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A Onda Temporal – Terence McKenna

Os trechos que seguem são as interpretaçoes dos irmãos McKenna após a bizarra experiência em La Chorrera descrita em “Alucinações Reais”, mesmo livro do qual foram retirados os trechos.

Com a palavra, Terence McKenna:

(…) Durante aquele dia e os que se seguiram, todos os tipos de idéias se formavam espontaneamente em meu pensamento, e inevitavelmente me levariam a alguma expansão dos temas ao redor dos quais havíamos organizado nossas vidas. Um desses temas que era apanhado e ampliado, a princípio devagar e em seguida mais rápida, radical e inclusivamente, era o conjunto de idéias e relacionamentos contidos no texto do oráculo chinês chamado I Ching. Há muito me interessavam, como parte de meu interesse geral em lógicas não-causais, esses comentários antigos e fragmentados sobre um conjunto ainda mais antigo de 64 ideogramas oraculares chamados de hexagramas. Na verdade eu ouvira falar pela primeira vez do I Ching ao ler Jung. Ele sugerira que a justaposição significativa de um hexagrama a uma situação do mundo externo, que permite que o I Ching seja usado como um dispositivo de leitura da sorte, sugeria uma conexão não-causal entre o mundo mental e a realidade exterior. Jung chamara esse fenômeno de sincronicidade.

Há vários anos era meu hábito jogar o I Ching – jogo que consiste em manipular 49 varetas de milefólio, ou, no meu caso, palitos de bambu, cuja configuração forma os hexagramas – a cada lua nova e cada lua cheia, e anotar os resultados num pedaço de papel que eu guardava dentro da capa do livro. No primeiro dia depois da experiência a voz dentro de minha cabeça sugeriu que eu pegasse as anotações dos hexagramas que eu obtivera até então. Eu mal podia imaginar as deduções e as conclusões a que essa sugestão simples levaria. Peguei essas anotações e procurei uma situação em que houvesse tirado o primeiro hexagrama; depois de achar, voltei ao início da lista e procurei por uma anotação do segundo hexagrama, e assim por diante. Minha lista cobria um período de três anos e continha cerca de oitenta jogadas e suas mutações.

Depois de meia hora determinei que, de acordo com minha listagem, eu tinha tirado cada um dos 64 hexagramas pelo menos uma vez nos três anos. Esse fato bastante improvável me pareceu carregado de significação. A probabilidade de ocorrência não é igual, e as chances de tirar todos os hexagramas em tão poucas jogadas parecia incomum. Pareceu-me que eu tinha uma espécie de identidade secreta e que estava no processo de descobri-la. Aquilo provava que eu era um reflexo do microcosmo, e que de algum modo fora escolhido para estar na situação em que me encontrava. Lágrimas rolaram facilmente com essa verificação pessoal do padrão ordenado, cujos desígnios eu estava encontrando em todos os pontos da minha vida. Recompus-me e em seguida, sob a forte sugestão daquela onda interna de compreensão, queimei a lista de minhas jogadas do I Ching. Foi uma coisa muito pouco característica de meu modo de agir.

Dennis olhou tudo aquilo e soltou uma das muitas charadas que vinha propondo naqueles dias:

– O que é que você pode fazer com um buraco num graveto e o que não pode fazer com um graveto num buraco? – gritou do outro lado do quintal arenoso para mim, que estava junto à fogueira. Supus que a resposta envolvesse um mergulho nos pressupostos alegres e quentes do Tantra, a favor da idéia de que o cachimbo era um veículo superior para a viagem interdimensional, e que isso era o que se podia fazer.

Mais ou menos uma hora depois, e após um longo silêncio pouco característico de sua nova condição, Dennis levantou os olhos de suas meditações e anunciou que tinha acabado de perceber que podia fazer qualquer telefone tocar simplesmente concentrando-se numa imagem que ele se recusou a dizer qual era. Foi mais longe ainda e afirmou que podia fazer telefones tocarem em qualquer momento do passado desde quando existiam os telefones. Para demonstrar essa habilidade, ligou para nossa mãe em algum momento no outono de 1953. Pegou-a no ato de ouvir Dizzy Dean narrar um jogo de beisebol. E de acordo com Dennis ela se recusou a acreditar que ele estava ao telefone, já que podia vê-lo em sua forma de três anos de idade dormindo diante dela. Ele disse que iria ligar para ela mais cedo, e então passou o resto da tarde ligando para todo mundo em quem podia pensar e em vários momentos do passado, conversando animadamente e rindo consigo mesmo das mentes que ele estava fundindo e das maravilhas do que ele chamava de “Ma Bell”, a companhia telefônica. E assim passou-se a tarde de 6 de março.

Uma conclusão razoável seria supor que Dennis estava toxicamente esquizofrênico, e que deveríamos deixar a Amazônia. O que complicava era eu. Eu parecia comparativamente normal, exceto por uma coisa: insistia em que tudo estava certo, e que Dennis sabia exatamente o que estava fazendo.

– Está tudo bem – tentei tranqüilizar os outros. – Ele fez aquilo que se propôs, e agora as pessoas devem tentar relaxar até que tudo se resolva.

Sentia isso apesar de não saber como ele realizara a experiência ou como descobrira a teoria. Só sabia que, depois daquele momento no alvorocer, quando tínhamos saído de nossas redes para olhar o cogumelo depois da experiência, algo muito esquisito acontecera comigo.

Eu estava num lugar muito estranho. Sentia como se houvesse me transformado em mim mesmo. Meu contato com a voz era de aluno com professor. Ela me ensinava. Além de qualquer possibilidade de argumentação, eu ficava sabendo coisas que não poderia saber normalmente. Ev passara pela experiência, mas nada acontecera com ela. Meus outros amigos pareciam muito distantes. Não podiam compreender o que sucedia e preferiram nos rejeitar. Cada um achava que os outros estavam loucos. De fato, com relação aos seus comportamentos normais, todo mundo agia de modo muito estranho.

A coisa principal que o professor invisível me disse foi: “Não se preocupe. Não se preocupe porque há algo pelo qual você tem de passar. Seu irmão vai ficar bom. Seus companheiros vão cuidar dele. Não se preocupe, mas ouça. Você precisa passar por isso.” Horas depois da experiência isso começou a martelar dentro de mim – uma coisa que eu precisava descobrir o que era.(…)

(…) No dia 21 de março fiz uma anotação no diário – a primeira em semanas e a única que eu teria condições de fazer em mais vários meses. Escrevi isso:

Faz dezessete dias desde 4 de março e da concretização do ampesand. Se entendi mais ou menos corretamente esse fenômeno, então amanhã, o décimo oitavo dia, irá marcar uma tipo de meio caminho nessa experiência. Prevejo que amanhã Dennis irá voltar ao cenário psicológico em que estava antes de 1º de março, se bem que é possível que, ao invés de uma amnésia residual com relação aos eventos em La Chorrera, ele tenha uma compreensão cada vez maior do experimento que criou. As últimas semanas foram angustiantes, e aparentemente eram compostas de tantos tempos, lugares e mentes que foi impossível fazer um relato racional. Apenas o Finnegans Wake dá alguma idéia da realidade do paradoxo que experimentamos em virtude de atravessarmos a face dupla do tempo. A despeito de mal-entendidos anteriores e de projeções errôneas relativas aos ciclos de tempo e de números atuando dentro do fenômeno, agora acredito que nesses dezessete dias experimentamos – ainda que algumas vezes correndo para trás e decerto enormemente condensado – boa parte de um ciclo total, e podemos começar a prever de um modo vago os eventos dos próximos vinte dias, mais ou menos, e ter alguma idéia da natureza aproximada e da direção da Obra.

Essa anotação no diário deixa claro que, enquanto Dennis estava se recuperando de sua submersão na luta titânica, eu estava no meio de uma luta pessoal. Fora apanhado num mergulho obsessivo, quase uma meditação forçada, sobre a natureza do tempo. As preocupações comuns da vida cotidiana deixaram de ter importância. Minha atenção era inteiramente exigida por meus esforços de construir um novo modelo do que é na verdade o tempo. Chamavam minha atenção ressonâncias, recorrências e a idéia de que os conjuntos de eventos eram resultado de padrões de interferência cujas fontes estavam temporal e causalmente distantes. Naquelas primeiras especulações imaginei um ciclo mítico precisando de 40 dias para se completar. Foi só mais tarde, quando comecei a me impressionar com a natureza dos ciclos temporais – a natureza calêndrica e relacionada ao DNA – que dirigi minha atenção aos ciclos de 64 dias. Foi isso que eventualmente me levou a me voltar para o I Ching. Naquelas primeiras idéias só há uma vaguíssima sugestão da teoria eventual em seus detalhes operacionais, mas ainda assim o objetivo é claramente o mesmo. Ressonâncias, padrões de interferência e retornos fractais de tempos dentro de tempos – esses eram os materiais com os quais comecei a construir. Eventualmente, depois de alguns anos de trabalho, o resultado chegaria a uma certa elegância. Entretanto essa elegância estava reservada ao futuro; a primeira concepção era crua, auto-referente e idiossincrática. Foi apenas minha fé de que ela poderia ser racionalmente compreensível aos outros que me segurou durante os vários anos necessários para transformar a intuição original num conjunto de proposições formais.(…)

(…) Enquanto avançavam meus estudos sobre o I Ching, ou O Livro das Mutações, aprimorei a idéia de que sua estrutura era a base de uma ou de várias ondas temporais. Essas ondas são pequenos períodos de mudança que se seguem e se interpenetram. Vim a perceber que a lógica interna das ondas temporais implicava fortemente no término do tempo normal e num fim para a história comum. Nesse ponto a idéia da psicomatéria tornada concreta identificou-se em minha mente com o OVNI que eu encontrara em La Chorrera e ambos, por sua vez, com os cenários de fim dos tempos das tradições religiosas ocidentais.

O primeiro gráfico de tempo não-quantificado era cheio de coincidências com minha vida pessoal. Em particular, os pontos terminais de cada seção componente da onda pareciam ter um significado especial para mim. O posicionamento em um daqueles pontos na experiência em La Chorrera parecia tornar especialmente importantes outros pontos no passado (a morte de minha mãe e meu encontro com Ev) e pontos que, na época, estavam no futuro (meu 25º aniversário). Vi que eventos importantes em minha vida pareciam estar ocorrendo a cada 64 dias, com uma regularidade misteriosa. Era necessário trabalhar sozinho nessas idéias, já que a intensidade de meu envolvimento com elas e sua natureza paradoxal parecia absurda aos olhos das outras pessoas. Compreendi que para mim, pessoalmente, era de importância vital deixar as forças com as quais me envolvera se desenvolverem por si próprias até o fim – quer o efeito que estávamos explorando fosse um fenômeno geral da natureza ou uma idiossincrasia única.

Por mais esdrúxulo que o plano parecesse aos outros, resolvi voltar a La Chorrera, à sua solidão e sua estranheza, e passar um tempo ali simplesmente observando com calma a coisa que tinha me acontecido (…)

(…)A coisa importante com relação à segunda viagem a La Chorrera é que o ensinamento dado pelo Logos foi mais ou menos contínuo. E o que foi ensinado depois de meses e meses foi uma idéia a respeito do tempo. É uma idéia muito concreta; com rigor matemático. O Logos ensinou como fazer com o I Ching uma coisa que talvez ninguém antes soubesse fazer. Talvez os chineses tenham sabido algum dia, e perderam o conhecimento há milhares de anos. Ele me ensinou um modo hipertemporal de ver. Meus livros, minha vida pública, meus sonhos particulares, são tudo parte do esforço de sentir e entender o novo tempo que foi revelado. Uma revolução no entendimento humano não é algo que possa ser encurralado nos limites de uma conversa.

Esse novo modelo do tempo nos permite uma boa certeza sobre o futuro, o máximo que é possível de se ter. O futuro não é absolutamente determinado; não há, em outras palavras, um futuro para se “ver”, no qual todos os eventos já estejam determinados. Não é assim que o universo é feito. O futuro está para ser completado, mas é condicionado. Misteriosamente, dentre o conjunto de todos os eventos possíveis, alguns são selecionados para passar pela formalidade de ocorrer. Era a mecânica desse processo que o Logos estava querendo revelar, e realmente revelou, com a idéia da Onda Temporal.

O que me levou originalmente a olhar o I Ching foi o modo estranho como a noção simplista de ciclos de 64 dias de influências funcionou bem em minha própria vida naquela época. A morte de minha mãe foi o primeiro desses pontos temporais que isolei. Em seguida percebi que meu relacionemento com Ev, formado pelo acaso, começara 64 dias depois disso, e que a culminação da experiência em La Chorrera ocorrera outros 64 dias depois. A noção do ano lunar baseado no hexagrama surgiu da idéia de seis ciclos de 64 dias, um ano de seis partes, assim como um hexagrama do I Ching tem seis linhas.

A validade pessoal da idéia me foi confirmada quando percebi que esse ano de trezentos e oitenta e quatro dias, caso iniciado com a morte de minha mãe, terminaria em meu 25º aniversário, em 16 de novembro de 1971. Então vi que havia ciclos, e ciclos de ciclos; imaginei um ano lunar de 384 dias e em seguida a coisa da qual ele era apenas uma parte: um ciclo de 64 vezes 384 dias; e daí por diante. Os mapas que construí e eventual classificação a que cheguei estão contidos em The Invisible Landscape. Mas o que não foi dito lá é o modo como essas coincidências e minha mente inconsciente – ou algo dentro de minha mente – me guiaram para descobrir essas propriedades há muito ocultas no I Ching.

O que fazer do oceano de ressonâncias que a Onda Temporal parecia mostrar, ligando cada momento do tempo a cada outro momento através de um esquema de conexão que nada tinha de aleatório ou de causalidade? E o que fazer do fato de que certos detalhes na matemática da onda pareciam implicar que o tempo em que vivemos era o foco de um esforço de eras, e terrivelmente importante? Essas eram imagens que inflavam meu ego, e as reconheci como tal, mas a força e o fascínio delas como forma de diversão particular eram francamente irresistíveis.

A Onda Temporal parecia ser uma imagem do inconsciente coletivo que buscava provar, pelo menos em seus próprios termos, que a culminância de todos os processos do universo ocorreriam durante o nosso tempo de vida. Para cada um de nós isso é obviamente verdadeiro, nossas vidas nos parecem, a nós que estamos engastados em nossos corpos e em nossas épocas, ser de algum modo a expressão do objetivo final de todas as coisas.

A Onda Temporal previa seu fim dentro de nosso períodos de vida; na verdade, apenas uma década após a virada do século, um período de tamanha novidade que além dele poderia estar nada menos que o fim do próprio tempo. Isso era o mais atordoante de tudo, mais atordoante do que seu lado idiossincrático pessoal, esse “fim do tempo” implícito; um período em que aconteceria uma transição do regime que transformaria completamente as modalidades do real.

Eu estava familiarizado com a idéia da escatologia – o fim dos tempos – num contexto religioso, mas nunca antes me ocorrera que regimes da natureza poderiam passar por mudanças súbitas que reembaralhariam as leis naturais. Na verdade não há nada contra isso. Simplesmente a ciência, para poder funcionar, precisa presumir que as leis físicas não são dependentes do tempo e do contexto em que são testadas. Se não fosse assim, a idéia de experimentos não faria sentido, já que experimentos realizados em tempos diferentes poderiam dar resultados diferentes.

Durante anos continuei a elaborar essa teoria e a clarear minha compreensão do empreendimento que é formar uma teoria em termos gerais. Em 1974 consegui finalmente alcançar uma quantificação matemática completamente formal da estrutura fractal que eu desencavara da estrutura do I Ching. Durante a década de 80 trabalhei, primeiro com Peter Broadwell e depois com Peter Meyer, para criar um programa de computador, que chamei de Timewave Zero, que permite o estudo cuidadoso dessa onda. O computador é uma ferramenta poderosa que tornou possível aprimorar grandemente minhas noções do que constituía prova ou negação da teoria.

Hoje minha conclusão sobre esses assuntos é que a teoria sobre a natureza fractal e cíclica do ingresso de novidades no mundo é uma teoria autoconsistente e completamente matemática. Tem coerência interna. E traz o drama humano e as nossa vidas de volta ao próprio centro do palco universal.

É possível que, em certo sentido, todos os estados de libertação nada mais sejam que um conhecimento perfeito do conteúdo da eternidade. Se sabemos o que está contido no tempo desde seu início até o seu fim, ficamos de algum modo fora do tempo. Mesmo que ainda tenha um corpo, ainda coma e faça o que faz, você descobriu algo que o liberta para uma situação satisfatória de tudo-ao-mesmo-tempo. Há outras satisfações que surgem da teoria, e que não são citadas em sua formulação. Os tempos se relacionam uns com os outros – as coisas acontecem por um motivo, e o motivo não é casual. A ressonância, aquele fenômeno misterioso no qual uma corda que vibra parece invocar magicamente uma vibração semelhante em outra corda ou em outro objeto que não está fisicamente conectado ao original, sugere-se como um modelo para a propriedade misteriosa que relaciona um tempo a outro, ainda que possam estar separados por dias, anos ou mesmo milênios. Convenci-me de que há uma onda, ou um sistema de ressonâncias, que condiciona eventos em todos os níveis. Essa onda é fractal e auto-referencial, parecida com muitos dos mais interessantes objetos e curvas que vêm sendo descritos nas fronteiras da pesquisa matemática. Essa onda temporal exprime-se através do universo numa variedade de níveis extremamente pequenos. Ela faz com que os átomos sejam átomos, células sejam células, mentes sejam mentes e estrelas sejam estrelas. O que estou sugerindo é uma nova metafísica, uma metafísica com rigor matemático; algo que não é simplesmente uma nova crença ou uma nova convicção religiosa. Ao contrário, essa percepção assumiu a forma de uma proposição formal.

Eu sou o primeiro a admitir que não foi possível encontrar uma ponte entre essa teoria e a física normal. Uma ponte dessas pode não ser possível nem necessária. Podemos descobrir que a ciência normal indica o que é possível, enquanto a teoria temporal que proponho oferece uma explicação para o que é. É uma teoria que parece explicar como, dentre todas as classes de coisas possíveis, alguns eventos e coisas passam pela formalidade de ocorrer. Para mim é claro que a teoria não pode ser negada de fora, só pode ser negada caso seja vista como inconsistente dentro de si mesma.

Por volta de 16 de novembro de 1971 eu tinha começado a perceber que a tabela tinha muitas variáveis para fincionar como um mapa previsível do futuro. Seria necessário, percebi então, quantificar de algum modo os vários parâmetros da onda, de modo que os julgamentos pudessem ficar menos sujeitos a interferências pessoais. A última coisa que produzi em La Chorrera foi escrito na manhã do dia 16, meu 25º aniversário. Era uma espécie de fábula:

16 de novembro de 1971

Dois velhos amigos, digamos que árabes, e velhíssimos, estão num palácio muito mais velho do que eles próprios, construído numa montanha rodeada por vinhedos, tomareiras e pomares de frutas cítricas. Sem sonmo e sociáveis, passam as longas horas estreladas antes do amanhecer fumando haxixe e propondo charadas.

– Compartilhe meu prazer com este quebra-cabeça e sua solução – disse o mais moreno para o mais velho, e passou a mão sobre os olhos do companheiro. O mais velho entrou no sonho e olhou o quebra-cabeça aberto – um mundo de formas e leis, engrenagens encaixadas, paixão e intelecto. Viu suas espécies e seus impérios, famílias dinásticas e indivíduos geniais, tornou-se seus filósofos e suportou suas catástrofes. Sentiu a textura e o caráter de todos os seres do mundo que seu amigo havia criado. Buscou o padrão secreto que o amigo, ele sabia, certamente escondera em sua criação, já que esse era um jogo que disputavam com freqüência.

Finalmente, num momento de grande despotismo, numa era de ciência impetuosa e decadência brilhante, ele se viu dividido nas pessoas de dois irmãos – e através deles, através de suas viagens e de suas vidas que passaram num instante diante de seus olhos, ele percebeu a natureza intrincada e agradável da charada. Compreendendo, enfim, e rindo – um riso que os dois compartilharam – ele dissolveu a névoa e as engrenagens da fábula de sonho. E mais uma vez eles passaram o cachimbo antes de sair pelo jardim azulado, onde a alvorada os encontraria conversando entre os pavões, entre as romãzeiras e as acácias.

E então será que vamos ficar apenas com uma fábula? Ou há mais alguma coisa aqui? Alguns jardins tropicais que eu plantei têm pequenas acácias se desenvolvendo. Talvez ainda haja tempo para que elas cresçam até fazer sombra para discursos filosóficos. A vida é mais estranha do que até mesmo o mais estranho de nós pode supor.

Parecia que o trabalho em La Chorrera estava terminado. Desarmamos nosso acampamento e voltamos pelas trilhas e pelos rios. Demorou, havia livros a serem escritos, pontas soltas de uma vida levada muito frouxamente precisavam ser arrumadas e amarradas. Ficamos um tempo em Florência, na finca de um amigo, onde escrevi os primeiros capítulos de The Invisible Landscape. (…)

(…) Até que a Onda Temporal do I Ching fosse quantificada com mais dados, seu modo de integrar fatores aparentemente sem sentido e não relacionados tornava muito fácil que ela fosse vista em termos psicológicos. Parecia operar como uma espécie de teste de manchas de Rorchach; podíamos ver nela o que quiséssemos. Mesmo depois de meu vigésimo quinto aniversário, em 16 de novembro de 1971, ter se passado com muito pouca novidade seja em minha vida ou no mundo, continuei a propagar para o futuro os ciclos da tabela. Sentia que a idéia de uma estrutura oculta do tempo estava correta, mas isso não podia ser afirmado até que o alinhamento correto entre a estrututra e a história humana fosse encontrado e confirmado. Eu estava procurando uma data com características especiais relacionadas à tabela, uma data que fosse um bom candidato para o surgimento de um evento especial.

Aqui vem uma parte de minha história que achei muito perturbadora. Depois da desconfirmação de novembro de 1971, procurei no futuro outras datas em que terminariam os ciclos de 384 dias, caso eu continuasse a assumir que 16 de novembro de 1971 fosse o fim de um desses ciclos. Isso significava que a próxima data no fim do ciclo de 384 dias seria quatro de dezembro de 1972. Consultei várias tabelas astronômicas, mas a data parecia nada prometer. A data final do ciclo seguinte de 384 dias era muito mais interessante, já que caía em 22 de dezembro de 1973.

Percebi que era um solstício de inverno. Ali estava uma pista. O solstício de inverno é tradicionalmente a época do nascimento do messias salvador. É um tempo de pausa, quando há uma mudança no mecanismo cósmico. É também no momento de transição do sol de Sagitário para Capricórnio. Não dou muita importância à astrologia, mas notei que Dennis é Sagitário e Ev é Capricórnio. Consultei meus mapas astronômicos e acrescentei outra coincidência; vi que onde a eclíptica cruza a cúspide de Sagitário e Capricórnio, a 23 graus de Sagitário, era o ponto, com um ou dois graus de variação, em que o centro da galáxia estava localizado naquele momento. Durante 26 mil anos o centro da galáxia, como todos os pontos na eclíptica, move-se devagar entre os signos, mas ele estaria na cúspide de Sagitário e Capricórnio no dia de solstício de inverno.

Parecia um número incomum de coincidências, de modo que continuei minha busca. Consultas no almanaque do Observatório Naval trouxeram uma verdadeira surpresa. Exatamente naquele dia que eu estava pesquisando, 22 de dezembro de 1973, haveria um eclipse anular total do sol, e o caminho de totalidade passaria diretamente sobre La Chorrera e a bacia amazônica. Fiquei pasmo. Sentia-me como um personagem de romance; aquela fiada de indícios era verdadeira! Pesquisei o eclipse para determinar exatamente onde ele alcançaria a totalidade. Descobri que ela ocorreria diretamente sobre a cidade de Belém, no Brasil, no delta do rio Amazonas. O vertiginoso matraquear élfico do hiperespaço aumentou de volume até um guincho agudo em meus ouvidos. Estaria zombando de mim ou me instigando?

A meditação sobre a data desse eclipse tirou minha mente do âmbito das coincidências astronômicas, trazendo-a de volta para os temas dos transes em La Chorrera. A cidade se chama Belém. Minhas percepções, sensíveis a qualquer possibilidade messiânica, ligaram-se a isso. Belém, a cidade de nascimento do Messias; e está no delta do Amazonas. Delta é o símbolo para a mudança no tempo; delta, em Joyce e para os grafiteiros através de toda a história, representa a vagina. Dennis nasceu em Delta, Colorado. Seria possível que todas as nossas experiências fossem uma premonição de um evento que ocorreria dali a dois anos no Brasil? Seria essa, absurdamente, a conclusão da experiência em La Chorrera, os acordes do hino “Oh, Cidadezinha de Belém” ecoando em minha mente? No final da primavera de 1972 eu sabia de tudo que acabo de mencionar. Por que a onda apontava para 22 de dezembro de 1973? E por que havia tamanha coincidência apontando para aquele momento? Será que eu já sabia do eclipse em algum nível do inconsciente? Será que eu sabia que ele alcançaria a totalidade em Belém? Por que as datas importantes em minha vida se alinhavam com aquela data, de acordo com a onda que eu aprendera a construir após o contato com o OVNI em La Chorrera? Parecia-me impossível que eu, de algum modo, já soubesse dessas coisas e tivesse manipulado minha consciência para imaginar que ela estivesse “descobrindo” essas coisas. Eu era como um viajante cego pela neve, apanhado por uma nevasca de coincidências.

Por fim, no início da primavera de 1973, ocorreu um evento que oferecia uma prova perfeita de que algo maior que meu inconsciente, aparentemente maior ainda que a consciência coletiva de toda a raça humana, estava posto em funcionamento. Foi a descoberta do cometa Kohotek, anunciado como o maior cometa da história humana, deixando até mesmo o Halley como um anão.

“O Cometa Mais Brilhante Que Já Se Dirigiu à Terra”, era a manchete do San francisco Chronicle. Enquanto lia o artigo, deixei sair um grito de espanto. O cometa faria sua aproximação máxima no dia 23 de dezembro! Um cometa não-periódico, desconhecido de todos na terra antes de março de 1973, se aproximava para um encontro com o sol a poucas horas do solstício e do eclipse sobre a Amazônia. Era uma enorme coincidência, se definirmos coincidência como uma improbabilidade que impressiona profundamente seu observador. Ela não foi diminuída pelo fato de Kohotek não ter correspondido às expectativas, porque apenas as expectativas já se transformariam numa onde de milenarismo e inquietude apocalíptica que só morreria com a volta do cometa à escuridão da qual havia emergido. Será que aconteceu alguma coisa em Belém no dia do eclipse? Não sei; eu não estava lá. Na época era um prisioneiro de obrigações mundanas. Mas realmente sei que a compressão de eventos que ocorreu naquela data, e o modo como as tabelas a previam, era espantosa.

Somente com o desenvolvimento do programa para computadores pessoais pude entender o modo como a Onda Temporal descreve o fluxo e refluxo de novidades no tempo em muitos períodos temporais diferentes: alguns durando apenas minutos, outros durando séculos. Agora qualquer um que se familiarize com a teoria pode juntar-se a mim nessa aventura intelectual e ver por si próprio o imenso desafio envolvido em prever uma concretude. Não me contentei em meramente compreender a teoria, mas continuei os esforços para aplica-la especificamente a predizer o curso dos eventos futuros. Se, durante anos de estudos, uma pessoa torna-se convencida de que a onda realmente mostra o curso futuro de novidades, a antecipação comum do futuro é gradualmente substituída por uma apreciação e uma compreensão quase zen do padrão total. (…)

Diga o que isso significa ?

Onde tento ligar nossas experiências à ciência que é qualquer coisa, menos normal.

Apesar de ter saído da Amazônia, essa história estranha e enrolada continua por mais um pouco. Ainda é tempo de destilar algumas conclusões das idéias que foram geradas em La Chorrera.

Um modelo do mundo é um modo de ver, e assimilar a teoria da onda temporal que nos foi forçada é ver o mundo de um jeito diferente. Minha abordagem tem sido a de garantir a possibilidade da teoria ser verdadeira, uma vez que não foi refutada. Pode ser que algum dia a refutem; mas até então devo acreditar nela, ainda que com uma ponta de ironia. Talvez outros reforcem e contextualizem a idéia caso se dignem a ouvi-la. Muitas boas idéias simplesmente morrem por falta de um contexto. Mas esta idéia propõe uma reconstrução fundamental no modo como vemos a realidade. E pode ser ensinada. Ela preenche minhas aspirações espirituais porque é feita de compreensão: simples e puramente compreensão.

A teoria elaborada no início da experiência em La Chorrera não nega nenhuma classe de conhecimentos; ela os aumenta. Há um argumento para isso ao nível físico, se bem que a idéia é muito complicada, tocando, como toca, áreas envolvendo física quântica, biologia submolecular e estrutura do DNA. Essas são as noções que espero ter delineado com cuidado e atenção em The Invisible Landscape.

Apesar da idéia que desenvolvi poder não ter sido causada pelo que Dennis fez na Amazônia, tenho a forte intuição de que o foi. No início da experiência minhas preocupações particulares foram substituídas por pensamentos tão absolutamente estranhos que não pude reconhecê-los como produtos de minha personalidade. Ele realizou sua experiência e eu tive uma espécie de retroalimentação informativa a partir do meu DNA ou de alguma outra armazenagem molecular de informação. Isso aconteceu precisamente porque as moléculas psicodélicas ligaram-se ao DNA e em seguida se comportaram do modo que havíamos previsto; elas realmente irradiaram um símbolo da totalidade, cuja estrutura profunda reflete os princípios organizacionais das moléculas da própria vida. Essa totalidade entrou no tempo linear – na presença da consciência comum – disfarçada em um diálogo com o Logos. O Logos proporcionou uma voz narrativa capaz de estruturar e dar coerência à torrente de novas percepções que, de outra forma, teriam me esmagado. Minha tarefa tornou-se desencavar e replicar a estrutura simbólica que havia por trás da voz, e descobrir se ela tinha algum significado fora de mim e de meu pequeno círculo de conhecidos. Era como criar um sistema de arquivos para um mundo recém-revelado de infinita variedade. A onda temporal é uma espécie de mandala matemática descrevendo a organização do tempo e do espaço. É uma representação dos padrões de energia e de intenções dentro do DNA. O DNA desdobra esses mistérios através do tempo como uma gravação ou uma canção. Essa canção é a nossa vida, e é toda a vida. Mas sem uma visão conceitual não podemos entender a melodia que ele toca. A teoria da onda temporal é como a partitura da sinfonia biocósmica.

Estou interessado em refutar a teoria. Uma boa idéia não é frágil, e pode suportar grande pressão. O que aconteceu em La Chorrera não pode ser atenuado com palavras, ao contrário, aquilo pede simplesmente para ser explicado. Se não é o que eu digo que é, então o que é a concrescência, a centelha, o encontro com o totalmente Outro? O que isso realmente representa?

É, como parece ser, o ingresso de uma época pertencente a uma dimensão mais elevada, que reverbera através da história? É uma onda de choque sendo gerada por um evento escatológico no fim dos tempos? As leis naturais são mais fáceis de entender se assumirmos que não existem constantes universais; e sim fenômenos de fluxo que se desenvolvem lentamente. Afinal de contas a velocidade da luz, que é vista como uma constante universal, só foi medida nos últimos cem anos. É um pensamento puramente indutivo extrapolar o princípio da não-variação da velocidade da luz a todos os tempos e lugares. Qualquer bom cientista sabe que a indução é um salto de fé. Ainda assim a ciência é baseada no princípio da indução. É esse princípio que esta teoria desafia. A indução presume que se fazemos A, e disso resultar B, significa que sempre que fizermos A, B será o resultado. O fato é que no mundo real não acontece nenhum A ou B no vácuo. Outros fatores podem se intrometer em qualquer situação real, mandando-a para uma conclusão diferente ou incomum..

Antes de Einstein o espaço era visto como uma dimensão onde colocamos coisas. O espaço era visualizado como uma analogia para o vazio. Mas então Einstein mostrou que o espaço é uma coisa que tem torque, e que é afetada pela matéria e pelos campos gravitacionais. A luz passando através de um campo gravitacional no espaço será curvada porque o espaço através do qual ela viaja está curvado. Em outras palavras, o espaço é uma coisa, e não um lugar onde você põe coisas.

O que proponho, em síntese, é que o tempo – que também foi previamente considerado uma abstração necessária – também é uma coisa. O tempo não apenas muda, como também há diversos tipos de tempo. Enquanto esses tipos de tempo vem e vão em progressão cíclica em muitos níveis, as situações se desenvolvem à medida que a matéria responde às condições de tempo e espaço. Esses dois padrões condicionam a matéria. Há muito tempo a ciência está consciente dos padrões de espaço, chamamos isso de “leis naturais”, mas e quanto aos padrões de tempo? Essa é uma consideração completamente diferente.

A matéria, que sempre foi considerada a epítome da realidade, tem algumas características mais próximas do pensamento. A matéria passa por mudanças definidas por dois agentes padronizadores que estão correlacionados: espaço e tempo. Essa idéia implica em axiomas. Um dos maiores é tirado do filósofo Gottfried Wilhelm von Liebnitz. Liebnitz imaginava as mônadas como partículas minúsculas que são infinitamente replicadas em todos os pontos do universo e que contêm em si todos os lugares. As mônadas não estão meramente aqui e agora. Estão em todos os lugares o tempo todo. Ou têm dentro de si todo o espaço e todo o tempo, dependendo do ponto de vista. Todas as mônadas são idênticas, mas dependendo do modo como se interconectam elas constroem um continuum mais amplo enquanto ao mesmo tempo mantêm suas perspectivas individualmente únicas. Essas idéias liebnitzianas anteciparam o novo campo da matemática fractal, do qual minha idéia de um padrão temporal é um exemplo exótico.

Idéias como essa oferecem uma explicação possível para os mecanismos de memória que, de outro modo, seriam misteriosos. A destruição de noventa e cinco por cento do cérebro não danifica a função de memória. Parece que a memória não está guardada em lugar nenhum; a memória parece permear o cérebro. Como um holograma, toda a memória está em cada parte. Podemos pegar uma prancha holográfica do monte Fuji e corta-la ao meio; quando uma metade é iluminada, toda a imagem está presente. Podemos fazer isso de novo e de novo, o holograma é feito de um número quase infinito de minúsculas imagens, cada uma, em combinação com as outras, apresenta uma imagem inteira.

O aspecto “holográfico” da memória foi visto como de importância central por pensadores como David Bohm e KarlPribram. Mas foi Dennis e eu quem chegamos ao ponto de sugerir que essa forma de organização poderia ser estendida para além do cérebro, para incluir o cosmo inteiro.

A física quântica faz afirmações semelhantes dizendo que o elétron não está em algum lugar ou em algum tempo, o elétron é uma nuvem de probabilidades, e isso é tudo que podemos dizer dele. Uma característica semelhante liga-se a esta idéia do tempo e da comparação do tempo com um objeto. A pergunta óbvia a ser feita é: qual a menor duração relevante para os processos físicos? A abordagem científica seria dividir o tempo até sua menor parte, para descobrir se há uma unidade. O que estamos procurando é um crônon, ou uma partícula de tempo. Acredito na existência do crônon, mas não como uma coisa distinta do átomo. Os sistemas atômicos são crônons; os átomos são muito mais complicados do que se suspeitava. Acredito que os átomos têm propriedades ainda não descritas, que podem responder não apenas pelas propriedades da matéria, mas também pelo comportamento do espaço/tempo.

Os crônons podem não ser redutíveis a átomos, mas suspeito de que o que estamos procurando seja uma onda/partícula que compõe a matéria, o espaço/tempo e a energia. O crônon é mais complicado do que a descrição clássica dos sistemas atômicos feitas por Heisenberg e Bohr. O crônon tem propriedades que o tornam capaz de funcionar como constituinte fundamental de um universo no qual surgem mentes e organismos. Até agora fomos incapazes de definir as propriedades dinâmicas que permitiria uma partícula atuar como parte necessária de um organismo vivo ou de um organismo pensante. Até mesmo uma bactéria como E. coli é um feito estonteante para o átomo de Heisenberg e Bohr.

O modelo de Heisenberg/Bohr permite-nos simular o universo físico de estrelas, galáxias e quasars; mas não explica os organismos ou a mente. Temos de sobrepor diferentes características àquele modelo atômico para modelar fenômenos mais complexos. Devemos imaginar um átomo com novos parâmetros caso desejemos compreender como podemos existir, como os seres humanos pensantes, usuários de ferramentas, puderam surgir do substrato universal.

Não afirmo que já tenha feito isso. Mas realmente creio que tropecei numa avenida intelectual que poderia ser seguida para chegar a essa compreensão. A chave está em ciclos de variáveis temporais aninhadas em estruturas hierárquicas que geram vários tipos de relacionamentos fractais se desdobrando em direção a conclusões que são, com freqüência, surpreendentes.

A pessoa que estabeleceu a base mais firme para compreender filosoficamente este tipo de noção é Alfred North Whitehead. Nada do que sugerimos está além do poder de seu método de previsão. O formalismo de Whitehead responde pelas mentes, pelos organismos e por uma quantidade de fenômenos mal resolvidos pela abordagem cartesiana.

Outros pensadores visionários estão sondando essas áreas; a Dinâmica do Atrator Caótico é a idéia de que qualquer processo pode ser relacionado a qualquer outro através de uma equação matemática, simplesmente em virtude de todos os processos fazerem parte de uma classe comum. A derrubada de um ditador, a explosão de uma estrela, a fertilização de um ovo; tudo deveria ser descrito através de um conjunto de termos.

O desenvolvimento mais promissor nessa área foi o surgimento do novo paradigma evolucionário de Ilya Prigogine e Erich Jantsch. Seu trabalho chegou a nada menos do que um novo princípio ordenador da natureza. É a descoberta e a descrição matemática da auto-organização dissipativa como um princípio criativo subjacente à dinâmica de uma realidade aberta e de múltiplos níveis. As estruturas dissipativas fazem o milagre de gerar e preservar a ordem através de flutuações – flutuações cuja base, em última instância, está na indeterminação da mecânica quântica.

Se alguém tivesse um perfeito espelho filosófico do universo, poderia dizer a uma pessoa, aplicando seu método filosófico, quanto dinheiro ela tem no bolso. Como é um fato, essa quantia deveria, pelo menos em princípio, ser possível de se calcular. O importante é compreender as verdadeiras fronteiras da realidade, e não os limites prováveis de possíveis eventos futuros. Se bem que condições limites operem no futuro, elas são restrições probabilísticas, e não fatos absolutamente determinados. Presumimos que daqui a dez minutos o cômodo em que estamos continuará a existir. É uma condição limite que irá definir os próximos dez minutos em nossa coordenada espaço-temporal. Mas não podemos saber quem estará no cômodo daqui a dez minutos; isso está para ser determinado.

Pode-se perguntar se realmente podemos saber que o cômodo ainda existirá em qualquer momento futuro. Aí é que entra a indução no quadro geral, já que na verdade não podemos saber com certeza. Não há um modo absolutamente rigoroso de estabelecer isso. Mas podemos fazer o salto indutivo de fé, que tem a ver com a experiência acumulada. Projetamos a idéia de que a existência do cômodo irá seguir como condição limite mas, em princípio, poderia haver um terremoto nos próximos dez minutos e esse prédio poderia não ficar de pé. Entretanto, para que isso aconteça, a condição limite teria de ser radicalmente rompida de algum modo inesperado e improvável.

O curioso é que esse tipo de coisa poderia acontecer. É isso que a onda temporal nos permite prever: que há condições em que podem ocorrer eventos de grande novidade. Entretanto há um problema. Como sugerimos um modelo de tempo cuja matemática dita uma construção em estrutura espiral, os eventos vão-se reunindo em espirais cada vez mais apertadas, que levam inevitavelmente a um tempo final. Como o centro de um buraco negro, o tempo final é necessariamente uma singularidade., um local ou um evento em que as leis comuns da física não funcionam. Em princípio é impossível imaginar o que acontece numa singularidade e, naturalmente, a ciência tem evitado essa idéia. A singularidade definitiva é o Big Bang, que os físicos acreditam ter sido responsável pelo nascimento do universo. A ciência pede que acreditemos que o universo inteiro explodiu do nada, num único ponto e sem motivo discernível. Essa noção é o caso limite para a credulidade. Em outras palavras, se você acredita nisso, pode acreditar em qualquer coisa. Uma noção que é, de fato, absolutamente absurda, e mesmo assim terrivelmente importante para todas as suposições racionais que a ciência deseja preservar. Essas suposições partem daquela situação inicial impossível.

A religião ocidental tem sua própria singularidade na forma do Apocalipse. Esse evento é localizado não no princípio do universo, mas no fim. Isso parece uma posição mais lógica do que a da ciência. Se existem as singularidades, parece mais fácil supor que elas possam surgir de um cosmo antigo e altamente complexo como o nosso do que de um megavácuo sem forma e sem dimensões.

A ciência olha de cima de seu nariz empinado para as fantasias apocalípticas da religião. A visão da ciência é de que o tempo final pode apenas significar um tempo entrópico de não-mudança. A visão da ciência é de que todos os processos terminam por se esgotar, e que a entropia é maximizada apenas num futuro muitíssimo distante. A idéia da entropia cria uma suposição de que as leis do continuum espaço-tempo são infinita e linearmente expansíveis para o futuro. No esquema de tempo espiral da onda temporal não se faz essa suposição. Ao invés disso, o tempo final significa passar de um conjunto de leis que estão condicionando a existência para outro conjunto de leis radicalmente diverso. O universo é visto como uma série de eras compartimentadas, tendo leis bastante diferentes umas das outras, com transições de uma época para outra ocorrendo com inesperada subitaneidade.

Ver através dessa teoria é ver nosso lugar no esquema espiral e antecipar quando irá ocorrer a transição para uma nova época. Vemos isso no mundo físico. O planeta tem cinco ou seis bilhões de anos. A formação do universo inorgânico ocupa a primeira volta da espiral. Então surge a vida. Se examinarmos este planeta, o único planeta que podemos examinar em profundidade, descobrimos que os processos vão sempre acelerando em velocidade e complexidade.

Um planeta gira através do espaço dois bilhões de anos antes de aparecer a vida. A vida representa uma nova qualidade emergente. No instante em que a vida inicia, começa uma corrida louca. Espécies aparecem e desaparecem. Isso acontece durante um bilhão e meio de anos e, subitamente, uma nova propriedade nascente assume o palco; surgem espécies pensantes. Essa nova época da mente é breve em comparação com a que a precedeu; do confronto silencioso com a pedra lascada até a nave estelar passam-se cem mil anos. O que poderia ser essa era a não ser o ingresso de um novo conjunto de leis? Uma nova psicofísica permite nossa espécie manifestar propriedades peculiares: linguagem, escrita, sonho, e o tecer da filosofia.

Como as cascavéis e os álamos, os seres humanos são feitos de DNA. Ainda assim nós detonamos as mesmas energias que iluminam as estrelas. Fazemos isso na superfície de nosso planeta. Ou podemos criar uma temperatura de zero absoluto. Fazemos essas coisas porque, apesar de sermos criados no barro, nossas mentes nos ensinaram a aumentar nosso alcance através do uso de ferramentas. Com ferramentas podemos liberar energias que normalmente só ocorrem sob condições muito diferentes. O centro das estrelas é o lugar normal para os processos de fusão.

Fazemos essas coisas usando a mente. E o que é a mente? Não temos qualquer pista. Vinte mil anos para passar da caça e da coleta nômade para a cibernética e a viagem espacial. E continuamos acelerando. Ainda há mais espirais à frente. Do Ford modelo T até a nave espacial. Cem anos. Do homem mais rápido, capaz de mover-se a quarenta quilômetros por hora, ao homem mais rápido movendo-se a quatorze quilômetros por segundo. Sessenta anos.

Mais desconcertantes são as previsões que a teoria faz das próximas mudanças de eras, tornadas necessárias pela congruência da onda temporal com os dados históricos. A onda temporal parece dar uma melhor configuração dos dados históricos quando se supõe que um ingresso máximo de novidades irá ocorrer em 21 de dezembro de 2012. Estranhamente, essa é a data final que os Maias puseram em seu calendário. Bom, o que é isso que dá a um indivíduo do século XX e uma antiga civilização mesoamericana a mesma data para a transformação do mundo? Será porque ambos usaram cogumelos psicodélicos? Poderia a resposta ser tão simples? Não creio. Ao invés disso suspeito de que, quando inspecionamos a estrutura de nosso inconsciente profundo, fazemos a descoberta inesperada de que ele está ordenado sob o mesmo princípio do universo mais amplo, do qual emergiu. Esta noção, a princípio surpreendente, logo passa a ser vista como óbvia, natural e inevitável.

Uma analogia que explica por que isso pode ser assim é dada ao se olhar dunas de areia. A coisa interessante com essas dunas é que elas guardam uma semelhança com a força que as criou, o vento. É como se cada grão de areia fosse um bit na memória de um computador natural. O vento é o sinal de entrada que arranja os grãos de areia de modo que se tornem um reflexo em dimensão inferior do fenômeno que ocorre na dimensão mais elevada, neste caso, o vento. Não há nada de mágico com isso, e não nos parece misterioso: o vento, uma pressão que é variável com o tempo, cria uma duna ondeada que é uma estrutura variando regularmente no espaço. Em meu modo de pensar, os organismos são grãos de areia arranjados pelo fluxo e refluxo dos ventos do tempo. Nesse caso os organismos têm naturalmente a marca das variáveis inerentes ao meio temporal em que surgem. O DNA é o meio virgem em que as variáveis temporais têm sua seqüência e suas diferenças relativas gravadas. Qualquer técnica que penetre os relacionamentos energéticos dentro de um organismo vivo, como a yoga ou o uso de plantas psicodélicas, também dará uma percepção profunda sobre a natureza variável do tempo. A seqüência King Wen do I Ching é o produto desse tipo de percepção.

A cultura humana é uma curva de potencialidade em expansão. Em nosso século atormentado ela alcançou uma verticalidade. Os seres humanos ameaçam todas as espécies do planeta. Empilhamos materiais radiativos em todo canto, e todas as espécies da Terra podem ver isso. O planeta, como entidade inteligente, pode reagir a esse tipo de pressão. Ele tem três bilhões de anos, e tem muitas opções.

A conversa dualística sobre a humanidade não fazer parte da ordem natural é bobagem. Nós não poderíamos ter surgido a não ser que servíssemos a um propósito que se ajustasse à ecologia planetária. Não está claro qual é esse propósito, mas parece ter a ver com nossa enorme capacidade de investigação. E com nossas crises! Acumulando armas atômicas afirmamos a capacidade de destruir a Terra como uma banana de dinamite enfiada numa maçã podre. Por quê? Não sabemos. Certamente não pelos motivos políticos e sociais que são apresentados. Somos simplesmente uma espécie construtora de ferramentas; ela mesma uma ferramenta da ecologia planetária que é uma inteligência superior. Essa inteligência sabe quais são os perigos e limitações na escala cósmica e organiza furiosamente a vida para se preservar e se transformar.

Minha história é peculiar. É difícil saber o que achar dela. A noção de algum tipo de revelação visionária fantasticamente complicada que nos põe no centro da ação é um sintoma de doença mental. Essa teoria faz isso; assim com a experiência direta, e também as ontologias do judaísmo, do islamismo e do cristianismo. Minha teoria pode ser clinicamente patológica, mas, diferentemente desses sistemas religiosos, tenho humor suficiente pra perceber isso. É importante apreciar a comédia intrínseca ao conhecimento privilegiado. Também é importante ter acesso ao método científico, sempre que for apropriado. A maioria das teorias científicas pode ser refutada nos calmos limites do laboratório, a evolução não.

Para sentir empatia com as visões de La Chorrera, precisamos imaginar o que podemos imaginar. Imagine se os desejos fossem cavalos, como os mendigos cavalgariam! As idéias desenvolvidas em La Chorrera eram tão envolventes porque prometiam novas dimensões à liberdade humana. Os rumores ouvidos na Amazônia sobre fluidos mágicos relacionados com o tempo, autogerados a partir dos próprios corpos pelos mestres xamãs, são nada menos do que sugestões da metamorfose do corpo/alma humano para um estado dimensional mais elevado. Caso essa transformação da matéria fosse possível poderíamos fazer qualquer coisa com ela. Poderíamos espalhá-la, subir em cima e leva-la a qualquer altitude, adicionando oxigênio à vontade. É a imagem assombrosa do disco voador voltando outra vez. Podemos entrar na substância; usando-a como um traje de mergulho mental. O disco voador é uma imagem da mente humana aperfeiçoada; ele espera zumbindo quente no fim da história humana neste planeta. Quando ela estiver perfeita, haverá uma mutação ontológica da forma humana, nada menos do que o corpo ressurreto que o Cristianismo prevê.

É função do gênio da tecnologia humana dominar e servir às energias da vida e da morte, do tempo e do espaço. O OVNI guarda a possibilidade da mente tornar-se objeto, uma nave que pode cruzar o universo no tempo necessário para se pensar a respeito. Porque ela é como o universo: um pensamento. Quando a mente tornada objeto móvel for aperfeiçoada, a humanidade – noviça no domínio do pensamento – irá começar a partir.

Claro que podemos descobrir que não vamos embora; o futuro pode revelar, ao invés disso, que há algo lá fora chamando-nos para casa. Então será nossa tecnologia e o chamamento do Outro que irão mover-se na direção de um encontro. O disco é uma excelente metáfora para isso. Quando Jung sugeriu que o disco era a alma humana, ele estava mais correto do que pode ter suposto. E isso não está muito distante de acontecer. Essa é a outra coisa; a última virada de épocas nos deu a teoria da relatividade e a mecânica quântica. Outra mudança de época se aproxima, mas é difícil saber se será a época final. Nosso papéis como partes do processo introduzem um princípio de incerteza que impede a previsão.

Todos esses temas foram tecidos ao redor do DMT, possivelmente porque a DMT cria um microcosmo dessa mudança de épocas na experiência de um único indivíduo. Parece difícil elevar a mente perceptível acima dos confins do espaço comum e ter um vislumbre da maior estrutura possível do Ser. Quando Platão disse que “O tempo é a imagem móvel da Eternidade”, fez uma afirmação que é reforçada a cada viagem para o espaço da DMT. Como a mudança de época chamada Apocalipse, antecipada por histéricos religiosos, a DMT parece iluminar a região após a morte. E qual é a dimensão além da vida, que a DMT ilumina? Se pudermos confiar em nossas percepções, é um lugar no qual existe uma ecologia de almas cujo estado de ser é mais sintático do que material. Parece ser um reino próximo, habitado por intelectos élficos eternos, feitos inteiramente de informação e de alegre auto-expressão. O depois da vida é mais um país de fadas céltico do que uma não-entidade existencial, pelo menos isto é evidenciado na experiência com DMT.

Nós, seres humanos, devemos admitir que nossa situação é peculiar: tendo nascido, somos sistemas químicos abertos e autônomos que se mantêm num ponto distante do equilíbrio metabólico. E somos criaturas pensantes. O que é isso? O que são as três dimensões? O que é a energia? Encontramo-nos na estranha posição de estarmos vivos. Tendo nascido, sabemos que vamos morrer. Um monte de pensadores diz que isso não é tão estranho, que acontece no universo – as coisas vivas surgem. E no entanto a nossa física, que pode acender o fogo das estrelas em nossas desertos, não pode explicar a estranheza do fenômeno de estarmos vivos.

No ponto em que a ciência está hoje em dia os organismos se encontram completamente fora do âmbito da explicação física. Então de que ela serve? Spencer e Shakespeare, a teoria quântica e as pinturas de cavernas em Altamira. Quem somos nós? O que é a história? E para onde ela vai? Agora libertamos processos potencialmente fatais ao planeta. Disparamos a crise final para toda a vida. Fizemos isso, mas não temos controle. Nenhum de nós. Nenhum líder e nenhum Estado pode mandar parar o fato de estarmos presos à história. Estamos nos movendo em direção ao inimaginável enquanto se empilham as informações sobre a natureza real da situação que enfrentamos. Para parafrasear J.B.S. Haldane: nossa situação pode não ser apenas mais estranha do que supomos; pode ser mais estranha do que podemos supor.

Timewave Zero – Alguns vídeos no Youtube (em inglês):

[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=w-prt5d6m6s&feature=related]

[youtube=http://www.youtube.com/watch?v=LLbS-kQhd9o]

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11:11, Discos voadores, Sincronicidade…

Vejo em muitos lugares, várias teorias à respeito do significado desses fenômenos, desde as que dizem que nada tá acontecendo até as que afirmam que estamos sendo vigiados por alienígenas oriundos de planetas distantes. Sinceramente tendo a não crer em nenhuma delas. E não que eu considere tais coisas impossíveis; mas pelo contrário, acho que nesses terrenos absolutamente tudo é possível, e por isso mesmo devemos olhar tais coisas com o máximo de lucidez.

Quando somos surpreendidos por esses fenômenos , geralmente a primeira coisa q fazemos é nos perguntar: “O que é isso?”. A resposta pra essa pergunta é um leque aberto de infinitas possibilidades, e acabamos muitas vezes por ficar perdidos no meio de todo tipo de devaneios, e vulneráveis à todo tipo de maluquice e oportunismo. Nós tendemos a acreditar que a nossa interpretação última das coisas é a explicação total e definitiva sobre a realidade, o que eu considero um engano. É realmente muito confortável saber que sabemos alguma coisa. Mas o preço do conforto é a limitação

A forma de pensar que eu acho mais útil pra abordar esses fenômenos “sobrenaturais”, por assim dizer, é deixando um pouco de lado o questionamento sobre “o que podem ser” essas coisas; reconhecendo-se que algo está acontecendo mas que não podemos ter certeza absoluta sobre o que exatamente está acontecendo. Proponho, assim como alguns pesquisadores já propuseram, que nos concentremos totalmente na questão sobre o que essas coisas estão fazendo, ou o que parecem estar fazendo.

Sei que pra muitas pessoas, essa forma de pensar pode ser extremamente desconfortável, pois significa jogar no lixo crenças cuidadosamente cultivadas. Ficam com a sensação de “E agora?”, ecoando em um vazio de todas as possibilidades em potencial, e não sabem como reagir à isso. Então se apegam rapidamente à mais próxima e conveniente possibilidade. E assim o jogo continua…..

Já deu pra perceber que eu proponho uma certa dose de ceticismo ao analisar essas coisas. Não o ceticismo de quem não acredita em nada, mas o ceticismo daqueles que valorizam e se baseiam em experiências pessoais. Acredito que só poderemos lançar uma luz verdadeira sobre essas coisas quando nos colocarmos na nossa posição diante disso, e construirmos nosso alicerce baseado em experiências. Em outras palavras, colocar a experiência direta como base, na frente de qualquer dogma. Caso contrário ficaremos andando em círculos, como o cachorro que corre atrás do próprio rabo. E assim 11:11s, discos voadores e afins continuarão passando pela nossa vida inexplicavelmente, como que ironizando nossa própria infantilidade e ignorância. E nós, continuaremos explicando pra nós mesmos da forma que nos for conveniente no momento. E não que eu ache isso errado, apenas vejo como parte do jogo.

Pode-se jogar eternamente, as possibilidades desse jogo são infinitas e irão entretê-lo o suficiente durante o tempo que você quiser. Mas se você cansar do jogo, e quiser ver o que realmente está por trás dele, então vc deve transcender o jogo. É nesse sentido que eu proponho uma diferente forma de pensar.

Eu acho que é aí que está a chave, pois sob um ponto de vista abrangente, o que todos esses fenômenos parecem fazer é desafiar brutalmente as suposições e presunções da humanidade em relação ao que é a realidade. Pegando como exemplo a “Ciência”, nossa entidade oficial no quesito de explicar a realidade; então pergunte a um cientista do tipo “ortodoxo” qual é a explicação científica para a sincronicidade do número 11, que permeia atualmente a vida de pelo menos muitas pessoas, com uma freqüência absolutamente incomum. Ele lhe diria que isso é um engano, uma ilusão, um mero “acaso”. Lhe diria que o fenômeno é inconcebível para a “Ciência”. No entanto as pessoas experimentam isso, e nós sabemos. É um fato. A mesma coisa ocorre com os discos voadores., fenômenos de mesma natureza, na minha opinião.

O que esses fenômenos parecem estar fazendo, é simplesmente nos mostrar que há algo além do “jogo” que tem sido ignorado há muito tempo por nós; algo que pode ser muito mais estranho e bizarro do que qualquer coisa que nós pudermos imaginar. Nenhuma explicação, seja esotérica ou científica, clareia o fato simplesmente porque tudo isso também faz parte do jogo, e sendo assim, nada poderá dizer sobre o além-jogo.

O que eu chamo de “jogo” são simplesmente nossas concepções estritamente humanas sobre a realidade. E o que eu defendo é que esses fenômenos vieram exatamente pra quebrar essas fronteiras que nós mesmos criamos a partir de nossas próprias suposições. Nos tornamos humanos demais, e assim nos fechamos à todo o Universo não-humano. Os discos voadores nos mostram isso brilhantemente, introduzindo nas nossas mentes a idéia de que podemos estar dividindo o planeta com alienígenas inteligentes. Simplesmente aceitar isso como possibilidade já é um grande passo, principalmente se relembrarmos nossa estrutura mental de uns 50 anos atrás, por exemplo.

Estamos começando a perceber que nessa vida tudo é possível, e que passamos tempo demais adormecidos em relação à isso. Realmente não importa se são E.Ts ou qualquer outra coisa, o que realmente importa é a consciência de que existe de fato um nexo interdimensional no Universo, no qual estamos incluídos.

Eu acredito que toda a repressão causada pelos sistemas de controle, o regime paternalista, cultura dominadora, reducionismo científico, etc..Tudo isso ao longo dos milênios da nossa existência nesse planeta gerou um acúmulo de energias reprimidas em nosso inconsciente, que em ponto crítico começam a “explodir” – e atualmente com cada vez mais freqüência -, vindo à tona na forma de sincronicidades e fenômenos tidos por nós como “sobrenaturais”, mas que nada mais são do que o campo gerado por nós mesmos, nos convidando, e praticamente nos intimando a uma inteiramente nova visão sobre a realidade. O momento é agora, e há evidências disso por todo lado.

A Experiência Religiosa e a Meditação

(Do livro, ainda não editado em nosso idioma, “O Despertar da Inteligência”).

“Dissemos que íamos falar sobre um problema sobremodo complexo, ou seja: Existe experiência religiosa, e que significa “meditação”? Observando, podemos ver que, em todo o mundo, o homem sempre andou buscando uma coisa existente além da morte, além dos seus problemas, uma coisa duradoura, verdadeira, eterna. Deu-lhe o nome de “Deus”, e outros mais; e a maioria acredita em tal coisa, sem jamais tê-la experimentado. Prometem algumas religiões que se crermos em certos rituais, dogmas e salvadores, e se vivermos de um dado modo, encontraremos essa coisa maravilhosa, que podemos denominar como quisermos. Os que a têm “experimentado” diretamente fazem-no segundo o seu condicionamento, sua crença, as influências ambientes e culturais a que estão submetidos.

A religião, evidentemente, perdeu o seu significado, pois sempre houve guerras religiosas. Ela não resolve os nossos problemas. As religiões separaram os povos. Poderão ter exercido determinada influência civilizadora, mas não transformaram radicalmente o homem. Para começarmos a investigar se existe a “experiência religiosa”, e o que tal experiência representa, e o porquê de a chamarmos “religiosa”, evidentemente, em primeiro lugar, se faz mister muita sinceridade. Isso não significa ser sincero em obediência a algum princípio ou crença, ou em relação a algum “compromisso”, mas, sim, ver as coisas tais quais são, sem deformá-las, não só as coisas exteriores, senão também as interiores; significa jamais iludir a si próprio. Porque é facílimo nos iludirmos ao ansiarmos por uma dada experiência, religiosa ou de outra natureza – pelo uso de drogas, etc. Estamos, então, sujeitos a nos enredarmos em alguma espécie de ilusão.

Cabe-nos descobrir diretamente o que é “experiência religiosa”. Precisamos imbuir-nos de humildade e sinceridade, a fim de não exigirmos para nós algum proveito ou ganho. Devemos, pois, atentar em nossos próprios desejos, apegos e temores, para os compreendermos a fundo, e não deixarmos a mente deformar-se de nenhuma maneira, impedindo assim toda e qualquer ilusão. E, igualmente, cumpre indagar: Que significa “experimentar”?

Não sei se já consideraram esta questão. Em regra, cansamo-nos das habituais experiências cotidianas. De todas elas estamos fartos, e quanto mais “sofisticada” ou intelectual a pessoa, tanto mais deseja viver só no agora – o que quer que isso signifique – e inventar uma filosofia do presente. A palavra “experiência” exprime passar por um certo estado, do começo ao fim, e dá-lo por acabado. Mas, infelizmente, para a maioria toda experiência deixa uma cicatriz, uma lembrança, agradável ou desagradável, e nós desejamos conservar as aprazíveis. Se ansiamos por qualquer espécie de experiência, espiritual, religiosa ou transcendental, devemos primeiramente descobrir se existe tal experiência, e também o que ela expressa. Se você passou por alguma e não é capaz de reconhecê-la, ela deixa de existir. Um dos elementos essenciais da experiência é o reconhecimento. E, havendo reconhecimento, aquilo que se experimenta já é conhecido, já foi sentido, pois, do contrário, não seria reconhecido.

Assim, ao falar de experiência religiosa, espiritual ou transcendental, a pessoa deve tê-la conhecido antes, para ser capaz de reconhecer que está experimentando algo diferente de uma experiência comum. Parece lógico e verdadeiro que a mente deve ser capaz de reconhecer a experiência, e o reconhecimento implica que a coisa já é conhecida e, por conseguinte, não é nova.

Ao desejarmos experiências no terreno religioso, nós as desejamos porque não resolvemos os nossos problemas, nossas ânsias, desesperos, temores e tristezas de cada dia; por essa razão pretendemos algo “mais”. Nessa pretensão de “mais” encontra-se a ilusão. Isso é bem lógico e verdadeiro, penso eu. Não digo que a lógica seja sempre verdadeira, mas, quando, sã e equilibradamente, nos servimos da lógica e da razão, conhecemos as limitações da razão. O desejo de experiências mais amplas, profundas e fundamentais leva-nos a alongar ainda mais o caminho do conhecido. Isso me parece claro, e espero estejamos em comunhão, em “participação” uns com os outros.

Outrossim, investigando o terreno religioso, queremos descobrir o que é a verdade, se existe uma realidade, se existe um estado mental fora do tempo. A procura implica também uma entidade que busca. E que está buscando essa entidade? Como saberá que o que descobre, em sua busca, é verdadeiro? E, ainda, se ela encontra o verdadeiro – pelo menos o que pensa ser o verdadeiro – o que ela encontra depende de seu condicionamento, de seus conhecimentos, de suas anteriores experiências; a busca torna-se, então, apenas mais uma projeção de suas passadas esperanças, temores e anseios.

A mente que está investigando – não, buscando – deve achar-se totalmente livre destas duas coisas: o desejo de experiência e a busca da verdade. Isso porque, se estamos buscando, procuramos diferentes instrutores, lemos livros vários, aderimos a vários cultos, seguimos diversos gurus, etc, etc. – como quem percorre as vitrines das lojas. Essa busca não tem nenhum significado.

Assim, ao investigarem esta questão – “Que é mente religiosa, e qual a natureza da mente que já não tem experiência alguma” – vocês devem saber se a mente pode libertar-se do desejo de experiência e pôr fim a toda atividade de busca. Impende investigar, sem nenhum “motivo” ou propósito, os fatos concernentes ao tempo e se existe um estado atemporal. Tal investigação requer que não se tenha crença alguma, não se esteja ligado a nenhuma religião ou organização dita espiritual, que não se siga nenhum guru e, portanto, não se esteja sujeito a nenhuma autoridade – inclusive, e principalmente, à deste orador. Porque as pessoas são facilmente influenciáveis, excessivamente crédulas, ainda que sejam “sofisticadas” e muito sabedoras; mas estão sempre ansiando por alguma coisa, sempre a desejar e, por essa razão, crêem.

Assim, a mente que investiga para descobrir o que é religião deve achar-se inteiramente livre de qualquer forma de crença, de qualquer forma de medo; porque o medo, conforme já explicamos, é um elemento deformador, produtivo de violência e agressão. Por conseguinte, ao investigarmos o estado religioso e seu movimento, devemos achar-nos livres do temor. Isso requer sinceridade e humildade.

No tocante à maioria de nós, a vaidade é um dos maiores impedimentos. Porque, tendo lido muito, tendo assumido compromissos com algum guru que anda a oferecer a sua filosofia, pensamos saber, pelo menos um pouco, e esse é o começo da vaidade. Ao averiguarmos uma questão tão importante como esta, precisamos fazê-lo com isenção, isto é, sem nada sabermos a seu respeito. Vocês, de fato, não sabem nada, sabem? Ignoram o que é a Verdade, o que é Deus – se tal entidade existe – o que é uma mente religiosa. Lêem livros que tratam desta questão, da qual se fala há milênios e estão vivendo com base no conhecimento e nas experiências de outros, com base na propaganda. É necessário pôr tudo isso de lado, se desejam descobrir alguma coisa; por conseguinte, a investigação desta matéria é uma coisa sumamente “séria”. Se desejam “brincar”, existem entretenimentos de toda espécie: os chamados espirituais, os de cunho religioso; mas estes não têm valor algum para o homem de reflexão.

Para investigar o que é a mente religiosa, devemos estar livres de nosso condicionamento, de nosso cristianismo, de nosso budismo, com a respectiva propaganda de milhares de anos, a fim de que tenhamos isenção para observar. Isso é sobremaneira difícil, porque tememos achar-nos sós. Desejamos segurança, externa e internamente; por isso, dependemos dos outros – do sacerdote, do guia espiritual, do guru que diz: “Experimentei e, portanto, sei”. Temos de estar completamente sós – mas não, isolados. Há vasta diferença entre estar isolado e estar completamente só, ser um todo não fracionado. O isolamento é um estado de espírito em que cessaram as relações e, em nossa vida e atividades diárias, erguemos (consciente ou inconscientemente) uma muralha em torno de nós para não sofrermos danos. Esse isolamento, naturalmente, impede qualquer espécie de relação. “Estar só” implica que a pessoa não depende de outra, psicologicamente, não está apegada a ninguém; isso não é dizer que não há, então, amor; o amor não é apego. “Estar só” significa que, profundamente, interiormente, não existe nenhum movimento de medo e, por conseguinte, nenhum movimento de conflito.

Se me acompanharam até aqui, podemos passar a investigar o que exprime disciplina. Geralmente, disciplina é para nós uma espécie de “treinamento”, de repetição, um meio de vencer um obstáculo, ou de resistir, reprimir, controlar, ajustar. Tudo isso está implicado na palavra “disciplina”, tal como a consideramos. Já o significado etimológico da palavra é “aprender”.

A mente que quer aprender deve ter curiosidade, vivo interesse; e, quanto à mente que “já sabe”, esta não tem possibilidade de aprender. Disciplina, por conseguinte, significa aprender por que razão controlamos, reprimimos, por que razão há medo, porque nos ajustamos, comparamos e, conseqüentemente, nos vemos em conflito. O próprio ato de aprender produz ordem; não a ordem criada segundo um plano ou padrão: na mesma investigação da confusão, da desordem, existe ordem. Em regra, vivemos confusos por dúzias de razões, que, por ora, não precisamos examinar. Necessitamos aprender sobre a confusão, sobre a vida desordenada que estamos levando; não nos cabe tratar de estabelecer a ordem na confusão, ou na desordem, mas, sim, aprender sobre a confusão e a desordem. Assim, enquanto aprendemos, nasce a ordem.

A ordem é uma coisa viva, e não uma coisa mecânica; a ordem, por certo, é virtude. Na mente que se acha confusa, que se ajusta, que imita, não existe ordem, porém conflito. E em conflito a mente se acha em desordem e, deste modo, é sem virtude. Com esse investigar, com esse aprender, vem a ordem, e a ordem é virtude. Observem-se, vejam o estado de desordem em que se encontra sua vida – tão confusa e mecânica! Nesse estado, queremos descobrir uma maneira moral de viver com ordem e com uma mente sã. Como pode a pessoa confusa, que apenas sabe obedecer ou imitar, ter qualquer espécie de ordem, qualquer espécie de virtude? Examinando-se a moralidade social, vê-se que é totalmente imoral; poderá ser “respeitável”, mas o que é respeitável é quase sempre sem ordem.

A ordem é necessária, porque só com ela é possível uma ação plena, e ação é vida. Mas nossa ação produz desordem; há a ação política, a ação religiosa, a ação atinente aos negócios, à família; todas essas ações são fragmentárias e, portanto e naturalmente, contraditórias. Você é um duro homem de negócios e, em casa, um meigo ente humano – pelo menos mostra sê-lo; aí há contradição e, por conseguinte, desordem. A mente em desordem não tem possibilidade de compreender o que é virtude. E, hoje em dia, com a licença existente em todos os sentidos, não existe ordem nem virtude. A mente religiosa necessita dessa ordem não obediente a nenhum padrão ou plano estabelecido por você ou por outrem. Mas, essa ordem, esse senso de retidão moral, só vem quando se compreende a desordem, a confusão, o caos em que estamos vivendo.

O que acabamos de dizer visa a mostrar como lançar as bases da meditação. Se não lançarmos essas bases, a meditação se tornará uma fuga. Com essa espécie de meditação pode-se ficar brincando toda a vida, e é isso o que a maioria das pessoas está fazendo: vivendo vidas medíocres, confusas, desordenadas e encontrando maneiras de quietar a mente, pois há tanta gente a prometer “uma mente quieta” (o que quer que isso signifique).

Assim, para a mente ardorosa, pois trata-se de uma coisa importante e não de uma brincadeira é necessário estar-se livre de toda crença, de toda e qualquer ligação porque nós estamos ligados ao todo da vida, e não a um fragmento dela. Em maioria estamos vinculados a alguma revolução física, política, a um movimento religioso, a uma espécie de vida espiritual, monástica, etc. Todas essas coisas são ligações fragmentárias. Falamos sobre liberdade porque dela necessitamos para ligarmos o nosso ser, a nossa energia, vitalidade e paixão à totalidade da vida e não a uma de suas partes. Podemos então começar a investigar o que significa meditar.

Não sei se já consideraram esta questão da meditação. Provavelmente alguns de vocês têm “brincado de meditar”, procurando controlar seus pensamentos, seguir diferentes sistemas, mas isso não é meditação. Temos de abrir mão de todos os sistemas que se nos têm oferecido: sistema Zen, Meditação Transcendental, etc. – armadilhas trazidas da Índia e da Ásia, nas quais tanta gente se deixa aprisionar. Precisamos examinar a questão dos sistemas, dos métodos, e espero tenham vontade de fazê-lo; porque nós estamos participando, todos juntos, no exame deste problema.

Quando temos de seguir um sistema, que sucede à nossa mente? Que implicam os sistemas e os métodos? Um guru. Não sei porque eles se denominam, a si próprios, “gurus”. Não encontro um termo suficientemente forte com que reprovar a classe dos gurus, com sua autoridade (eles pensam que sabem). O homem que diz “Eu sei”, esse homem não sabe. Ou, se ele diz “Experimentei a Verdade”, desconfiem dele decididamente. São estes os que oferecem os sistemas. Um sistema envolve: praticar, seguir, repetir, alterar “o que realmente é” e, por conseguinte, aumentar o conflito. Os sistemas tornam a mente mecânica, não libertam ninguém; poderão prometer a liberdade no fim de tudo, mas a liberdade está no começo e não no fim. Se querem investigar a verdade sobre qualquer sistema, sem terem liberdade, logo de início, acabarão então, fatalmente, adotando um método e com a mente incapacitada de ser sutil, ágil, sensível. Podem, pois, abandonar completamente todos os sistemas. O importante não é controlar o pensamento, mas compreendê-lo, compreender as origens, os começos do pensamento, que se acham na própria pessoa. Quer dizer, o cérebro armazena “memórias” (isso vocês mesmos podem observar, e não necessitam de ler livros sobre a matéria); se ele não armazenasse “memórias”, seria completamente incapaz de pensar. A memória é o resultado da experiência, do conhecimento, de cada um ou da comunidade, da família, da raça, etc. O pensamento brota daquele reservatório de “lembranças”. O pensamento, portanto, jamais é livre, é sempre velho; não existe essa coisa chamada “liberdade de pensamento”.

O pensamento, em si, não pode ser livre, embora fale sobre liberdade; em si próprio, ele é o resultado das “memórias”, experiências e conhecimentos trazidos do passado; em conseqüência, ele é velho. Todavia, necessitamos desse acervo de conhecimentos, pois, sem ele não poderíamos funcionar, não poderíamos falar uns aos outros, não poderíamos voltar para casa, etc. O conhecimento é de essencial importância.

Compete-nos descobrir se, na meditação, o conhecimento tem fim, se nela estamos livres do conhecido. Se a meditação é a continuação do conhecimento, a continuação de tudo o que o homem acumulou, não há, então, nela, liberdade. Só há liberdade se compreendemos a função do conhecimento e, por conseguinte, dele nos achamos livres.
Estamos explorando o campo do conhecimento, para vermos quando deve funcionar e quando se torna um empecilho à investigação mais profunda. Se as células cerebrais continuam ativas, só podem funcionar no campo do conhecimento. É só isso que o cérebro pode fazer, ou seja, funcionar no campo da experiência, do conhecimento, no campo do tempo, vale dizer, no passado. Meditação é descobrir se existe um campo ainda não contaminado pelo conhecido.

Se, meditando, continuo com o que antes aprendi, com o que já sei, estou então vivendo no passado, no campo de meu condicionamento. Nesse campo não há liberdade. Posso adornar a prisão em que estou vivendo, fazer coisas diversas dentro dela, mas há sempre uma limitação, uma barreira. Cumpre, pois, descobrir se as células cerebrais, evolvidas através de milênios, podem estar totalmente quietas e em correspondência com uma dimensão desconhecida. Quer dizer, pode a mente tornar-se tranqüila?

Foi sempre esse o problema das pessoas religiosas, através dos séculos, reconhecendo que se necessita de total serenidade, porque só então se pode ver. Se estamos a tagarelar, com o espírito em movimento, a correr para todos os lados, é óbvio que não podemos ver nem escutar totalmente. Assim, dizem as pessoas religiosas: “Controle a mente, segure-a, coloque-a numa prisão”; não descobriram uma maneira de pôr a mente num estado de completa e absoluta quietude. Dizem: “Não cedam a nenhum desejo, não olhem para uma mulher, para os belos montes, para as árvores e a beleza da Terra, porque se o fizerem, aquela beleza poderá sugerir-lhes a lembrança de uma mulher ou um homem. Portanto, controlem-se, perseverem, concentrem-se”. Assim fazendo, os põem em conflito e, desta maneira, haverá mais o que controlar, mais o que superar. Sucede isso há milênios, por se ter percebido a necessidade de uma mente tranqüila. Ora, como pode a mente serenar sem esforço, sem controle, sem se lhe traçarem limites? No momento em que se pergunta “como?”, cria-se a necessidade de um sistema. Portanto, aqui não há como”.

Pode a mente quietar-se? Não sei o que irão fazer ao perceberem verdadeiramente a necessidade de terem aquela mente que, estando absolutamente quieta, se torna sobremodo sensível e sutil. Como pode isso verificar-se? Esse é um problema de meditação, porque só essa é a mentalidade religiosa. Só ela é capaz de ver o todo da vida como uma unidade, como um movimento unitário, não fragmentado. Essa mentalidade, por conseguinte, atua totalmente e não fragmentariamente, porque sua ação emana da quietude completa.

A verdadeira base é uma vida de relação total, uma vida com ordem e, por conseguinte, virtude, uma vida interior simples e, portanto, austera – a austeridade da simplicidade profunda, própria da mente isenta de conflito. Se lançarem essa base, facilmente, sem esforço algum (porque, tão logo se introduz o esforço, há conflito), verão a sua genuína valia. É, conseqüentemente, a percepção de “o que é” que realiza a transformação radical.

Só a mente tranqüila pode compreender que, em sua quietude, há um movimento bem diverso, de diferente dimensão, de outra qualidade. Esse movimento, sendo inefável, não pode ser expresso em palavras. O que pode ser descrito só nos leva até este ponto: o ponto em que, tendo lançado a base correta, percebemos a necessidade, o valor e a beleza da serenidade espiritual.

Para a maioria, a beleza se encontra em alguma coisa: um edifício, uma nuvem, a forma de uma árvore, um lindo rosto. A beleza está “lá fora” ou faz parte da natureza da mente em que não há atividade egocêntrica? Porque a meditação, tão importante como a alegria que nela encontramos, é a compreensão da beleza. A beleza, com efeito, é o total abandono do “eu”; e os olhos que abandonaram o “eu” podem ver as árvores e sua pujança, e a formosura de uma nuvem. Isso acontece quando não existe nenhum centro constituído pelo “eu”. É uma coisa que sucede a qualquer de nós, – não é verdade? – ao vermos, por exemplo, uma majestosa montanha que subitamente se nos descortina. Tudo foi varrido para o lado, exceto aquela majestade. A montanha, a árvore, nos absorve completamente.

Algo semelhante sucede a uma criança que se diverte com um brinquedo; o brinquedo a absorve e, se se quebra, ela volta a suas ocupações habituais, suas travessuras, seus choros. Conosco se dá a mesma coisa, ao vermos a montanha ou a árvore solitária no alto de um monte, elas nos absorvem. E nós desejamos absorver-nos em alguma coisa – numa idéia, numa atividade, num compromisso, numa crença, ou noutra pessoa tal qual a criança com seu brinquedo.

A beleza, pois, significa sensibilidade – um corpo sensível, graças a uma alimentação adequada e a uma maneira correta de viver. A mente se torna, então, naturalmente quieta. Não é possível aquietar a mente, porque você é que é o causador de todos os males, você é que se acha perturbado, ansioso, confuso. Como pode torná-la tranqüila? Mas, ao compreender o que é quietude e o que é confusão, ao entender o que é sofrimento e que é possível acabar com ele, e, também, ao compreender o que é o prazer – então, dessa compreensão, surge uma mentalidade serena; não precisamos buscá-la. Devemos partir do começo, e o primeiro passo é o último passo. Eis o que é meditação.”

INTERROGANTE: Faz o senhor a apologia da beleza das montanhas, dos montes, do céu. Essa apologia não é útil para o comum das pessoas. A apologia que serve é a da sordidez.

KRISHNAMURTI: Está bem; façamos a apologia das ruas imundas de Nova Iorque, a apologia da miséria, da pobreza, dos guetos, das guerras, para as quais cada um de nós contribuiu. Vocês sentem de outro modo, porque se separaram, se isolaram; portanto, não estando em relação com os outros, corrompem-se e permitem que a corrupção se espalhe pelo mundo. Eis porque a corrupção, a poluição, as guerras, o ódio, não podem ser sustados por nenhum sistema político ou religioso, por nenhuma organização. Cumpre haver transformação. Não o percebem? Precisam deixar de ser o que são. Não à força de “querer”; meditação é expurgar a mente da vontade. Verifica-se, então, uma ação de espécie inteiramente diferente.

INTERROGANTE: Se pudermos alcançar o privilégio de nos conscientizarmos, como poderemos ajudar àqueles que se acham condicionados, àqueles que abrigam um profundo ressentimento?

KRISHNAMURTI: Permita-me interrogá-lo porque usa a palavra “privilégio”. Que há de sagrado ou de “privilegiado” em estar-se conscientizado? Essa é uma coisa natural, não acha? – estar ciente. Se você tiver ciência de seu condicionamento, da agitação, da sordidez, da miséria, da guerra, do ódio, existentes no mundo – se de tudo isso estiver inteirado, estabelecerá uma relação tão completa entre você – que ficará em relação com todos os outros entes humanos. Verá, então, que não causará dano aos outros; eles é que causam dano a si próprios. E, assim o que se pode fazer é sair pelo mundo a pregar, a falar – mas não com o desejo de ajudá-los, compreende? Esta é a coisa mais terrível que se pode dizer: “Quero ajudar a outrem”. Quem é você, quem sou eu, para ajudar os outros?

Senhor, a beleza da árvore ou da flor não “deseja” ajudá-lo. A você é que cabe olhar a sordidez ou a beleza; e se é incapaz de olhá-las, trate de descobrir porque se tornou tão indiferente, tão insensível, tão superficial e vazio. Se o descobrir, ver-se-á num estado em que a vida fluirá como as águas, e você nada terá de fazer.

INTERROGANTE: Qual a relação entre a percepção das coisas exatamente como são e a consciência?

KRISHNAMURTI: Você só conhece a consciência pelo seu conteúdo, e esse conteúdo são as coisas que estão sucedendo no mundo, do qual você faz parte. O esvaziar desse conteúdo não significa ficar privado da consciência, senão ingressar numa dimensão bem diferente. Sobre essa dimensão não é possível especular. O que podemos fazer é tratarmos de descobrir se é possível descondicionarmos a mente pela conscientização, pelo tornar-nos atentos.

INTERROGANTE: Eu próprio não sei o que é o amor, o que é a Verdade, ou o que é Deus. Mas diz o senhor que “amor é Deus”, em vez de “Amor é Amor”. Poderá explicar porque diz “Amor é Deus”?

KRISHNAMURTI: Eu não disse que amor é Deus.

INTERROGANTE: Lendo um de seus livros …

KRISHNAMURTI: Desculpe a interrupção … não leia livros! Daquela palavra se tem usado e abusado. Ela está “carregada” dos desesperos e esperanças do homem. Você tem o seu Deus, e os comunistas têm o deles. Assim, se me permite sugeri-lo, trate de descobrir o que é o Amor. Só descobrirá o que é o amor, se souber o que ele não é. Não, se o souber intelectualmente, porém, na vida real, afastando tudo o que o nega – o ciúme, a ambição, a avidez; as divisões que diariamente se verificam; eu e você, nós e eles, brancos e pretos. Infelizmente, as pessoas não o fazem, porque isso requer energia e a energia só vem ao observarmos a realidade, sem dela fugirmos. Vendo o que realmente é, então, observando-o, teremos a energia necessária para transcendê-lo. Não podemos transcendê-lo, se forcejamos para evitá-lo, para traduzi-lo ou superá-lo. Note simplesmente “o que é”, e descobrirá o que é amar. O amor não é prazer. E sabe o que significa descobri-lo realmente, você mesmo, em seu interior? Significa já não haver medo, nem apego, nem dependência, mas tão somente uma relação isenta de qualquer divisão.

INTERROGANTE: Pode-me dizer algo sobre a função do artista na sociedade? Desempenha ele algum papel além do que lhe é atribuído?

KRISHNAMURTI: Que é um artista? Aquele que pinta quadros, escreve poesias, aquele que busca expressar-se por meio da pintura ou escrevendo livros ou dramas? Porque separamos o artista de nós outros? Ou, porque diferenciamos o intelectual dos demais indivíduos? Colocamos o intelectual num certo nível, o artista noutro nível, talvez mais alto, e o cientista num nível mais elevado ainda. Depois, perguntamos: “Qual a função deles na sociedade?” Não se trata de saber qual é a função deles, mas qual é a sua junto à coletividade. Porque foi você que criou a desordem existente. Qual a sua função? Descubra-o. Isto é, trate de descobrir porque vive dentro deste mundo de sordidez, ódio e aflição; aparentemente, ele não o atinge.

Como vê, o senhor escutou estas palestras, participou em algumas das coisas ditas e compreendeu – nós o esperamos – muitas delas. Com isso pode tornar-se um “centro de relações corretas” e, portanto, compete-lhe transformar esta terrível, corrupta e destrutiva sociedade.

INTERROGANTE: Poderá falar sobre o tempo psicológico?

KRISHNAMURTI: O tempo é velhice, o tempo é sofrimento, o tempo não respeita ninguém. Há o tempo cronológico, medido pelo relógio. Este é indispensável; do contrário, não poderíamos ter condução, viajar, preparar uma refeição, etc. Mas, nós aceitamos outra espécie de tempo, ou seja “amanhã eu serei, amanhã mudarei, futuramente me tornarei isto ou aquilo”; psicologicamente, criamos este tempo – amanhã. Mas, existe esse dia imediato? Eis uma pergunta que tememos fazer a sério. Porque nós desejamos o amanhã: “amanhã terei o prazer de me encontrar com você, amanhã eu compreenderei, minha vida será diferente. Amanhã conhecerei a iluminação. E desse modo o futuro se torna a coisa mais importante de nossa vida. Ontem você se deleitou sexualmente, fruiu vários prazeres, e deseja repeti-los no dia seguinte, ou logo depois.

Faça a si próprio esta pergunta, e descubra a verdade respectiva: “Existe realmente um amanhã fora do pensamento” que projeta o amanhã? O futuro, com efeito, é uma invenção do pensamento. Se, psicologicamente, não houvesse um amanhã, que aconteceria, hoje, em sua vida? Uma tremenda revolução, não é? Sua ação se transformaria radicalmente, não é assim? Você seria, agora, um ente total e não um ente projetado do passado para o presente e daí para o futuro.

Tal equivale a viver e morrer todos os dias. Faça-o, e verá o que exprime viver completamente hoje. E isso não é amor? Ninguém diz “Amanhã amarei”. Ou amamos ou não amamos. O amor não reside no tempo; nele só está o amargor, porque o amargor, tal como o prazer, é pensamento. Devemos, pois, descobrir o que é o tempo, e descobrir se existe um “não amanhã” (no tomorrow). Isso é viver; há então aquela vida eterna – porque, na Eternidade, não existe tempo.

Krishnamurti

FONTE: http://www.cuidardoser.com.br/

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O Crepúsculo

O crepúsculo anuncia
A chegada de um novo dia
Os pássaros cantam uma harmonia sutil, como em ritual de agradecimento, celebrando esse momento
A chegada da luz faz a escuridão se dissipar
Revelando as cores vivas daquele lugar
O sol já vai nascer
A nova vida vai começar…
Acenda a luz da sua consciência
E comece a participar

Tentam manipular seus desejos
Para não enchergar o que você realmente precisa
Falsas comodidas entorpecem sua mente
E te tornam alheio ao milagre da vida
Assim os dias parecem iguais
Nem sabes o que quer, mas quer sempre mais
e nunca se satisfás….
Pense na real causa de seu desconforto, e acredite
Os pássaros têm muito a lhe dizer
E o nascer do sol muito a lhe mostrar

Meditação


Pensem na mente como um oceano, sendo suas ondulações os pensamentos. Tais ondulações são inseparáveis do oceano, assim como pensamentos são inseparáveis da natureza da mente. Em um oceano muito revolto poderá cair um caminhão, que não perceberemos os efeitos causados por este fato, enquanto em um oceano calmo, poderemos ver claramente as reações de qualquer mínimo estímulo, como uma pequena gota caindo na água.

Meditar, pra mim, não objetiva parar de pensar, mas acalmar o “oceano” com a intenção de clarear a consciência para a natureza dos pensamentos. “Parar de pensar” é consequência do meio utilizado, e conseguimos isso através da prática da concentração, seja na respiração, em mantras e sons ou simplesmente na observação da própria mente, testemunhando sua manifestação natural. Meditar é testemunhar, e a melhor testemunha de um fato é sempre aquela que apenas o observa , de forma alheia, sem envolvimento ou agregação de valores.

Os pensamentos surgem naturalmente em um fluxo, mas no estado de meditação nos tornamos os observadores, sem se apegar a emoções e pensamentos específicos. Assim passamos a conhecer melhor o oceano, não apenas as ondas em sua superfície. Muitas pessoas falam que para meditar devemos nos esforçar para “afastar todos os pensamentos”, porém pra mim isso não faz sentido, pois nunca poderemos calar a mente com um esforço mental incessante como este. Existe uma grande diferença entre “afastar pensamentos” e “se afastar dos pensamentos”, sendo esta segunda a única forma de meditação, na minha opinião. O erro está em pensar na meditação como uma luta contra os processos naturais da mente. Quando nos esforçamos para simplesmente afastar os pensamentos, sempre fazemos isso através de novos pensamentos e nunca entramos no silêncio. Porém se não nos preocuparmos com isso e praticarmos apenas a concentração, o silêncio virá naturalmente.

Os efeitos da prática podem ser observados pela diminuição natural do fluxo de pensamentos, que permite uma observação mais clara, e pela permanência no “espaço vazio” entre os pensamentos, que caracteriza o estado de meditação. A meditação proporciona auto-conhecimento, ao ponto que buscamos não interpretar a realidade com nossos conceitos contaminados de valores sociais, culturais ou o que quer que sejam. Nesse momento não se busca compreender nada, apenas sentir.

Psicoativos X Enteógenos

Acho que convém fazer aqui, uma diferenciação entre esses 2 conceitos. Claro que tudo o que eu escrever será apenas minha visão dos fatos, então estejam à vontade para falarem o que pensam também.

Sobre o termo Psicoativos, acredito que nem tenha necessidade de explicação, já que o nome fala por si. Entra nesse grupo qualquer substância que tenha efeito na mente do indivíduo. Café, maconha, cocaína, guaraná, anti-depressivos/calmantes, álcool e milhões de outros.

Os Enteógenos são substâncias que nos colocam em contato com o “sagrado”. Expandem a consciência,  nos levando a  níveis de percepção inacessíveis nos estados normais. É claro que isso acaba ficando subjetivo, pois cada um pode ter sua própria interpretação do tal “contato com o sagrado”. Assim como muitas pessoas frequentam a Igreja Universal, acreditando que doar seu dinheiro à instituição fará sua fé valer, outras podem acreditar até que a cocaína proporciona experiências divinas. E quem sou eu para julgá-los…… Mas o fato é que existem  substâncias que não oferecem riscos físicos ou dependência, e são exatamente estas que são usadas desde os primórdios da humanidade, como ferramentas espirituais. E de fato são as únicas que parecem gerar estes resultados de expansão de consciência. A maioria das pessoas que tomam pela primeira vez a psilocibina (“alucinógeno” presente apenas em cogumelos) relatam intensas experiências místicas/espirituais, de forma a modificar completamente sua visão de mundo. Isso foi comprovado pela matéria que saiu no “Estadão”, sobre a ciência avaliando o poder espiritual dessa substância, na qual já até postamos o link.  Mesmo assim acho que cabe aqui transcrever um pequeno trecho do texto :

” Entre as experiências descritas, houve “senso de pura consciência” e “fusão com a realidade última”, “transcendência do tempo e do espaço”, “senso do sagrado” e emoções como alegria, paz e amor.”

Este tipo de experiência é comum não só com a psilocibina dos cogumelos, mas também com DMT(ayahuasca, e análogos), mescalina (peyote, san pedro), LSA( presente nas sementes de algumas plantas) e o LSD. Alguns não gostam de classificar o LSD como enteógeno, por ser um semi-sintético, mas pra mim isso é um preconceito, pois essa dúvida é facilmente tirada se você tomar um bom doce em meio à natureza. Penso que LSD é enteógeno sim, mas não é tão poderoso quanto os outros, naturais.

Enquanto isso, psicoativos como os da Cocaína e do Ecstasy parecem ir no caminho inverso. Causam dependência, danos físicos e mentais, overdoses ,etc… E além disso, os efeitos dessas substâncias são facilmente entendidos através de lógicas simples de química. Na minha opinião, não há nada de trancedental em se tomar uma “pastilha”.

É por essas e outras que eu acho que é muito conveniente fazer a separação entre Psicoativos e Enteógenos. Todo enteógeno é um psicoativo, mas a grande maioria dos psicoativos NÃO são enteógenos.

Tenham um bom dia, fiquem em paz.

O Uso Espiritual

Quando se fala em uso espiritual de substâncias, pra alguns é difícil de engolir. A maioria das pessoas associa logo a palavra “droga” e todo o peso que ela carrega consigo, e outros não conseguem admitir a intervenção de alteradores de percepção como uma coisa benéfica.

Pois bem, milênios antes da palavra “droga”  existir, psicoativos como Ayahuasca, peyote e cogumelos eram e continuam sendo utilizados por indígenas de diversas tribos, de crenças e localidades totalmente diferentes. Alguns acreditam entrar em contato com deuses, outros com os espíritos das plantas ou dos animais, outros com espíritos humanos desencarnados e por aí vai. Na sociedade moderna de hoje também foram criadas diversas seitas religiosas e crenças envolvendo o uso dos chás…cada cultura com seu colorido diferente. Mas por “coincidência” o objetivo é basicamente sempre o mesmo: entrar em contato com o mundo espiritual. “Mundo espiritual” é apenas um rótulo que usei, que significa o sagrado, algo que está além da percepção normal e nos ajudaria a compreender melhor o universo e as clássicas questões existenciais como “quem somos nós?” ; “Por que estamos aqui?” ; “O que devemos fazer?”. A raiz do uso dessas substâncias sempre foi seriamente relacionada à estas questões, independente da interpretação cultural dada, e isso é o que caracteriza o uso espiritual. Mas aqui na civilização, as pessoas que nem conhecem tais substâncias insistem em sustentar a idéia de que isso é “coisa de maluco”, ou que o efeito enteógeno não é real, é apenas um “estado alucinatório”, uma falsa noção da realidade. Como já falamos aqui, é bem difícil definir a realidade, já que cada um a percebe e interpreta de sua forma particular. E se o tal “estado alucinatório” me parece violentamente mais REAL do que o estado comum, como poderei acreditar no contrário? É a mesma coisa que você flagrar sua mulher com outro e alguém ainda tentar convencê-lo de que o que você viu não é real. Aí a escolha é sua, ou você cria essa ilusão e acredita nela a ponto de vivenciá-la, ou vive a realidade da forma que sua experiência lhe mostrou ser.

Em diversos relatos de Experiências de Quase Morte, as pessoas afirmam terem passado naqueles momentos pelas situações mais reais de toda a sua vida, mesmo que dentro das próprias mentes. E tais experiências modificam para sempre a forma de enxergar a realidade e interagir com ela dessas pessoas, a ponto de muitos afirmarem que foi a melhor coisa que já lhes aconteceu. Experiências com enteónegos são completamente diferentes (nunca tive uma E.q.m. mas acredito que deva ser bem diferente, e principalmente muito mais dolorosa do que uma com enteógenos) mas nesse ponto são semelhantes. Na minha opinião, ambas são experiências espirituais e assim devem ser consideradas.

Acreditando ou não no poder dessas plantas e fungos, as pessoas precisam aceitar o fato de que existe o uso espiritual dessas substâncias, e deve ser tratado com seriedade e respeito, pois sempre fez parte da cultura em toda a história da humanidade.

“Loucura” e realidade …

Bom…eu ia criar um post com a pergunta: “quem toma alucinógenos fica louco pra sempre?” no título,para desmistificar algumas lendas, mas vi que antes de falar dos alucinógenos devemos analisar os conceitos de loucura e realidade. Fui escrevendo sobre estes conceitos e vi que era assunto pra um post inteiro. Então resolvi falar só disso agora, deixando o outro assunto para um próximo post.

Primeiramente temos que estabelecer o que é de fato a loucura, tarefa difícil….Eu penso que alguém é louco a partir do momento em que suas atitudes não fazem nenhum sentido para mim, então são “loucuras” que não condizem com a realidade. Mas….o que é a realidade ? Sabemos que existe uma, temos 5 sentidos que nos permitem captar algo, e o cérebro, que “junta tudo” e cria uma interpretação à partir disso. Mas essa interpretação é particular, e experiências distintas podem levar à caminhos totalmente diferentes, ou seja, a sua realidade pode não ser a mesma que a minha, mesmo sendo a mesma hehehe.
Seguindo esssa linha de raciocínio, chamar alguém de louco seria mais um pré-conceito, talvez por pura preguiça de tentar entender a interpretação da pessoa. E também egocentrismo, pois quando fazemos isso, colocamos nossa verdade como o padrão de normalidade, e esquecemos que talvez para o “maluco”, os loucos sejamos nós. Agora entendo porquê tantas pessoas me acham louco =)

Vivemos em sociedade, onde somos unidos pelas nossas semelhanças, interesses, etc. Há pessoas que não compartilham de semelhanças, vivem em um mundo particular, estão sintonizados em outra realidade que não se encaixa na sociedade e não conseguimos compreender. Algumas dessas pessoas estão tão imersas em suas realidades particulares que dependem de outras para fazer as coisas mais básicas e sobreviver. Alguns chamam isso de doença, mas pra mim isso também é preconceito. O que eu acho que acontece é que além dessas pessoas interpretarem a realidade de forma muito particular, elas levam isso tão à sério a ponto de não enxergar as outras facetas da realidade, principalmente àquelas comuns à quase todos. E nós, que estamos aqui compartilhando uma realidade comum, achamos que isso está errado, que não deveria ser assim, que não é “normal”. Mas sequer paramos pra pensar se os tais “loucos” concordam com isso, pois pelo menos ao que parece, a maioria não está se importando, muito menos acham que devem mudar em algum aspecto. Com certeza para eles, suas interpretações são totalmente reais e fazem sentido. Mas como pode alguém interpretar a mesma coisa de forma tão diferente ? É como interpretar um texto subjetivo…o texto está lá, igual para todos, mas as pessoas podem interpretar de várias formas diferentes, e até contrárias, dependendo do que elas já têm em suas mentes. Mas para tentar interpretar um texto da forma mais fiel possível devemos tentar enxergar com os olhos do autor, entender o que ELE quis passar com suas palavras, deixando nossos próprios valores um pouco de lado….Essa analogia realmente soou bem pra mim, pois eu penso que é exatamente isso que devemos fazer para interpretar a realidade da melhor forma possível. Esquecer nossos valores, preferências, desejos, buscando a realidade tal como é. Já dizia Bruce Lee: “ver algo sem o colorido dos próprios olhos e preferências pessoais é vê-lo em sua simplicidade primitiva.”

“Enxergar com os olhos do autor” – quero chamar a atenção também pra importância dessa expressão nessa analogia da interpretação da realidade. Isso é o que buscam várias filosofias e religiões, tal como Budismo e Hinduísmo. O Nirvana ou Samadhi, grande objetivo dessas religiões seria exatamente isso, como se unir à Deus, conhecendo seus verdadeiros pensamentos, através da meditação. Não acredito que podemos realmente alcançar isto de forma definitiva, pois diferente de um texto, a realidade não é imutável, e só cresce continuamente, em ciclos. Portanto, mesmo que se chegue a “enxergar com os olhos do autor”, no momento em que você interpretou isso de alguma forma, a realidade já mudou…..mas ficou todo o aprendizado, abrindo novos caminhos e possibilitando novas buscas…..uma eterna evolução.

PAZ

Psiconautas …

Olá a todos!

Psilocybe cubensis spore print
Psilocybe cubensis spore print

É com grande prazer que venho escrever o texto de inauguração do nosso Blog, que será um espaço democrático, onde a liberdade de expressão e o respeito serão valores essenciais.

Somos um grupo de pessoas que nos reunimos pela rede, com o objetivo de trocar idéias, experiências, artigos científicos e tudo mais que envolva este mundo mágico, não só dos cogumelos, mas de todo tipo de “agente enteógeno” existente. Queremos desmistificar lendas, quebrar os tabus e preconceitos que rodeiam estes assuntos, e valorizar o lado Espiritual do uso dessas substâncias.

Acredito que o maior ponto comum em nós, seja o fato dessas experiências terem marcado as nossas vidas, mostrando um novo rumo a ser tomado.

Trabalho, estudo, correria do dia-a-dia, tudo isso nos faz acreditar que temos um objetivo na vida. O objetivo que a sociedade nos impõe a todo o momento, precisamos juntar dinheiro para possuirmos nossa própria casa, pagarmos nossas contas e constituirmos nossas famílias. O engraçado é alguns chamarem isso de independência…dependendo de tanta coisa ! !hehehe…

Mas será que é realmente disso que precisamos?

Os Enteógenos proporcionam momentos profundos de auto-reflexão, e é possível se desligar dos padrões diários quando se está sob efeito deles. Pensar por si mesmo é uma das conseqüências disso, e se passa a perceber que os valores da “sociedade” apenas “embaçam” nosso verdadeiro caminho, pois este só pode ser conhecido através da busca introspectiva, sem levar em conta valores alheios.

Enfim, acima de tudo nosso Blog é isso, um espaço onde a busca espiritual é livre de dogmas e pregação de valores, onde o caminho só pode ser traçado por aquele que nele caminha…onde os enteógenos são ferramentas essenciais para a busca do Eu superior, ou o que quer que seja que chamamos de Deus.

Sejamos livres para trocarmos idéias, desde que haja respeito. Afinal somos todos parte do mesmo organismo. яндекс

Desde já um grande abraço, fiquem em PAZ!