisadores envolvidos nessa linha de pesquisa se viram profi ssionalmente marginalizados.

Décadas se passaram antes que as atitudes que bloquearam as pesquisas arrefecessem o bastante para permitir estudos rigorosos com humanos envolvendo o uso dessas substâncias. As experiências místicas permitidas pelos alucinógenos interessam os pesquisadores particularmente porque têm o potencial de produzir mudanças positivas rápidas e duradouras no humor e comportamento – alterações que podem demandar anos de esforço na psicoterapia convencional.

O trabalho feito na Johns Hopkins é emocionante porque demonstra que essas experiências podem ser produzidas em laboratório na maioria das pessoas estudadas. Ele permite, pela primeira vez, pesquisas científi cas rigorosas e avaliações que registram os voluntários antes e depois do uso da droga. Esse tipo de estudo permite aos pesquisadores examinar as causas e efeitos psicológicos e comportamentais dessas experiências extraordinárias.

Pesquisadores da Johns Hopkins usaram questionários originalmente desenvolvidos para avaliar experiências místicas que ocorriam sem drogas. Eles também analisaram os estados psicológicos gerais dos participantes entre dois e 14 meses após a sessão com psilocibina. Os dados mostraram que os participantes experimentaram um aumento na autoconfiança, maior sensação de contentamento interior, melhor capacidade de tolerar frustrações, diminuição do nervosismo e aumento no bem-estar geral. Um comentário típico de um participante: “A sensação de que tudo é Um, que eu experimentei a essência do Universo e o saber que Deus não nos pede nada, exceto receber amor. Não estou sozinho. Não temo a morte. Sou mais paciente comigo mesmo”. Outra participante ficou tão inspirada que escreveu um livro sobre as experiências.

ALÍVIO DO SOFRIMENTO

QUANDO A PESQUISA SOBRE a terapia baseada em alucinógenos foi suspensa, há cerca de 40 anos, deixou uma lista de tarefas que incluía o tratamento do alcoolismo e outras dependências, a ansiedade associada ao câncer, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno de estresse pós- traumático, desordens psicossomáticas, transtornos severos de personalidade e autismo.

No câncer, os pacientes frequentemente se confrontam com ansiedade severa e depressão, e antidepressivos e drogas redutoras de ansiedade podem ter uma atuação limitada para amenizar esses casos. Nos anos 60 e início dos 70, mais de 200 pacientes de câncer receberam alucinógenos clássicos em uma série de estudos clínicos. Em 1964, Eric Kast, da Chicago Medical School, que administrou LSD a pacientes terminais com dores severas, relatou que os pacientes desenvolveram um “desprezo peculiar pela gravidade de sua situação e conversavam livremente sobre sua morte iminente com uma característica considerada não usual pelos costumes ocidentais, mas muito benéfica aos seus estados mentais.” Estudos posteriores, produzidos por Stanislav Grof, William Richards e seus colegas do Spring Grove Psychiatric Hospital próximo a Baltimore (e mais tarde no Maryland Psychiatric Research Center) usaram LSD e outro alucinógeno clássico, o DPT (dipropiltriptamina). Os testes mostraram diminuição na depressão, ansiedade e medo da morte. E pacientes com experiências místicas mostram as melhoras mais significativas na medição psicológica de bem-estar.

Um de nós (Grob) atualizou esse trabalho. Em setembro passando, um ensaio no periódico Archives of General Psychiatry relatou um estudo piloto realizado entre 2004 e 2008 no Harbor-Ucla Medical Center para avaliar se as sessões com psilocibina reduziam a ansiedade em 12 pacientes terminais de câncer. Apesar de o estudo ser pequeno demais para permitir conclusões mais significativas, foi encorajador: os pacientes mostraram diminuição na ansiedade e melhora no humor, mesmo vários meses após a sessão.

Alcoólatras, fumantes e outros dependentes químicos podem relatar vitória sobre suas dependências após uma experiência mística que os afetou profundamente e ocorreu de forma espontânea, sem uso de drogas. A primeira onda de pesquisas clínicas com alucinógenos reconheceu o potencial terapêutico dessas experiências transformadoras. Mais de 1.300 pacientes participaram de estudos sobre dependência que originaram mais de duas dúzias de publicações décadas atrás. Em alguns desses estudos foram administradas altas doses em pacientes pouco preparados e reduzido apoio psicológico, alguns fisicamente presos ao leito. Pesquisadores que compreendiam a importância da preparação e deram apoio a seus pacientes tendiam a obter melhores resultados. Esse trabalho antigo trouxe resultados
promissores, mas inconclusivos.

A nova geração de pesquisa com alucinógenos, com melhores metodologias, deve ser capaz de determinar se essas drogas podem de fato ajudar as pessoas a superar dependências. Além do tratamento da dependência, os estudos mais recentemente começaram a testar se a psilocibina pode mitigar os sintomas do transtorno obsessivo-compulsivo. Outras substâncias controladas com mecanismos diferentes de ação também estão mostrando potencial terapêutico. Pesquisas evidenciam que a quetamina, administrada em baixas doses (é normalmente usada como anestésico), poderia dar um alívio mais rápido da depressão que os antidepressivos tradicionais, caso do Prozac. Um teste recente, na Carolina do Sul, usou o MDMA para tratar com sucesso o transtorno de estresse pós-traumático em pacientes em que as terapias convencionais não produziram efeito. Testes similares com o MDMA estão a caminho na Suíça e em Israel.

A ESTRADA À FRENTE

PARA QUE AS TERAPIAS COM USO de alucinógenos clássicos ganhem aceitação, terão de superar preocupações que emergiram com os excessos dos “psicodélicos anos 60”. Os alucinógenos podem, às vezes, induzir à ansiedade, paranoia ou pânico, que, em ambientes sem supervisão, podem produzir ferimentos acidentais ou mesmo suicídio. No estudo feito na Johns Hopkins, mesmo após cuidadosa seleção, e ao menos oito horas de preparação com um psicólogo clínico, cerca de um terço dos participantes experimentaram algum período de medo significativo e cerca de um quinto sentiram paranoia em algum momento durante a sessão. Mas no ambiente acolhedor oferecido pelo centro de pesquisas e com a constante presença de guias treinados, os participantes não demonstraram efeitos negativos duradouros.

Outros riscos potenciais dos alucinógenos incluem psicose prolongada, aflição psicológica, distúrbios na visão ou nos outros sentidos, com duração de dias ou mais. Esses efeitos, no entanto, não são muito frequentes e se mostram ainda mais raros em voluntários preparados psicologicamente. Apesar do eventual abuso na utilização dos alucinógenos clássicos (usados de forma a pôr em risco a segurança dos usuários ou de outros), eles não são tipicamente considerados drogas viciantes, porque não levam ao uso compulsivo nem produzem síndrome de abstinência. Para ajudar a minimizar as reações adversas, os pesquisadores da Johns Hopkins publicaram recentemente um conjunto de normas de segurança para a realização de estudos com altas dosagens de alucinógenos. Em função da habilidade dos pesquisadores em tratar com os riscos das drogas, sentimos que os estudos dessas substâncias devem continuar devido ao seu potencial para transformar a vida, digamos, de um paciente de câncer ou dependente químico. Se elas se mostrarem úteis no tratamento do abuso químico, ou da ansiedade existencial associada a doenças que põem a vida em risco, pesquisas posteriores poderiam ser beneficiadas. Os benefícios também podem vir da neuroimagem e de técnicas farmacológicas que não existiam nos anos 60 e que fornecem uma melhor compreensão de como essas drogas atuam.

A visualização das áreas do cérebro envolvidas nas emoções e pensamentos intensos que as pessoas têm sob a influência das drogas dará uma janela para a psicologia por trás das experiências místicas produzidas pelos alucinógenos. Pesquisas adicionais também poderão trazer abordagens não farmacológicas mais eficientes se comparadas às práticas espirituais tradicionais, como meditação ou jejum para produzir experiências místicas e mudanças comportamentais desejadas.

A compreensão sobre como as experiências místicas podem levar a atitudes benevolentes em relação a si mesmo e aos outros deve ajudar a explicar o bem documentado papel de proteção da espiritualidade no bem-estar e saúde psicológica. As experiências místicas podem originar um senso profundo e duradouro da interconexão entre pessoas e coisas – perspectiva que está por trás dos ensinamentos éticos das tradições religiosas e espirituais. Assim, uma compreensão da biologia dos alucinógenos clássicos poderia ajudar a esclarecer os mecanismos por trás do comportamento ético e cooperativo humano – conhecimento que, acreditamos, poderá vir a ser crucial para sobrevivência da nossa espécie.

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Roland R. Griffiths é professor nos departamentos de psiquiatria e neurociências da Johns Hopkins University School of Medicine. Seus principais focos de pesquisa têm sido os efeitos comportamentais e subjetivos das drogas que alteram o humor. Ele é o líder de pesquisas com a psilocibina na Johns Hopkins.

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Charles S. Grob é professor de psiquiatria e pediatria da David Geff em School of Medicine da Ucla e diretor de Divisão de Psiquiatria Infantil e Adolescente no Harbor-Ucla Medical Center. Ele conduziu testes clínicos com várias drogas alucinógenas, incluindo o uso da psilocibina no tratamento da ansiedade em pacientes com câncer.

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Agregado ao Micélio


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