Archives dezembro 2006

Na Teia da Sálvia


Minha Experiência com Sálvia Divinorum

Vou relatar aqui minha experiência com a Salvinorina…. Apesar de curta, foi uma das minhas mais intensas experiências dentre todas, no sentido de ter me provocado mais reações posteriores….. 5 minutos que valeram uma vida!
Mas antes de correr pra arrumar Sálvia, leia o relato e veja que em nenhum momento foi divertido!

Acordei 9:00 na manhã de sol e minha casa estava vazia pois tínhamos combinado de almoçar fora…. Comecei a assistir um filme que logo me encheu o saco. Sabia que precisava fazer alguma coisa diferente…. foi aí que lembrei que minha encomenda, que eu havia feito com o Rafael, já tinha chegado e senti que era hora de experimentar… Tinha ainda 2 horas antes de encontrar a minha família pro almoço.

Fui para o meu quarto, acendi um incenso e coloquei uma música leve. Separei uma dose do extrato de Sálvia e enchi o meu pipe…. já sentado na cama e encostado no travesseiro.
Mandei pra dentro em dois tapas e aguardei….
Esperava passar por uma viagem tranqüila…. mas tudo foi muito sinistro

Senti minha visão se alterando levemente e me senti indo em direção a algum lugar….
De repente, em um instante meu quarto se transformara numa grande “Teia” em espiral, formada por plantas… e senti uma presença muito forte de uma entidade… como se fosse a grande “Aranha-Mãe” da Teia… uma entidade um pouco sádica e não muito bondosa comigo…. (fui racionalizando os sentimentos e dando a minha interpretação à eles: digo isso, pois pra quem experimentar certamente será diferente.)

A “Planta-Rainha” era muito poderosa, mandava naquele lugar. E seu poder era compartilhado por outras entidades que estavam fora da “teia”, mas era possível sentir a suas presenças… o tempo todo elas se comunicando com a “Rainha”….. e ela foi tentando tomar o controle da minha cabeça através do medo.. Senti ela como sendo meu sentimento interior de medo.. e o tempo todo era como se as entidades rissem de mim e me dissessem:
– “ Olha só quem veio brincar com a gente”
– “ Veio Brincar onde não devia?! Agora agüenta!
– “ Agora você tá preso aqui, mané… Não tem pra onde correr ”

e eu sentia claramente isso….

Percebi que de fato era uma brincadeira idiota… ou talvez o idiota fosse eu por querer brincar com uma coisa que se mostrou muito séria!
O sentimento de medo era intenso como eu nunca havia sentido antes…. era forte, pouco confortável e parecia não ter fim…. meu corpo não existia mais, só o sentimento e as zombarias das “entidades-plantas” cada vez rindo mais e querendo me aprisionar naquela “teia”

A “planta-rainha” ficava a minha esquerda e estava sendo responsável pela construção daquele caminho.. as outras entidades se comunicavam com ela, mas eu não as via… O tempo todo parecia que elas queriam me castigar por ter ido brincar onde não devia…. brincar no mundo delas…
Me senti como uma criança no meio de pessoas más que queriam me fazer mal…. Queria chorar, mas lembrava que aquilo ia passar!
Mesmo nunca tendo passado por aquilo, senti que aquela situação não era novidade… como se estranhamente eu já tivesse presenciado aquilo ….

Com o medo tomando conta, minha reação foi me afastar da planta….. agindo por instinto, joguei o pipe com as cinzas na lixeira do meu quarto…. em vão.
As entidades mais uma vez zombaram de mim como se dizendo:
– “Ha Ha Ha ..Garoto idiota!! Você acha que isso vai adiantar??? Isso está acontecendo muito além desse pequeno plano … Você não está no seu quarto e o problema não é a planta!!!”

Quando percebi o óbvio, vi que somente naquele plano eu conseguiria resolver a situação… foi quando alguma coisa interior começou a “argumentar” com a “Planta-Rainha”, dizendo a ela que eu iria agüentar!!! Que não ia mais me sujeitar ao medo… Supostamente havia entendido a origem do medo onde estava se manifestando o mal…

A Planta-Rainha não queria desistir, e junto com as outras entidades começou a “falar” que eu não ia conseguir… mas me mantive forte….
Foi engraçado, porque quando a Rainha percebeu de fato que eu não ia mais ceder, ela simplesmente virou as costas e foi embora junto com as outras presenças me libertando da Teia…

Foi engraçado sentir que as entidades conversavam zombando de mim, como dizendo “pegamos ele” “agora eu quero ver aguentar” e coisas do tipo. Foi como ficar sob o poder delas, no mundo delas! E não existia saída sem encarar a situação de frente…..

No geral, apesar de ter sido meio aterrorizante, me fez um bem enorme…. Saí da trip completamente mudado…
Qualquer coisa que antes me assustava ou me impedia de estar tranqüilo, perderam o peso….  nenhum medo até hoje na minha vida superou o encontro com a “Planta-Rainha”

Infelizmente as palavras são limitadas e não conseguem explicar o que de fato aconteceu.. só dar uma pequena idéia. Foi intenso.

medos são sentimentos… eles não tem causa… eles existem ou não existem… se existem, nós mesmos criamos suas “causas” que na real são só as razões pra nós mesmos assumirmos que ele existe

Forte abraço amigos
Fiquem em Paz.

Dany3l

– Acrescentando informação ao post (em 15/07/2009)

Em virtude da atual popularização da Sálvia Divinorum, acho importante acrescentar que não se trata de uma planta recreativa. A experiência espiritual que advém do seu consumo transcende a realidade ordinária e tradicionalmente é utilizada por nativos mexicanos que a chamam de “los ojos de la pastora”…
Constitui um meio de auto conhecimento cuja experiência surpreende pela peculiaridade e intensidade… Os mais diversos tipos de experiência são relatados, os mais diversos níveis de consciência são atingidos
Sálvia Divinorum é um enteógeno. Deve  ser respeitada como é a Ayahuasca, o Psilocybe Cubensis e tantas outras ferramentas…. portanto, antes da experiência, pesquise sempre mais, busque informação, não limite seu conhecimento, e identifique sempre qual o seu propósito para o uso.

– Informações técnicas importantes (atualizado em 21/03/2010)

Retirado da Comunidade “enteógenos sem dogmas

A Salvia divinorum é a única entre milhares de espécies do gênero Salvia que apresenta efeitos psicoativos (embora suspeite-se que outras espécies possam conter essas propriedades). Originária do México na Sierra Mazateca, é considerada rara, o que torna difícil a sua obtenção. Difícilmente se reproduz por sementes, sendo multiplicada através de cortes enraizados (clones, as famosas mudas).

Seu efeito é extremamente forte, principalmente quando usados extratos potencializados, que nada mais são do que folhas concentradas com a substância psicoativa. É extremamente recomendável que os futuros usuários venham a se informar sobre seus efeitos antes de se aventurarem. Não é uma erva a ser usada em festas, raves ou com multidões, pois exige uma certa discrição da parte do usuário para que o mesmo se sinta a vontade. Não é uma droga recreativa e pode ser traumático quando usada nessas condições.

Até hoje, não existe confirmação de que seu uso é prejudicial a saúde, não acarreta vício e seu uso tende a não ser freqüente. Contudo, bons estudos estão sendo feitos in vivo e in vitro e o uso tradicional está garantido por um conhecimento e histórico de uso centenários.

É considerada LEGAL na maioria dos países, sendo que a Itália, 2 estados dos EUA e a Austrália já proibiram o uso da planta sem antes fazer um estudo sobre a periculosidade da mesma. Tal medida mostra a falta de critério científico por parte dos legisladores quanto aos requesitos usados para se proibir uma substância. Acredita-se que essa medida foi tomada devido a algumas notícias de incidentes nos EUA, sendo que nenhum deles foi comprovado ter sido causado pelo consumo da planta. A única alegação neste sentido teria sido da parte da mãe de um usuário que cometeu suicídio inalando gas de cozinha dentro de uma barraca. Apesar de ele não estar sob o efeito de salvia no momento do suicídio, ela afirmou: “Só pode ter sido culpa dessa planta”.

Tem como pricípio ativo a Salvinorina A, que, no entanto, não se trata de alcalóide, mas de um diterpeno, com ação diferente da maioria das substâncias psicoativas. Pesquisas atuais sobre o efeito da salvinorina no organismo revelaram que esta, além de não ser uma substância que leva à dependência, apresenta propriedades antidepressiva, analgésica e ainda mostra-se promissora para o desenvolvimento de fármacos para o tratamento da esquizofrenia e dependencia química.

É chamada por alguns como o alucinógeno natural mais potente já descoberto, só perdendo para o LSD, o qual não é encontrado na natureza (é um semi-sintético). Por isso, pode conduzir a estados alterados de percepção onde não se recomenda interação com máquinas ou eventos sociais. Daí o uso espiritual étnico entre os Mazatecas e bruxos ancestrais.

Curiosidade

Devido à dificuldade de se obter sementes férteis, sua propagação tem sido feita através de cortes de seus galhos que são enraizados em água, isso vem ocorrendo nas últimas décadas. Suspeita-se que os clones espalhados pelo mundo inteiro têm origem em apenas 3 espécimes, ou seja, os clones espalhados pelo mundo todo são geneticamente idênticos.Uma das mudas mais difundidas foi originada pela muda coletada no Mexico por Albert Hoffman, o mesmo doutor que sintetizou o LSD

Uso Tradicional

Os “curanderos” mexicanos a usam mascando suas folhas, uma pessoa necessita de cerca de 50 a 100 folhas para obter uma experiência visionária. Tal método é ineficiênte, a absorção da Salvinorina ocorre na realidade pelo tecido sublingual durante a mastigação e não pelo estomago, mas ao contrário do uso moderno, em que se fumam as folhas e se obtem um efeito rápido, ao mascar as folhas o usuário obtém efeitos mais prolongados, podendo chegar a até 2 horas após a ingestão.

Uso Moderno

Há, normalmente, 4 métodos que são utilizados para consumir as folhas da Salvia Divinorum: aromatizando os ambientes, mascando as folhas, fumando as folhas e usando tinturas ou essências sublinguais.O uso de várias plantas em rituais sempre foi prática xamânica tradicional. Elas são, geralmente, queimadas na preparação do ambiente em que são celebrados os rituais xamânicos. É dito que a fumaça das folhas inspira o xamã e o ambiente circundante, propiciando o contato com outros mundos e entidades auxiliadoras.É sabido que mascar as folhas de Salvia Divinorum tem sido o método tradicional utilizado pelos xamãs mazatecas (chotachine). Segundo informações colhidas, os xamãs utilizam entre 10 e 60 folhas, aos pares, enroladas umas nas outras (“quid”), formando uma massa compacta, sendo então mascada, sem engolir o sumo das folhas. Para alcoólatras, o xamã chega a utilizar cerca de 100 folhas, o que sugere que o álcool bloqueie os efeitos da salvinorina. Masca-se por cerca de 30 minutos ou até atingir o estado de consciência almejado. Os xamãs afirmam ser essencial manter o sumo das folhas na boca o máximo possível, podendo-se engoli-lo após o uso ou, ir engolindo o sumo bem lentamente, à medida que se for mascando. Em geral, afirma-se que a pessoa precisa de doses maiores nas primeiras vezes, pois, segundo a tradição xamã, ela tem que “soltar as amarras e aprender o caminho”. Caso sejam folhas secas, tem-se recomendado deixá-las de molho na água fria, pouco antes da mascagem, para que amoleçam e possam ser enroladas uma na outra.

Supondo uma pessoa com nível mediano de sensibilidade, tem se afirmado que 12 a 24 folhas frescas de Salvia Divinorum, mascadas por 30 minutos, são suficientes para obter um estado meditativo profundo. Neste método, o elemento psicoativo é assimilado pela língua, gengivas e demais tecidos bucais. Por isso não se deve engolir o sumo imediatamente, mas mantê-lo na boca pelo maior período de tempo possível. Relata-se que, neste método, os efeitos psicoativos iniciais começam após 15-20 minutos, aumentando pelos próximos 30min, quando então, gradualmente, vão se amenizando até terminar uma ou, no máximo, duas horas depois, quando a pessoa estará se sentindo totalmente normal.

No mercado, existem as “folhas fortificadas”, também denominadas extratos. São folhas comuns de Salvia Divinorum banhadas em solução de salvinorina na proporção de 5 vezes mais do que uma folha normal (5X), ou 10 vezes mais forte do que o normal (10X). Tem-se dito que elas são feitas para certas pessoas, denominadas “cabeças duras”, que têm pouca sensibilidade à folha natural da Salvia. Portanto, é importante verificar a sensibilidade de cada um, antes de utilizar as folhas fortificadas para incenso já que, muitas vezes, não seriam necessárias.Há também as tinturas ou essências de Salvia Divinorum, que são um composto alcoólico, assim como são certas gotas homeopáticas, com a diferença de que possuem uma maior concentração de álcool.

O que é um extrato de Salvia?

Extrato de Salvia é quando o princípio ativo, a salvinorina-A, é extraído da planta com o propósito de aumentar a concentração do mesmo. Por exemplo: Você pega 9 gramas de folhas de Salvia divinorume extrái a salvinorina que é depositada de volta em outro 1 grama de folhas. Então, esse outro 1 grama de folhas terá a potência aumentada em 10 vezes (9+1), daí o nome 10X. Resumindo, você terá colocado a quantia de salvinorina que existe em 10g de folhas em apenas 1g de folhas.Geralmente, esses extratos são divididos em Standardized Extracts(extratos padronizados) e Non-Standardized ou Crude Extracts (extratos não padronizados).Standardized Extracts (Extratos padronizados) : É aquele onde o princípio ativo – no caso a Salvinorina-A – é extraído da planta e isolado, pesado e então recolocado nas folhas secas em uma quantia específica. No caso de extratos de Salvia divinorum, 2.4mg é considerada a quantia padrão (standardized) para cada grama de folha seca. Por essa razão, se vc quiser elevar sua folha para 10x, você precisa colocar 24mg de extrato por grama de folha. Entretanto, essa quantidade pode variar de 0,8 a 3,6mg de Salvinorina-A por grama de folhas.

Partindo dessas informações, concluímos a quantidade de Salvinorina-A presente em cada grama de extrato STANTARDIZED (padrão – 2.4mg):

1g de Extrato 5X – 12mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 6X – 15mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 10X – 24mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 15X – 36mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 20X – 48mg de Salvinorina-A
Obs.: 1g de Extrato significa 1g de folhas secas picotadas onde foram adicionados de salvinorina.

Obs.: Foram usados os valores 5X, 6X, 10x, 15X e 20x, pois são os mais comumente encontrados. E também por serem os extratos mais seguros para uso, sendo que os mais fortes são perigosos.
Entretanto, como dito acima, a quantidade de Salvinorina-A em cada grama de folhas pode variar de 0,8 a 3,6mg. A maioria dos fabricantes de extratos trabalham com extratos de 3,6mg. Dessa maneira, confira a outra tabela baixo:Quantidade de Salvinorina-A presente em cada grama de extrato 3,6mg:1g de Extrato 5X – 18mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 6X – 21mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 10X – 36mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 15X – 54mg de Salvinorina-A
1g de Extrato 20X – 72mg de Salvinorina-ANON-Standardized Extracts ou Crude Extracts (extratos não-padronizados): É feito socando-se as folhas em uma variedade de solventes para retirar/extrair a Salvinorina-A, e então a mistura é adicionada à outras folhas. Os problemas desse método são: uma boa parte da Salvinorina-A é perdida junto com os solventes; concentra uma grande parte de alcatrão e de outras substâncias nocivas; não queima tão bem quanto um Standardized; e não se tem noção da quantia exata do alcalóide por grama de folha, pois como dito acima varia de folha à folha.Quantidades usadas quando fumada:

Folhas normais de Salvia: de 1/2 a 1 grama.
Folhas de alto nível (High grade leaves): de 1/4 a 1/2 de grama.
Extrato de Salvia 5x: de 1/10 a 1/3 de grama.
Extrato de Salvia 6x: de 1/10 a 1/4 de grama.
Extrato de Salvia 10x: 1/10 de grama.
Extrato de Salvia 15x: 1/20 de grama.
Extrato de Salvia 20x: de 1/25 a 1/20 de grama..

—-> Segue alguns links com mais informações importantes sobre a “divina pastora”


Importante.

A Internet libertou as pessoas da informação tendenciosa e manipulativa que algumas redes de imprensa gostam de impor.
Através de suas revistas e programas de TV, clichês direcionados à parcela da população que busca conforto na ignorância, trata assuntos  recentes e importantes como a Sálvia Divinorum de forma superficial e longe da realidade. Dessa forma constroem “pseudo-verdades” psicológicas que são cuidadosamente inseridas no senso comum sob a máscara de “reportagens informativas”. Enquanto na verdade o que ocorre é o caminho inverso, pois não levam em consideração os fatos e registros de experiências, afastando o espectador da verdade, fazendo um trabalho de desinformação. São matérias arquitetadas com interesses específicos, que se aproveitam do medo que essas pessoas tem daquilo que não conhecem, não compreendem ou querem fingir que não existe.

Portanto, estejam sempre atentos ao que lhes é oferecido.
Pesquise sempre, se informe sempre, não aceite uma só informação, busque sempre mais informação. Questione! Questione até o que você acha que tem certeza. ….. busque sempre a experiência direta.

O Poder do Xamã

A gente tá meio sem tempo, mas a roda tem q girar…to postando então um texto interesssante a respeito dos xamãs, e o conceito de espírito. Bastante esclarecedor!

Retirado do site: http://www.duplipensar.net/artigos/2006-Q4
/xamanismo-o-conceito-de-espirito.html
Texto escrito por Janos Biro

“De onde vem o conceito de espírito como oposto de corpo? O homem sempre teve a idéia de um acesso privilegiado a algo sobrenatural? De acordo com David Abram, que conviveu com tribos na Indonésia para descobrir a ligação entre magia e medicina, não há nada de sobrenatural no xamanismo.

No capítulo “A ecologia da magia”, ele diz que o xamã não está em contato com entidades sobrenaturais, mas sim fenômenos naturais que causam tamanho espanto à mente humana que só podemos nos referir àquilo como “magia”. O que é visto com maravilha não é nada além da natureza que está aquém e além do homem, pois apesar de não a compreendermos, ela nos compreende e se comunica conosco.

Os xamãs originais eram membros indistintos da tribo, não tinham um acesso privilegiado a segredos ou mistérios da natureza. Tinham mais contato com a natureza porque ficavam à margem da sociedade. Todas as populações de animais oscilam em harmonia com os recursos que elas usam do meio. A natureza é fonte da vida e da morte. O xamã traz boas e más noticias, traz curas e também maldições. As maldições podem ser mudanças no meio, que o xamã, por estar nos limites da tribo, percebe primeiro, ao observar o comportamento modificado dos animais. Para curar, o xamã usa um conhecimento comum a toda a tribo, ele apenas tem mais prática. Logo, o xamanismo não é privilégio do xamã.

O conceito de espírito como algo interno, anterior e superior ao corpo, se origina de uma perda da nossa reciprocidade ancestral com a comunidade da vida. Em culturas genuinamente orais, não é enviando sua consciência além do mundo natural que se faz contato com as forças da vida, nem fazendo jornadas num mundo espiritual interior, mas projetando sua consciência lateralmente, nas profundezas de um meio tanto sensível quanto psicológico, o sonho vivo que dividimos com todas as criaturas vivas. Isto ecoa com a idéia de transcendência horizontal, que Aldous Huxley cita no apêndice de Demônios de Loudum.

A visão popular do xamanismo é que ele serve para transcendência pessoal. Mas os “xamãs urbanos” parecem esquecer dos motivos para alterar sua consciência. Hoje há empresas e profissionais que decidem, com base na ciência, até onde a natureza pode agir. Nós agora organizamos a natureza de acordo com nossa inteligência. Os xamãs originais precisavam lidar com a natureza nos termos dela, isto é, sem nunca compreender realmente o que se passava, sem uma explicação racional. Outros animais fazem o mesmo, lidam com o meio sem terem plena consciência do que estão fazendo, mas fazem exatamente o que é preciso para manter o equilíbrio. O homem tribal não pode usar a lógica de sua cultura para ouvir o que a as outras formas de vida tem a dizer. Ele deve se deixar levar por uma lógica mais ampla, uma lógica não humana. O homem civilizado precisa reduzir tudo à lógica de sua própria cultura, e esse é o fim da “magia”.

Há um exemplo interessante no texto de Abram. Ele ficou um tempo na casa de um xamã. Todo dia, ao trazer a comida, o xamã colocava uma pequena quantidade de comida em pontos ao redor da casa. Ele dizia que eram oferendas para os espíritos da casa. À tarde, quando observou de novo, a comida que foi oferecida tinha sumido. Então ele resolveu ficar olhando para ver como a comida sumia. Ele descobriu que a comida era recolhida pelas formigas. Na região há muitas formigas, e as oferendas pareciam ter uma utilidade prática: 1- servem para saciar as formigas e impedir que elas continuem e invadam a casa. Ao encontrar a comida, elas dão meia volta para o formigueiro. 2- Serve para atrasar as formigas num eventual ataque em massa, comum na região. 3- Serve para medir a população de formigas, prevendo eventuais ataques em massa. Mas o importante não é saber que há uma utilidade prática por trás de cada rito. O interessante é que o xamã nunca pensa nisso. Ele não precisa saber explicar porque isso funciona.

As teorias científicas não nos tornaram mais inteligentes, nosso cérebro continua o mesmo há pelo menos 50 mil anos. De fato, ele se acostumou a não ter que explicar tudo em palavras, pois é basicamente um cérebro de ação. Linguagem é apenas uma função do cérebro. O fato de que agora precisamos explicar tudo não nos torna mais capazes de sobreviver, e sim mais estressados. Sobrevivemos durante 90% da nossa existência sem teorias, mas sim prática. Seguindo a lei do menor gasto de energia, as teorias sobre tudo que ocorre são um desperdício para pessoas que convivem em comunidade. Elas só são úteis quando as pessoas estão afastadas, pois não precisamos explicar o que estamos fazendo às pessoas com que convivemos todos os dias. Esse afastamento só é possível em sociedades de massa. Logo, numa nova comunidade tribal, sua importância diminuiria até o ponto de se extinguir. Se isto for verdade, então não precisamos combater o pensamento simbólico como se ele fosse maléfico, como se ele tivesse que ser extinto para podermos voltar à naturalidade. Ao experimentarmos modos de vida não que não sejam massificados, a necessidade da representação diminuirá por economia de energia. Deixaremos de fazer coisas que antes pareciam necessárias e que então se tornarão inúteis.

“Espíritos”, para uma cultura tribal, são primariamente formas de “inteligência” não-humana. Por exemplo, todos os lobos “sabem” coisas semelhantes, independente de onde nasçam. Para os tribais, é como se os lobos fossem uma tribo só, estão unidos por uma sabedoria comum. O “espírito do lobo” é essa sabedoria que une todos os grupos isolados de lobos sem que eles se comuniquem. Não funciona para humanos, porque humanos se comportam de formas muito diferentes em diferentes grupos (pelo menos de acordo com o olhar humano), ou seja, dependem da tradição oral. Do ponto de vista dos tribais, o modo de vida humano é o único que não é regido por nenhum espírito. É criação humana.

Para as culturas tribais, a morte de uma pessoa significava uma “reencarnação” num modo não humano, porém ainda natural. O conceito era de que a vida não desaparece, ela muda de lugar. Assim como a morte de uma presa é a vida do predador, a morte do predador é a vida da presa. E por que a permanência da personalidade é tão importante para nós? É comum ver a explicação de que espíritos de pessoas mortas rondam o mundo porque “deixaram algo pendente”. Eu identifico isso como ressentimento. A maioria das pessoas de nossa cultura não vive sua vida natural, mas uma vida artificial, elas sempre morrem “com algo pendente”. Esse algo pode ser o simples desejo de liberdade e felicidade, impossibilitado por uma cultura de controle. Esse sentimento é próprio da nossa cultura. Em culturas tribais provavelmente não há muitos “assuntos pendentes” que exigem a sobrevivência da personalidade para se realizarem. Esse conceito depende de certo grau de egocentrismo.

A adoração aos ancestrais não é um reconhecimento do poder humano, mas sim do que há de primitivo em cada humano, a sua essência primitiva. Mesmo as culturas mais antigas sentiam que nós dividimos ancestralidade com os animais, vegetais e até minerais. Um antepassado não tem mais a forma humana, ele se espalha pelo terreno. Sua personalidade não permanece, porque sua essência não é sua personalidade. Sua essência é seu corpo, seu corpo está agora misturado substancialmente com outros seres. Pode estar no ar, invisível, porém ainda material. O que havia de mais significativo em sua personalidade só pode permanecer nas estórias que ele deixou. Na morte o homem retorna à natureza que o criou. Portanto os antepassados estão ao redor da aldeia, eles são as formigas, as nuvens e as árvores. Neste sentido, podem dizer que o homem não abandona seu corpo, pois o corpo é o que o torna homem. Mas ele nunca deixa a natureza.

Quando um xamã fala de poder, ele fala de algo que existe na natureza. Ele pode sentir uma força invisível, mas ainda assim ele a sente porque ela se manifesta de alguma forma no mundo. O xamã não eleva seus sentidos acima do mundo sensível, e sim dentro dele. Não é por outros sentidos que ele se comunica com o meio, mas sim com os seus sentidos. Uma pessoa comum pode achar que ele tem um sentido a mais, porque ela não percebe o mesmo que ele. As diferenças sutis num terreno podem informar coisas importantes àquele que está acostumado a observá-lo. O tipo de animal que vive por ali, por exemplo. Uma marca tênue pode significar perigo. Uma área de “poder” pode ser uma área segura, onde se pode observar longe, onde o comportamento do meio seja mais visível. Novamente, o xamã não precisa saber disso. Ele apenas sente, e isso funciona.

O xamã se comunica com os outros animais porque sua presença se torna neutra para eles. Mas nós, vivendo em cidades, não podemos fazer o mesmo. Nós não somos neutros para os animais que nos cercam. Eles nos temem, e nós os tememos. Criamos uma fronteira que não existia antes, e não pode ser quebrada fazendo um “workshop” de xamanismo. Não podemos resgatar nossa naturalidade vivendo num ambiente artificial, num modo de vida artificial. A medicina baseada nos métodos do xamanismo não pode ter os mesmos resultados, pois a causa dos nossos desequilíbrios não é individual, está na relação da nossa sociedade com o resto da comunidade da vida. Nós vemos o mundo como se ele fosse um mundo meramente humano, nós nos esquecemos que vivemos num mundo não-humano, e deixamos de afinar nossas percepções para tudo que não é humano.

Muitos acreditam que o conceito de espírito como algo não material é uma continuação lógica do animismo, algo necessário para o desenvolvimento psíquico do homem. Mas o conceito de espírito é um passo além numa direção etnocêntrica, numa direção que reduz o mundo natural a um mundo cultural. Não podemos ser humanos sem a reciprocidade com o não humano. A forma humana foi criada em conformidade com o meio natural, e sobreviveu porque havia reciprocidade na comunicação com o resto da comunidade da vida. Quando negamos essa relação igualitária, não o fazemos para sobreviver ou para explicar melhor o mundo. Nada disso era necessário, o homem não estava ameaçado, viveu em tribos por 90 mil anos. Ao mudar nossa relação para uma não igualitária, tudo que ganhamos foi maior quantidade de pessoas. A tecnologia possibilita que mais pessoas vivam dessa forma, mas não pode evitar o custo desse projeto expansivo, que é a nossa natureza humana.

O xamã pode ser visto como uma figura de poder que inaugura a hierarquia entre os homens, mas nem sempre foi assim. O xamã em seu contexto original não está separado da tribo. Ele não possui um conhecimento inacessível aos outros membros. Os outros membros o aceitam porque sabem o que ele está fazendo. O xamã no contexto original não pode ganhar poder porque não controla as forças da natureza, apenas se comunica com elas. Se em algum ponto da história humana foi instituído o poder de um homem usando o título de xamã, é porque já havia um acesso privilegiado a algo que os outros não podiam saber de forma alguma, algo distinto da percepção partilhada. Um conceito de algo sobrenatural, algo que pessoas normais não podem acessar; algo distinto do corpo: o nosso conceito de espírito. Tal conceito é uma criação humana para justificar privilégio, para justificar o poder de um homem sobre outro, e sobre a própria natureza. Talvez o próprio conceito de xamanismo já seja uma traição das práticas animistas, assim como a palavra “espírito” foi colocada na boca dos tribais. No fundo, não há xamãs, há seres humanos que vivem na natureza e há seres humanos que tentam viver fora dela.”

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