A Dança da Energia – Fritjof Capra
“Os conceitos de espaço e tempo são tão básicos para nossa descrição dos fenômenos naturais que sua modificação radical na teoria da relatividade acarretou uma modificação de todos os conceitos que usamos em física para descrever a natureza. A mais importante conseqüência da nova estrutura relativística foi a compreensão de que a massa nada mais é senão uma forma de energia. Mesmo um objeto em repouso tem energia armazenada em sua massa, e a relação entre as duas é dada pela famosa equação de Einstein, E = m c², sendo “c” a velocidade da luz.
Uma vez aceita como forma de energia, deixa de se requerer que a massa seja indestrutível, já que pode ser transformada em outras formas de energia. Isso acontece continuamente nos processos de colisão de alta energia, em física, nos quais partículas materiais são criadas e destruídas, sendo suas massas transformadas em energia de movimento e vice-versa. As colisões de partículas subatômicas constituem nosso principal instrumento para estudar suas propriedades, e a relação entre massa e energia é essencial para sua descrição. A equivalência de massa e energia tem sido verificada inúmeras vezes, e os físicos estão completamente familiarizados com ela – tão familiarizados, de fato, que eles medem a massa das partículas nas unidades correspondentes de energia.
A descoberta de que a massa é uma forma de energia teve uma profunda influência em nossa representação da matéria e forçou-nos a modificar nosso conceito de partícula de um modo essencial. Na física moderna, a massa deixou de estar associada a uma substância material; por conseguinte, não se considera que as partículas consistam em qualquer “substância” básica; elas são vistas como feixes de energia. Entretanto, a energia está associada à atividade, a processos, o que implica que a natureza das partículas subatômicas é intrinsecamente dinâmica. Para entender isso melhor, cumpre recordar que essas partículas só podem ser concebidas em termos relativísticos, isto é, em termos de uma estrutura conceitual onde espaço e tempo estão fundidos num continuum quadridimensional. Nessa estrutura, as partículas já não podem ser representadas como pequenas bolas de bilhar ou pequenos grãos de areia. Tais imagens são inadequadas, não só porque representam as partículas como objetos separados, mas também porque são imagens estáticas, tridimensionais. As partículas subatômicas devem ser concebidas como entidades quadridimensionais no espaço-tempo. Suas formas têm que ser entendidas dinamicamente, como formas no espaço e no tempo. As partículas são padrões dinâmicos, padrões de atividade que possuem um aspecto espacial e um aspecto temporal. O aspecto espacial faz com que elas se apresentem como objetos com uma certa massa, o aspect temporal, como processos que envolvem a energia equivalente. Assim, o ser da matéria e sua atividade não podem ser separados; são apenas aspectos diferentes da mesma realidade espaço-tempo.
A concepção relativística da matéria afetou drasticamente tanto nossa concepção de partículas como nossa representação das forças entre essas partículas. Numa descrição relativística de interações de partículas, as forças entre elas – sua mútua atração ou repulsão – são apresentadas como a troca de outras partículas. Esse conceito é muito difícil de visualizar, mas é necessário para se entender os fenômenos subatômicos. Liga as forças entre constituintes da matéria e, assim, unifica os dois conceitos, força e matéria, que pareciam tão fundamentalmente diferentes na física newtoniana. Força e matéria são vistas agora como tendo sua origem comum nos modelos dinâmicos a que chamamos partículas Esses modelos de energia do mundo subatômico formam as estruturas nucleares, atômicas e moleculares estáveis que constroem a matéria e lhe conferem seu sólido aspecto macroscópico, fazendo-nos por isso acreditar que ela é feita de alguma substância material. Em nível macroscópico, essa noção de substância é uma útil aproximação, mas no nível atômico deixa de ter qualquer sentido. Os átomos consistem em partículas, e estas partículas não são feitas de qualquer substância material. Quando as observamos, nunca vemos qualquer substância; o que vemos são modelos dinâmicos que se convertem continuamente uns nos outros.
– a contínua dança da energia.
As duas teorias básicas da física moderna transcenderam, pois, os principais aspectos da visão de mundo cartesiana e da física newtoniana. A teoria quântica mostrou que as partículas subatômicas não são grãos isolados de matéria, mas modelos de probabilidade, interconexões numa inseparável teia cósmica que inclui o observador humano e sua consciência. A teoria da relatividade fez com que a teia cósmica adquirisse vida, por assim dizer, ao revelar seu caráter intrinsecamente dinâmico, ao mostrar que sua atividade é a própria essência de seu ser. Na física moderna, a imagem do universo como uma máquina foi transcendida por uma visão dele como um todo dinâmico e indivisível, cujas partes estão essencialmente inter-relacionadas e só podem ser entendidas como modelos de um processo cósmico. No nível subatômico, as inter-relações e interações entre as partes do todo são mais fundamentais do que as próprias partes. Há movimento, mas não existem, em última análise, objetos moventes; há atividade, mas não existem atores; não há dançarinos, somente a dança. “
“O Ponto de Mutação” – Fritjof Capra