O que você veria se pudesse olhar dentro de um cérebro em processo alucinatório? Apesar de décadas de investigação científica, nós ainda temos a falta de um entendimento claro de como drogas alucinógenas como o LSD (dietilamida do ácido lisérgico), mescalina e psilocibina (o principal ingrediente ativo em cogumelos mágicos) trabalham no cérebro. A ciência moderna demonstrou que alucinógenos ativam receptores da serotonina, um dos mensageiros químicos chave. Especificamente, dos 15 diferentes receptores de serotonina, o subtipo 2A (5-HT2A), parece ser o que produz alterações profundas do pensamento e da percepção. É incerto, entretanto, por que a ativação do receptor 5-HT2A pelos alucinógenos produz efeitos psicodélicos, mas muitos cientistas acreditam que os efeitos estão ligados a aumentos na atividade cerebral. Embora não seja conhecido porque essa ativação causaria profundas alterações da consciência, uma especulação é que um aumento espontâneo da atividade de algumas células do cérebro levariam a alterações sensoriais e perceptivas, ressurgimento incontrolado de memórias, e a projeção de “ruído” mental no olho da consciência.
O autor Inglês Aldous Huxley acreditava que o cérebro funciona como uma “válvula redutora”, que acabaria por restringir a consciência. Com mescalina e outros alucinógenos, é possível induzir efeitos psicodélicos inibindo esse mecanismo de filtragem. Huxley baseou essa explicação inteiramente em suas experiências pessoais com mescalina, que foi dada a ele por Humphrey Osmond, o psiquiatra que deu origem ao termo “psicodélico”. Apesar de Huxley ter proposto essa ideia em 1954,décadas antes do surgimento da ciência moderna do cérebro, ele pode estar correto. A maioria das opiniões é de que alucinógenos trabalham ativando o cérebro, ao invés de inibi-lo como Huxley disse. Os resultados de um estudo recente de imagens está desafiando essas explicações convencionais sobre a ativação da atividade cerebral.
O estudo em questão foi conduzido pelo Dr. Robin Carhart-Harris em conjunto com o professor David Nutt, um psiquiatra que era assessor científico do governo do Reino Unido na a política de drogas. O Doutor Carhart-Harris, Nutt, e colegas utilizaram ressonância magnética funcional para estudar os efeitos da psilocibina na atividade cerebral de 30 utilizadores experientes de psicodélicos. Nesse estudo, a administração intravenosa de 2mg de psilocibina induziu um estado psicodélico moderado que foi associado a reduções da atividade neural em regiões do cérebro, como o córtex pré-frontal medial e o córtex cingulado anterior.
Os dois córtex em questão estão extremamente inter-conectados com outras regiões do cérebro e acredita-se estarem envolvidos em funções como a regulação emocional, o processamento cognitivo, e a instrospecção. Baseado nas suas descobertas, os autores do estudo concluíram que alucinógenos reduzem atividades em regiões específicas do cérebro, diminuindo potencialmente a sua habilidade de coordenar o funcionamento de regiões cerebrais inferiores. De fato, a psilocibina aparenta inibir regiões do cérebro que são responsáveis por restringir a consciência dentro dos limites normais do estado desperto, uma interpretação que é notavelmente similar ao que Huxley propôs meio século atrás.
Os achados reportados pelo Dr. Carhart-Harris são notáveis porque eles vão de encontro aos resultados de estudos de imagens anteriores com alucinógenos. Geralmente, essas ressonâncias em humanos confirmaram o que estudos prévios em animais sugeriram: alucinógenos agem aumentando a atividade de certos tipos de células em diversas regiões do cérebro, ao invés de diminuir como indicado pelo estudo de ressonâncias do Dr. Nutt. Por exemplo, experimentos com tomografia por emissão de pósitrons conduzidos pelo Dr. Franz Vollenweider em Zurique (vide post: 10 Fatos Surpreendentes sobre Alucinógenos, Psicodélicos e Cogumelos Mágicos) demonstraram que a administração de psilocibina oralmente em humanos aumenta a atividade metabólica nos córtex descritos anteriormente, efeitos que acredita-se estarem correlacionados com a intensidade da resposta psicodélica. Estudos pré-clínicos, utilizando uma variedade de técnicas diferentes, mostraram que alucinógenos aumentam a atividade neural no córtex pré-frontal e em outras regiões corticais ativando neurônios excitatórios e inibitórios, levando a um aumento na liberação de neurotransmissores excitatórios e inibitórios.
Dado a esses achados anteriores, os dados colhidos pelas ressonâncias pelo Dr. Nutt são de certo modo supreendentes. Questões metodológicas (como rota de administração, dosagem, e o espectro e a extensão dos sintomas induzidos pela psilocibina) podem ser pelo menos parcialmente responsáveis por essas diferenças, devido ao processo não ser igualmente medido. É também importante considerar que o receptor 5HT2A não é o único receptor de serotonina que é ativado pela psilocibina. Os experimentos do Dr. Vollenweider confirmaram que o aumento da atividade metabólica detectada pelas tomografias é mediado pelo receptor 5HT2A (o receptor de serotonina responsável pelos efeitos psicodélicos da psilocibina). Como o grupo do Dr. Nutt não conduziu um teste similar para verificar que os efeitos que eles observaram foram mediados pelo receptor 5HT2A, esse com certeza é o próximo passo lógico.
Esperançosamente, estudos que se seguirão poderão providenciar uma explicação para esses achados discrepantes, e vão resolver o debate sobre se os alucinógenos funcionam reduzindo ou aumentando a atividade cerebral. Ensaios clínicos estão sendo conduzidos para investigar se os alucinógenos podem ser usados para aliviar o estresse e a ansiedade em pacientes com câncer terminal, para atenuar os sintomas do transtorno obsessivo-compulsivo, para reduzir a frequências de enxaquecas em salvas, entre outros (vide post), então é importante determinar o mecanismo para o efeito terapêutico dos alucinógenos. Além disso, parece haver alguma confusão entre os efeitos dos alucinógenos e os sintomas da psicose, então entendendo como os alucinógenos trabalham pode potencialmente providenciar insights sobre as causas da esquizofrenia e facilitar o desenvolvimento de tratamentos mais efetivos. Em qualquer evento, é importante notar que estudos identificaram que os córtex citados trabalham como peças-chaves na mediação dos efeitos dos alucinógenos. Na luz do que é conhecido sobre as funções base dessas regiões cerebrais, não é sem razão que eles poderiam estar envolvidos na mediação dos efeitos das drogas alucinógenas. Embora não esteja claro ainda se os alucinógenos trabalham na mente humana da maneira proposta por Huxley, parece que nós conseguimos identificar com sucesso algumas das regiões neurais chaves envolvidas nos efeitos desses agentes poderosos.
Segue abaixo uma pesquisa sobre a Psilocibina realizada com o apoio do Departamento de Psicologia da Pontifícia Univercidade Católica (PUC) de Minas, enviada ao micélio por Vinícius Ferraz e com a seguinte justificativa:
“Tendo em vista o complexo e intrigante fenômeno proporcionado pelos psicodélicos, ressalto a importância desta presente pesquisa, que ao investigar as possibilidades terapêuticas de uma destas substâncias, a Psilocibina, da margem a discussão sobre suas aplicações medicinais e propriedades curativas que podem vir a ser de grande préstimo a humanidade.
A pesquisa também contribuirá com o levantamento de material teórico, apresentando ao leitor o que houve de mais importante nos estudos desenvolvidos com psicodélicos na literatura e os modos de investigação e aplicação contemporâneos dessas substâncias, com ênfase na Psilocibina, que disponibilizará a pesquisadores e ao mundo científico informações adicionais para o estudo do tema. A importância deste estudo reside no crescente interesse científico que se apresenta no país com a investigação das mais diversas substâncias psicodélicas nos mais diferentes âmbitos.
Estudo este que é de grande relevância social levando em consideração tão antiga e intrínseca relação entre as substâncias psicodélicas e a humanidade no decorrer de sua história, sustentando a necessidade de elucidar e trazer a tona uma maior compreensão sobre o fenômeno para que a falta de esclarecimento sobre o tema não resulte na falta de critério e discernimento em seu uso e acabe por transformar uma possível ferramenta de pesquisa e terapia em um problema social.”
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
Departamento de Psicologia
Psilocibina: Possibilidades terapêuticas do cogumelo psicodélico
Vinícius Ferraz
Caio de Azevedo
Belo Horizonte
2010
Psilocibina: Possibilidades terapêuticas do cogumelo psicodélico
Artigo Cientifico apresentado para o departamento de psicologia, da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, unidade Coração Eucarístico.
Belo Horizonte
“Eu vejo a questão dos psicodélicos como uma parte da longa marcha em direção á liberdade humana, que tem certos marcos ao longo do caminho, como a abolição da escravatura, a conquista pelo direito de voto ás mulheres, a inclusão dos negros nos processos da sociedade democrática e agora, a necessidade do estabelecimento do direito universal das pessoas tomarem substâncias alteradoras de consciência. Tudo se trata da marcha triunfante em direção á uma sociedade onde a dignidade do individuo é sempre o primeiro valor a ser honrado. Não queremos ser governados pelos medos do fundamentalismo cristão, ou pela superficialidade do cientificismo, ou pelo sombrio vazio espiritual do materialismo. Nós queremos nos conectar primeiro com nossos corpos, e através dos nossos corpos com o planeta É disso que os alucinógenos, as plantas psicoativas e as substancias psicodélicas se tratam.”
Terence McKenna
Psilocibina: Possibilidades terapêuticas do cogumelo psicodélico
1. Prefácio
As substâncias psicodélicas têm sido estudadas há pouco mais de um século, desde que a ciência ocidental descobriu os seus usos entre as culturas tradicionais. A partir desse período até nossos tempos de ciência contemporânea, diversos estudos foram realizados em campos diferentes de acordo com as décadas e com os interesses envolvidos no estudo dessas substâncias.
A psilocibina (alcalóide pertencente à família das triptaminas) é uma poderosa substância psicodélica encontrada naturalmente em uma diversidade de espécies de cogumelo dos gêneros Psilocybe, Stropharia, Conocybe e Panaeolus, das quais o Psilocybe cubensis e o Psilocybe mexicana são as mais conhecidas. Descoberta em 1953, pelo autor e pesquisador russo Gordon Wasson, a psilocibina é um psicodélico relativamente novo, em termos científicos, já que a sua entrada nos laboratórios foi posterior à descoberta de outras substâncias como a mescalina, 60 anos antes. Logo ganhou grande relevância científica, protagonizando uma série de estudos, principalmente relativos à prática psicoterápica auxiliada por psicodélicos, até cair no silêncio sufocante imposto pela política norte-americana da Guerra às Drogas.
Após um período de quase extinção como linha de pesquisa, o retorno ao interesse envolvido com o intrigante fenômeno proporcionado pelos psicodélicos ocorre no final do século XX (década de 90) e continua seu reflorescimento em pleno século XXI. Apesar dos milhares de estudos desenvolvidos até então, pouco se sabe e menos ainda é desenvolvido no Brasil, país que possui grande biodiversidade dessas substâncias e variabilidades em suas formas de uso social. A cultura de uso de psicodélicos no Brasil e na América em geral atrai os interesses de diversos grupos de pesquisas interessados nesse fenômeno, que têm gerado debates amplos nos campos da neurociência, da ciência cognitiva e das ciências sociais, principalmente da antropologia e etnologia.
A presente dissertação buscou apresentar ao leitor o que houve de mais importante nos estudos desenvolvidos com a psilocibina e o cogumelo psicodélico na literatura, contrastando os dois grandes momentos da psilocibina na ciência, de 1950 a 1960 e de 1990 a 2010, separados por um período marcado pela moratória científica arbitrariamente imposta pela política norte-americana de guerra as drogas. As pesquisas mais relevantes de cada um destes períodos, envolvendo a administração de psilocibina em seres humanos, foram levantadas e analisadas com intuito de investigar a natureza da alteração mental que a psilocibina induz no indivíduo e as possibilidades destas alterações produzirem efeitos terapêuticos. Foi apresentado também um breve histórico, onde se procurou situar historicamente o cogumelo psicodélico e sua relação com a vida e cultura humana.
Tendo em vista o complexo e intrigante fenômeno proporcionado pelos psicodélicos, ressalto a importância desta presente pesquisa, que ao investigar as possibilidades terapêuticas de uma destas substâncias, a Psilocibina, da margem a discussão sobre suas aplicações medicinais e propriedades curativas que podem vir a ser de grande préstimo a humanidade.
A pesquisa também contribuirá com o levantamento de material teórico, apresentando ao leitor o que houve de mais importante nos estudos desenvolvidos com a psilocibina na literatura e os modos de investigação e aplicação contemporâneos dessas substâncias, que disponibilizará a pesquisadores e ao mundo científico informações adicionais para o estudo do tema. A importância deste estudo reside no crescente interesse científico que se apresenta no país com a investigação das mais diversas substâncias psicodélicas nos mais diferentes âmbitos.
Estudo este que é de grande relevância social levando em consideração tão antiga e intrínseca relação entre as substâncias psicodélicas e a humanidade no decorrer de sua história, sustentando a necessidade de elucidar e trazer a tona uma maior compreensão sobre o fenômeno para que a falta de esclarecimento sobre o tema não resulte na falta de critério e discernimento em seu uso e acabe por transformar uma possível ferramenta de pesquisa e terapia em um problema social.
2. Os Cogumelos Psicodélicos e a Psilocibina
Figura 1. Cogumelo da espécie Psilocybe cubensis
2.1 Introdução
A prática humana de promover estados alterados, incomuns ou ampliados de consciência induzidos por substâncias psicoativas é bastante antiga, pré-data a história escrita e é atualmente empregada em várias culturas em diversos contextos socioculturais e ritualísticos (Schultes, Hofmann & Ratsch, 2001).
Diversas substâncias psicoativas conhecidas como alucinógenas verdadeiras, tais como psilocibina, ergotamina, DMT, mescalina, LSD, entre outras de mesma natureza química podem, de acordo com as diferentes descrições dos seus efeitos serem denominadas de substancias psicotomiméticas (substancias que mimetizam a psicose), de substâncias psicodélicas (substancias que manifestam a mente ou “aquele que manifesta o espírito”) ou enteógenos (substancias que induzem experiências de significado espiritual ou “aquele que desperta o divino interior”) (Schultes, Hofmann & Ratsch, 2001). Para os propósitos deste estudo utilizaremos o termo de substâncias psicodélicas, por ser a denominação mais utilizada nos artigos científicos de psicologia e que mais se enquadra nos objetivos desta investigação.
A psilocibina – alcalóide pertencente à família das triptaminas – é uma poderosa substância psicodélica encontrada naturalmente em uma diversidade de espécies de cogumelo dos gêneros Psilocybe, Stropharia, Conocybe e Panaeolus, das quais o Psilocybe cubensis e o Psilocybe mexicana são as mais conhecidas. Estas espécies são geralmente encontradas na América do Sul e na América Central, sendo endêmicos em países como o México e o Brasil, mas podem também ser verificados em outras regiões do globo, principalmente nas localizações equatoriais e tropicais (Schultes, Hofmann & Ratsch, 2001).
Alguns pesquisadores acreditam que a psilocibina abre uma porta para o subconsciente, permitindo que o mundo consciente seja encarado de uma perspectiva o de percepção sensorial ampliada: as cores se destacam, detalhes minúsculos dos objetos são revelados e estruturas coloridas cruzam o campo de visão. O efeito pode degenerar em desorientação, reações paranóicas, inabilidade para distinguir entre fantasia e realidade, pânico e depressão (Schultes, Hofmann & Ratsch, 2001).
2.2 Histórico
Os cogumelos psicodélicos tem sido parte integrante da história humana há muitos milênios e têm desempenhado papel importante em várias cerimônias religiosas. Os maias que habitavam a Guatemala há 3.500 anos utilizavam um fungo conhecido na língua nahuátl como Teonanácatl – a Carne de Deus. Esse Cogumelo provavelmente pertence ao Gênero Psilocybe, embora também possa ser relacionada a duas outras variedades: Conocybe ou Stropharia. O primeiro registro histórico do consumo do cogumelo Psilocybe data de 1502, durante a coroação do imperador Montezuma (Heim, 1972).
Com o início das grandes navegações e “descoberta” do novo continente surge o primeiro contato dos povos europeus com as culturas pré-colombianas que utilizavam o cogumelo em seus rituais. Despreparados e assustados pelos efeitos da droga, os conquistadores espanhóis tomaram a decisão de proibir a religião nativa e o uso dos fungos psicoativos, considerando estes cultos como “obra do diabo”. (Heim, 1972)
Não existe qualquer evidência do emprego cerimonial dos cogumelos ‘mágicos’ por culturas tradicionais na América do Sul, exceto achados arqueológicos no norte da Colômbia datando de 300-100 anos a.C., conquanto seu uso ritualístico ainda é observado em outras partes do continente americano, principalmente México e países vizinhos. Acredita-se que o ritual com cogumelos por povos indígenas no México exista há pelo menos 2.200 a 3000 anos, como demonstra a datação de achados arqueológicos de esculturas de pedra em forma de cogumelos (Schultes, Hofmann & Ratsch, 2001). Um estudo recente sugere que o uso de cogumelos ‘mágicos’, provavelmente Psilocybe cubensis, também tenha ocorrido na história do Egito antigo, utilizado ritualmente e descrito no Livro Egípcio dos Mortos (Berlant, 2005).
Não há dados na literatura acerca do uso de cogumelos no Brasil. A utilização contemporânea de cogumelos, na América do Sul e em diversas localidades do mundo, ocorre em sua maioria de maneira recreacional ou hedonística, devido à facilidade de comércio pela internet, inexistência de legislação reguladora (no caso do Brasil) e pela facilidade de serem encontrados em condições naturais (no estrume de bovinos).
O interesse dos cogumelos pela ciência aconteceu no início do século XX, quando o geógrafo alemão Carl Sapper descreveu em 1898 esculturas de pedra com formas de cogumelos (Figura 2), por ele interpretadas como representações fálicas, mais tarde evidenciadas por se tratarem dos cogumelos que há muito eram utilizados em rituais mágicos. O único conhecimento acerca do uso ritual de cogumelos consistia nas descrições de um guia de missionários de 1656 contra as idolatrias indígenas, incluindo a ingestão de cogumelos e recomendando sua extirpação (Schultes, Hofmann & Ratsch, 2001).
Figura 2. Deuses cogumelos de pedra. (A) Cogumelo de pedra Maya de El Salvador, período formativo em anos de 300 a.C. – 200 d.C. Altura de 33,5 cm. (Retirada de Schultes et al., 2001). (B) Cogumelos de pedra encontrados na Guatemala, datação em anos de 1000 a.C. – 500 d.C.
Figura 2. Deuses cogumelos de pedra. (A) Cogumelo de pedra Maya de El Salvador, período formativo em anos de 300 a.C. – 200 d.C. Altura de 33,5 cm. (Retirada de Schultes et al., 2001). (B) Cogumelos de pedra encontrados na Guatemala, datação em anos de 1000 a.C. – 500 d.C.
Outros documentos antigos que parecem citar o uso de cogumelos na antiguidade são o Rig Veda(Livro dos Hinos hindu) na Índia e o The Westcar Papyrus no Egito, também havendo possibilidade de os gregos terem utilizado (Berlant, 2005).
3. Estudos e pesquisas
3.1 Estudos e pesquisas de 1950 – 1960.
Os estudos científicos com os cogumelos Psilocybe têm origem na década de 50, através de expedições ao México com intuito de obter um maior conhecimento a cerca das culturas tradicionais da região, onde xamãs, através da ingestão de cogumelos psicodélicos em rituais sagrados extraordinários, induziam poderosas visões para curar e guiar o destino de seus povos.
Em 1953, o autor e pesquisador russo Gordon Wasson e sua esposa Valentina Pavlovna realizaram um estudo de expedição de campo para o México, para estudar o uso de cogumelos alucinógenos em rituais e cerimônias de cura. Esta expedição marca o inicio do estudo do cogumelo psicodélico pela ciência. Em 1955, eles se tornaram os primeiros estrangeiros a participar do ritual com cogumelos sagrados dos índios Mazatecas. Gordon Wasson fez muito para divulgar a sua descoberta, publicando o artigo sobre suas experiências em uma influente revista da época, a Life Magazine, em 1957 (Allen, 1987; Wasson, 1957).
O relato de Wasson sobre sua experiência com cogumelos provoca o interesse da comunidade cientifica sobre o fenômeno, descrevendo com fascinação seus efeitos:
“Tudo o que se vê naquela noite se banha na claridade da origem: a paisagem, as casas, os utensílios de uso diário, os animais, tudo é calmamente irradiado pela luz primordial; dir-se-ia que as coisas apenas acabam de serem produzidas pelo criador! Esta novidade total – a aurora da criação – o submerge e o envolve, o dissolve na sua beleza inexplicável (…) Seu espírito está livre, você vive uma eternidade numa noite, vê o infinito no grão de areia. O que você vê e escuta grava-se na sua memória, é gravado ali para sempre. Enfim, você conhece o inefável, sabe o que é o êxtase! (…) Uma simples planta abre as portas, libera o inefável, traz o êxtase. Não é a primeira vez na história da humanidade que as formas mais humildes de vida dão a luz ao divino. Por mais desconcertante que seja, a maravilha que anuncia merece ser ouvida pelos homens.” (Wasson, 1961, pag.8-12)
Auspiciado por Roger Heim, micologista e diretor do Museu Nacional de História Natural de Paris, Wasson desenvolve uma série de contribuições para os campos da botânica e antropologia realizando a identificação do cogumelo psicodélico através da colheita sistemática, cultura em laboratório e análise detalhada das diferentes espécies de cogumelos do gênero Psilocybe e seu uso ritualístico. Mais tarde Wasson e Heim se associam a Sandoz, uma empresa farmacêutica suíça, fornecendo amostras de cogumelos para uma pesquisa mais abrangente a cerca das propriedades químicas e farmacológicas (Forte, 1997; Heim, 1972).
Em 1958, cinco anos após a identificação por Wasson, o cientista suíço (e mais conhecido como o “pai” do LSD) Albert Hoffmann, investiga as propriedades químicas desse cogumelo e extrai a psilocibina e a psilocina, substância de propriedades psicotrópicas e alucinógenas que depois foram sintetizadas. A psilocibina é um psicodélico relativamente novo, em termos científicos, já que a sua entrada nos laboratórios foi posterior à descoberta de outras substâncias como a mescalina, 60 anos antes, e do LSD, anterior em uma década. Albert Hoffman foi o primeiro cientista a isolar o princípio ativo e a descrever sua estrutura molecular: o alcalóide de coloração azulada, na verdade eram dois deles e extremamente similares, foram batizados de Psilocibina e Psilocina, em alusão ao gênero Psilocybe: palavra de origem grega que significa cabeça (cybe) pelada (psilos). Os resultados, obtidos por Hoffman em colaboração com dois colegas (A. Brack e Dr. H. Kobel) e o professor Roger Heim, foram publicados, em março de 1958, em nota no jornal científico Experientia. Os mecanismos de ação, em fato, devem-se a um princípio único, visto que a psilocibina converte-se em psilocina dentro do próprio corpo através de um processo chamado desfoforilação, mas os dois compostos são naturalmente encontrados nos cogumelos, sendo o primeiro deles verificado em maior porcentagem (Hoffmann, Heim, Brack & Kobbel, 1958).
Posteriormente, em parceria com outros quatro colegas (A. J. Frey, H. Ott, T. Petrzilka e F. Troxler), Hoffman descobriu a síntese da psilocibina, cuja fórmula foi patenteada em 1963. Os resultados da pesquisa foram publicados em dezembro de 1958, também no jornal Experientia. A substância foi identificada como similar a outros químicos com o LSD, cujos intensos efeitos psíquicos denunciavam a urgência de novas frentes de pesquisa. A psilocibina entrou, decisivamente, para a família daqueles estranhos e misteriosos alcalóides que vinham desafiando a percepção sobre a natureza da mente humana. A partir da descoberta da sintetização, os laboratórios Sandoz, para o qual Hoffman trabalhava, passaram a disponibilizar a substância, assim como o LSD e outros psicodélicos, para as novas frentes de pesquisa que se disseminavam no início dos anos 60, principalmente norteados pelas vanguardas investigativas da Psiquiatria e Neurologia (Hoffmann, Frey, Ott, Petrzilka & Troxler, 1958).
Em 1959, a psilocibina já se tornava a protagonista de uma série de estudos científicos, principalmente relativos à prática psicoterápica auxiliada por psicodélicos. Uma pesquisa francesa intitulada Les Effets Psychiques de la Psilocybine et les Perspectives Thérapeutiques (Os Efeitos Psíquicos da Psilocibina e as Perspectivas Terapêuticas) liderada pelo médico Jean Delay, pioneiro da pesquisa sistemática da psilocibina nos domínios psiquiátricos, administrou a psilocibina em 13 pacientes saudáveis e em 30 pacientes diagnosticados com desordens mentais e concluiu que a substância, com efeito alucinógeno mais leve do que a mescalina e efeito despersonalizante menor do que o LSD, possuía um significativo potencial enquanto ferramenta terapêutica por sua capacidade de provocar melhor acessibilidade aos conteúdos do paciente, assim como desencadear efeito psicolítico, ou seja, liberar estes conteúdos na forma de revivências (geralmente da infância), estímulos da memória afetiva e eventos traumáticos (Delay, Pichot, Lempérière, Nicolas-Charles & Quétin, 1959). No mesmo ano, Delay, deu continuidade à investigação, publicando o artigo Premiers Essais de la Psilocybine en Psychiatrie (Primeiros Ensaios da Psilocibina na Psiquiatria) (Delay, Pichot & Nicolas-Charles, 1959).
Ainda em 1959, o psiquiatra alemão F. Gnirss desenvolveu uma pesquisa intitulada Untersuchungen mit Psilocybin, einem Phantastikum aus dem Mexikanischen Rauschpilz Psilocybe mexicana (Estudos com psilocibina, um psicodélico do cogumelo Psilocybe mexicana), através da qual administra o alcalóide em um grupo de 18 pacientes saudáveis, através deste estudo Gnirss identifica propriedades psicotrópicas na substância , que significa que a Psilocibina age no Sistema Nervoso Central (SNC) produzindo alterações de comportamento, humor e cognição, possuindo grande propriedade reforçadora sendo, portanto, passíveis de auto-administração. Conclui que a substância é de significativa importância teórica e possibilidade de utilização psicoterapêutica. (Gnirss, 1959).
Em 1960, outra pesquisa francesa, desenvolvida pelo psiquiatra A. M. Quétin, resultou em conclusões similares ao administrar o fármaco em um grupo de 32 pacientes saudáveis e 68 pacientes diagnosticados com quadros psicóticos com idades entre 16-66 (21 esquizofrênicos, 6 com delírios crônicos, 6 com psicoses maníaco-depressiva, 6 oligofrênicos, 29 com neuroses, incluindo 3 alcoólicos). Através da análise exaustiva Quétin afirmou que a droga é certamente de grande interesse para o diagnóstico e, provavelmente, também para a psicoterapia (Quétin, 1960).
Inspirado pelo artigo de Wasson na Life Magazine (Wasson, 1957), o psicólogo, neurocientista, escritor, Ph.D. e professor de Harvard, Timothy Leary, viajou para o México com o intuito de experimentar e pesquisar os cogumelos psicodélicos (Higgs, 2006). Em 1960, ao voltar para Harvard, os psicólogos Timothy Leary e Richard Alpert iniciaram o projeto intitulado de “Harvard Psilocybin Project”, do qual fizeram parte também o ensaísta filosófico e autor de Portas da Percepção Aldous Huxley, o Presidente da Associação Psiquiátrica Americana John Spiegel, o superior de Leary em Harvard David McClelland, o psicólogo e professor da Universidade da Califórnia Frank Barron e dois estudantes graduados que já haviam trabalhado em um projeto à cerca da mescalina. Durante o programa, que durou de 60 a 62, uma série de experimentos foi desenvolvida para investigar as implicações da psilocibina sobre a natureza dos distúrbios psicóticos, tratamento de desordens de personalidade e psicoterapia auxiliada pelo uso do químico. Este projeto fazia parte do programa de pesquisa psicodélica em Harvard (Harvard Psychedelic Drug Research Program) inaugurado em 1960 por 35 professores, instrutores e estudantes graduados que deram luz a várias pesquisas importantes com psicodélicos na época (Higgs, 2006; Leary, 1961).
Em 1961, foi conduzido um dos mais significativos estudos feitos pela Harvard Psilocybin Project intitulado de “Um novo programa de mudança de comportamento para infratores adultos usando psilocibina” (A New Behavior change program for adult offenders using psilocybin), mais conhecido como “A experiência da prisão de Concord”. O experimento foi realizado no período de 1961 a 1963 por uma equipe de pesquisadores da Universidade de Harvard, sob a direção de Timothy Leary, dentro dos muros da Prisão Estadual de Concord, uma prisão de segurança máxima para jovens delinqüentes. O estudo envolveu a administração de psilocibina para auxiliar a psicoterapia de grupo para 32 presos, em um esforço para reduzir as taxas de reincidência criminal. Os registros da Prisão Estadual de Concord sugeriam que 64% dos 32 indivíduos voltariam para a prisão no prazo de seis meses após a liberdade condicional. No entanto, após seis meses, apenas 25% das pessoas em liberdade condicional retornaram a prisão, seis por causa de violação da condicional e dois para novos crimes. Estes resultados são ainda mais dramáticos quando a literatura correcional é pesquisada, poucos projetos de curto prazo com prisioneiros têm sido eficazes até mesmo em menor grau. Além disso, testes de personalidade indicaram uma mensurável mudança positiva no comportamento dos presos depois da experiência com a psilocibina, em comparação com os mesmo antes da experiência (Leary, Metzner, Presnell, Weil, Schwitzgebel & S. Kinne, 1965). Esta é apenas uma de várias pesquisas produzidas pelo Harvard Psilocybin Project nesta época.
O desenvolvimento do projeto, no entanto, foi significativamente prejudicado pela desenvoltura um tanto quanto anti-acadêmica de Timothy Leary, que extremamente fascinado pelas experiências de consciência desencadeadas por tais alcalóides, abandonou gradativamente a figura do pesquisador para investir-se da figura quase mística de um profeta do alucinógeno. Em 1963, Timothy Leary foi expulso de Harvard depois de ter promovido uma experiência psicotrópica com uma turma inteira de estudantes de psicologia (com o consentimento destes, naturalmente) sem monitoramento laboratorial ou intuito de pesquisa. Aos poucos foi se desfazendo da característica científica para tornar-se, anos mais tarde, uma espécie de guru da cultura psicodélica que vinha incitando os fluxos intensos da contracultura. (Higgs, 2006; Leary, 1963) A popularização de enteógenos promovida por Robert Wasson, Timothy Leary, Terence McKenna, entre outros autores e pesquisadores, levou a uma explosão no uso de cogumelos contendo Psilocibina por todo o mundo.
Até o momento drástico em que os psicodélicos escaparam dos laboratórios e tornaram-se os protagonistas de uma batalha política e, em função da política norte-americana da Guerra às Drogas, foram terminantemente proibidos, inclusive no universo científico. Até o final dos anos 60 e início dos 70, quando os Estados Unidos responderam violentamente aos questionamentos da Contracultura, movimento do qual fazia parte expressiva a utilização destas drogas, os principais estudos concentravam-se em traçar paralelos entre as três principais substâncias do grupo – LSD, mescalina e psilocibina – e em examinar a potencialidade psicoterapêutica e possível relação entre os estados alterados de consciência provocados pela adição destes alcalóides e os distúrbios mentais. Com a medida que pôs fim às pesquisas, e através da qual o governo norte-americano arbitrariamente revogou toda e qualquer qualidade científica dos psicodélicos, a psilocibina foi, assim como os demais, silenciada, apenas voltando aos laboratórios após quase trinta anos de moratória (Schultes, Hofmann & Ratsch, 2001).
3.2 Estudos e pesquisas de 1990 – 2010.
De 1953 ao final dos anos 60 as substâncias psicodélicas, como a psilocibina, foram o centro de diversas pesquisas, já citadas anteriormente, até caírem no silêncio sufocante imposto pela política norte-americana da Guerra às Drogas. Aproximadamente três décadas após o período marcado pela moratória científica arbitrariamente fixada, os psicodélicos iniciaram um expressivo movimento de retorno aos domínios científicos (Schultes, Hofmann & Ratsch, 2001). Somente na década de 90 se reiniciaram seriamente as pesquisas com psicodélicos em humanos, principalmente devido aos esforços do Dr. Rick Strassman, da Universidade do Novo México, nos EUA, e do Dr. Franz Vollenweider, da Universidade Psiquiátrica Hospital Zürich, na Suíça (Schultes, Hofmann & Ratsch, 2001). A partir deste momento e até os dias de hoje, a psilocibina tornou-se novamente o centro de diversos estudos.
Em 2004, o psiquiatra norte-americano Charles Grob, da Universidade da Califórnia, desenvolveu a pesquisa intitulada “Pilot Study of Psilocybin Treatment for Anxiety in Patients With Advanced-Stage Cancer” (Estudo Piloto de Tratamento de psilocibina para ansiedade em pacientes com câncer em estágio avançado) que investigou a substância enquanto fator terapêutico em pacientes com câncer em estado terminal explorando a sua segurança e eficácia. O estudo incluiu a administração de uma pequena dose (0,2 mg/kg) de psilocibina em 12 pacientes adultos – dos quais 11 eram mulheres – com câncer em estágio avançado e ansiedade, que ficaram deitados, com os olhos vendados, e ouvindo música a seu gosto durante seis horas sob supervisão de terapeutas treinados. A freqüência cardíaca, a pressão arterial e a temperatura dos voluntários foram monitoradas ao longo de cada tratamento. Os investigadores também verificaram os níveis de depressão, ansiedade e humor em cada um deles. Duas semanas após a experiência com a psilocibina, os voluntários reportaram que se sentiam menos deprimidos e ansiosos. Seis meses depois, o nível de depressão tinha diminuído 30%, conforme os resultados publicados na Archives of General Psychiatry. Alguns voluntários relataram estados de consciência ligeiramente alterados após receber a psilocibina, mas os pesquisadores não notaram efeitos adversos fisiológicos, ainda não foram identificados possíveis efeitos maléficos na utilização de psilocibina. Ainda assim, outros testes são necessários para examinar a segurança e a eficácia do cogumelo. O estudo, que procurava a redução do estresse e dor, obteve resultados animadores no aumento da qualidade de vida dos pacientes e os dados revelaram um aspecto promissor na utilização terapêutica da substância (Grob, Danforth, Chopra, Hagerty, McKay, Halberstadt & Greer, 2010).
Em 2006, o psiquiatra Francisco Moreno, da Universidade do Arizona, iniciou uma pesquisa sobre o uso terapêutico da substância em pacientes diagnosticados com transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) que resistiram a outros tipos de tratamento, assim como para fins de teste de segurança do alcalóide no organismo. Em uma clínica com ambiente controlado, a psilocibina foi usada com segurança em pacientes com TOC e foi associado a reduções agudas no TOC sintomas básicos em vários indivíduos. As conclusões reportaram que todos os pacientes, da amostra de nove, experienciaram melhorias nos quadros obsessivos compulsivos durante o período da experiência. Apesar de ser uma pequena pesquisa, com uma amostra e um alcance não tão significativos, Moreno reportou seu ânimo diante da potencialidade da substância: “O que vimos foi uma drástica diminuição dos sintomas durante um período de tempo. As pessoas diziam que não se sentiam tão bem há anos” (Moreno, Wiegand, Taitano & Delgado, 2006).
Em outro estudo, em 2006, o neurocientista Roland Griffiths, da Universidade Johns Hopkins, administrou psilocibina em 36 voluntários saudáveis, que participavam regularmente de atividades religiosas ou espirituais, com o objetivo de investigar os mecanismos da experiência mística/espiritual induzida pela psilocibina. Foram realizadas três sessões em intervalos de dois meses onde a psilocibina foi administrada via oral aos voluntários em doses altas (30 mg/70 kg). Nas sessões de 8 horas, realizadas individualmente, os voluntários eram encorajados a fechar os olhos e dirigir a sua atenção para seu interior. O comportamento dos voluntários foi monitorado e avaliado durante as sessões e questionários foram preenchidos imediatamente após e dois meses após as sessões, avaliando os efeitos da substancia e as características da experiência. Cerca de dois terços dos voluntários relatou haver vivenciado uma completa experiência mística, caracterizada por uma sensação de unidade com todo o universo. Entre os resultados foram relatados uma série de grandes alterações na percepção, experiência subjetiva e humor lábil – incluindo ansiedade – dos participantes. Em dois meses, os voluntários classificaram a experiência como possuidora de substancial sentido pessoal e significado espiritual, além de atribuírem a psilocibina as mudanças positivas em suas atitudes e comportamentos, coerentes com observações e avaliações cientificas (Griffiths, Richards, McCann & Jesse, 2006). Griffiths continuou monitorando os voluntários de sua pesquisa por quatorze meses após este estudo, através de entrevistas periódicas com intuito de avaliar os efeitos agudos e persistentes da administração das doses de psilocibina. Dentre os resultados obtidos pode se observar que os voluntários ainda atribuíam à experiência a causa de seus altos níveis de satisfação com a vida e a associaram ao crescente bem-estar que sentiam desde então. Foi relatado pela maioria dos participantes que seu humor, suas atitudes e comportamentos mudaram para melhor. Entrevistas estruturadas com familiares, amigos e colegas de trabalho em geral, confirmaram as observações dos sujeitos. Testes psicológicos e relatórios dos próprios sujeitos não mostraram nenhum dano aos participantes do estudo, embora alguns admitiram ansiedade extrema ou outros efeitos desagradáveis nas primeiras horas após a administração da psilocibina. Além disto, não foram observadas dependência física ou intoxicações proporcionadas pela substância. Griffiths conclui que sob condições bem definidas, com uma preparação cuidadosa, se pode gerar de forma segura e bastante confiável uma experiência mística que pode trazer mudanças positivas a uma pessoa. Afirma também que seu estudo é um passo inicial de uma série de trabalhos científicos com a psilocibina que acabará por ajudar pessoas (Griffiths, Richards, Johnson, McCann & Jesse, 2008).
Ainda em 2006, o psiquiatra John Halpern, da Universidade de Harvard, liderou um estudo com intuito de investigar os efeitos terapêuticos da psilocibina em pacientes diagnosticados com uma enxaqueca intensa conhecida como cefaléia em salvas. Considerada como a mais forte dor de cabeça que se conhece, a cefaléia em salvas é extremamente dolorosa e de ocorrência rara. É caracterizada por uma dor unilateral que atinge a zona ocular ou temporal, sua duração varia de 15 minutos a 3 horas podendo apresentar de uma até oito crises por dia, a dor é tão insuportável que muitos pensam em suicídio e alguns de fato o cometem. Com o objetivo de trazer alívio para suas excruciantes dores de cabeça, Bob Wold, depois de ter tomado sem eficácia mais de 75 medicamentos prescritos, em mais de 100 combinações diferentes e tendo como ultimo recurso quatro opções cirúrgicas, algumas de alto risco, e todas sem promessa de resultado definitivo, Wold conheceu dois médicos que sabiam que Albert Hofmann, quando sintetizou o LSD, procurava tratamentos para hemorragias durante o parto e para dores de cabeça. Devido à ilegalidade do LSD em todo o mundo e sua difícil síntese, os médicos e Wold decidiram tentar um tratamento com psilocibina. O resultado foi tão expressivo e marcante que Bob se viu, pela primeira vez em duas décadas, livre de suas dores. Bob Wold fundou uma organização, a Clusterbusters, para ajudar pacientes com a mesma condição e estudar os efeitos da psilocibina como tratamento, através da qual mantêm contato com cerca de 200 vitimas, de onde Wold pode levantar uma série imensa de informações – adquiridas em forma de questionários – que foram apresentadas à Harvard. A organização chamou atenção da universidade, que iniciou um estudo, onde seus autores entrevistaram 53 vítimas de cefaléia em salvas que experimentaram psilocibina ou LSD para tratar de sua condição. Vinte e dois dos 26 pacientes em que a psilocibina foi administrada reportaram diminuição dos ataques e alguns até mesmo a remissão por períodos extensos. A associação cresceu e hoje conta com apoio de pesquisadores em instituições formais de pesquisa, ajudando dezenas de pacientes na mesma condição (Sewell, Halpern & Pope, 2006).
As pesquisas atuais têm apontado, com dados promissores, que psicodélicos possuem uma potencialidade ainda pouco conhecida pelos cientistas e que jamais deveriam ter sido condenados a repressão durante longas décadas. Os novos estudos têm inspirado um honesto retorno de alcalóides como a psilocibina aos domínios da ciência e desmentindo a deturpada imagem pintada pelas políticas antidrogas norte-americanas nos anos 60.
4. Metodologia
O estudo foi realizado através de revisões bibliográficas de artigos científicos que tratam sobre o tema. As revisões estão divididas em duas partes: de 1950-1960 e de 1990-2010.
Coletamos os resultados de 8 pesquisas, 4 de cada época, de diversos pesquisadores que administraram psilocibina em humanos. Os resultados foram analisados e separados por tópicos de acordo com a natureza dos efeitos produzidos pela psilocibina (como humor, cognição e comportamento), buscando nestes efeitos as possibilidades do uso da substância em tratamentos, investigando sua eficácia, segurança e contra-indicações.
5. Resultados
1950-1960 1959 – Os Efeitos Psíquicos da Psilocibina e as Perspectivas Terapêuticas.
Autoria: Delay
Objetivo: Pesquisar sistemáticamente os efeitos psíquicos da psilocibina e suas perspectivas terapêuticas.
Metodologia: Administração de psilocibina em 13 indivíduos normais e 30 portadores de transtornos mentais.
Resultados:
Humor: Alteração no humor, com predominio de euforia e váriações para sentimentos de desconforto, apreensão ou ansiedade acentuada.
Cognição: Disturbios de atenção, ideação, alteração na noção subjetiva de tempo, afastamento da realidade ou isolamento do individuo, pensamentos delirantes.
Comportamento: Excitação, com movimentos compulsivos e gargalhadas sem motivos aparentes, alternando para desânimo e indiferença.
Percepção: Alteração na intensidade das impressões sensoriais (predominantemente visuais, mas também acústicas e gustativas), ilusão, alucinação, distorção da imagem corporal, disturbios de propriocepção, despersonalização e interpretação antagonista do ambiente.
Memória: Estimulação da memoria da infância, incluindo experiencias traumáticas, acesso ao material esquecido e liberação de inibições (ab-reação emocional).
Conclusão: Para os autores o acesso ao material esquecido e a liberação de inibições (ab-reação emocional) poderia ter grande valor terapêutico e interesse para a psicologia e psiquiatria.
Referência: Delay, Pichot, Lempérière, Nicolas-Charles & Quétin, 1959
1959 – Estudos com psilocibina, um psicodélico do cogumelo Psilocybe mexicana.
Autoria: Gnirss
Objetivo: Verificar os efeitos da substância em populações humanas.
Metodologia: Administração de psilocibina em 18 pacientes saudáveis.
Resultados:
Humor: Alteração no humor, com predomínio de euforia.
Comportamento: Possui ação direta no Sistema Nervoso Central, produzindo alterações de comportamento, com efeitos iniciais de atividades reduzidas e variando para uma segunda fase com o aumento da atividade e excitação.
Percepção: Alterações da imagem corporal, sentimentos de despersonalização e distúrbios de percepção sensorial.
Efeitos somáticos: Foram relatadas alterações no funcionamento do sistema nervoso autônomo como bradicardia, aumento da pressão arterial, diminuição da freqüência respiratória e aumento do volume respiratório, dor de cabeça, vertigem e dessincronização do EEG.
Conclusão: O autor afirma que a psilocibina possui ação direta no Sistema Nervoso Central, produzindo alterações de comportamento, humor e cognição, possuindo grande propriedade reforçadora sendo, passíveis de auto-administração.
Referência: Gnirss,1959
1960 – A Psilocibina na psiquiatria e clínica experimental.
Autoria: Quétin
Objetivo:
Metodologia: Administração de psilocibina em 32 pessoas saudáveis, com idade entre 25-35 anos e 68 pacientes diagnosticados com quadros psicóticos.
Resultados:
Humor: Não houve mudança
Memória: Liberação de memórias reprimidas.
Efeitos somáticos: Produz bradicardia, hipoglicemia e uma pequena alteração na esfera psíquica.
Conclusão: O efeito da psilocibina é comparável à do LSD e mescalina, mas difere em manifestações somáticas e não há nenhuma mudança na contagem de leucócitos. O modo de ação é complexo e ainda não esclarecido. A droga é certamente de grande interesse para o diagnóstico e, provavelmente, também para a psicoterapia. A reação dos indivíduos saudáveis podem às vezes ser previsíveis se o tipo de personalidade é conhecido: estudos psicométricos devem ser feitos.
Referência: Quétin,1960
1965 – Um novo programa de mudança de comportamento para infratores adultos usando psilocibina.
Autoria: Leary
Objetivo: Reduzir as taxas de reincidência criminal.
Metodologia: Administração de psilocibina em 32 presos, para auxiliar a psicoterapia de grupo.
Resultados:
Comportamento: Houve uma mudança positiva no comportamento dos presos depois da experiência com a psilocibina, em comparação com os mesmos antes da experiência.
Conclusão: O estudo concluiu que o novo programa de psicoterapia de grupo, auxiliada pela administração de psilocibina, e programas de pós-libertação carcerária, reduziria significativamente os índices de reincidência criminal. Os registros da Prisão Estadual de Concord sugeriam que 64% dos 32 indivíduos voltariam para a prisão no prazo de seis meses após a liberdade condicional. No entanto, após seis meses, apenas 25% das pessoas em liberdade condicional retornaram a prisão, seis por causa de violação da condicional e dois por novos crimes.
Referência: Leary, Metzner, Presnell, Weil, Schwitzgebel & S. Kinne, 1965
1990-2010 2006 – Segurança, tolerância e eficácia da psilocibina em 9 pacientes com Transtorno Obsessivo-Compulsivo.
Autoria: Moreno
Objetivo: Uso terapêutico da psilocibina em pacientes diagnosticados com TOC, que resistiram a outros tipos de tratamentos.
Metodologia: Administração de psilocibina em 9 pacientes portadores de transtorno obsessivo-compulsivo (TOC).
Resultados:
Comportamento: Foi observada uma diminuição acentuada dos sintomas de TOC em todos os pacientes. A diminuição dos sintomas em pacientes que sofrem de transtorno obsessivo-compulsivo durou após as primeiras 24 horas após a ingestão da psilocibina.
Efeitos somáticos: Um indivíduo apresentou hipertensão transitória.
Conclusão: As conclusões reportaram que a psilocibina foi usada com segurança em todos os pacientes, da amostra de nove, que experienciaram reduções agudas nos sintomas básicos do TOC e melhorias nos quadros obsessivos compulsivos durante o período da experiência.
Referência: Moreno, Wiegand, Taitano & Delgado, 2006
2006 – Reação da cefaléia em salvas à psilocibina e ao LSD.
Autoria: Halpern
Objetivo: Investigar os efeitos terapêuticos da psilocibina e do LSD em pacientes diagnosticados com uma enxaqueca intensa, conhecida como cefaléia em salvas.
Metodologia: Administração de psilocibina em 53 pacientes com cefaléia em salvas.
Conclusão: Foi confirmada a eficácia completa (definida como a causa da parada total dos ataques) ou a eficácia parcial (definida como diminuição da intensidade ou freqüência dos ataques, mas não a extinção dos mesmos) da psilocibina neste tratamento em 42% dos 53 indivíduos.
Referência: Sewell, Halpern & Pope, 2006
2006 – A psilocibina pode ocasionar experiências místicas possuindo substancial sentido pessoal e significado espiritual.
Autoria: Griffiths
Objetivo: Investigar os mecanismos da experiência mística/espiritual induzida pela psilocibina e avaliar os efeitos psicológicos, agudos e de longo prazo, proporcionados por uma dose alta de psilocibina.
Metodologia: Administração de psilocibina em 36 voluntarios adultos saudaveis, que participavam regularmente de atividades religiosas ou espirituais.
Resultados:
Humor: Humor lábil, com sentimentos de transcendência, tristeza, alegria, e/ou ansiedade. Redução de ansiedade de longo prazo após experiencia.
Cognição: Senso de significado e/ou idéias de referência. Sensação de bem estar ou satisfação com a vida.
Comportamento: Resultados mais elevados de estimulação/excitação e de atividade motora espontânea, sonolência muito baixa, agitação e maior contato físico com os monitores. Mudanças positivas duradouras nas atitudes e comportamentos dos sujeitos.
Percepção: Alteração perceptivas como pseudo-alucinações visual, ilusões, e sinestesias.
Conclusão: O estudo, constata que as modificações sofridas no humor, afeto e cognição dos sujeitos, após a expreriência com a psilocibina, são típicas desta substância e produzem uma série de grandes alterações na percepção, experiência subjetiva e humor lábil, incluindo ansiedade, dos participantes. Maiores elevações, a longo prazo, nos índices de atitudes positivas, bom humor, sociabilidade e comportamentos assertivos. Experiência classificada pelos sujeitos como estando dentre as cinco experiências mais significativas de sua vida, considerando-a como possuidora de substancial sentido pessoal e significado espiritual.
Referência: Griffiths, Richards, McCann & Jesse, 2006
2010 – Estudo Piloto de Tratamento de psilocibina para ansiedade em pacientes com câncer em estágio avançado.
Autoria: Grob
Objetivo: Investigar a segurança e eficácia terapêutica da psilocibina para pacientes com câncer terminal
Metodologia: Administração de psilocibina em 12 indivíduos adultos com câncer em estágio avançado e ansiedade.
Resultados:
Humor: Melhora de humor que atingiu significância de seis meses, com redução da ansiedade no tempo de até três meses após o tratamento.
Conclusão: O estudo, que procurava a redução do estresse e dor, obteve resultados animadores no aumento da qualidade de vida e melhora do humor e ansiedade dos pacientes e os dados revelaram um aspecto promissor na utilização terapêutica da substância, estabelecendo a viabilidade e segurança da administração de doses moderadas de psilocibina para pacientes.
Referência: Grob, Danforth, Chopra, Hagerty, McKay, Halberstadt & Greer, 2010.
6. Discussão e análise dos dados
A partir da análise dos resultados obtidos nestas 8 pesquisas realizadas através da administração de psilocibina, entre outros conhecimentos sobre o tema, podemos observar alguns aspectos que devem ser levados em consideração:
Em relação aos efeitos somáticos produzidos pela psilocibina, que são divulgados mais amplamente em 3 pesquisas, que consiste nas alterações no funcionamento do sistema nervoso autônomo como bradicardia, aumento da pressão arterial, diminuição da freqüência respiratória e aumento do volume respiratório, dor de cabeça, vertigem e hipoglicemia podem representar riscos para algumas pessoas, necessitando de acompanhamento médico. Outros efeitos somáticos observados como midríase, hipotensão, congestão facial, suor, astenia e sono são aparentemente os mesmos, tanto em pessoas com transtornos mentais quanto em pessoas normais. Andar ébrio e tremores acontecem paralelamente.
Em relação aos efeitos psíquicos, são caracterizados em primeiro lugar por perturbações do humor, como euforia e sensação de bem-estar, é interessante notar uma inversão do humor nos melancólicos. A agitação é freqüente, variando muitas vezes de um estado eufórico para sentimentos de desconforto, mal-estar geral, fadiga com apreensão, perplexidade e até mesmo ansiedade, nos mostrando o quão sensível para emoções a psilocibina deixa o paciente.
O comportamento é alterado, geralmente há uma grande excitação com o uso da substância, podendo ocorrer, por exemplo, movimentos compulsivos que se alternam para desânimo e indiferença. Porém a longo prazo pode ser constatado uma melhora significativa nos comportamentos e atitudes do sujeito.
A cognição é afetada por distúrbios de atenção, alteração na noção subjetiva de tempo, afastamento da realidade, isolamento do indivíduo e ocorre pensamento delirantes. Os fenômenos intelectuais apresentam déficit, como perturbações de concentração, às vezes são de um tipo onírico que pode ser ansioso, e até erótico.
A percepção é alterada, ocorrendo alteração na intensidade das impressões sensoriais, distorção da imagem corporal e podendo ocorrer ilusões e sinestesias. Os contatos com o mundo exterior traduzem modificações que levam, por exemplo, os melancólicos a sorrir, os catatônicos a procurar contato. Às vezes desaparece a timidez e um fenômeno nomeado por um dos autores como reticências, que diz da “omissão voluntária do que se poderia dizer”. Sentimentos de despersonalização não são raros.
A memória é afetada através da estimulação da memória da infância, da liberação de inibições (ab-reação emocional) e liberação de memórias reprimidas. As manifestações mais interessantes aplicam-se as evocações, permitindo aos pacientes reviver suas crises de angústia ou cenas que podem tê-los marcado. A supressão das inibições permanece também como um dos resultados mais dignos de atenção.
Podemos considerar, de um modo geral, que existe grande semelhança entre os efeitos da psilocibina nos sujeitos normais e nos doentes mentais.
A liberação de memórias reprimidas ocorre igualmente a ambos, entretanto, nas pessoas normais são recordações de infância geralmente não penosas, enquanto que nos doentes mentais são, mais freqüentemente, cenas traumatizantes.
Convém separar os efeitos da psilocibina conforme a condição psíquica do sujeito, se ele é psicótico ou neurótico. Nos esquizofrênicos crônicos, nos dementes, toda possibilidade de resposta afetiva parece abolida, os risos discordantes sem nenhum motivo ou razão são freqüentes. Nos paranóicos de evolução recente as reações são violentas, as vezes provocadas por poderosas recordações nas quais as testemunhas presentes podem ser identificadas a personagens ligadas a cenas do passado do doente, que as reencontra, sob o efeito da substância. Assim sendo, a agressividade deste em relação a certas pessoas de seu ambiente renascerá, devido a esta lembrança provocada, necessitando de maio cuidado neste ponto.
Nos casos de neurose, determina-se o interesse da aplicação da psilocibina. Nos psicopatas, a atitude se revelará teatral ou pueril. As lembranças afluem, o sujeito registra-as com todo o cortejo afetivo: reivindicações, frustrações, invejas, culpabilidade (Quétin, 1960). Assim sendo, a supressão das inibições e dos recalques acelera-se, fixa-se. Em alguns casos, essas modificações chegam a uma verdadeira tomada de consciência intelectual do paciente sobre seu estado, o que pode levar a uma espécie de euforia, a qual aguçaria, por exemplo, seu “apetite” renovador, levando o sujeito a novas atitudes.
Nos histéricos, enfim, numa primeira fase ansiosa acentuada pela desconfiança, sucederá um desaparecimento progressivo da hostilidade em relação às testemunhas. Pouco a pouco, as lembranças longínquas se reconstituem, acumulam, as circunstâncias do passado tornam a juntar-se. Também nos portadores de transtorno obsessivo-compulsivo o sentimento de culpa pode exteriorizar-se, fazendo nascer os elementos que permitirão que talvez se desenhem — definidas pelo próprio doente — as etapas sucessivas de sua despersonalização, trazendo uma grande melhora para sua vida e redução, com raros casos de extinção, dos sintomas.
Este efeito sobre a memória humana, provocando o acesso a memórias reprimidas, é de grande interesse para a psicologia, se mostrando um método eficaz no tratamento de algumas desordens mentais e outros transtornos, provocando uma significativa melhora na vida dos pacientes e se mostrando segura para sua aplicação, se mediante a um acompanhamento profissional e um direcionamento terapêutico.
7. Considerações finais
Os efeitos únicos produzidos pela psilocibina fornecem panoramas para o estudo da mente em geral e da consciência humana em particular. Permitem a exploração de diversos parâmetros e mecanismos atrelados ao processo consciente, como a percepção sensorial e a autoconsciência.
Nas mãos do terapeuta, a psilocibina não apenas pode agir francamente sobre o ressurgimento de lembranças reprimidas como também despertar um desejo de aproximação entre o paciente e o terapeuta, formando um vínculo onde seja possível uma colaboração maior de ambas as partes para a revelação da origem das perturbações mentais.
Mostrando-se então uma eficaz ferramenta terapêutica, e comprovando minhas hipóteses de que a proibição desta substância advém antes de uma arbitrariedade preconceituosa de pretextos hediondos do que de um real risco a vida ou bem-estar do ser humano. Porém, para uma aplicação segura e com resultados benéficos da psilocibina, como uma ferramenta auxiliar em processos terapêuticos, mais estudos são necessários.
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“UM ATALHO PARA DEUS Cogumelo alucinógeno evoca experiências místicas, causa bem-estar e melhora o humor, diz pesquisa
Por Rogério Tuma
Cientistas da Johns Hopkins University utilizam, pela primeira vez, métodos científicos rigorosos para avaliar alucinógenos e comprovam que o chamado “cogumelo sagrado” consegue evocar experiências místicas e espirituais idênticas àquelas espontâneas descritas por pessoas em transe religioso por séculos.
A psilocibina é um alcalóide encontrado no cogumelo psilocibe, existente no México e no Sudoeste americano, e é semelhante aos alcalóides encontrados em quase 200 plantas espalhadas pelo mundo. Esses alcalóides atuam nos receptores cerebrais do neurotransmissor serotonina (envolvido nos sonhos, no humor e em outras funções afetivas). Neles se encaixam o LSD, a mescalina e várias outras substâncias. Há milênios esse grupo de alucinógenos é utilizado em rituais religiosos. No Brasil, a seita mais conhecida que pratica esses rituais é o Santo Daime.
Durante o movimento hippie, nos anos 60, o cogumelo foi muitas vezes tomado de forma exagerada, o que inibiu seus estudos até recentemente. Agora, com as novas técnicas, o controle das pesquisas é maior e os resultados positivos e negativos são, portanto, mais confiáveis.
No estudo da Johns Hopkins, 36 voluntários foram divididos em três grupos e foram avisados de que poderiam receber um alucinógeno ou outras medicações que poderiam alterar a consciência. Um grupo de 15 voluntários recebeu oralmente a psilocibina na dose de 30 mg/70 kg. Um segundo grupo de 15 recebeu metilfenidato (estimulante cerebral utilizado para síndrome do déficit de atenção) como placebo positivo, isto é, uma medicação que simula os efeitos colaterais, mas que não provoca alucinações. E um terceiro grupo de seis voluntários recebeu metilfenidato duas vezes, sem saber, achando que receberam drogas diferentes nas duas ocasiões. Com isso os pesquisadores controlaram os efeitos da sugestão e da expectativa.
Para avaliar as possíveis alucinações e experiências foram aplicadas diversas escalas predefinidas que caracterizam estados de consciência, humor, misticismo, transcedência espiritual e várias outras alterações psíquicas.
Entre os indivíduos que receberam o alucinógeno, 60% descreveram sintomas que preencheram os critérios definidos para uma “experiência espiritual e mística completa” nas primeiras oito horas de avaliação, e um terço deles a descreveu como “a experiência espiritual mais importante de sua vida” e mais de dois terços descreveram a experiência como uma das cinco mais marcantes, comparável com a morte do pai ou o nascimento do primeiro filho.
Dois meses depois, 79% dos indivíduos ainda se referiam a uma grande ou moderada mudança positiva no seu bem-estar e na sua satisfação com a vida. A grande maioria também mencionou que seu humor, suas atitudes e comportamento melhoraram significativamente, e esse dado foi confirmado com parentes e colegas de trabalho.
O líder do estudo, publicado na revista americana Psychopharmacology de 11 de julho, dr. Roland Griffiths, afirma que a mensagem não é a de que se pode reproduzir experiências místicas artificialmente, mas que elas modificam positivamente a vida dos voluntários por pelo menos alguns meses, indicando um uso terapêutico valioso. Griffiths também alerta para os efeitos colaterais, pois mesmo nas condições bem controladas do estudo, um terço dos voluntários apresentou medo considerável e ansiedade. Alguns apresentaram sintomas passageiros de paranóia. A utilização sem controle da droga pode levar a sintomas negativos com freqüência ainda maior.
Apesar de no estudo em questão a droga não ter causado dependência ou sinais de intolerância, Griffiths alerta também que ela não é um instrumento de uso contínuo para melhorar a vida ou ser um caminho mais curto para Deus. “Há uma enorme diferença entre ter uma experiência espiritual e ter uma vida espiritual”, diz.
O estudo foi considerado um marco da ciência por Charles Schuster, diretor do Instituto Americano sobre Abuso de Drogas (Nida), pois reintegra à análise da consciência e percepção sensorial um grupo de substâncias de grande valor que foi abominado por quase 40 anos.
Os autores afirmam não existir interesse em explicar a religiosidade das pessoas. Segundo Lawrence Kraus, em artigo na revista New Scientist de julho, utilizar a ciência para negar a religião é um desserviço, pois coloca uma contra a outra e vice-versa. Também para o padre belga Georges Lemaitre, que foi o primeiro cientista a demonstrar que a Teoria da Relatividade de Einstein previa o Big-Bang: “É um erro utilizar a ciência para explicar a existência de Deus ou para torná-lo irrelevante, pois a tese serviria apenas ao propósito de satisfazer a convicção religiosa do postulante”. “
Matéria publicada em Janeiro pela ” Scientific American Brasil“, nos foi direcionada por Vinícius Costa.
Em horas, substâncias psicoativas são capazes de induzir realinhamentos psicológicos profundos que exigiriam décadas para serem alcançados no divã.
por Roland R. Griffiths e Charles S. Grob
SANDY LUNDAHL, EDUCADORA EM SAÚDE DE 50 ANOS DE IDADE, chegou ao centro de estudos biológicos comportamentais na Johns Hopkins University School of Medicine em uma manhã de primavera de 2004. Ela se ofereceu para participar de um dos primeiros estudos com drogas alucinógenas nos Estados Unidos em mais de três décadas. Preencheu questionários, conversou com os dois monitores que estariam com ela pelas próximas oito horas e se ajeitou no confortável espaço parecido com uma sala de estar em que a sessão aconteceria. Então, engoliu duas cápsulas azuis e reclinou-se em um sofá. Para ajudá-la a relaxar e focar seu interior, ela usava tapa-olhos e fones de ouvido, que transmitiam música clássica especialmente selecionada.
As cápsulas continham um a alta dose de psilocibina, principal componente dos cogumelos “mágicos”, que, como o LSD e a mescalina, produzem alterações de humor e percepção, mas muito raramente alucinações. Ao final da sessão, quando os efeitos haviam se dissipado, Sandy, que nunca havia tomado um alucinógeno antes, preencheu mais questionários. Suas respostas indicavam que, durante o tempo em que ficou na sala, havia passado por uma profunda
experiência mística.
Em uma visita de acompanhamento mais de um ano depois, ela disse que continuava a pensar na experiência diariamente e – o mais notável – que ela a considerava o evento mais pessoal e espiritualmente significativo de sua vida. Ela sentia que aquilo trouxera mudanças positivas em seu humor, atitudes, comportamento e uma perceptível melhora em sua satisfação com a vida como um todo. “Parece que a experiência levou a uma aceleração do meu desdobramento ou desenvolvimento espiritual”, descreveu. “Lampejos de introspecção ainda ocorrem… Sou muito mais amorosa – compensando as feridas que causei no passado… Sou cada vez mais capaz de perceber as pessoas como tendo a luz do divino fluindo por elas.”
Sandy foi uma de 36 participantes de um estudo conduzido por um de nós de (Griffiths) na Johns Hopkins que começou em 2001 e foi publicado em 2006, seguido por um relatório que saiu dois anos depois. Quando o primeiro trabalho apareceu no periódico Psychopharmacology, muitos membros da comunidade científica saudaram a ressurreição de uma área de pesquisas que estava dormente havia um bom tempo. Os estudos com a psilocibina na universidade continuam por dois caminhos: um explora os efeitos psicoespirituais da droga em voluntários saudáveis. O outro estuda se os estados de consciência alterada induzidos por alucinógenos – e, em particular, experiências místicas – poderiam mitigar os efeitos de vários problemas psiquiátricos e comportamentais, incluindo alguns para os quais as terapias atuais não chegam a ser efetivas. A principal droga usada nesses estudos é a psilocibina, que integra os chamados alucinógenos clássicos. Assim como as outras drogas dessa classe – psilocina, mescalina, DMT e LSD –, a psilocibina age nos receptores de serotonina das células cerebrais. Confusamente, substâncias de outras classes que exercem efeitos farmacológicos diferentes desses dos alucinógenos clássicos também são rotuladas como alucinógenos” pela mídia e por relatórios epidemiológicos. Esses compostos, alguns dos quais também podem oferecer potencial terapêutico, incluem a quetamina, o MDMA (popularizado como “ecstasy”), salviorina A e ibogaína, entre outros.
SUPERANDO LEARY
A PESQUISA TERAPÊUTICA com os alucinógenos se vale de evidências promissoras observadas em estudos iniciados nos anos 50 que, coletivamente, envolveram milhares de participantes. Alguns desses estudos sugeriam que os alucinógenos poderiam ajudar a tratar a dependência química e a aliviar o sofrimento psicológico das doenças terminais. Essa pesquisa parou no início dos anos 70, quando o uso recreativo dos alucinógenos, principalmente o LSD, cresceu e atraiu uma cobertura sensacionalista da mídia. Esse campo de investigação também foi afetado pela demissão amplamente divulgada de Timothy Leary e Richard Alpert da Harvard University em 1963, em resposta à preocupação sobre métodos heterodoxos de pesquisa usando alucinógenos, incluindo, no caso de Alpert, oferecer psilocibina a um estudante fora do campus.
O crescente uso sem supervisão de substâncias pouco compreendidas, em parte resultado do apoio dado a elas pelo carismático Leary, ganhou repercussão. O Ato de Substâncias Controladas, de 1970, pôs os alucinógenos comuns na Lista 1, a categoria mais restritiva. Novas limitações foram impostas à pesquisa com humanos, a subvenção estatal foi suspensa e os pesquisadores envolvidos nessa linha de pesquisa se viram profi ssionalmente marginalizados.
Décadas se passaram antes que as atitudes que bloquearam as pesquisas arrefecessem o bastante para permitir estudos rigorosos com humanos envolvendo o uso dessas substâncias. As experiências místicas permitidas pelos alucinógenos interessam os pesquisadores particularmente porque têm o potencial de produzir mudanças positivas rápidas e duradouras no humor e comportamento – alterações que podem demandar anos de esforço na psicoterapia convencional.
O trabalho feito na Johns Hopkins é emocionante porque demonstra que essas experiências podem ser produzidas em laboratório na maioria das pessoas estudadas. Ele permite, pela primeira vez, pesquisas científi cas rigorosas e avaliações que registram os voluntários antes e depois do uso da droga. Esse tipo de estudo permite aos pesquisadores examinar as causas e efeitos psicológicos e comportamentais dessas experiências extraordinárias.
Pesquisadores da Johns Hopkins usaram questionários originalmente desenvolvidos para avaliar experiências místicas que ocorriam sem drogas. Eles também analisaram os estados psicológicos gerais dos participantes entre dois e 14 meses após a sessão com psilocibina. Os dados mostraram que os participantes experimentaram um aumento na autoconfiança, maior sensação de contentamento interior, melhor capacidade de tolerar frustrações, diminuição do nervosismo e aumento no bem-estar geral. Um comentário típico de um participante: “A sensação de que tudo é Um, que eu experimentei a essência do Universo e o saber que Deus não nos pede nada, exceto receber amor. Não estou sozinho. Não temo a morte. Sou mais paciente comigo mesmo”. Outra participante ficou tão inspirada que escreveu um livro sobre as experiências.
ALÍVIO DO SOFRIMENTO
QUANDO A PESQUISA SOBRE a terapia baseada em alucinógenos foi suspensa, há cerca de 40 anos, deixou uma lista de tarefas que incluía o tratamento do alcoolismo e outras dependências, a ansiedade associada ao câncer, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno de estresse pós- traumático, desordens psicossomáticas, transtornos severos de personalidade e autismo.
No câncer, os pacientes frequentemente se confrontam com ansiedade severa e depressão, e antidepressivos e drogas redutoras de ansiedade podem ter uma atuação limitada para amenizar esses casos. Nos anos 60 e início dos 70, mais de 200 pacientes de câncer receberam alucinógenos clássicos em uma série de estudos clínicos. Em 1964, Eric Kast, da Chicago Medical School, que administrou LSD a pacientes terminais com dores severas, relatou que os pacientes desenvolveram um “desprezo peculiar pela gravidade de sua situação e conversavam livremente sobre sua morte iminente com uma característica considerada não usual pelos costumes ocidentais, mas muito benéfica aos seus estados mentais.” Estudos posteriores, produzidos por Stanislav Grof, William Richards e seus colegas do Spring Grove Psychiatric Hospital próximo a Baltimore (e mais tarde no Maryland Psychiatric Research Center) usaram LSD e outro alucinógeno clássico, o DPT (dipropiltriptamina). Os testes mostraram diminuição na depressão, ansiedade e medo da morte. E pacientes com experiências místicas mostram as melhoras mais significativas na medição psicológica de bem-estar.
Um de nós (Grob) atualizou esse trabalho. Em setembro passando, um ensaio no periódico Archives of General Psychiatry relatou um estudo piloto realizado entre 2004 e 2008 no Harbor-Ucla Medical Center para avaliar se as sessões com psilocibina reduziam a ansiedade em 12 pacientes terminais de câncer. Apesar de o estudo ser pequeno demais para permitir conclusões mais significativas, foi encorajador: os pacientes mostraram diminuição na ansiedade e melhora no humor, mesmo vários meses após a sessão.
Alcoólatras, fumantes e outros dependentes químicos podem relatar vitória sobre suas dependências após uma experiência mística que os afetou profundamente e ocorreu de forma espontânea, sem uso de drogas. A primeira onda de pesquisas clínicas com alucinógenos reconheceu o potencial terapêutico dessas experiências transformadoras. Mais de 1.300 pacientes participaram de estudos sobre dependência que originaram mais de duas dúzias de publicações décadas atrás. Em alguns desses estudos foram administradas altas doses em pacientes pouco preparados e reduzido apoio psicológico, alguns fisicamente presos ao leito. Pesquisadores que compreendiam a importância da preparação e deram apoio a seus pacientes tendiam a obter melhores resultados. Esse trabalho antigo trouxe resultados
promissores, mas inconclusivos.
A nova geração de pesquisa com alucinógenos, com melhores metodologias, deve ser capaz de determinar se essas drogas podem de fato ajudar as pessoas a superar dependências. Além do tratamento da dependência, os estudos mais recentemente começaram a testar se a psilocibina pode mitigar os sintomas do transtorno obsessivo-compulsivo. Outras substâncias controladas com mecanismos diferentes de ação também estão mostrando potencial terapêutico. Pesquisas evidenciam que a quetamina, administrada em baixas doses (é normalmente usada como anestésico), poderia dar um alívio mais rápido da depressão que os antidepressivos tradicionais, caso do Prozac. Um teste recente, na Carolina do Sul, usou o MDMA para tratar com sucesso o transtorno de estresse pós-traumático em pacientes em que as terapias convencionais não produziram efeito. Testes similares com o MDMA estão a caminho na Suíça e em Israel.
A ESTRADA À FRENTE
PARA QUE AS TERAPIAS COM USO de alucinógenos clássicos ganhem aceitação, terão de superar preocupações que emergiram com os excessos dos “psicodélicos anos 60”. Os alucinógenos podem, às vezes, induzir à ansiedade, paranoia ou pânico, que, em ambientes sem supervisão, podem produzir ferimentos acidentais ou mesmo suicídio. No estudo feito na Johns Hopkins, mesmo após cuidadosa seleção, e ao menos oito horas de preparação com um psicólogo clínico, cerca de um terço dos participantes experimentaram algum período de medo significativo e cerca de um quinto sentiram paranoia em algum momento durante a sessão. Mas no ambiente acolhedor oferecido pelo centro de pesquisas e com a constante presença de guias treinados, os participantes não demonstraram efeitos negativos duradouros.
Outros riscos potenciais dos alucinógenos incluem psicose prolongada, aflição psicológica, distúrbios na visão ou nos outros sentidos, com duração de dias ou mais. Esses efeitos, no entanto, não são muito frequentes e se mostram ainda mais raros em voluntários preparados psicologicamente. Apesar do eventual abuso na utilização dos alucinógenos clássicos (usados de forma a pôr em risco a segurança dos usuários ou de outros), eles não são tipicamente considerados drogas viciantes, porque não levam ao uso compulsivo nem produzem síndrome de abstinência. Para ajudar a minimizar as reações adversas, os pesquisadores da Johns Hopkins publicaram recentemente um conjunto de normas de segurança para a realização de estudos com altas dosagens de alucinógenos. Em função da habilidade dos pesquisadores em tratar com os riscos das drogas, sentimos que os estudos dessas substâncias devem continuar devido ao seu potencial para transformar a vida, digamos, de um paciente de câncer ou dependente químico. Se elas se mostrarem úteis no tratamento do abuso químico, ou da ansiedade existencial associada a doenças que põem a vida em risco, pesquisas posteriores poderiam ser beneficiadas. Os benefícios também podem vir da neuroimagem e de técnicas farmacológicas que não existiam nos anos 60 e que fornecem uma melhor compreensão de como essas drogas atuam.
A visualização das áreas do cérebro envolvidas nas emoções e pensamentos intensos que as pessoas têm sob a influência das drogas dará uma janela para a psicologia por trás das experiências místicas produzidas pelos alucinógenos. Pesquisas adicionais também poderão trazer abordagens não farmacológicas mais eficientes se comparadas às práticas espirituais tradicionais, como meditação ou jejum para produzir experiências místicas e mudanças comportamentais desejadas.
A compreensão sobre como as experiências místicas podem levar a atitudes benevolentes em relação a si mesmo e aos outros deve ajudar a explicar o bem documentado papel de proteção da espiritualidade no bem-estar e saúde psicológica. As experiências místicas podem originar um senso profundo e duradouro da interconexão entre pessoas e coisas – perspectiva que está por trás dos ensinamentos éticos das tradições religiosas e espirituais. Assim, uma compreensão da biologia dos alucinógenos clássicos poderia ajudar a esclarecer os mecanismos por trás do comportamento ético e cooperativo humano – conhecimento que, acreditamos, poderá vir a ser crucial para sobrevivência da nossa espécie.
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Roland R. Griffiths é professor nos departamentos de psiquiatria e neurociências da Johns Hopkins University School of Medicine. Seus principais focos de pesquisa têm sido os efeitos comportamentais e subjetivos das drogas que alteram o humor. Ele é o líder de pesquisas com a psilocibina na Johns Hopkins.
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Charles S. Grob é professor de psiquiatria e pediatria da David Geff em School of Medicine da Ucla e diretor de Divisão de Psiquiatria Infantil e Adolescente no Harbor-Ucla Medical Center. Ele conduziu testes clínicos com várias drogas alucinógenas, incluindo o uso da psilocibina no tratamento da ansiedade em pacientes com câncer.
Traduzido do arquivo da Associação Multidisciplinar para o Estudo de Psicodélicos (MAPS)
MAPS – Volume 7 N# 1, Inverno 1996-97 – pp. 10-11
Pesquisas recentes e suas implicações para o aumento da criatividade
Matthew J. Baggott
Pesquisador Associado, Centro de Pesquisa de Dependência de Drogas
Universidade da California, San Francisco
Para os estudos de Rick Doblin de acompanhamento a longo prazo da pesquisa com psilocibina originalmente conduzida ou supervisionada por Timothy Leary em Harvard de 1960 a 1963, veja o Good Friday experiment follow-up (em inglês), que investiga o uso da psilocibina como catalizador de experiências místicas, e o Concord Prison experiment follow-up (em inglês), que investiga o uso da psilocibina em promover mudança de comportamento e reduzir reincidências.
Discussão do artigo: Spitzer M, Thimm M, Hermle L, Holzmann P, Kovar KA, Heimann H, Gouzoulis-Mayfrank E, Kischka U, Schneider F (1996); Aumento da ativação de associações semânticas indiretas com o uso de psilocibina. Biol Psychiatry 39:1055-1057. Spitzer e seus colegas chegaram mais perto de compreender os efeitos dos psicodélicos. Como eles apontaram na conclusão do seu trabalho, obtiveram sucesso na utilização dos resultados de uma tarefa simples para teorizar ligações entre os relatos subjetivos dos usuários de psicodélicos, medições objetivas dos efeitos da psilocibina, e a fisiologia cerebral subjacente. No processo, eles levantaram uma série de ligações produtivas a futuras pesquisas.
A primeira onda de pesquisas sobre psicodélicos nos anos 60 viu muitas tentativas de entender os mecanismos e os efeitos dos psicodélicos. Olhando de volta para esses estudos do passado, chega-se a idéia que as substâncias psicodélicas talvez fossem complexas demais para as ferramentas científicas da época. No entanto, a onda atual de pesquisas sobre psicodélicos se mostra muito mais promissora. Desde os 60, ganhamos muitas ferramentas sofisticadas de pesquisa. Essas ferramentas incluem testes neuropsicológicos simples, tarefas repetitivas, jogos, que podem dar valiosos insights de como os psicodélicos afetam a mente. Manfred Spitzer, M.D., Ph.D., e seus colegas (1996) publicaram recentemente um fascinante relatório sobre os efeitos da psilocibina em um desses testes neuropsicológicos.
O grupo de Spitzer, de oito homens voluntários, foi oralmente administrado com 0.2 mg de psilocibina, por kg de peso corporal, junto a um grupo de controle que recebeu um placebo. Em seguida estudaram os efeitos da psilocibina em uma tarefa de reconhecimento de palavras. Nesse teste, o indivíduo identifica se uma sequência de caracteres é uma palavra, ou não. Estudos anteriores descobriram que indivíduos podem identificar uma palavra mais rápido se a sequência de caracteres que a precede for uma palavra proximamente relacionada. Por exemplo, uma pessoa pode reconhecer a palavra “preto” mais rapidamente se ela foi imediatamente precedida pela palavra “branco”. Este efeito é conhecido como “disparo semântico” (semantic priming). Em indivíduos normais, o disparo semântico ocorre somente com palavras de relação próxima. No entanto, palavras indiretamente relacionadas (“doce” e “limão,” por exemplo) produz esse disparo semântico em indivíduos esquizofrênicos de pensamento desordenado (Spitzer et al 1993a, 1993b).
Disparo semântico
Os pesquisadores descobriram que a psilocibina desacelerou o tempo de reação dos indivíduos, ao mesmo tempo que produzia um efeito de disparo semântico das palavras indiretamente relacionadas (“doce” e “limão”), semelhante ao observado na pesquisa de esquizofrenia. A descoberta de que a psilocibina desacelera o tempo de reação não era inesperada; uma pesquisa anterior com psicodélicos encontrou o mesmo efeito. No entanto, a descoberta que a psilocibina produzia disparo semântico indireto é mais interessante. Em suas discussões, os pesquisadores ressaltam que seus resultados são relevantes para a afirmação que psicodélicos “aumentam a criatividade” ou “expandem a consciência”:
Embora a maioria das medições objetivas tenham falhado em apoiar estas afirmações, nossos dados sugerem que o agente [alucinógeno] de fato leva a um aumento da disponibilidade de associações remotas e, portanto, pode trazer efeitos cognitivos à mente que, em circunstâncias normais, permaneceriam desativados; no entanto, a diminuição geral do desempenho psicológico sob efeito de agentes alucinógenos sugere que o aumento indireto do efeito de disparo se deve à diminuição da capacidade de usar informação contextual para a focalização do processamento semântico. Por isso, a experiência subjetiva de aumento da criatividade, assim como a ampliação da consciência, foram encontradas paralelamente com a diminuição nas medições objetivas de desempenho. (p. 1056-1057).
Assim, os pesquisadores sugerem que os psicodélicos podem de fato “ampliar a consciência” tornando mais disponíveis as associações mentais remotas. No entanto, isso envolve um trade-off. Embora as associações remotas se tornem mais acessíveis, os sujeitos ficam menos capazes de focalizerem a atenção, o que diminui seus tempos de reação.
Redes neurais semânticas
Os pesquisadores interpretam seus resultados utilizando um modelo que afirma que o cérebro contém redes neurais semânticas que podem ser ativadas pela informação semântica. A propagação dessa ativação pelas redes neurais determina a quantidade de disparo semântico que ocorre no teste de reconhecimento de palavras. Essa ativação se propaga de forma mais profunda e rápida em esquizofrênicos de pensamento desordenado e usuários de psilocibina do que em voluntários normais. Uma explicação para essa quantidade incomum de ativações é a dimuição da eficiência no córtex onde a informação semântica é processada (Servan-Schreiber et al 1990, Cohen and Servan-Schreiber 1992, 1993). Existem evidências de que essa ineficiência de processamento está relacionada com a diminuição da modulação dopaminérgica. Como suporte a essa teoria, os pesquisadores descobriram que a L-dopa, um precursor da dopamina, reduz a propagação da ativação e, dessa forma, reduz indiretamente o disparo semântico (Kischka et al 1995). No contexto dessa teoria, a psilocibina (que atua no sistema serotoninérgico) pode ser vista como um potencializador de ativação das redes semânticas. Essencialmente, a dopamina parece ter um efeito de focalização na ativação das redes semânticas, enquanto a psilocibina tem um efeito de desfocalização.
O teste de reconhecimento de palavras
O teste de reconhecimento de palavras usado pelo grupo de Spitzer é particularmente interessante por várias razões. Primeiro, ele permitiu aos pesquisadores testar o acesso automático, ao invés de voluntário, à memória. Mesmo quando os sujeitos não conseguiam recordar conscientemente as palavras previamente vistas (seja por causa de uma droga ou por desordens neurológicas), o teste de reconhecimento de palavras pode demonstrar se os sujeitos ainda podem acessar automaticamente essa memória. Além disso, o teste permite que os pesquisadores vejam como o foco das associações mentais do sujeito é modificado por diferentes estados farmacológicos ou psicológicos. Esse aspecto parece potencialmente promissor para a diferenciação entre diferentes tipos de memórias. Por exemplo, em algumas situações, palavras emocionais (“feliz” e “triste”) podem ser ativadas em maior medida do que palavras com pouco conteúdo emocional (“preto” e “branco”).
Spitzer e seus colegas chegaram mais perto de compreender os efeitos dos psicodélicos. Como eles apontaram na conclusão do seu trabalho, obtiveram sucesso na utilização dos resultados de uma tarefa simples para teorizar ligações entre os relatos subjetivos dos usuários de psicodélicos, medições objetivas dos efeitos da psilocibina, e a fisiologia cerebral subjacente. No processo, eles levantaram uma série de ligações produtivas para futuras pesquisas.
Referências
Cohen JD, Servan-Schreiber D (1992); Context, cortex and dopamine: A connectionist approach to behavior and biology in schizophrenia. Psychol Rev 12:45-77.
Cohen JD, Servan-Schreiber D (1993); A theory of dopamine function and its role in cognitive deficits in schizophrenia. Schizoph Bull 19:85-104.
Kischka U, Kammer T, Weisbrod M, Maier S, Thimm M, Spitzer M (1995); Dopaminergic modulation of semantic network activation (in submission). Servan-Schreiber D, Printz H, Cohen JD (1990); A network model of catcholamine effects: Gain, signal-to-noise ratio, and behavior. Science 249:892-895.
Spitzer M, Braun U, Maier S, Hermle L, Maher BA (1993a); Indirect semantic priming in schizophrenic patients. Schizoph Res 11:71-80.
Spitzer M, Braun U, Hermle L, Maier S (1993b); Associative semantic network dysfunction in thought-disordered schizophrenic patients: Direct evidence from indirect semantic priming. Biol Psychiatry 34:864-877.
Spitzer M, Thimm M, Hermle L, Holzmann P, Kovar KA, Heimann H, Gouzoulis-Mayfrank E, Kischka U, Schneider F (1996); Increased activation of indirect semantic associations under psilocybin. Biol Psychiatry 39:1055-1057.
Trecho do vídeo “Psychedelics in The Age of Intelligent Machines” – palestra realizada em Seattle, em 1999.
O etnobotânico Terence McKenna explica brevemente como o cogumelo Stropharia cubensis pode ter influenciado o desenvolvimento espantoso do cérebro humano no período de transição entre os primatas superiores e a nossa atual espécie. Sua teoria é descrita em maiores detalhes no livro “O Alimento dos Deuses“.
Nas pradarias africanas, onde estima-se que se deu nosso processo evolutivo, também se proliferavam várias espécies de animais ungulados, dos quais o esterco é o ambiente ideal para a ocorrência de cogumelos coprófilos. Um dos comportamentos dos primatas insectívoros, como éramos nós algum dia, é investigar os velhos estercos de vaca em busca de grupos de insetos. Nesses mesmos estercos brotam suculentos cogumelos, muitos deles contendo psilocibina. O Stropharia cubensis é pandêmico, ocorrendo em todas as regiões tropicais onde existe gado.. Quais seriam os impactos de uma química tão extraordinária na dieta dos primatas em evolução? A psilocibina possui características singulares, que a fazem um pefeito candidado para disparar muitos dos processos que nos diferenciam dos primatas superiores.
Especulações de Terence Mckenna sobre a natureza alienígena do transe provocado pelo cogumelo Stropharia cubensis, o fenômeno das “vozes na cabeça” e seu papel na história humana. Trecho do livro/áudio “True Hallucinations” (“Alucinações Reais”)
Quando um assunto se torna muito presente na consciência coletiva, a grande mídia logo trata de abraçá-lo e colocá-lo em uma matéria. Ontem o programa “Fantástico”, da rede Globo, finalmente fez justiça ao seu nome e exibiu uma matéria inteira de 4 minutos sobre a psilocibina e os estudos que vem sendo feitos sobre a sua aplicação terapeutica no combate a depressão e problemas psicológicos.
pra quem não viu, aí vai a matéria na íntegra, exibida ontem (18/04/2010), reproduzida diretamente do site do fantástico
Alucinógenos são usados em tratamento de doenças psíquicas
A psilocibina foi descoberta pela ciência nos anos 1950, banida nos anos 1960, em meio à febre das drogas psicodélicas. Agora redescoberta, legalmente, nos laboratórios.
A ciência acaba de fazer as pazes com drogas proibidas há muitas décadas. Pesquisadores voltam a apostar nas substâncias alucinógenas, que alteram a consciência e provocam visões, para tratar de distúrbios como depressão, ansiedade e transtornos de compulsão.
A substância proibida que fez uma revolução na vida do aposentado Clark Martin é um alucinógeno encontrado em mais de cem espécies do chamados cogumelos mágicos.
A psilocibina foi descoberta pela ciência nos anos 1950, banida nos anos 1960, em meio à febre das drogas psicodélicas. Agora redescoberta, legalmente, nos laboratórios.
Nem a psicanálise nem todos os remédios da medicina moderna. Como nada curava a depressão, depois de anos com um câncer no rim, o aposentado se ofereceu como voluntário em uma pesquisa da Universidade John Hopkins, uma das mais respeitadas dos Estados Unidos. E teve, pela primeira vez na vida, uma experiência alucinante.
No laboratório, recebeu uma cápsula com psilocibina – a mesma substância dos cogumelos, só que na forma sintética. Deitado, com uma venda nos olhos, passou seis horas ouvindo música clássica. Foi uma viagem completamente segura.
“No começo é muito assustador, porque todas as imagens e representações da realidade são de certa forma desligadas, elas começam a se dissolver”, diz o psicólogo aposentado.
Cenas multicoloridas e formas completamente estranhas. Os relatos de usuários de alucinógenos, a doideira da música dos Beatles, não foi exatamente assim na experiência científica.
“Não vi cores, não tinha nenhuma sensação ou pensamento na minha cabeça, era um vazio, e eu não me sentia drogado. Lembrei agora do sentimento que tive enquanto estava sob efeito da substância: minha filha e todos os meus velho amigos”, descreve.
Depois disso, o aposentado parou de ter medo da morte e resolveu um enorme problema: “Eu era muito inacessível para a minha filha, e quando eu estava sob os efeitos da psilocibina, me dei conta de que o que ela precisava de mim não era orientação, era meu amor e minha compreensão”, lembra. “Minha vida começou a mudar naquele momento, mas continua, porque o efeito continua sendo reforçado. A maneira como o cérebro processa as coisas fica diferente”, diz.
A experiência que mudou radicalmente, e para melhor, a vida do psicólogo aposentado Clark Martin fez parte de um dos maiores estudos com alucinógenos já realizados nos Estados Unidos. Depois de mais de 40 anos de proibição, um pequeno grupo de cientistas recebeu autorização para lidar com substâncias que sempre foram vistas com desconfiança.
O doutor Charles Grob é responsável pela pesquisa com psilocibina na Universidade da Califórnia, em Los Angeles.
“Não temos uma droga milagrosa. Temos um modelo de tratamento que pode ser muito efetivo, até mesmo em pacientes que não têm bons resultados com os medicamentos convencionais”, explica Charles Grob.
Foi ainda no século passado que a ciência descobriu a força dos alucinógenos. Mas os exageros transformaram as substâncias psicodélicas em drogas malditas. Agora, só vencendo muito preconceito para transformar a pesquisa em tratamento.
“Da maneira que imagino – e estamos décadas distantes disso – haverá centros de tratamento onde as pessoas poderão ser auxiliadas em uma experiência com substâncias como psilocibina”, comenta Charles Grob.
A estátua de louvação ao cogumelo teria mais de dois mil anos. Foi encontrada no México, de onde chegaram também as primeiras notícias sobre as propriedades medicinais da psilocibina. Paul Stamets já descobriu cinco novas espécies do tal cogumelo mágico.
Paul é um dos maiores especialistas em cogumelo do mundo e comemora as novas pesquisas científicas: “Acredito muito na evolução da consciência e vejo isso como um passo importante em nosso avanço no uso de substâncias naturais para ajudar na saúde mental das pessoas.”
O ilustre morador da floresta concorda com outros pesquisadores: acha que a ciência já perdeu tempo demais ignorando uma substância tão misteriosa quanto promissora.
Terence McKenna expõe suas idéias sobre o Fenômeno UFO, e sugere uma situação hipotética em um futuro próximo, que nos leva a pensar profundamente a respeito do nosso passado e presente.
Trecho de um dos capítulos perdidos do livro “Alucinações Reais”
Palestra pronunciada a convite de Ruth e Arthur Young, do Instituto para o Estudo da Consciência, de berkeley, Califórnia, em 1984
Extraído do Livro “O Retorno à Cultura Arcaica”
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No Ulysses, de James Joyce, Stephen Dedalus nos diz: “A História é o pesadelo do qual estou tentando despertar”. Eu mudaria a frase e diria que a História é aquilo que tentamos despertar para ingressar no sonho. O sonho é escatológico. O sonho é tempo zero e fora da História. Desejamos fugir para o sonho. O desejo de fuga é a principal acusação que se faz aos que se propõem a experimentar plantas alucinógenas. Quem faz essa acusação mal poderia conceber o quanto os alucinógenos são escapistas. Escapar. Escapar do planeta, da morte, do hábito, e, se possível, do problema do Inexprimível.
Se deixarmos de lado os últimos trezentos anos de experiência histórica na Europa e na América, e examinarmos o fenômeno da morte e a doutrina da alma em todas as suas ramificações – neoplatônica, cristã, dinástica-egípcia etc. -, encontraremos repetidamente a noção de que existe um corpo leve, uma enteléquia associada de alguma forma com o corpo humano durante a vida, e que a morte acarreta uma crise na qual os dois se separam. Uma das partes perde a sua raison d´être e entra em dissolução; o metabolismo pára. A outra vai não sabemos para onde. Talvez não vá para lugar algum, se não se acredita que ela exista; mas, então, tem-se o problema de achar uma explicação para a vida. E embora a ciência alegue saber muitas coisas e tenha conseguido explicar sistemas atômicos simples, a idéia de que os cientistas possam dizer alguma coisa acerca do que é a vida e de onde ela vem é, atualmente, absurda.
A ciência nada tem a dizer acerca de como uma pessoa decide fechar a mão para agarrar um peixe, e, no entanto, isso acontece. Trata-se de algo inteiramente fora do alcance da explicação científica, porque o que vemos nesse fenômeno é o espírito como causa primária. É um exemplo de telecinésia: a mente faz a matéria mover-se. Portanto, não devemos temer o escárnio da ciência na questão do destino ou da origem da alma. Minha forma de sondar o assunto sempre foi a experiência psicodélica, mas recentemente passei a investigar sonhos, porque os sonhos são uma forma muito mais generalizada de experimentar a hiperdimensão na qual a vida e a alma parecem estar imersas.
Observando o que as pessoas com tradições xamanistas dizem a respeito dos sonhos, chega-se à conclusão de que, para elas, a realidade do sonho é, experiencialmente, um contínuo paralelo. O xamã ingressa nesse contínuo através de alucinógenos e de certas outras técnicas, mas o meio mais eficaz são os alucinógenos. No caso de todos os outros, esse ingresso é feito através do sonho. Para Freud, os sonhos eram os “resíduos do dia”, e a pessoa poderia encontrar a origem do conteúdo do sonho na distorção de algo que houvesse acontecido durante o estado de vigília.
Meu argumento é que é muito mais útil tentar construir uma espécie de modelo geométrico da consciência, encarar seriamente a idéia de um contínuo paralelo, e dizer que a mente e o corpo estão imersos no sonho e que este é uma ordem superior de dimensão espacial. Durante o sono, a pessoa se transfere para o mundo real, do qual o mundo da vigília é apenas a superfície no sentido geométrico literal. Existe um plenum – e certas experiências recentes de física quântica tendem a confirmá-lo -, um plenum holográfico de informação. Toda informação está em toda parte. A informação que não estiver ali não estará em parte alguma. A informação situa-se fora do tempo histórico, em uma espécie de eternidade – uma eternidade que não tem existência temporal, nem mesmo o tipo de existência temporal da qual se poderia dizer “Sempre existiu”. Não possui qualquer tipo de duração temporal. É eternidade. Nós não somos fundamentalmente biológicos, dotados de uma alma que surge como uma espécie de iridescência, uma espécie de epifenômeno nos níveis mais elevados de organização da biologia. Somos objetos hiperespaciais de algum tipo, que projetam sua sombra sobre a matéria. A sombra na matéria é o nosso organismo físico.
Na morte, o objeto que projeta a sombra se retira; o metabolismo cessa. A forma material entra em colapso; deixa de ser uma estrutura dissipativa em uma área muito localizada, sustentada contra a entropia pelo processamento de matéria que entra, extraindo energia e eliminando rejeitos. Mas a forma que ordenou tudo isso não é afetada. Essas afirmações são feitas do ponto de vista da tradição xamanista, que tem a ver com todas as religiões superiores. Tanto o estado do sonho psicodélico como o estado do despertar psicodélico adquirem grande importância, pois revelam uma tarefa para a vida: familiarizar-nos com essa dimensão que causa a existência, para que estejamos familiarizados com ela no momento em que morremos.
Várias tradições valem-se da metáfora do veículo – um veículo para após a morte, um corpo astral. O xamanismo e certas iogas, inclusive a ioga taoísta, afirmam claramente que a finalidade da vida é familiarizar-nos com esse corpo que iremos ter depois da morte, para que o ato de morrer não traga confusão à nossa psique. A pessoa reconhecerá o que está acontecendo. Saberá o que fazer e poderá separar-se ordeiramente. Contudo, parece haver a possibilidade de um problema no ato de morrer. Não é o caso de ser condenado à vida eterna. A pessoa pode confundir-se por ignorância.
Aparentemente há, no momento da morte, uma espécie de separação, como no nascimento – a metáfora é trivial, mas perfeita. Há a possibilidade de dano ou de atividade incorreta. William Blake, poeta e místico inglês, dizia que, à medida que se começa a subir a espiral, há a possibilidade de se cair da trilha dourada para a morte eterna. Contudo, é apenas a crise de um momento – uma crise de transição -, e toda a finalidade do xamanismo e da vida corretamente vivida é fortalecer a alma e reforçar a relação entre o ego e a alma, para que essa transição possa ser feita ordenadamente. Essa é a posição tradicional.
Desejo incluir um abismo nesse modelo – um abismo menos conhecido dos racionalistas, porém familiar a todos nós, a um nível psíquico mais profundo, como herdeiros da cultura judeu-cristã. Trata-se da idéia de que o mundo vai acabar, que haverá um tempo final, que existe não só a crise da morte do indivíduo, mas também a crise da morte na história da espécie.
Aparentemente, trata-se de que, desde o tempo da conscientização da existência da alma até a resolução do potencial apocalíptico, decorrem aproximadamente cem mil anos. Do ponto de vista biológico, isso representa apenas um momento, mas é dez vezes mais do que toda a duração da História. Durante esse período, tudo é incerto, pois há uma corrida louca desde o hominídeo até o vôo espacial. No pulo por sobre esses cem mil anos, há dispersão de energia, religiões se ascendem como centelhas, filosofias nascem e morrem, surgem a ciência e a magia, como também surgem todos os interesses que controlam o poder com maior ou menor grau de respeito à ética. E há a onipresente possibilidade de que a transformação da espécie em uma enteléquia hiperespacial venha a abortar.
Estamos hoje, sem sombra de dúvida, nos segundos históricos finais dessa crise – crise que envolve o fim da História, nossa partida do planeta, o triunfo sobre a morte, e a libertação dos indivíduos em relação ao corpo. Estamos, de fato, nos aproximando do mais profundo evento com o qual uma ecologia planetária pode se deparar – o momento em que a vida se liberta da sombria crisálida da matéria. A velha metáfora da psique como lagarta que se transforma por metamorfose é uma analogia que se aplica a toda a nossa espécie. Temos de passar por uma metamorfose a fim de sobreviver ao ímpeto de forças históricas que já foram deflagradas.
Os biólogos evolucionistas consideram que os humanos são uma espécie que cessou de evoluir. Em algum momento, nos últimos cinqüenta mil anos, com a invenção da cultura, a evolução biológica dos seres humanos cessou e a evolução tornou-se um fenômeno epigenético e cultural. Os instrumentos, as línguas e as filosofias passaram a evoluir, mas o tipo somático humano permaneceu o mesmo. Somos, fisicamente, muito semelhantes a indivíduos que viveram em um passado distante. A tecnologia, porém, é a verdadeira pele da nossa espécie. A humanidade, encarada corretamente no contexto dos últimos quinhentos anos, é um agente extrusivo de material tecnológico. Tomamos matéria com baixo grau de organização, fazemo-la passar por nossos filtros mentais e expelimos em formas de jóias, escrituras sagradas e ônibus espaciais. É isso o que fazemos. Somos como corais incrustados em um recife tecnológico de objetos psíquicos extrudados. Toda a nossa fabricação de instrumentos implica a nossa fé em um instrumento supremo. Esse instrumento é o disco voador ou a alma exteriorizada no espaço tridimensional. O corpo pode tornar-se um objeto holográfico interiorizado, inserido em uma matriz tridimensional, em estado sólido, que é eterna, de modo que todos passamos a viver em um verdadeiro Elísio.
Espécie de paraíso muçulmano, esse Elísio permite-nos gozar de todos os prazeres da carne, contanto que saibamos que somos uma projeção holográfica de uma matriz em estado sólido, microminiaturizada e supercondutora, a qual não se encontra em lugar algum: é parte do plenum. A finalidade de toda a história tecnológica é produzir protótipos dessa situação, cada vez mais próximos do ideal, de modo que os aviões, os automóveis,os ônibus espaciais, as colônias espaciais, as naves interestelares, feitas de parafusos e porcas e capazes de viajar à velocidade da luz, são, como disse Mircea Eliade, “imagens de vôo que se autotransformam e que nos dizem muito a respeito das aspirações humanas de autotranscendência”.
Nosso desejo, nossa salvação e nossa única esperança é pôr fim à crise história, transformando-nos no alienígena, pondo fim à alienação, reconhecendo o alienígena como o Eu – de fato, reconhecendo o alienígena como a Supermente que conserva intatas todas as leis físicas do planeta, da mesma forma que conservamos intata uma idéia em nosso pensamento. Os dados que julgamos indelevelmente a para sempre escritos são, na verdade, apenas estados de ânimo da Deusa, da qual somos o reflexo. Todo o significado da história humana reside em recuperar essas informações perdidas, para que o homem possa ser dirigível ou, parafraseando Joyce em Finnegans Wake, ao referir-se a Moicane, a zona de prostituição de Dublin: “Aqui em Moicane, se caímos na calçada, logo nos levantamos, reunimos as nossas forças e batemos as asas. De modo que, se você quiser renascer, venha sentar-se conosco.”. Como se vê, é muito simples, mas é preciso coragem para permanecer-se sentado quando a Morte se aproxima – a Morte que Joyce chama de “benção disfarçada”.
O que os alucinógenos encorajam – e aquilo que espero venha a merecer atenção assim que os alucinógenos sejam integrados à nossa cultura ao ponto em que grandes grupos de pessoas possam planejar programas de pesquisa sem receio de perseguição – é um modelo do estudo que se segue à morte. Os alucinógenos podem fazer mais do que modelar esse estado; podem revelar a sua natureza. Podem mostrar-nos que é possível alterar as modalidades de aparência e conhecimento de modo a permitir que vejamos a nossa mente no contexto da Mente Única. A Mente Única contém todas as experiências do Desconhecido. Não há qualquer dicotomia entre o universo newtoniano, que se estende através de anos-luz de espaço tridimensional, e o universo mental interior. Ambos são reflexos da mesma coisa.
Se percebemos esses dois universos como dualismos irredutíveis, isso se deve a má qualidade do código que costumamos usar. A linguagem que empregamos para discutir esse problema tem dualismos inerentes. Trata-se de um problema de linguagem. Todos os códigos tem as suas qualidades relativas, exceto o Logos. O Logos é perfeito e, portanto, não compartilha das qualidades de nenhum outro. Uso aqui o termo Logos no sentido em que esse termo é utilizado por Fílon, o Judeu – o de Razão Divina que abrange o complexo arquetípico de ideais platônicos que servem de modelo à criação. Quando não usamos o Logos para traçar os nossos mapas, temos problemas de qualidade de código. O dualismo inerente a nossa linguagem faz com que a morte da espécie e a morte do indivíduo pareçam dois conceitos opostos.
Da mesma forma, há uma dicotomia entre os cenários criados pela biologia, a partir do exame do universo físico, e os mundos de anjos e demônios aos quais a psicologia se refere. A experiência psicodélica atua no sentido de resolver essa dicotomia. Para irmos além de um conhecimento acadêmico das plantas alucinógenas, basta-nos experimentar o êxtase induzido pela triptamina. A molécula de dimetiltriptamina (DMT) tem a singular propriedade de libertar o ego estruturado para que este se reúna ao Superego. Todos os que tiveram essa experiência passaram por um mini-apocalipse, um mini-ingresso e mapeamento do hiperespaço. Para que a sociedade volte a sua atenção nesse sentido, basta que essa experiência se torne objeto do interesse geral.
Não quero dizer com isso que todos devam fazer experiências com cogumelos ou outras fontes de triptaminas psiquicamente ativas que ocorrem na natureza. Devemos procurar assimilar e integrar a experiência psicodélica, uma vez que se trata de um plano experiencial ao qual todos temos acesso direto. O papel que iremos desempenhar em nossa relação com ele determina como iremos nos apresentar naquela anunciada transformação final. Em outras palavras, há nessa noção uma espécie de preconceito teológico; há a crença que existe um hiperobjeto chamado Supermente, ou Deus, que projeta uma sombra no tempo. A História é a nossa experiência grupal dessa sombra. À medida que nos aproximamos cada vez mais da fonte da sombra, os paradoxos aumentam, aumenta o coeficiente de mudança. O que acontece é que o hiperobjeto começa a ingressar no espaço tridimensional.
Uma forma de conceber isso é supor que o mundo da vigília e o mundo do sonho passam a fundir-se, de modo que, até certo ponto, aqueles críticos do OVNI que afirmam que os discos voadores são alucinações estão corretos, no sentido de que as leis que regem o sonho, as leis que regem o hiperespaço, podem as vezes funcionar no espaço tridimensional, quando a barreira entre as duas realidades se dissipa. Nesse caso, a pessoa tem experiências curiosas, as vezes chamadas de falhas psicóticas, as quais sempre exercem tremendo impacto sobre o paciente, uma vez que parece haver um componente externo que absolutamente não pode ser subjetivo. Nessas ocasiões, as coincidências começam a se acumular, até que a pessoa finalmente admite não saber o que está acontecendo. Contudo, é absurdo afirmar que se trata de um fenômenos psicológico, pois o fenômenos é acompanhado de mudanças no mundo exterior. Jung deu a isso o nome de “sincronicidade” e construiu o seu modelo psicológico, mas o que realmente sucede é que uma física alternativa começa a intervir com a realidade local.
Essa física alternativa é uma física da luz. A luz é feita de fótons, e os fótons não possuem antipartículas. Isso significa que não existem dualismos no mundo da luz. As convenções da relatividade dizem que o tempo se atrasa à medida que nos aproximamos da velocidade da luz; mas, se tentarmos imaginar o ponto de vista de uma coisa feita de luz, temos de reconhecer que o que nunca se diz é que, se viajarmos à velocidade da luz, o tempo deixa de existir. Experimentamos o tempo zero. Portanto, se imaginarmos por um instante que somos feitos de luz, ou que estamos de posse de um veículo capaz de mover-se à velocidade da luz, podemos ir de um a qualquer ponto do universo com uma experiência subjetiva de tempo zero. Ou seja, iremos à Alfa Centauro no tempo zero, enquanto o tempo ocorrido no universo relativista é de quatro anos e meio. Mesmo que atravessemos distâncias muito grandes, se viajarmos ao longo de 250 mil anos-luz até Andrômeda, continuaremos a ter a experiência subjetiva de tempo zero.
A única experiência do tempo que podemos ter é a de um tempo subjetivo, criado por nossos próprios processos mentais; em relação ao universo newtoniano, o tempo não existe. Passamos a existir na eternidade, tornamo-nos eternos; em tal situação, o universo envelhece a uma velocidade espantosa à nossa volta, mas isso é percebido como um fato do universo – da mesma forma que percebemos a física newtoniana como um fato deste universo. A pessoa passa para a modalidade eterna; separa-se da imagem transitória; existe na perfeição da eternidade.
Acredito que é nessa direção que estamos sendo levados pela tecnologia. Não há contradição entre equilíbrio ecológico e migração espacial, entre hipertecnologia e ecologia radical. Todas essas questões são especulativas; a única entidade histórica que está se tornando iminente é a alma humana. O corpo do primata serviu para trazer-nos a este momento de liberação, e sempre servirá de foco de nossa auto-imagem, mas estamos passando a existir cada vez mais em um mundo feito de imaginação humana. É isto o que se tem em mente quando se fala do retorno ao Pai, a transcendência da physis, a libertação da prisão gnóstica universal, uma prisão de ferro que detém a luz: nada menos que a transformação da nossa espécie.
Dentro de muito pouco tempo haverá uma aceleração desse fenômeno sob a forma de exploração espacial e colônias espaciais. O animal chamado Homem, semelhante a um recife de coral, que vem extrudando tecnologia sobre a superfície do planeta, será libertado de todas as limitações, exceto das limitações dos materiais e da imaginação. Já se sugeriu que as primeiras colônias espaciais devem incluir um esforço de duplicar, como ideal, o idílico ecossistema do Havaí. Esses exercícios de conhecimento ecológico demonstrarão que sabemos o que estamos fazendo. Contudo, assim que esses conhecimentos estiverem sob controle, passaremos ao domínio da arte. É isso o que sempre buscamos. Construiremos o nosso mundo – todos os nossos mundos -, e o mundo de onde viemos será mantido como um jardim. O que Eliade discutiu como metáforas de autotransformação através do vôo será realizado brevemente na tecnologia da colonização do espaço.
A transição da Terra para o espaço constituirá um filtro genético tremendamente rigoroso, mais rigoroso que qualquer fronteira jamais o foi no passado, inclusive o filtro genético e demográfico representado pela colonização do Novo Mundo. Já se disse que a vitalidade das Américas se deve ao fato de que somente os sonhadores, pioneiros e fanáticos cruzaram o oceano. Isto se aplicará ainda mais a transição para o espaço. A conquista tecnológica do espaço criará as condições iniciais; em seguida, para a internalização dessa metáfora, trará a conquista do espaço interior e o colapso dos vetores de estado associados a essa tecnologia no espaço newtoniano. Nesse ponto, a espécie humana ter-se-á tornado mais do que dirigível.
Uma tecnologia que interiorize o corpo e exteriorize a alma se desenvolverá paralelamente à transição para o espaço. The Invisible Landscape, livro que o meu irmão e eu escrevemos, faz um esforço no sentido de abreviar essa cronologia e, de certa forma, forçar o resultado. O livro é a história, ou melhor, as bases intelectuais da história de uma expedição à Amazônia que o meu irmão, eu e várias outras pessoas empreendemos em 1971. Durante essa expedição, o meu irmão formulou uma idéia que incluía o uso de harmina e harmalina, compostos que ocorrem no Banisteriopsis caapi, a vinha silvestre que é a base do Ayahuasca. Procuramos usar harmina em conjunto com a voz humana no que chamamos “experiência de La Chorrera”. Tratava-se de um esforço de carregar, através do som, a estrutura das moléculas de harmina que se metabolizavam no organismo, de tal forma que elas formassem ligações, preferencial e permanentemente, com estruturas moleculares endógenas.
Nosso candidato na ocasião era o DNA neural, embora Frank Barr, que vinha pesquisando as propriedades da melanina cerebral, me houvesse convencido de que há igual possibilidade que a harmina atuasse ligando-se a corpos de melanina. Em ambos os casos a farmacologia acarreta ligações com um local de armazenamento, de informações, sendo estas, em seguida, transmitidas de tal forma que a pessoa passa a ter uma leitura mental da estrutura da alma. Nossa experiência foi um esforço no sentido de usar um tipo de tecnologia xamanista para, por assim dizer, colocar um sino no pescoço do gato, pendurar um dispositivo telemétrico supercondutor na Supermente para que houvesse uma leitura contínua de informações a partir daquela dimensão. Deixo a quem assim o deseja julgar o sucesso ou fracasso dessa tentativa.
A primeira parte do livro descreve as bases teóricas da experiência. A segunda descreve a teoria da estrutura do tempo que resultou dos bizarros estados mentais que se seguiram a experiência. Não afirmo que tenhamos tido êxito, apenas que a nossa teoria quanto ao que aconteceu é mais plausível que qualquer teoria proposta pelos críticos. Quer tenhamos tido êxito ou não, esse tipo de raciocínio nos aponta o caminho a seguir. Por exemplo, quando falo da tecnologia da construção de espaçonaves, imagino que esta será obtida com voltagens bem inferiores à voltagem de uma lanterna comum de pilhas. Afinal, é nesse nível que ocorrem os fenômenos mais interessantes da natureza, como o pensamento e o metabolismo. O pensamento e o metabolismo são fenômenos desse tipo.
Uma nova ciência que coloque a experiência psicodélica no centro de seu programa de pesquisas deve buscar a realização prática desse objetivo – o objetivo de eliminar a bareira entre o ego e o Superego, para que o ego possa ver-se como uma expressão do Superego. Assim, a ansiedade de encarar uma tremenda crise biológica como as crises do ecossistema, bem como a crise da limitação do espaço físico que a nossa situação terrena nos força a atravessar, poderá ser evitada através do cultivo da alma e da prática de um novo xamanismo que use plantas contendo triptaminas.
A psilocibina é, desses compostos, o mais facilmente encontrado e o mais experimentalmente acessível. Portanto, o apelo que faço aos cientistas, administradores e políticos que venham ler as minhas palavras é este: voltem a examinar a psilocibina. Não a confundam com os outros alucinógenos, compreendam que ela é um fenômeno por si mesma, com enorme potencial de transformar os seres humanos – e não somente transformar as pessoas que ingerem, mas transformar a sociedade, tal como um movimento artístico, um novo conhecimento matemático ou um progresso científico transforma a sociedade. A psilocibina tem a possibilidade de transformar espécies inteiras, simplesmente em virtude das informações que transmite. É uma fonte de gnose, e a voz da gnose foi silenciada na mente ocidental há pelo menos mil anos.
Quando os franciscanos e dominicanos chegaram ao México, no século XVI, trataram imediatamente de eliminar a religião do cogumelo ao qual os índios davam o nome de teonanacatl, ”a carne dos deuses”. A religião católica detinha o monopólio da teofagia, e não viu com bons olhos aquela maneira de abordar o assunto. Hoje, quatrocentos anos após esse contato inicial, acredito que Eros, que se retirou da Europa com o advento do cristianismo, refugiou-se na Sierra Mazateca. Finalmente, após sua reclusão nas montanhas, reemerge agora na consciência ocidental.
Nossas instituições, nossas epistemologias estão falidas e exauridas; temos de recomeçar de novo e esperar que, com a ajuda de personalidades inspiradas no xamanismo, possamos cultivar mais uma vez esse antigo mistério. O Logos pode ser liberado; a voz que falou a Platão, Parmênides e Heráclito pode voltar a falar na mente do homem moderno. Quando o fizer, a alienação terminará, porque passaremos a ser o alienígena. Essa é a promessa que se nos apresenta; para alguns, pode parecer uma visão de pesadelo, mas todas as mudanças históricas de imensa magnitude trazem consigo uma carga emocional. Lançam a humanidade em um mundo completamente novo.
Acredito que essa tarefa tem de ser realizada através do uso de alucinógenos. Sempre se acreditou que existem muitos caminhos para o progresso espiritual. Nesse particular, valho-me de minha experiência pessoal. Nenhuma outra técnica me trouxe bons resultados. Passei algum tempo na Índia, pratiquei ioga, visitei vários rishis roshis, geysheys e gurus que existem na Ásia, e acredito que eles devem estar falando de algo tão pálido, tão distanciado do contato o pleno êxtase das triptaminas, que realmente não sei o que pensar deles e das vagas revelações que fazem.
O tantrismo alega ser outro caminho nessa direção. Tantra significa “o caminho mais curto” e certamente pode estar no rumo certo. A sexualidade, o orgasmo, essas coisas possuem qualidades semelhantes às das triptaminas, mas a diferença entre a psilocibina e todos os outros alucinógenos é a informação – enormes quantidades de informação.
O LSD me pareceu ter muito a ver com a estrutura da personalidade. As visões que ele proporciona me pareciam, muitas vezes, ser meramente geométricas, a não ser que fosse sinergizadas por outro composto. A clássica experiência psicodélica relatada por Aldous Huxley foi feita com 200 microgramas de LSD e e 30 miligramas de mescalina. Essa combinação produz uma experiência visual, não uma experiência de alucinações. Em minha opinião, a qualidade especial da psilocibina é que ela revela não luzes coloridas ou configurações móveis, mas lugares – selvas, cidades, máquinas, livros, formas arquitetônicas de incrível complexidade. Não há qualquer possibilidade de confundir tais coisas com qualquer tipo de “estática” neurológica. Trata-se, de fato, da informação visual mais altamente organizada que se pode receber, muito mais altamente organizada que a visão normal do estado de vigília.
E por isto que é muito difícil a quem experimenta um composto alucinógeno trazer de volta informações. É muito difícil transformar essas informações em linguagem; é como tentar fazer uma reprodução tridimensional de um objeto quadrimensional. Somente através da visão pode-se perceber a verdadeira modalidade desse Logos. Por isso é tão interessante o fato de a psilocibina e o ayahuasca – a poção aborígene que contém triptamina – produzirem telepatia e um estado de espírito do qual várias pessoas podem compartilhar. A resultante alucinação em grupo é compartilhada em completo silêncio. É difícil provar isso a um cientista; mas, se várias pessoas participarem desse tipo de experiência, uma delas pode começar a descrever a visão, interromper-se, e outra retomar a descrição. Todos vêem a mesma coisa! É o fato de ser informação visual complexa que faz do Logos uma visão cuja verdade não se pode descrever.
Mas as informações assim transmitidas não se limitam a modalidade visual. O Logos é capaz de passar de algo que se ouve para algo que se vê, sem qualquer transição perceptível. Isso parece uma impossibilidade lógica; no entanto quanto realmente se tem tal experiência, a pessoa vê – ah-ah! –, é como se o pensamento que a pessoa ouve se transformasse em algo que se vê. O pensamento que a pessoa ouve torna-se cada vez mais intenso, até que, finalmente, sua intensidade é tão grande que, sem transição, a pessoa passa a vê-lo em seu espaço visual e tridimensional. A própria pessoa comanda o fenômeno. Isso é muito típico da psilocibina.
Naturalmente, sempre que introduz algum composto no organismo, a pessoa deve ter cuidado e estar bem informada acerca de possíveis efeitos colaterais. Os pesquisadores profissionais da experiência psicodélica têm conhecimento desses fatores e reconhecem abertamente a importância fundamental de se estar bem informado.
Quanto a mim posso dizer que não abuso dos alucinógenos. Levo muito tempo para assimilar cada experiência visionária. Nunca perco o meu respeito por essas dimensões. O medo é uma das emoções que sinto sempre que vou fazer uma experiência. Trabalhar com um alucinógeno é como navegar em um mar escuro em um pequeno barco. Pode-se ver a lua subindo serenamente por sobre a água escura e calma, ou algo do tamanho de um trem de carga pode passar rugindo, fazer virar o barco e deixar a pessoa na água, agarrada ao remo.
O diálogo com o Desconhecido é o que faz valer a pena repetir essas experiências. O cogumelo nos fala quando falamos com ele. Na introdução do livro que o meu irmão e eu escrevemos (e assinamos com pseudônimos), intitulado Psilocybin: The Magic Mushroom Grower’s Guide há um monólogo de um cogumelo que começa assim: “Sou velho, cinqüenta vezes mais velho que o pensamento é para a espécie a que você pertence, e vim das estrelas.” Palavras textuais: eu vinha anotando tudo furiosamente. Às vezes ele é muito humano. Minha atitude com ele é hassídica. Esbravejo com ele e ele esbraveja comigo. Discutimos quanto ao que vai ou não vai revelar. Digo: “Eu sou um disseminador, você não pode se negar a me dizer coisas.” E ele responde: “Mas se eu lhe mostrasse o disco voador durante cinco minutos, você ficaria sabendo como ele funciona.” E eu digo: “Pois então me mostre.” O cogumelo se manifesta de várias maneiras. Às vezes é como a Dorothy de O Mágico de Oz; outras vezes é como um agiota muito talmúdico. Certa vez perguntei: “O que está fazendo na Terra?” E ele respondeu: “Quando se é um cogumelo, não custa nada ir para onde se quer. Além do mais, isto aqui era um lugar bastante bom até que os macacos escaparam ao controle.”
“Macacos que escaparam ao controle”: é assim que o cogumelo vê a história humana. Para nós, a história é bem diferente: é a onda de choque da escatologia. Em outras palavras, vivemos um momento muito especial de dez ou vinte mil anos de duração, no qual uma enorme transição está ocorrendo. O objeto que há no fim da História e além da História é a espécie humana em união tântrica e eterna com a Supermente/OVNI supercondutora. É esse o mistério cuja sombra se projeta de volta no tempo. Todas as religiões, todas as filosofias, todas as guerras, todos os extermínios e perseguições acontecem porque as pessoas não recebem adequadamente a mensagem. Há, ao mesmo tempo, a progressiva casuística do ser (determinismo causal) e o padrão de interferência que se lhe contrapõe a existência desse hiperobjeto escatológico que lança a sua sombra através da paisagem to tempo. Nós existimos, mas há muita interferência. Essa situação chamada História é totalmente singular; irá durar somente um momento; começou há apenas um instante. Nesse instante, há uma tremenda explosão de estática quando o macaco atinge a divindade, quando o objeto escatológico final mitiga e transforma o fluxo da circunstância entrópica.
A vida é fundamental para o processo de organização da matéria. Rejeito a idéia de que tenhamos enveredado por um desvio chamado existência orgânica, que o nosso verdadeiro lugar é a eternidade. Essa modalidade de existência é parte importante do ciclo. É um filtro. Há a possibilidade de extinção, a possibilidade de cair para sempre na physis, e, nesse sentido, a metáfora da queda é válida. Há uma obrigação espiritual, uma tarefa a ser cumprida. Mas não é algo tão simples quanto seguir um conjunto de regras ditado por outra pessoa. O empreendimento noético é uma das obrigações primárias da existência. Dele depende nossa salvação. Nem todos precisam ler livros de alquimia ou estudar moléculas supercondutoras para fazer a transição. A maioria das pessoas consegue fazê-la ingenuamente, raciocinando com clareza sobre o presente, mas nós, intelectuais, estamos presos a um mundo onde há informações em demasia. Perdemos a inocência. Não podemos esperar atravessar a ponte estreita mediante um bom ato de contrição; isso não será suficiente.
Precisamos compreender. O Whitehead disse: “O conhecimento é a percepção de um padrão como tal.” Temer a morte é não compreender a vida. A atividade cognitiva é o fato definidor da humanidade. Linguagem, pensamento, análise, arte, dança, poesia, invenção de mitos – estas são as coisas que apontam na direção do éscathos. Nós, humanos, podemos entrar em um reino de pura auto-engenharia. A imaginação é tudo. Foi isso o que Blake percebeu. É de lá que viemos. É para lá que estamos indo. E só podemos chegar lá através da atividade cognitiva.
O tempo é a noção que reforça noções como esta, pois elas implicam um novo conceito de tempo. Durante a experiência de La Chorrera, o Logos demonstrou que o tempo não é simplesmente um meio homogêneo no qual as coisas ocorrem, e sim uma densidade flutuante de probabilidade. Embora a ciência possa, às vezes, nos dizer o que pode e o que não pode acontecer, não temos uma teoria que explique porque, de tudo o que poderia acontecer, certas coisas passam pelo que Whitehead chama de “a formalidade de realmente ocorrer”. Foi isto o que o Logos tentou explicar, o motivo pelo qual, de toda uma miríade de coisas que podiam acontecer, certas coisas passam pela formalidade de ocorrer. É porque existe uma hierarquia modular de ondas de condicionamento temporal, de densidade temporal. Determinado evento, considerado altamente improvável, é mais provável em certos momentos do que em outros.
Tomando essa simples percepção e guiado pelo Logos, pude construir um modelo fractal do tempo, passível de ser programado em computador e produzir um mapa da introdução do que chamo “novidade” – a introdução da novidade no tempo. Como norma geral, a novidade está obviamente aumentando. Vem aumentando desde o começo do universo. Imediatamente após o “Big Bang”, havia somente a possibilidade de interação nuclear; depois, quando as temperaturas caíram abaixo do ponto da resistência do núcleo, tornou-se possível a formação de sistemas atômicos. Mais tarde ainda, à medida que as temperaturas continuaram a cair, surgiram os sistemas moleculares. E, muito mais tarde, a vida se tornou possível: surgiram formas muito complexas de vida, o pensamento se tornou possível, a cultura foi inventada. Inventaram-se a imprensa e a transferência eletrônica de informações.
O que está acontecendo em nosso mundo é uma invasão de novidades, na direção daquilo que Whitehead chamava de “concrescência”, uma espiral que vai afunilando cada vez mais. Tudo flui e se une. A lapis autopoetica, a pedra alquímica que está no fim do tempo, coalesce quando tudo flui e se une. Quando as leis da física são neutralizadas, o universo desaparece, e o que resta é o plenum fortemente unido, a mônada, capaz de se expressar por si mesma, em vez de apenas lançar a sua sombra na physis como reflexo de si própria. Neste ponto, eu me aproximo muito do pensamento clássico milenário e apocalíptico em minha noção da rapidez com que as mudanças vão se acelerando. Pela forma como a espiral vai se estreitando, prevejo que a concrescência se dará em breve – por volta do ano 2012 d.C. Será o ingresso de nossa espécie no hiperespaço, mas parecerá ser o fim das leis da física, acompanhado pela liberação da mente, que passará a existir na imaginação.
Todas essas imagens – a nave espacial, a colônia espacial, a lapis – são imagens percursoras. Seguem-se naturalmente da idéia de que a História é a onda de choque da escatologia. À medida que nos aproximamos do objeto escatológico, os reflexos que ele lança, mais se assemelham ao próprio objeto. No último instante, o Inefável é revelado. Não há mais reflexos do Mistério. O Mistério é visto em toda a sua nudez, e nada mais existe. Mas o que ele é, mal podemos supor; não obstante, o prazer máximo do futurismo é tentar adivinhá-lo.
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Retirado do Livro “O Retorno à Cultura Arcaica” (Terence Mckenna)